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PODER JUDICIÁRIO COMARCA DE SENTENÇA

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Academic year: 2021

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SENTENÇA

Cuida-se de ação indenizatória ajuizada por XXXXXXXX em face de YYYYYYYYY, exigindo a implementação de cobertura securitária e a reparação moral, sob a alegação de ter sofrido lesão a direito da personalidade em virtude de conduta da ré.

Assevera o autor, em apertado esforço de síntese, ter firmado com a requerida contrato de seguro de veículo automotivo e estar em situação regular quanto ao pagamento do prêmio. Aduz que teve seu veículo roubado, mas a seguradora negou-se a implementar a cobertura ao argumento de que houve falsidade na declaração do perfil do condutor.

Aduz que, no trâmite do pedido de cobertura, a seguradora agiu de modo desarrazoado, vexatório e abusivo, atingindo os direitos da personalidade do autor.

Postula, ao final, a condenação da ré ao pagamento de indenização por danos morais e ao pagamento da cobertura securitária, conforme tabela FIPE.

Liminar indeferida.

Citada, a ré ofertou contestação na qual assevera que a cobertura foi negada em razão da falsidade da informação acerca do condutor principal do veículo. Sustenta que, embora o contrato tenha sido firmado declarando-se como condutor principal a pessoa de ZZZZZZZZZZ, no momento do sinistro era XXXXXXXXX quem guiava o veículo. Giza que esse fato acarretou a assunção pela seguradora de um risco não dimensionado no contrato. Assevera que caso houvesse sido estipulada a pessoa de XXXXXXXXX na condição de condutor principal o prêmio teria sido calculado em 2486 reais, em vez dos 1659 reais contratados.

Afirma não haver sido caracterizada lesão moral, uma vez que, quando muito, houve mero inadimplemento contratual.

Postula ao final a improcedência dos pedidos. Subsidiariamente, requer a aplicação dos juros e correção apenas desde a citação, bem como a eventual devolução do salvado à seguradora e o abatimento do valor da indenização, em razão do prêmio pago ao menor.

Realizada audiência, foi colhido o depoimento pessoal do autor. Em sede de razões finais, as partes reiteraram a argumentação lançada. É o relatório.

A lide em questão gira em derredor da licitude da negativa de cobertura securitária em razão de suposta falsidade nas declarações pertinentes ao perfil do condutor no momento da fixação do contrato.

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tem o direito de conhecer de modo razoável e previsível o alcance daquilo que se compromete a resguardar. Sendo assim, é dever do segurado apresentar no momento da contratação informações verdadeiras e leais, em obséquio à boa-fé objetiva, justamente porque o valor do prêmio leva em consideração, além de outros fatores, o risco estimado que será suportado pela seguradora.

Na hipótese sob julgamento, a parte ré sustenta que houve falsidade quanto à declaração do condutor principal. Narra que o condutor principal é a pessoa de XXXXXX, embora houvesse sido declarada a pessoa de ZZZZZZZ (fl. ).

As provas arroladas não suficientes a se concluir que realmente XXXXXX era o condutor principal do veículo. Em seu depoimento pessoal, o autor afirma que utilizava o automóvel 4 vezes por semana enquanto ZZZZZZZ o fazia nos três dias remanescentes. Sendo esta a única prova produzida acerca do fato, inviável certificar a falsidade da informação, até porque o autor afirma que seu pai era o condutor principal do veículo. Ausentes, ademais, eventuais provas de deliberada má-fé, notadamente porquanto a ré não se desincumbiu do ônus de trazer evidências nesse sentido.

Ainda que fosse verificada inexatidão da informação prestada, tal situação não garante à seguradora situação jurídica de salvaguarda universal para não cumprir a contraprestação contratual a que se obrigou. A contratada, que aceitou as declarações do segurado sem qualquer contestação ou investigação no momento do pacto, não se recusou a firmar a apólice nem a receber o prêmio. Sendo assim, não pode alegar que foi completamente ludibriada pela conduta do segurado. Trata-se escolha consciente, verdadeira estratégia comercial, de focar na obtenção de contratos em quantidade, sem se concentrar na investigação dos dados dos segurados. As perdas pontuais em razão de falsidade ou omissão de alguns, seriam compensadas com os ganhos em escala em razão do número de avenças firmadas, garantindo-se a lucratividade da estratégia.

Neste contexto, a negativa de cobertura em razão de suposta falsidade de declarações do segurado somente se afigura legítima quando houver relação de pertinência entre a informação omitida ou falseada, o incremento do risco e o sinistro. A esse respeito:

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. CERCEAMENTO DE DEFESA. NÃO OCORRÊNCIA. CONTRATO DE SEGURO. QUESTIONÁRIO DE RISCO. DECLARAÇÕES INEXATAS OU OMISSAS FEITAS PELO SEGURADO. NEGATIVA DE

COBERTURA SECURITÁRIA. DESCABIMENTO.

INEXISTÊNCIA, NO CASO CONCRETO, DE AGRAVAMENTO DO RISCO E DE MÁ-FÉ DO SEGURADO. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 7. EXISTÊNCIA DE CLÁUSULA LIMITATIVA COM DUPLO SENTIDO. APLICAÇÃO DA SÚMULA 5.

1. Vigora, no direito processual pátrio, o sistema de persuasão racional, adotado pelo Código de Processo Civil nos arts. 130 e

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partes, se pela análise das provas em comunhão estiver convencido da verdade dos fatos.

2. As declarações inexatas ou omissões no questionário de risco em contrato de seguro de veículo automotor não autorizam, automaticamente, a perda da indenização securitária. É preciso que tais inexatidões ou omissões tenham acarretado concretamente o agravamento do risco contratado e decorram de ato intencional do segurado. Interpretação sistemática dos arts. 766, 768 e 769 do CC/02.

3. "No contrato de seguro, o juiz deve proceder com equilíbrio, atentando às circunstâncias reais, e não a probabilidades infundadas, quanto à agravação dos riscos" (Enunciado n. 374 da IV Jornada de Direito Civil do STJ).

4. No caso concreto, a circunstância de a segurada não possuir carteira de habilitação ou de ter idade avançada - ao contrário do seu neto, o verdadeiro condutor - não poderia mesmo, por si, justificar a negativa da seguradora. É sabido, por exemplo, que o valor do prêmio de seguro de veículo automotor é mais elevado na primeira faixa etária (18 a 24 anos), mas volta a crescer para contratantes de idade avançada. Por outro lado, o roubo do veículo segurado - que, no caso, ocorreu com o neto da segurada no interior do automóvel - não guarda relação lógica com o fato de o condutor ter ou não carteira de habilitação. Ou seja, não ter carteira de habilitação ordinariamente não agrava o risco de roubo de veículo.

Ademais, no caso de roubo, a experiência demonstra que, ao invés de reduzi-lo, a idade avançada do condutor pode até agravar o risco de sinistro - o que ocorreria se a condutora fosse a segurada, de mais de 70 anos de idade -, porque haveria, em tese, uma vítima mais frágil a investidas criminosas.

5. Não tendo o acórdão recorrido reconhecido agravamento do risco com o preenchimento inexato do formulário, tampouco que tenha sido em razão de má-fé da contratante, incide a Súmula 7. 6. Soma-se a isso o fato de ter o acórdão recorrido entendido que eventual equívoco no preenchimento do questionário de risco ter decorrido também de dubiedade da cláusula limitativa. Assim, aplica-se a milenar regra de direito romano interpretatio contra stipulatorem, acolhida expressamente no art. 423 do Código Civil de 2002: "Quando houver no contrato de adesão cláusulas ambíguas ou contraditórias, dever-se-á adotar a interpretação mais favorável ao aderente".

7. Recurso especial não provido.

(REsp 1210205/RS, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 01/09/2011, DJe 15/09/2011)

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No caso concreto, não vislumbro tal relação de pertinência. É que, ainda que se repute que houve falsidade da informação relativa ao condutor principal, o sinistro em questão (assalto em via pública em dia útil e horário comercial – fl. ) não guarda qualquer relação com a pessoa do condutor. Pelo contrário, as regras da experiência demonstram que pessoas mais idosas são em geral mais susceptíveis a assaltos, já que aparentam maior fragilidade aos olhos dos meliantes.

É certo que motoristas mais jovens tendem a ser mais impetuosos e envolver-se com mais frequência em acidentes, além utilizar o veículo em horários mais propensos a assaltos, estacionar em locais com pior estrutura, dentre outros. Todas estas circunstâncias fazem com que o risco relativo a veículos conduzidos por jovens aumente, com elevação proporcional do prêmio.

Mas não se percebe pertinência entre a condição de ser mais jovem com o maior risco de assaltos à mão armada em via pública, em horário comercial.

No que concerne à indenização por danos morais, não vislumbro a ocorrência de ilícito que extrapole o mero inadimplemento contratual.

É cediço que o mero inadimplemento contratual, via de regra, não produz lesão moral indenizável. Apenas em hipóteses excepcionalíssimas, quando demonstrada violação de magnitude tal que exacerbe o campo obrigacional, alcançando os atributos personalíssimos do indivíduo, é que se pode cogitar de ressarcimento civil moral. A propósito:

AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO DE INSTRUMENTO. RESCISÃO DE COMPROMISSO DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL. IMPONTUALIDADE. DANO MORAL. INEXISTÊNCIA. 1. O mero inadimplemento contratual não enseja, por si só, indenização por dano moral. "Salvo circunstância excepcional que coloque o contratante em situação de extraordinária angústia ou humilhação, não há dano moral. Isso porque, o dissabor inerente à expectativa frustrada decorrente de inadimplemento contratual se insere no cotidiano das relações comerciais e não implica lesão à honra ou violação da dignidade humana" (REsp n. 1.129.881/RJ, relator Ministro MASSAMI UYEDA, 3ª Turma, unânime, DJe 19.12.2011).

2. Agravo regimental a que se nega provimento.

(AgRg no AgRg no Ag 546.608/RJ, Rel. Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, QUARTA TURMA, julgado em 03/05/2012, DJe 09/05/2012)

No caso sub judice, de índole estritamente patrimonial, inviável reconhecer a ocorrência de dano moral.

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A condenação da seguradora deve observar os termos da apólice. Se assim o é, verifico que o seguro contratado abrange o valor do automóvel conforme 100% da tabela FIPE vigente na data da indenização. Tendo o roubo ocorrido em 02/06/2014, o parâmetro empregado deve ser a tabela FIPE de 02/07/2014 (fls. 30 e 104).

Despiciendo regrar que eventual salvado do sinistro pertence à seguradora, sob pena de enriquecimento sem causa do segurado.

De outro lado , não há fundamento jurídico para a revisão do contrato com aumento do valor do prêmio somente agora que o sinistro se consumou.

Verifico que o sinistro cuja cobertura se vem de determinar não guarda correlação lógica com o incremento do risco que se pretende compensar com o aumento do prêmio. Aliás sequer a inexatidão da informação restou cabalmente comprovada. Caberia à seguradora, no momento de efetuar a contratação, aquilatar os fatos e fixar o valor correto do prêmio. Não pode agora pretender corrigir sua incúria por meio de pedido contraposto.

Pelo exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES OS PEDIDOS para: 1) condenar a ré ao implemento da cobertura contratada consistente no pagamento de indenização correspondente a 100% do valor da tabela FIPE vigente ao tempo da indenização (julho de 2014), com incidência de juros de mora desde a citação e correção monetária desde o dia do sinistro.

A atualização será feita pelo IPCA até a data da citação. A partir da citação, incidirá a SELIC (art. 406, CC). A taxa SELIC é índice que engloba tanto a atualização monetária quanto os juros de mora.

2) indeferir o pedido de reparação moral.

Custas pro rata. Sem honorários, em razão da sucumbência recíproca. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Cumpra-se.

Local, Data

Lucas de Andrade Cerqueira Monteiro Juiz de Direito

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