Instrumento usado pelos mensageiros no Alto Amazonas. Com ele avisavam as aldeias quando
traziam notícias. Correspondência para:
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ISSN 1679-2335
CAPA E EDITORAÇÃO ELETRÔNICA: ARTUR DIAS.
Esta Revista nasceu em 1979 por iniciativa de 5
tuxauas
É uma revista de: informação
formação e
intercâmbio a serviço
dos Povos Indígenas
Publicação do Conselho Indigenista Missionário Em todo canto do Brasil se cons-tata: os índios estão indo para a cida-de. Nas aldeias estão ocorrendo mu-danças rápidas e profundas. Os jovens se distanciam dos adultos e os pais não mais se entendem com os filhos. Aliás, a sociedade está mudando no mundo inteiro. Hoje todo mundo está mais perto. Pela internet se criam redes de amigos e se sabe o que acontece em quase todo o mundo.
Na aldeia chegou a televisão, os DVDs, o internet, o telefone. Hoje em dia é muito mais fácil se deslocar para a cidade vizinha. São poucas as aldeias isoladas.
Todos nós procuramos novos ho-rizontes e alternativas para viver bem. Os caminhos se apresentam desafian-tes e esperançosos. Como povos indí-genas, olhamos com esperança toda a dinâmica da vida, mas ao mesmo tem-po sentimos a necessidade de refletir, com urgência, sobre a situação atual: terras fragmentadas ou abandonadas, famílias desintegradas, valores cultu-rais em processo de desaparecimento, crianças e jovens sem respaldo comu-nitário.
Nas sociedades e nas culturas sempre houve mudanças. As mudan-ças podem levar ao progresso, mas só quando nós tomamos a frente do pro-cesso, refazendo continuamente o
pla-no de vida e tirando proveito do bom e do melhor que encontramos.
Na mensagem final do VI Encontro de Teologia Índia, cujo tema foi as migrações e as mudanças, se dizia:
“Reafirmamos a denúncia do modelo econômico neoliberal globalizante, que através de macro projetos: Minérios, hidroelétricas, energéticos, madeirei-ros e turísticos, violam e ameaçam a vida e o futuro dos povos e do pla-neta”. No mundo se discute sobre as
mudanças climáticas, em atenção ao futuro do planeta. Mas o problema do clima é o modelo econômico e político que provoca as mudanças. O clima é um alerta para que todos tomem cons-ciência de que algo tem que mudar no gerenciamento dos recursos naturais.
Assim os problemas que surgem em nossa aldeia não podem nos levar a dizer: “Vamos impedir as mudanças”, mas sim: vamos pegar o que é útil, vamos conservar o que é importante e vamos reconstruir a nossa vida de um jeito melhor que no passado, mas sem assimilar o que prejudica e mata.
Em nosso caminhar com outros povos nos reconstituímos com a con-tribuição de seus valores, de sua sa-bedoria; recriamos nossa esperança e fortalecemos nosso coração para res-ponder aos novos desafios.
Somos povos vivos que cantam e dançam com o Deus da vida, partilhando o pão e o amor com o forasteiro e o migrante
O censo populacional do IBGE realizado no ano 2000
re-gistrava um grande aumento da presença dos índios nas
cidades, em comparação a 1990. O deslocamento e o
con-tato sempre mais intenso da população índia com a cidade
é um fato indiscutível. Não somente o índio intensifica o seu
contato com o mundo de fora, mas este entra nas aldeias e
em cada família, através da televisão. Estes fatores
provo-cam mudanças profundas e rápidas na vida cultural,
orga-nização social e põem em crise o mundo religioso indígena,
que não consegue mais encontrar uma explicação para o que
acontece ao seu redor. Os Povos indígenas que resistiram à
tentativa de assimilação durante 500 anos, agora parecem
desmoronar no momento em que a sociedade reconhece,
na Constituição, artigo 231 “São reconhecidos aos índios sua
organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, e
os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente
ocupam,competindo à União demarcá-las, proteger e fazer
respeitar todos os seus bens”.
A estes fatores temos que acrescentar outras influências
como: a entrada de dinheiro e o aumento do poder
aquisiti-vo, a energia elétrica, a escola, o telefone, os meios de
trans-porte mais rápidos, os projetos e a mudança da economia.
Estas mudanças não se restringem a uma ou duas aldeias,
mas atingem, mais ou menos diretamente a totalidade das
aldeias. Quem mais sente as mudanças são os jovens e
ado-lescentes.
Entre os mais velhos e a nova geração nasce um abismo de
separação, e os pais não sabem mais como lidar com os filhos.
As organizações indígenas, nascidas para garantir os direitos
do povo, não são imunes às influências externas do ganho
individual e da corrupção. Política e religião, neste contexto,
às vezes, aumentam a confusão e a insegurança.
O relato e as considerações do Padre Renato, na visita aos
Asurini de Koatinemo, são uma provocação para refletir
so-bre as mudanças em nossa própria aldeia, e também soso-bre
a necessidade de encontrar o caminho para lidar com tudo
isto.
Asurini, do ponto de vista populacional,
não corre mais perigo de extinção, como
já ocorreu no passado. A presença das
Irmãzinhas, em termos de convivência e
acompanhamento
fa-miliar durante duas
dé-cadas, foi
indiscutivel-mente preciosa e deu
resultados. Inclusive
as Irmãzinhas
favo-receram e realizaram
intercambio e visitas
entre os Asurini e os
índios Tapirapé, que
tinham passado pelo
mesmo problema
po-pulacional.
Lingüística:
Estranhei
chegando
em Koatinemo
ou-vir algumas crianças
Asurini falar em
por-tuguês entre elas. Os
poucos velhos falam
só a língua asurini;
os adultos de ambos
os sexos entendem e
falam, quem mais e
quem menos, o
por-tuguês...Isto é,
per-cebi logo como a
lín-A motivação da viagem
A iniciativa de visitar os Asurini
do rio Xingu foi da Irmãzinha de Jesus
Edith Chevalier. A vontade de voltar para
Koatinemo (nome da aldeia Asurini), foi
crescendo especialmente ao
completar-se 10 anos de falecimento da Irmãzinha
Mayi Ortiz (+ Belém, 06 de agosto de
1999). Fui convidado participar desta
visita, (mesmo trabalhando atualmente
entre os índios Kayapó) em consideração
do fato de ter acompanhado as primeiras
irmãzinhas de Jesus (Mayi e Dulcita) até
a aldeia Asurini, na primeira quinzena de
março de 1982; mas também a partir
dos contatos anuais e visitas que
reali-zei aos Asurini durante os quase 20 anos
de presença das Irmãzinhas junto a eles
(1982 - 2000). A minha última visita aos
Asurini foi em maio de 2005.
As mudanças:
Populacional: Voltando para a
his-tória do povo Asurini, anotamos os
se-guintes dados. No
momento do contato,
em 1971, os Asurini
eram
aproximada-mente 100
indivídu-os; em 1974, 58; em
1982, época da
che-gada das Irmãzinhas
eram 53, sendo só
3 com menos de 5
anos. Naquele ano
nasceu uma só
crian-ça. É interessante
lembrar que por volta
de 1930 a população
Asurini correspondia
a cerca de 150
indi-víduos. Os dados da
Funai atualmente
re-gistram 152 Asurini.
Hoje tem casais
ín-dios com até 09
fi-lhos. Em geral as
fa-mílias tem de dois a
três filhos.
O problema
de-mográfico
parece
ser
definitivamen-entrando aos poucos e se
substituindo à língua
asuri-ni.
Umas das razões
des-te quase que inconsciendes-te,
lento afastamento da língua
mãe especialmente por
par-te das crianças asurini são:
1) o aprendizado do
por-tuguês na escola da
al-deia (no mesmo tempo
importante,
necessá-rio);
2) as freqüentes idas para
a cidade de Altamira,
3) os contatos com os
co-merciantes e
pescado-res; mas sobretudo,
4) a presença da TV. Há
aparelhos da TV em
quase todas as casas
de Koatinemo. Todas as
noites tem energia...
todas as noites então
há a complementação
do português aprendido
na escola, com aquele
falado nas telenovelas
e nos demais
progra-mas da TV.
mudanças culturais: Perguntei
aos Asurini, quando haverá a festa do
“turé” - ritual importante que se realiza
entre a estação da chuva e a estação da
seca, durante o qual se usa como
ins-trumento musical a flauta - a resposta
foi sempre a mesma: “não sei, é o velho
Mure’yra que sabe!”. Wiliam, da Funai,
que há 9 anos trabalha entre as Asurini,
não lembra de ter assistido à celebração
do “turé”.
Se o velho e importante pajé
Mure’yra vier a falecer, provavelmente
não haverá mais ninguém, que possa
garantir e repassar para outros Asurini
os rituais das festas, inclusive os
conhe-cimentos ligados à pajelança, às curas
com remédios naturais. O perigo de uma
irreparável perda cultural é real, é seria,
é incalculável.
Ironia da sorte ou contradições da
antropologia: afinal teremos um povo
demograficamente salvo, mas
cultural-mente morto!
Lembro que chegando pela primeira
vez entre os Asurini, quando ainda eles
moravam na margem do rio Ipiaçava,
pequeno afluente de direita do Rio Xingu,
umas 6 – 7 horas de viagem
(dependen-do da água) da boca (dependen-do igarapé até à
aldeia, todo mundo andava com pouca
roupa, aliás andava com o corpo todo
bem pintado. Os Asurini desde sempre
costumam se pintar tendo como
motiva-ção a própria identificamotiva-ção no contexto
da família e da comunidade. A prática do
grafismo Asurini na sua função
sociológi-ca e estétisociológi-ca é tão peculiar à sua cultura
que não só o corpo humano, mas
tam-bém os objetos de uso comum são
pin-tados: como as panelas, os tamboretes.
Com a pintura tais objetos recebem uma
segunda pele e são integrados à vida da
comunidade (Lux Vidal).
Durante os dias de
permanência na aldeia, vi
várias crianças pintadas,
bonitas;
adultos...tam-bém, mas poucos jovens
(alguns só em parte, nas
pernas e ou nos
bra-ços). Os jovens em
ge-ral, quando perguntados
porque não se pintam,
respondem
evasivamen-te, “...Quando tiver a
fes-ta!” – que porém há
mui-to tempo não acontece!
No entanto expõem, nos
bíceps dos braços, um e
outro desenho exótico
deixando entrever a
pre-ferência de se
iden-tificar mais com os
jovens encontrados
em Altamira do que
com a si mesmos
como Asurini! Nem
se fala dos tipos de
camisetas de mil
co-res e desenhos
inve-rossímeis.
A
ambiva-lência do
aspec-to
econômico:
Uma característica
do povo Asurini de
Koatinemo, que
im-pressiona o visitante
logo chegando na
al-deia é a sua afeição
ao trabalho. Ao
lon-go do rio Xingu não
tem (que seja do
meu conhecimento)
um povo que
traba-lha tanto quanto o povo Asurini (outros
povos são: Os Araweté, os Parakanã, os
Arara, os Kayapó, os Curuaia, Xipaia...).
Você é introduzido logo na aldeia
acom-panhado pelo ritmo dos golpes do facão
que vão aos poucos recortando e
ali-sando a peça de mogno, madeira de lei
(só é usado mogno bem seco), que em
três dias no máximo, se tornará um dos
banquinhos que os Asurini usam para
sentar. Por ser os tamboretes peças
úni-cas, embora repetidas, são autênticas
esculturas....É um trabalho que pertence
só aos homens.
No entanto, às mulheres
Asurini competem a primazia
no trabalho oferecendo ao
vi-sitante vários tipos de
vasi-lhame (vasos policromos,
pa-nelas de cozinha e tigelas de
cerâmica); quase obras
pri-mas em termos de
criativida-de na escolha dos criativida-desenhos
decorativos e perfeição
geo-métrica na estrutura. Todo o
material usado vem do mato:
do barro até a resina para dar
brilho aos desenhos
decorati-as dondecorati-as da pintura corporal, embora os
homens costumam ás vezes se pintar os
braços e as pernas reciprocamente. Logo
se percebe que os desenhos pintados no
corpo são parecidos aos que são
aplica-dos ás panelas, aos tamboretes.
Os trabalhos das roças continuam
como sempre, igualmente repartidos
en-tre homens e mulheres (durante a nossa
visita pelo menos quatro grupos
familia-res estavam trabalhando para preparar
farinha de mandioca). No entanto a caça
e a pesca, são tarefas basicamente
mas-culinas. Presenciei à chegada dos
pes-cadores-caçadores voltando do rio e ou
do mato, trazendo peixe, javalis, e
ou-tra caça, inclusive pássaros. Vendo isso,
a tentação de chegar logo a uma
con-clusão (pergunta) foi forte. Como não
pensar instintivamente às populações
das periferias, das favelas...das regiões
alagadas, dos desastres ambientais, aos
problemas de subsistência de milhões
de pessoas, cotidianamente
enfrenta-dos, em quanto aqui há comida até de
sobra?
Aspecto Social: Hoje em dia,
de-pois de uma primeira visita rápida às
casas Asurini, a impressão que se têm
é de que este povo vive numa certa
se-gurança econômica, alimentar... Há
ob-jetos de consumo, como roupa,
acessó-rios, instrumentos de trabalho, motores
para as canoas....espingardas...etc. Na
aldeia funciona o telefone, energia
elé-trica, água encanada, meios rápidos de
transporte para Altamira, farmácia
abas-tecida, escola... Os Asurini tem um
dis-creto poder econômico (dinheiro) que
provem da venda do artesanato, da
bol-sa família para as mães, das
aposenta-dorias e sobretudo da reserva florestal e
hídrica que fornece a alimentação básica
(produtos da terra, da caça e da pesca).
Mas “a festa” nem acaba de
come-çar que já apareceram sérios problemas
e ameaças à comunidade, fazendo suas
primeiras vítimas: os jovens!
Conseqüências e mudanças
sociais e culturais
Há e houve, sérios casos de
alcoo-lismo e de uso de droga entre os jovens.
Isso sobretudo a partir da presença dos
pescadores abusivos, vindo de Altamira,
os quais para conseguir a licença de
pes-car nas águas da reserva, oferecem
di-nheiro....bebida, fumo.
Há longas permanência dos índios
na cidade de Altamira... com a
conse-qüente perda de interesse pela vida da
aldeia e o aumento da descrença nos
va-lores culturais e religiosos tradicionais,
isto é na pajelança, nas celebrações dos
rituais e das festas.
na cidade de Altamira. Há
dois jovens Asurini já
for-mados Agentes de Saúde
Indígena (AIS). Há
ain-da casos de malária e de
dengue, algum outro de
tuberculose. Aos poucos
porém os Asurini estão
percebendo a importância
da higiene pessoal e do
sa-neamento básico
especial-mente nas proximidades
das casas, e da aldeia.
A Prelazia do
Xingu.
Os Asurini, com
res-peito ao passado, têm
uma idéia um pouco mais já definida
so-bre a Prelazia do Xingu. Eles conhecem
algumas pessoas a ela ligadas. Há quem
lembra de Dom Erwin por ter
encontra-do ele, na primeira viagem à aldeia
ve-lha no igarapé Ipiaçava, juntamente, às
Irmãzinhas e à quem está escrevendo.
Concluindo
Na volta continuei imaginando
quando e o que se poderia fazer no meio
deste povo que cresceu como população,
mas que lentamente está perdendo os
sinais de sua inconfundível presença no
vale do Xingu, e no maior e estupendo
Reino de Deus.
Redenção, 31.12.2009
Renato Trevisan
Ligado a isso há uma lenta, mas
inexorável divisão entre duas faixas
etá-rias, aquela dos velhos (conservadores,
só falantes a língua asurini), que
des-confiam com tudo que vem da cidade e
de fora....e a juventude (a maioria da
população) que, exemplificando,
encer-ram o dia na aldeia, com uma partida
de futebol e vão dormir ouvindo a
músi-ca de Michel Jakson. Só 20 anos atrás,
além de poucos meninos\as, as crianças
nem brincavam com as crianças da
famí-lia vizinha.
Incontestável o valor da escola
(educação) na aldeia! O mesmo
diga-se do tratamento da saúde na aldeia e
N
a visita que fez à Comunidade de
Maturuca, na Terra Indígena Raposa
Serra do Sol, no Município de Uiramutã,
no dia 19 de abril, o presidente Luís Inácio
Lula da Silva prometeu que vai retornar
antes de concluir seu mandato. No
dis-curso aos índios e às centenas de
con-vidados para a Festa da Homologação,
ele não hesitou em marcar a data: 19 de
setembro deste ano.
A pressa em confirmar seu
retor-no a Maturuca ocorreu depois que, ao
chegar na comunidade, perto de
meio-dia, recebeu a “Carta do Araçá” das
mãos do coordenador-geral do Conselho
processo de demarcação não
come-çou no governo dele e foi enfático ao
lembrar que há 34 anos os índios de
Roraima já vinham lutando pela
de-marcação, enfrentando um embate
político jamais visto. Lula falou da
grande quantidade de outdoor em
Boa Vista atacando ele e seu
gover-no. “Era como se nós fôssemos o
de-mônio, porque diziam que a gente iria
tirar a terra que Roraima precisava
para produzir. Um estado com
tan-ta terra ainda sem produzir, alguns
queriam exatamente a terra que não era
deles, que era dos índios”, disse.
Comentou novamente sobre a luta
dos povos Macuxi, Wapichana, Ingaricó,
Patamona e Iekuana, os classificando
como exemplos para todo o Brasil como
“os mais bravos guerreiros” que o país
já conheceu.
Ele disse que, embora 21 lideranças
indígenas tenham morrido nos 34 anos
de luta, os índios venceram sem revidar,
sem praticar atos de violência. Lembrou
que enfrentaram inimigos armados, o
poder econômico e político. “Mas eles
não sabiam que os índios tinham uma
arma mais poderosa: o espírito de luta,
a união e a proteção dos seus
ances-trais, representado na figura mítica de
Makunaima”, afirmou.
A festa continuou reforçando os
la-ços de união e a determinação em
conti-nuar reivindicando seus direitos.
to final da Assembléia Geral dos Povos
Indígenas, realizada em março passado
na Comunidade do Araçá, no Município
de Amajari, que contém seis páginas
re-latando as principais reivindicações dos
povos indígenas depois da conquista de
suas terras.
Depois de ser conduzido a pé,
acom-panhado por dezenas de indígenas,
en-tre mulheres e crianças que o haviam
re-cepcionado na pista de pouso, às 11h47,
o presidente chegou ao palco montado
no centro da comunidade. Lá foi
salda-do, homenageasalda-do, ovacionado e
presen-teado por lideranças indígenas. Ele foi o
último a falar ao público, por volta das
13h40.
O Discurso de Lula foi marcado por
palavras expressivas do presidente que
agradaram os participantes da festa.
“Nunca vi, em nenhum
momen-to desses meus 30 anos de convivência
com o povo indígena, ninguém querer
reivindicar nada que
não fosse seu. Não
co-nhecemos, na história,
nenhum momento em
que uma nação indígena
invadiu a terra de outro
para tomar conta. Pelo
contrário, o que
aconte-ce, normalmente, são os
outros invadirem as
ter-ras indígenas, tentando
se apossar de uma terra
que não é deles”,
afir-mou Lula da Silva para
mostrar a legitimidade
da luta dos índios.
Lembrou que o
Foto: Cleymenne Cerqueira
D
o mês de novembro de 2008 até o mês de março de
2009, demos início a um trabalho que levou cinco
me-ses para concluir o nosso objetivo. Mesmo sabendo que somos
índios de fato, tivemos que pesquisar em vários arquivos do
Estado do Pará, Biblioteca Pública; Museu Emílio Goeldi e CIMI.
Para registrar nossa presença na região viajamos por
vá-rios lugares pesquisando em igrejas de Igarapé-açu, Maracanã,
Santarém Novo, Colônia Santo Antônio do Prata, Santa Maria do
Pará.
Dentro de nossas próprias aldeias (Jeju e Areal) e fomos
ain-da ao convento dos franciscanos em Belém, trabalho esse que
deveria ter sido feito por antropólogos enviados pela FUNAI.
Este trabalho faz parte da teimosia de se reencontrar e
con-quistar o reconhecimento como índios e como donos da terra.
Estamos há oito anos querendo conquistar a terra, lutando
pelos nossos direitos. Desde o ano de 2001 ate o ano de 2009
nada foi resolvido, mas na área onde estamos presentes já faz
mais de um século que ali vivemos. Em 2001 voltamos a nos
organizar, e realizamos a assembléia que fundou a
associa-ção indígena Tembé de Santa Maria do Pará - AITESAMPA,
no ano de 2003, com o objetivo de
alcançar órgãos competentes para
dar fortalecimento ás nossas lutas
e conquistar o que queremos,
in-centivando assim a nossa cultura
e a demarcação da terra.” A
nos-sa cultura não esta
totalmen-te completa,
falta-Os Tembé são um povo reduzido, que vive misturado à
população de Santa Maria, Estado do Pará. Por iniciativa
própria, eles organizaram uma pesquisa para
reencon-trar as suas raízes, documentar sua presença centenária
na terra onde moram e recuperar seus traços culturais,
herança dos antepassados.
Como eles escrevem na conclusão dos seu trabalho:
“Os nossos frutos podem ter sido tirados, os nossos
ga-lhos arrancados, os nossos troncos queimados mas ainda
permanece a essência de nossas vidas da identidade, a
raiz”.
Em sua pesquisa, os amigos Tembé saíram visitando
lu-gares, procurando testemunhos com pessoas, chegando a
descobertas interessantes, como a certeza de que a terra
onde moram e a outra que os não-índios ocuparam, é
terra de seus antepassados.
Instituto Santo Antônio do Prata, que serviu de lugar de catequese e educação para os primeiros Tembé. Foto Alan Silva.
nos a nossa mãe terra e a nossa língua.
Ainda existem pessoas na nossa aldeia
que conhecem palavras soltas e os
nos-sos rituais. Queremos reacender esta
cultura e para que isso venha acontecer
precisamos conquistar de volta o nosso
território.
Os Tembé se apresentam:
Nós indígenas Tembé de Santa Maria
do Pará estamos a 150 km da capital.
Vivemos em duas comunidades
conheci-das por Jeju e Areal que juntas contam
com 80 famílias Estamos divididos em
duas comunidades. Uma que fica a
apro-ximadamente 7 km distante da sede do
município de Santa Maria, localizada em
um ramal da rodovia BR 010. A
comuni-dade que fica neste ramal denomina-se
Areal e tem por núcleo principal a família
do sr. Miguel Carvalho da Silva.
O cacique Miguel da aldeia Areal e dois de seus quatro filhos, na roça de mandioca. Foto: arquivo CIMI
Rio Jeju. Foto Alan Tembé
ALDEIA JEJU: Fica em uma área
pequena cercada por propriedades de
não índios. Neste local se agrupam 06
famílias, com aproximadamente 30
pes-soas. Também há outros grupos de
famí-lias vivendo próximas do local, todas sob
influência do seu Miguel, tido por todos
como cacique da comunidade.
É localizada às margens da BR 316,
distante 5 km da sede do município,
pró-ximo do rio Jeju afluente da margem
es-querda do Maracanã. Nesta comunidade
há a presença de uma lagoa e de um
igarapé denominado Urucuryteua.
Nesse local se constituiu uma vila,
denominada Jeju, com a maioria dos
re-sidentes sendo migrantes de outras
regi-ões do país principalmente do Nordeste
do Brasil, em sua maioria. O Jeju é a
maior comunidade de Tembé em Santa
Maria do Pará. Nesta há pelo menos 5
grupos principais de famílias, além de
núcleos menores.
Capitoa d. Maria, da aldeia Jeju. Foto: Arquivo Cimi.
A história se repete
A estrada de ferro Belém-Bragança
foi construída em junho de 1883, mais
só foi inaugurada a 3 de Abril de 1908,
pelo governador da época Augusto
Montenegro.
A passagem da estrada de ferro, a
missão dos capuchinhos e a colonização
geraram grandes problemas na nossa
área, o território foi sendo invadido
pe-los nordestinos e junto colonizado, o
go-verno por sua vez sabia do nosso
terri-tório e mesmo assim construiu a estrada
de ferro que liga Belém a Bragança
dan-do assim acesso para colonos migrarem
para o território indígena.
O governo pretendia promover a
ocupação da terra dos índios e, além da
escola, outra estratégia foi o de
truir uma ferrovia, que teve sua
cons-trução iniciada no final do século XIX,
e seu principal objetivo era colonizar o
nordeste paraense e, ao mesmo tempo,
oferecer aos migrantes que vieram do
Ceará e Itália condições para escoarem
seus produtos via férrea ate Belém.
O Povo Tembé está procurando
so-luções nos campos da economia,
plan-tando roça, criando abelha, incentivando
artesanato. A saúde e a educação são
precárias, mas confiam em sua própria
organização para conquistar e garantir
seus direitos.
Seu Xavier, cearense casado com a filha da capitoa do Jeju. Foto: Alan Tembé
Seu Francisco, seus netos e a esposa, uma nordestina que migrou para Santa Maria. Foto: Alan Tembé.
Conclusão
No ano de 2001 tivemos
conheci-mento que poderíamos obter tudo de
volta, territórios e cultura, tivemos
co-nhecimento dos direitos dos povos
indí-genas, da convenção 169 da OIT e da
declaração da ONU. Os índios Tembé de
Santa Maria do Pará das aldeias Jeju e
Areal estão resistindo há mais de um
sé-culo em suas pequenas áreas de terras, e
com a chegada dos migrantes, passamos
por momentos difíceis de nossas vidas.
Não temos acesso ao cemitério em que
foram enterrados os nossos
antepassa-dos. Sempre soubemos da existência de
nosso antigo cemitério mas somente em
2008 tivemos a oportunidades de
conhe-cer esse antigo cemitério, onde no
pas-sado foram enterrados os nossos, com
ajuda de alguns freis do km 18. A aldeia
está crescendo e não temos terras para
construir nossas malocas e casas.
Nós indígenas Tembé de Santa Maria
do Pará das aldeias Jeju e Areal, vivemos
na ansiedade que paira sobre demandas
que até hoje não foram vistas como
coi-sas importantes pelos órgãos que tem
essa atribuição. Estamos tentando
ensi-nar aos pequenos nossas histórias.
Tiraram-nos quase tudo que nos
era de precioso e principalmente a nossa
mãe terra. Mas resistimos ate hoje para
fortalecer essa luta e ter de volta o
nos-so tenos-souro, resgatando todos os
costu-mes que tínhamos. Sabemos que essa
política de integração do governo e da
sociedade Brasileira ainda faz com que
muitos de nós nos envergonhemos de
sermos índios.
Hoje o nosso povo criou o próprio
grupo de pesquisa, tivemos que tomar
nossas iniciativas, pois queremos a
de-marcação e regularização de nosso
ter-ritório que pouco está interessando a
Funai e aos órgãos responsáveis. Nós
mesmos estamos fazendo o
reconheci-mento de nossa terra e nossa história.
Pedimos aos principais órgãos (Funai,
MPF, Incra, Iterpa, Governo do Estado
do Pará), que se mobilizem e procurem
solucionar nossas demandas. Queremos
apenas o que é nosso de direito,
segun-do a Constituição Federal, Convenção
169 da OIT e a Declaração Universal dos
Direitos dos Povos Indígenas da ONU,
nos asseguram.
Raimunda Tembé em frente a Igreja de São Sebastião na cidade de Igarapé -Açu. Foto: Alan Tembé.
D. Juliana Braz da Silva, de 92 anos. Foto: Alan Tembé.
Frei João Franco recebendo a visita dos Tembé de Santa Maria. Foto: Luiz Cláudio
Os Tembé de Santa Maria do Pará estão empenhados em adquirir novos conhecimentos que lhes possibili-tem compreender os problemas que os envolvem, dentro do con-texto amazônico. As questões históricas, políticas e econômicas que determinam os destinos da sua região, precisam ser “apropria-das” pelos índios, para que eles te-nham mais força em suas lutas.
Assim, eles passaram o final de se-mana que antecedia ao carnaval discutindo o
processo de territorialização dos povos na Amazônia. A atividade faz parte da iniciativa do Tembé em con-tinuar seu processo de reconhecimento territorial e também entender as outras formas possíveis de ter-ritorialização na Amazônia, como a dos camponeses e outros segmentos sociais que fazem parte da Via Campesina.
A atividade aconteceu em uma escola munici-pal na Vila do Jeju, onde reside a maioria das famílias Tembé de Santa Maria do Pará e contou com a parti-cipação dos Tembé da aldeia Areal, distante cerca de 12 km do Jeju.
O primeiro dia foi dedicado a entender a forma como outros grupos indígenas se relacionam com seu território, quais seus direitos e onde estão inscri-tos. Convidada pêlos Tembé a professora Jane Felipe Beltrão, antropóloga da Universidade Federal do Pará. Ela exibiu o vídeo “Muita terra para pouco índio?” e procurou relacionar este filme à história dos Tembé de Santa Maria do Pará, que narraram aquilo que ou-viram de seus pais e avós.
A atividade teve seqüência no domingo, com o assessor José Mendes de Andrade, Mestre em antro-pologia e colaborador da Via Campesina no Estado do Pará. Os Tembé puderam assistir ao vídeo “Vozes do
Clima” produzido pela Fase, e que
trata das conseqüências climáticas para o planeta do mau aproveita-mento dos territórios.
As mudanças sofridas pela Amazônia já começam com a che-gada do colonizador, mas pode-se afirmar que ela se intensifica e bru-taliza com a abertura das estradas que rasgaram a floresta e puseram sob o olhar do capital um vasto ter-ritório. É possível afirmar, sem som-bra de dúvidas, que não somente indígenas e camponeses se esta-belecem na Amazônia, cada qual forjando uma relação própria com o território e a natureza, mas tam-bém grandes grupos de interesses econômicos.
Na Amazônia há um novo tipo de território sendo constituído. É o território do dinheiro, que
frag-menta populações, violenta seus habitantes e os destitui de seus territórios. Para os que possuem dinheiro, as popula-ções que vivem na Amazônia são entraves aos seus planos de enriquecimento. Eles têm muitas faces; as mais conhecidas são as empreiteiras que constroem barragens, mineradoras que abrem bura-cos no meio da floresta, carvoarias que empregam crianças, latifundiários que transformam floresta em pasto e políticos que mudam, criam ou burlam leis em favor desses donos do dinheiro.
Em nossa Amazônia, uma resistência vem se for-mando desde 2007, pra evitar que a região seja enter-rada em uma grande “cova comum” dos desmandos e violências dos que têm dinheiro. A Via Campesina, entendendo a singularidade da região, tem buscado, a partir da diversidade de atores políticos, estabelecer um elo entre aqueles que têm identidade comum e princípios de resistência aos projetos de morte que se anunciam para a região. Um novo projeto étnico-político-cultural começou a ser gestado na região.
Mas a reação não tardou, vindo na forma da cri-minalização de lideranças dos movimentos sociais da região, de ameaças de morte e de ações do Estado, testando a resistência dos povos da região. Os Tembé, por isso mesmo, sabem que é necessário estar presen-te nas lutas sociais da região, conquistando dessa for-ma seu próprio território, onde poderão reconstruir sua vida a partir de seus próprios costumes e sua pró-pria cosmologia.
Luiz. C Brito Teixeira.
José Mendes (em pé) durante sua exposição sobre mudanças climáticas.
A
cada dia que passa, fica mais evidente para a opinião pública que existe algo de muito errado com o projeto da Hidrelétrica de Belo Monte, no Rio Xingu, Pará.A batalha sobre Belo Monte se arrasta du-rante 30 anos. De um lado as promessas de mais empregos, mais energia elétrica, mais crescimento econômico, maior prestígio com a maior hidrelétrica nacional no mundo. Ainda teve a promessa que o projeto não seria enfiado “goela abaixo”. E quando as promessas não convenceram... as ameaças: “É Belo Monte ou racionamento!”
No entanto, os planejadores da hidrelétrica nunca conseguiram demonstrar que ela é, de fato, viável. Ao contrário, cada vez mais rebatem as críticas com acusações e ne-nhum texto científico.
Perguntas sem respostas
Um assunto que está sendo deixado de lado é o custo para se construir a linha de transmissão, que deve atravessar vários estados até a região sudeste. O jornalista Lúcio Flávio Pinto estima que esse valor cor-responda a mais de 80% do custo total da obra. Será mais uma mordida no bolso dos trabalhadores brasileiros.
A voz dos críticos do projeto se faz ouvir com força nas grandes redes de co-municação. É uma voz com base científica amplamente documentada pelos melhores cientistas brasileiros. Uma voz que indica al-ternativas para conseguir a energia necessá-ria para a aceleração da economia. Uma voz que explica também os prejuízos ao meio ambiente e o custo social e cultural para as populações afetadas pelo projeto. Esta voz tem amparo legal na Constituição e
legisla-Quem paga a conta?
Todo este debate público fez com que os maiores construtores do Brasil começas-sem a desistir do empreendimento. O go-verno então, se dispôs a bancar os gastos das empreiteiras grandes para tê-los no pro-jeto. Com que dinheiro? Do BNDES. Mais um escândalo com dinheiro público. O orçamen-to desta obra já foi mudado tantas vezes que nem as empresas privadas que vence-ram o leilão demonstvence-ram segurança em to-car a obra, devido aos gastos que precisam ser feitos com estudos geológicos e outros.
Em Altamira, na bacia do Rio Xingu, indígenas realiza-ram novas manifestações, contra o leilão da hidrelétri-ca. Foto: Cimi N II.
Acima e abaixo, cenas da manifestação contra o leilão da hidrelétrica de Belo Monte na Capital Federal. Fotos de Maíra Heinen.
O jornal “O Globo” elencou os processos cri-minais em que se envolveu o grupo empresarial Bertin, escolhido pelo governo para liderar o con-sórcio que vai construir a usina de Belo Monte.
Segundo o jornal, o grupo Bertin deixou um rastro de denúncias de crimes ambientais e traba-lhistas pelo país. O grupo responde a processos em pelo menos quatro estados: Pará, Tocantins, São Paulo e Mato Grosso do Sul. No Pará, o grupo e seus sócios são processados na Justiça Federal por co-laborar com a devastação da Amazônia. Em Mato Grosso do Sul, procuradores querem corresponsa-bilizar a empresa de biocombustíveis da Bertin por genocídio de índios em Dourados. Em São Paulo, o MPF processa o Bertin por “exploração indevida e predatória de jazida de água mineral”. Em Tocantins, a empresa é envolvida em um escândalo de explo-ração de trabalho análogo à escravidão. A Bertin não quis falar sobre esses processos com o jornal.
Conforme noticia ainda o jornal, o grupo Bertin não tem conseguido honrar compromissos assumidos com o setor elétrico brasileiro, mas na mesma semana em que venceu o leilão de Belo Monte, o grupo Bertin recebeu uma ajuda de 280 milhões de reais do FI – FGTS, para formar uma nova empresa. Ao que parece, esta é uma estraté-gia para disfarçar as irregularidades em que o gru-po Bertin está envolvido, já que a nova empresa, a Cibe – Energia, surge com o nome limpo no merca-do. Com Belo Monte, o governo continua a premiar os destruidores da natureza, inclusive com o suado dinheiro do FGTS, descontado de todos os traba-lhadores.
“Considerando as opiniões dos especialistas, podemos dizer: a usina hidrelétrica de Belo Monte é tecnicamente desaconselhável, exageradamente cara, ecologicamente desastroso, socialmente per-versa, perturbadora da floresta amazônica e uma grave agressão ao sistema-Terra. Esse gigantismo, típico de mentes tecnocráticas, beira a insensatez, pois, dada a crise ambiental global, todos recomen-dam obras menores, valorizando matrizes energé-ticas alternativas, baseadas na água, no vento, no sol e na biomassa. E tudo isso nós temos em abun-dância.”
(Leonardo Boff – Belo Monte: a volta triun-blicou sobre os escândalos que cercam Belo
Monte).
Um erro histórico
que continua
O mal da hidrelétrica, como o de mui-tos outros projemui-tos na Amazônia, é ser pla-nejada visando apenas à lucratividade de empresas que estão a milhares de quilôme-tros da região. Desde o começo da história do Brasil, o morador da Amazônia é tratado como um ser invisível, sem vontade ou opi-nião. As decisões que lhe afetam a vida vêm de fora, para o bem e para o mal.
Este projeto é localizado na Amazônia, mas seus efeitos serão sentidos muito além. Por isso mesmo tantas vozes se juntam as dos amazônidas. Não temos o comando das decisões porque estamos alheios ao que acontece diante de nossos olhos, ou ape-nas nos conformamos em ser conduzidos. É preciso mudar essa forma de decidir, mas para que essa mudança ocorra, teremos que assumir a Amazônia como o nosso chão, a nossa origem. Precisamos conhecê-la, estu-dá-la, para poder dizer com segurança o que queremos para ela.
Grupo Bertin tem ficha
de crimes ambientais
A voz de um profeta
brasileiro
N
um ritual pedindo permissão da Mãe Terra para iniciar e abençoar o even-to, os povos indígenas da Bolívia abriram a Conferencia dos Povos do Mundo sobre as Alterações Climáticas e os Direitos da Mãe Terra, no dia 20 de abril de 2010. A Mãe Terra os presenteou com um dia lin-do, céu limpo e ensolarado. Os povos foram chegando com suas bandeiras, músicas, de-legações de todos os rincões. Uma energia muito forte tomou conta de todos os pre-sentes. Independentemente da língua que falavam, todos conseguiam se comunicar de alguma forma. Apresentações musicais de artistas do Paraguai e Bolívia acolheram e animaram os participantes. O presidente da Bolívia, Evo Morales, foi recebido e partici-pou do ritual.Mais de 15 mil pessoas de 130 pa-íses afluíram a Cochabamba, na Bolívia, para participar neste evento que terminou com resultados tão diferentes daqueles de Copenhague. Na suas palavras na abertura, Evo Morales lembrou que
“Foram os países desenvolvidos que nos obrigaram a reunir aqui hoje para dar uma voz àqueles que produ-zem apenas dois por cento de gases de efeito estufa, mas que vivem nas regiões mais afetadas pelas mudanças climáticas. Aqui em Cochabamba, pre-tendemos dar voz aos pobres do mun-do e encorajar os governos a serem mais ambiciosos depois do fracasso do Encontro de Copenhague, realizado pela Organização das Nações Unidas (ONU) em dezembro de 2009”.
Apesar das críticas de que a Conferência de Cochabamba teve uma baixa adesão oficial dos governos, inclusive da América Latina, para os organizadores e
participan-tância, já que o objetivo principal do encon-tro era a mobilização social e isto, segundo eles, foi atingido. De fato, a Conferência dos Povos recebeu delegações de centenas de organizações não-governamentais e movi-mentos sociais de todo o mundo e, surpre-endentemente, muitas delas dos Estados Unidos e da Europa. Os 17 grupos de traba-lho da Conferência chegaram à conclusão de que um acordo climático precisa ser amplia-do para um “Acoramplia-do entre os Povos”. Este Acordo entre os Povos denuncia o modelo capitalista e as suas formas de exploração dos recursos naturais e do trabalho huma-no. O Acordo propõe
um modelo de con-vivência harmônica entre a humanidade e o Planeta. O Acordo convoca os povos do mundo a recuperar, re-valorizar e forta-lecer os conhecimen-tos, saberes e prá-ticas ancestrais dos povos indígenas,
fir-proposta do bem viver, reconhecendo a Mãe Terra como um ser vivo, com o qual temos uma relação indivisível, interdependente, complementar e espiritual.
Peça fundamental produzida na Conferência foi a “Declaração Universal
dos Direitos da Mãe Terra”. Em linhas
gerais, este projeto prevê:
Diferente do “Acordo de Copenhague”, foi exigido que os países desenvolvidos, prin-cipais causadores das mudanças climáticas e seus efeitos, assumirem suas responsa-bilidades históricas e atuais, reconhecendo e honrando suas dívidas a humanidade e a Mãe Terra, procurando soluções justas, efe-tivas e imediatas para a crise. No documento final as demandas concretas para conseguir estas soluções são radicais e exigentes.
Outro tema importante tratado em Cochabamba foi a segurança alimentar.
Concluíram que para deter o aquecimento global é preciso transformar o modelo de produção agrícola atual. O povo tem direito de controlar suas sementes, terras, água e produção de alimentos, de forma a garantir a produção em harmonia com a Mãe Terra. Condenados também são os mega-projetos de infra-estrutura, que invadem territórios extrativistas, privatizando a água, militari-zando os territórios, expulsando os povos indígenas e camponeses.
A Conferência propõe a realização de um Plebiscito Mundial sobre as mudanças climáticas, no qual todos serão consultados sobre vários aspectos e propostas que foram debatidos durante os dias do encontro.
Finalmente, a Conferência de Cochabamba propõe a realização da 2ª Conferência Mundial dos Povos sobre Mudança Climática para 2011, como parte do processo de construção do Movimento Mundial dos Povos pela Mãe Terra e para rea-gir aos resultados da Conferência do México, que se realizará em novembro, 2010, no
l Direito à vida e à existência;
l Direito de ser respeitada;
l Direito à continuação de seus ciclos e processos vitais, livre de alterações hu-manas;
l Direito a manter sua identidade e inte-gridade como seres diferenciados, auto-regulados e inter-relacionados;
l Direito à água como fonte de vida;
l Direito ao ar limpo;
l Direito à saúde integral;
l Direito a estar livre da contaminação e poluição, de dejetos tóxicos e radioati-vos;
l Direito a não ser alterada geneticamen-te e modificada em sua estrutura amea-çando sua integridade ou funcionamen-to vital e saudável;
l Direito a uma restauração plena e pron-ta pelas violações aos direitos reconhe-cidos nesta declaração causados pelas atividades humanas.
“A
Diocese de Grajaú e o Cimi aler-tam sobre uma realidade que o Mensageiro vem apresentando desde o ano passado: o êxodo dos índios das aldeias para a cidade, êxodo que se dá de forma não plane-jada e muito menos acompanhada.O encontro dos índios com o pessoal da cidade se dá num contexto de preconceitos não ainda superados ou pelo menos num contexto de desconfiança pela falta de conhecimentos recíprocos. A Diocese, o Cimi e a Associação Carlos Ubbiali prepararam junto com os ín-dios UMA EXPOSIÇÃO SOBRE OS POVOS INDÍGENAS DO MARANHÃO, apresentando os aspectos mais diferenciados do mundo indíge-na. Apresentaram a sua maneira de viver, de relacionarem-se com a natureza, sua espiri-tualidade, cantos, além de estudos, vídeos e músicas.
A iniciativa encontrou grande participação e aceitação principalmente por parte dos es-tudantes. Afinal é tão bonito descobrir que o diferente não é teu inimigo, mas alguém que pode encontrar espaço e estima em teu cora-ção e tua vida.”
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Somente a iniciativa, o protagonismo indígena é que produz avanços e conquistas, na sua relação com a sociedade não- índia. Como relata a equipe do Cimi em Guajará-Mirim, os povos de Rondônia tomam a fren-te da luta pela educação, denunciando e co-brando melhorias.
Indígenas da aldeia Sagarana, Terra Indígena Sagarana, dos povos: Oro Mon, Oro Waram Xijein, Cao Oro Waje, Oro Nao’, Canoé, Makurap, Djeoromitxi e Aruá ocupa-ram na noite de 19 de maio, o prédio da escola estadual, do Ensino Médio, no Distrito de Surpresa.
São mais de 40 alunos indígenas da aldeia Sagarana que cursam o ensino mé-dio no Distrito de Surpresa. Há mais de 02 meses que estão sem transportes. Uma dis-tância de 10km para ir e 10 km para voltar, as aulas são à noite e o percurso torna-se perigoso.
Em meados de abril, alunos e pais de Sagarana enviaram Documentos à Secretaria de Educação do Município, reivindicando transporte; não obtendo resposta e vendo a situação a se agravar, resolveram tomar esta medida, e aguardam soluções. As lide-ranças indígenas bem como a população do Distrito de Surpresa disseram que só deso-cupariam o prédio mediante a chegada do
Estudantes da Terra Indígena Sagarana - RO,
reivindicam melhorias no Ensino Médio
transporte e a certeza da vinda dos profes-sores que faltam.
Além do transporte escolar faltam pro-fessores, nas disciplinas: matemática, quí-mica, física e sociologia. Alunos não indíge-nas da localidade somam-se nesta reivindi-cação.
Na região de Guajará-Mirim, não há implantação do ensino médio nas aldeias, e nas comunidades que há o ensino funda-mental, funciona com muita precariedade. A implantação do ensino médio nas aldeias é uma bandeira de luta do movimento indíge-na da região.
Texto e foto: Equipe Cimi – Guajará-Mirim
Nome: Estado: País: CEP: Cidade: Bairro: Fone: Endereço:na PUC-SP, lideranças Guarani Kaiowá denunciam violência
No dia 7 de maio de 2010, represen-tantes Guarani Kaiowá do Mato Grosso do Sul estiveram na PUC-SP para denunciar a violência contra seu povo e pedir apoio. Com o crescimento do agronegócio, a vio-lência no Mato Grosso do Sul aumenta a cada dia. Em 2006 foram mortos 28 indíge-nas naquele Estado, em 2007, 53 indígeindíge-nas, e em 2008 42 pessoas. A Reserva Indígena de Dourados, MS, por exemplo, melhor seria chamada de “Confinamento Indígena”: em 3 mil hectares de terra foram confinados 18 mil indígenas. Os espaços ínfimos de terras habitadas pelos índios contrastam com as terras disponibilizadas para o plantio da ca-na-de-açúcar. Uma usina de açúcar ocupa, no mínimo, uma área de 30 mil hectares. Na safra 2008/9, a ETH Bioenergia, braço ener-gético do Grupo Odebrecht, produziu 200 milhões de litros de etanol e 130 mil tone-ladas de açúcar. Em 2009, a ETH inaugurou
três usinas, nos estados de São Paulo, Goiás e Mato Grosso do Sul. A meta da ETH é pro-duzir 470 milhões de litros de etanol e 160 mil toneladas de açúcar na safra 2009/10.
“Nossa aposta é que o Centro-Oeste (GO, MT, MS) será a região de vocação natural para a expansão da cana-açúcar”,
de-clarou José Carlos Grubisich, presidente da ETH Bioenergia. A expansão do agronegócio configura a violência contra os povos indíge-nas da região.
Na semana em que as lideranças in-dígenas estiveram em São Paulo, iniciou-se o julgamento dos acusados do assassinato do cacique Marcos Verón (72), que ocorreu em janeiro de 2003, em Juti, MS. Por não haver isenção nos julgamentos envolven-do indígenas naquele estaenvolven-do, o Ministério Público Federal pediu que o processo fosse julgado na capital paulista. No segundo dia, o julgamento foi transferido para o dia 21 de fevereiro 2011, confirmando o dito de uma das advogadas dos Guarani Kaiowá: “Se os
índios são réus, os processos andam com certa rapidez, se os índios são vítimas, os processos são engavetados ou prescrevem pela morosidade da justiça”.
Valdelice Veron, filha do cacique as-sassinado, perguntou a plateia num depoi-mento comovente naquela noite no pátio do Museu da Cultura da PUC-SP: “Que
histó-ria vou contar para meus filhos? Meu bisavô e meu avô foram assassinados pela ‘Matte Laranjeira’, meu pai foi assassinado pelos jagunços do latifúndio. Rolindo e Genivaldo, meus colegas professores, foram assassina-dos este ano. Tudo permanece impune até a prescrição do processo. Isso não é nor-mal. Meu coração sangra muito. Pra quem a gente vai clamar? De nós esperam que deixemos de ser índios. Mas nós não vamos deixar de ser índios. Onde um cai, outro se levanta!”
Paulo Suess, presente no dia 07.10.2010 na PUC-SP.
Você já
conhece o Programa Potyrõ?
É um programa de rádio produzido aqui
na Editora Mensageiro, e distribuído a mais de
cem emissoras pelo país afora. Semanalmente,
le-vamos cinco minutos de notícas, comentários e
análi-ses sobre as comunidades indígenas a esanáli-ses ouvintes.
A geradora da Rede Católica de Rádio - RCR,
que é a Rádio Aparecida, também transmite o
Programa Potyrõ.
Transmissão: aos sábados e domingos,
às 12:35h, dentro do Programa
“Caminhos da Fé”. Para ouvir, você
sintoniza o seu rádio em:
Ondas Médias (820kHz),
Ondas Curtas de 25, 31 e 49 metros
ou Ondas Tropicais de 60 metros para
todo o Brasil.
A
Rádio Aparecida está no
portal da internet www.a12.com.
Confira! Seja ouvinte, seja parceiro na
comunicação a serviço dos povos indígenas.
Por Prof. Antônio Carlos Magalhães
Cada sábio que parte leva algo consigo que é perdido para sempre.
E deixa algo conosco e com as gerações futuras
que vai nos ajudar a escolher o caminho da vida, dentro de nossa tradição.
Fortunato Juruna nasceu junto à Cachoeira do Jurucuá, possivelmente em 1910, e depois morou na ilha do Muratá, tendo vivido também junto ao Igarapé do Buraco, à Cachoeira Dibanda e numa ilha denomi-nada Maloca Velha – reconhecida por ele como a maior aldeia em que viveu. A partir da segunda década do século XX, mais precisamente em 1928, Fortunato chegou ao Igarapé Furo Seco., Lá conheceu os não indí-genas (seringueiros, garimpeiros, etc.) e, como afirma, vestiu roupa pela primeira vez, e aprendeu a falar o português. Segundo ele, estava com cerca de 10/12 anos. Entre os anos 1943 e 1945 serviu como soldado da borracha e participou de algumas expedições promovidas pelo antigo Serviço de Proteção aos Índios/SPI.
“Na aldeia só usava tanga”; os braços e as coxas era tudo enfeita-do”; padres que trouxeram a gente pra batizar”.
Embora não saiba precisar a data, mas afirme que era bem mais novo, Fortunato menciona que esteve no Parque Indígena do Xingu du-rante um ano e nove meses para rever os parentes no Diauarum.
Fortunato casou-se quatro vezes, todas ctom mulheres não indígenas e teve 04 filhos em dois casamentos. Destes 03 estão vivos – Edivaldo, Carmina, a quem chamava de Cunha e Edilson, todos hoje residentes na Terra Indígena Paquiçamba. Este senhor - que era a mais im-portante liderança e o mais velho dos Juruna e cuja idade sempre gerou controvérsias - faleceu nesse mês de abril de 2010. Ele morreu no mesmo local aonde chegara em 1928, às margens do Igarapé Furo Seco, e com ele grande parte da história dos Juruna do Paquiçamba.
Fortunato Juruna se constitui ao longo de sua vida que se finda neste mes de abril de 2010 numa das mais importantes lideranças da etnia Juruna do curso médio do Rio Xingu.