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Capitalismo e a produção de migrantes e refugiados: limites e potencialidades do sistema

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Academic year: 2021

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CAPITALISMOEAPRODUÇÃODEMIGRANTESEREFUGIADOS:LIMITESE POTENCIALIDADESDOSISTEMA1

Renata Gonçalves Ribeiro Lucas2

Luiza Miranda Zechlinski3

OBJETIVOS

O presente trabalho busca fazer uma análise acerca das possíveis relações entre o fenômeno do capitalismo e as migrações internacionais. Pretende-se, a partir de então, posteriormente, a construção de uma pesquisa com viés critico e propositivo no que tange aos atuais fluxos migratórios internacionais.

A história mostra que as relações entre o capital e o trabalho tem caráter complexo e problemático. No entanto, a revolução na filosofia realizada por Marx com o surgimento do materialismo dialético e histórico alçou o pensamento e o mundo para uma nova concepção, principalmente entre as forças produtivas e as relações de produção. Foi no desenvolvimento socioeconômico e político da humanidade que sedimentou-se o regime capitalista; nas suas contradições intrínsecas e na luta do proletariado e da burguesia.

O capitalismo está assentado na propriedade privada dos meios de produção e na exploração do trabalho assalariado. A finalidade da produção capitalista e a fonte do enriquecimento é a apropriação dos meios de produção e a mais valia. E, a principal contradição é a existente entre o caráter social da produção e a forma privada de apropriação. Samir Amim em Le Développement inégal escreve que, “o modo de produção capitalista é caracterizado por uma contradição imanente: a que opõe o crescente caráter social das forças produtivas ao persistente caráter acanhado das ralações de produção” (AMIM, 1974).

A partir de suas análises, Marx constata que, a acumulação de capital constituí o imperativo ou a força motriz da sociedade burguesa. Ela se baseia na exploração da mão de obra operária que submete à produção mecanizada, com a finalidade de assegurar a mais valia. Consequentemente, há a formação de um

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Trabalho apresentado no XI Encontro Nacional sobre Migrações, realizado no Museu da Imigração do Estado de São Paulo, em São Paulo, SP, entre os dias 9 e 10 de outubro de 2019.

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Graduanda em Direito pela Universidade Católica de Pelotas e pesquisadoras do grupo de estudos em políticas migratórias e Direitos Humanos – GEMIGRA, da Universidade Católica de Pelotas.

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Graduanda em Direito pela Universidade Católica de Pelotas e pesquisadoras do grupo de estudos em políticas migratórias e Direitos Humanos – GEMIGRA, da Universidade Católica de Pelotas.

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exército industrial de reserva e sobre ele recai a Lei Geral de Acumulação Capitalista onde “O mecanismo da produção capitalista e da acumulação adapta continuamente esse número (de trabalhadores) e essas necessidades (de expansão do capital). O começo deste ajustamento é a criação de uma superpopulação relativa ou de um exército industrial de reserva, e o fim da miséria de camadas cada vez maiores do exército ativo e o peso morto do pauperismo” (MARX, 1984).

Esse processo pode ser compreendido historicamente a partir das primeiras migrações de caráter fundamentalmente econômico, as quais se iniciam com o desenvolvimento do capitalismo e, paralelamente, com o decurso da industrialização e urbanização; o que, na época, acarretou no declínio das sociedades rurais, bem como, no desenvolvimento dos burgos e da classe trabalhadora (SASAKI; ASSIS, 2000).

Marx, em “Contribuição a Crítica da Economia Política” (1984), demonstra que no transcurso da produção social, os homens contraem determinadas relações necessárias e independentes de sua vontade, relações de produção, que correspondem a uma determinada fase de desenvolvimento das forças produtivas materiais. E, o conjunto destas relações de produção forma a estrutura econômica da sociedade, a base real sobre a qual se ergue a superestrutura jurídica e política e àquelas que correspondem a determinadas formas de consciência social.

No entanto, diferentemente do êxodo rural no fervor da revolução industrial, é a partir das expedições para o Novo Mundo, onde as pessoas em situação de pobreza e miserabilidade, principalmente devido a exploração do trabalho na lógica capitalista, migraram, ou melhor, dizendo, fugiram para as colônias, para distanciarem-se das crises cíclicas que a produção industrial de larga escala estabelecia, ou também, devido a superpopulação e o consequente desemprego que se instaurava nestes centros (SASAKI; ASSIS, 2000). Esta superpopulação é produto inerente do processo de produção e valorização do capital, decorrente não só das condições de exploração que impõe o processo produtivo, mas ainda, na determinação dos níveis salariais.

Uma população trabalhadora excedente é produto necessário da acumulação ou do desenvolvimento da riqueza com base no capitalismo, essa super-população torna-se, por sua vez, a alavanca da acumulação capitalista, até uma condição de existência do modo de produção capitalista. Ela constitui um exército industrial de reserva disponível, que pertence ao

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custa […]. Não basta à produção capitalista de modo algum o quantum de força de trabalho disponível que o crescimento natural da população fornece. Ela precisa, para ter liberdade de ação, de um exército industrial de reserva independente dessa barreira natural (MARX, 1984, p. 200 e 202).

Em sequência, pode-se distinguir outro movimento migratório, o Novo Mundo incipiente e “não-civilizado” na tentativa de reproduzir instituições ocidentais torna-se, no caso das colônias de exploração, o 3º Mundo, o qual a partir de movimentos migratórios proporciona uma grande fonte de massa trabalhadora de reserva, mobilizada às necessidades do capital (SASAKI; ASSIS, 2000).

Estes imigrantes são designados para trabalhos marginalizados, de caráter informal, os quais, por vezes, em razão da própria dificuldade na regularização do seu status no país, acabam por privá-los do acesso aos institutos de proteção trabalhista tal como o direito do trabalho e os sindicatos. Relativo a isso, demonstra Gaudemar que:

Os trabalhadores imigrantes também não dispõem dos mesmos direitos sindicais, nem de um modo geral do direito de associação e de expressão cultural própria. Esta discriminação social e política que se encontra em todos os aspectos da vida dos imigrados (trabalho, alojamento, saúde, tempos livres...) implica grandes dificuldades para a organização e luta dos trabalhadores imigrados, mesmo para os seus direitos elementares, para escaparem à sua condição de novos escravos... (GAUDEMAR, 1977, p. 28).

Ressaltando ainda, a posição de vulnerabilidade dos imigrantes ilegais, em evidência as mulheres e minorias étnicas, que sofrem em grau superior para compor o corpo operário. É também nesses momentos em que valores culturais ocidentais são rechaçados, tais como igualdade, direitos fundamentais e estado de bem estar social, em prol do capital (KIZEK, 2016).

Em consonância:

O estatuto político inferiorizante e a fraca qualificação dos imigrados permitem às empresas explorá-los ao máximo (salários baixos, horários frequentemente prolongados, ritmo de trabalho muito intenso). Mas a sua forte taxa de mobilidade traz igualmente aos capitalistas economias apreciáveis sobre as massas salariais: a rápida rotação de trabalhadores imigrados suprime todas as regalias de antiguidade e permite manter uma fraca taxa salarial. Do mesmo modo, os trabalhadores imigrados, que têm uma taxa de atividade superior à média, contribuem para instituições sociais de que só raramente se beneficiam (doença, desemprego, velice) (GAUDEMAR, 1977, p. 27).

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Partindo desses princípios defendidos por Sasaki; Kizek e Gaudemar um ponto a ser analisado é o paradoxo existente entre a produção de migrantes e a exclusão deles do capital nacional resultante da sua força laboral. Começa-se observando como os migrantes são formados na conjuntura atual: o capitalismo é a resposta chave para tal. Parafraseando as palavras do doutorando Allisson Goes, a cultura capitalista constrói barreiras físicas e simbólicas para o trânsito de pessoas, principalmente para os menos favorecidos economicamente, os quais, teoricamente, não tem nada a ofertar àqueles que os receberão. Contudo, de forma controversa, esse sistema, ao mesmo tempo, permite que capitais, bens e mensagens sejam dissimulados pelo mundo de forma imediata.

Portanto, percebe-se que o migrante é necessário para o sistema capitalista, porém ele não é aceito na lógica social, em outras palavras, o capitalismo produz e precisa dos imigrantes para aqueles trabalhos com mão de obra barata, sub-remunerados e precarizados, mas em contra partida, exclui eles do resultante da sua produção laboral e, mais preocupante ainda, os exclui do corpo social, por meio de uma sociedade regada a preconceitos, que vê aquele que migra como forasteiro e indigno de permanência no país.

A migração surge como uma maneira de potencialização de ganhos no momento em que projeta essas pessoas nesses esquemas de trabalho debilitados, já que existe a fuga de condições degradantes no país de origem, almejando uma nova perspectiva de vida, entretanto são recebidos com novas formas de exploração que seguem perpetuando desigualdades e conjunturas de insegurança. Nesse aspecto, os refugiados são o extremo dessa estrutra decorrente do capitalismo e do processo de globalização, uma vez que são os que mais sofrem para sair de seus países e também quando conseguem chegar ao seu destino, são os que mais passam por preconceito e exclusão. Z. Bauman constata que: “eles deixam suas terras, mas são preteridos aonde tentam chegar e assim empurrados para lugar algum, rejeitados pelo medo do estrangeiro, da diferença, do outro; pelo medo da “desestabilização” social, econômica e cultural que a presença do outro pode causar” (BAUMAN, 2009).

Por conseguinte, eles seguem em frente indefinidamente e são repelidos na medida que o lucro chega a seu ápice; esses migrantes tem sua força da trabalho sugada ao máximo e depois, ao chegarem as crises econômicas naturais de um

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fora o ocorrido na França, pós Segunda Guerra, com a utilização do trabalho argelino para a reconstrução econômica francesa, bem ilustrado por Sayad (1998), desse modo pode-se depreender que, no mundo capitalista e globalizado atual, o capital circula preferencialmente e em seguida migram as pessoas.

Lembra, ainda, Marx que, o modo de produção capitalista é forçado a revolucionar incessantemente a produção, e, portanto, igualmente forçado a revolucionar incessantemente as relações de produção para adaptá-las à exigências do desenvolvimento contínuo das forças produtivas. A história do Capitalismo é, necessariamente, a história deste processo de ajustamento das relações de produção às exigências do progresso das forças produtivas. Este processo é constituído por fases de expansão e cada fase é caracterizada por um modelo particular de acumulação (AMIN, 1978).

No cenário atual há uma progressão da estrutura de mercado, em vista do processo de globalização e internacionalização da produção, dispersando as relações de trabalho e criando uma flexibilização das antigas estruturas de emprego. Portanto, percebe-se a imigração como um processo da própria estrutura de acumulação flexível (SASAKI; ASSIS, 2000).

Sustentado por Sassen "Globalization has also produced sites that concentrate a growing demand of particular types of labor supplies. Strategic among these are global cities, with their sharp demand for top-level transnational

professionals and for low-wage workers, often women from the global south”

(SASSEN, 2008).

Sob outra perspectiva da globalização fundamenta Zizek a partir de Sloterdijk:

En su obra En el mundo interior del capital, Peter Sloterdijk demuestra cómo, en la globalización actual, el sistema mundial completó su desarrollo y, en cuanto que sistema capitalista, acabó determinando todas las condiciones de vida. […]. El alcance global del capitalismo se fundamenta en la manera en que introduce una división radical de clases en todo el mundo, separando a los que están protegidos por la esfera de los que quedan fuera de su cobertura.

METODOLOGIA

O método de abordagem utilizado para o presente projeto de pesquisa é o materialismo-histórico. Ele consiste em uma pesquisa qualitativa de caráter

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bibliográfico-documental caracterizada pelo olhar interdisciplinar e o viés crítico sobre o problema proposto.

A pesquisa qualitativa responde a questões muito particulares. Ela se preocupa, nas ciências sociais, com um nível de realidade que não pode ser quantificado. Ou seja, ela trabalha com o universo de significados, motivos, aspirações, crenças, valores e atitudes, o que corresponde a um espaço mais profundo das relações, dos processos e dos fenômenos que não podem ser reduzidos à operacionalização de variáveis (p. 21-22).

É utilizado para explicar a migração uma análise bibliográfica marcada pelas referências de autores de cunho marxista para determinar a relação do migrante e o empresariado, em outras palavras, a própria luta de classes. Da mesma forma, serão utilizados outros autores para compreender o migrante para além da sua função laboral.

O objetivo do presente trabalho se propõe em denunciar a migração como um processo que advém do próprio capitalismo e de seus interesses evidenciando profundamente seus mecanismos de exploração. Assim como, explicar o paradoxo entre a produção do migrante dentro da lógica capitalista e sua decorrente exclusão dentro do sistema.

CONCLUSÃO

É possível, portanto, perceber que o movimento de migração, fundamentalmente econômico, tem seu alicerce sedimentado na história das relações de trabalho onde o detentor dos meios de produção desloca o capital variável, mão de obra excedente dos países de capitalismo dependente, às necessidades do capital. Tal fato reflete a intenção de maximizar os lucros por meio da contratação de trabalho imigrante cuja baixa remuneração da mão de obra propicia a acumulação do capital.

Outro aspecto a relevar, é a percepção de que a globalização naturalizou o processo de migração como parte da lógica do próprio funcionamento, em outras palavras, do próprio capitalismo. Este sistema traz no seu cerne contradições entre as duas classes, empresariado e o trabalhador, sendo no presente trabalho utilizado, em específico, o caso dos migrantes.

A conjuntura atual demonstra que políticas migratórias são retrógradas, intensificam as adversidades e maculam a imagem do imigrante. Percebe-se

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também que o imigrante é explorado em seu máximo pelo país que desembarca, em posições degradantes e precárias, servindo apenas como fornecedor de lucro, sendo facilmente descartado quando o país assim deseja. O capitalismo fez com que, no cenário atual, as pessoas sejam preteridas em função do capital, servindo aquelas apenas como mão de obra barata, em se tratando de imigrantes e refugiados.

REFERÊNCIAS

AMIM, S. Accumulation on a world scale: a critique of the theory of under development. New York, NY: Monthly Review Press, 1974.

GAUDEMAR, J. P. Mobilidade do trabalho e acumulação de capital. Lisboa: Editorial Estampa, 1977.

GOES, A. A cultura do capitalismo e as migrações internacionais contemporâneas. Revista Sinais, Vitória, ES, v. 22, n. 1, p. 62-79, 2018. Disponível em: https://www.google.com/url?sa=t&rct=j&q=&esrc=s&source=web&cd=2&ved=2ahUK Ewja2s7Ps6vkAhWrKLkGHbg0AcwQFjABegQIARAC&url=http%3A%2F%2Fperiodic os.ufes.br%2Fsinais%2Farticle%2Fdownload%2F20719%2F13926&usg=AOvVaw0I 0ptNYS8UU2i7_Kdr4i63. Acesso em: 30 ago. 2019.

GOMES, R. A análise de dados em pesquisa qualitativa. In: MINAYO, M. C. S. (org.) et al. Pesquisa social: teoria, método e criatividade. 21. ed. Petrópolis, RJ: Editora Vozes, 2002.

MARX, K. O capital: crítica da economia política. São Paulo, SP: Abril Cultural, 1984. (Livro Primeiro, v. II).

SASAKI, E. M.; ASSIS, G. O. Teorias das migrações internacionais. In: ENCONTRO NACIONAL DE ESTUDOS POPULACIONAIS, 12., 2000, Caxambu, MG. Anais...

Belo Horizonte, MG: ABEP, 2000. Disponível em:

https://www.pucsp.br/projetocenarios/downloads/CDH/Teoria_das_Migracoes_Intern acionais.pdf. Acesso em: 10 maio 2019.

SASSEN, S. Três migrações emergentes: uma mudança histórica. Sur – Revista

Internacional de Direitos Humanos, São Paulo, SP, v. 13, n. 23, p. 29-42, 2016.

SASSEN, S. Two stops in today„s new global geographies: shaping novel labor

supplies and employment regimes. American Behavioral Scientist, Princeton, NJ,

v. 52, n. 3, p. 457-496, 2008. Disponível em:

http://abs.sagepub.com/cgi/content/abstract/52/3/457. Acesso em: 10 maio 2019. ZIZEK, S. La nueva lucha de clases los refugiados y el terror. Barcelona: Anagrama, 2016.

Referências

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