• Nenhum resultado encontrado

O PRINCÍPIO DA ANUALIDADE TRIBUTÁRIA - A NECESSIDADE DE SUA ACOLHIDA PELA CONSTITUINTE DE 86

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2021

Share "O PRINCÍPIO DA ANUALIDADE TRIBUTÁRIA - A NECESSIDADE DE SUA ACOLHIDA PELA CONSTITUINTE DE 86"

Copied!
41
0
0

Texto

(1)

O Princípio da Anualidade Tributária —

A Necessidade de sua Acolhida pela

Constituinte de 86

SACHA CALMON NAVARRO COELHO

Professor de Direito Financeiro e Tributário da Faculdade de Direito da Universidade

Federal de Minas Gerais

SUMARIO: 1. A Quaestio Juris à guisa de fio condutor: o Princípio da Anualidade na Constituição Mineira; 2. A Validade Atual do Dispositivo da Constituição Estadual Face a Constituição Federal — O Papel da Suprema Corte no Equacionamento da Questão; 3. O Significado Jurídico do Princípio da Anualidade ou do Pressuposto da «Prévia Autorização Orça-mentária», segundo Aliomar Baleeiro em seu livro «Limitações ao Poder de Tributar». 4. O Princípio da Anterioridade na Atual Constitui-ção Federal, na Doutrina e na Praxis Judiciária — Retórica e Formalismo; 5. Advogando, em Homenagem a Baleeiro, um Retomo Puro e Simples ao Princípio da Anualidade da Consti-tuição de 1946 e a Superação da Súmula 66 do STF.

“Sem autorização orçamentária não se poderá cobrar nenhum tributo.

Cobrar tributo sem sua inclusão no orçamento não é apenas violar dispositivo constitucional mas pos-tulados do exercício democrático” . (A L B E R T O DEODATO, Manual de Ciências das Finanças — Editora Saraiva — 16- Edição — 1979 — pág. 273).

(2)

228 REVTSTA DA FACULDADE DE DIREITO

1. A QUAESTIO JURIS Ã GUISA DE FIO CONDUTOR:

O PRINCIPIO DA ANUALIDADE NA CONSTITUIÇÃO MINEIRA

1.1. Dispõe a Constituição Mineira vigente no seu

art. 10, I:

É vedado ao Estado e aos Municípios:

1. Instituir ou AUMENTAR TRIBUTO sem que a lei o estabeleça ou cobrá-lo sem a prévia autorização orçamen-tária (g rifo s ).

Trata-se aí do PRINCÍPIO DA ANUALIDADE que subor-dina a eficácia do ato tributário da cobrança à prévia autori-zação orçamentária. É dizer: A LEI MATERIAL TRIBUTÁ-RIA deve preexistir à LEI SUI GENERÍS de meios ou ânua. Funciona a lei orçamentária como “ATO-CONDIÇÁO” , para usar a terminologia de DUGUIT. Ato-condição porque para a cobrança do tributo no exercício vindouro não bastaria a EXISTÊNCIA DA LEI TRIBUTÁRIA MATERIAL, impondo- se a sua menção no orçamento de onde extrairia a devida autorização para a cobrança do tributo nela previsto. Para logo, é preciso dizer que o princípio da anualidade confere ao contribuinte um “plus” de segurança se comparado com o princípio da anterioridade que apenas exige a existência da lei tributária material, com termo a quo de vigência ao início do “exercício financeiro” que se lhe seguir. O princípio da anualidade garante ao contribuinte uma vacatio de pelo menos dois meses para conhecer a tributação a que estará sujeita no próximo exercício. O princípio da anterioridade apenas exige que a lei tributária material tenha vigência anterior a l 9 de janeiro. E, assim, se em 31 de dezembro vier a ser publicada a lei tributária, já no dia seguinte, l 9 de janeiro, será eficaz.

É intuitivo que neste caso A SURPRESA TRIBUTÁRIA está materializada e desprotegida resta a comunidade dos contribuintes, não passando de mera retórica a realização da finalidade a que se propôs servir ou seja à SEGURANÇA DO

(3)

CONTRIBUINTE, necessitado de um lapso de tempo, ao menos razoável, para conhecer e adequar-se à tributação pro-posta pelo Poder Público.

1.2. No plano federal vige e vale o princípio da anterio- ridade, um minimum de segurança, muita vez retórico. No plano estadual vigora o princípio da anualidade, de maior compostura jurídica, a teor do art. 10, I da Constituição Mineira.

2. A VALIDADE ATUAL DO DISPOSITIVO DA

CONSTITUIÇÃO ESTADUAL FACE A CONSTITUIÇÃO FEDERAL — O PAPEL DA SUPREMA CORTE NO EQUACIONAMENTO DA QUESTÃO

2.1. Esta questão foi resolvida pela Suprema Corte, com a decisiva participação de Baleeiro, como veremos

opor-tunamente. Em 1972, atendendo à solicitação que lhe dirigiu o Governador de Minas Gerais, o Procurador Geral da Repú-blica arguiu perante o Supremo Tribunal Federal a inconsti- tucionalidade de várias normas da Constituição Estadual, na redação que lhe fora dada pela emenda n9 1 de l 9 de outubro de 1970, emenda esta, portanto, posterior à emenda de 1969 à Constituição Federal de 67.

Na instrução da representação que tomou o número 861, sendo Relator o Ministro Osvaldo Trigueiro, averbou o Pro-curador Geral da República:

“A cláusula “ou cobrá-lo sem a prévia autorização orça-mentária” parece estabelecer uma proibição incompatível com o preceituado nos artigos 19, I e 153, § 29, da Constituição. Com efeito, se o comando federal apenas veda aos Estados e Municípios a cobrança de tributo instituído ou aumentado por lei que não esteja em vigor antes do início de cada exercício, é certo que o Estado- membro não pode alargar essa limitação para exigir, também, a previsão orçamentária do tributo. A regra constitucional, além de disciplinar o sistema tributário uniformizando-o, também se encontra inserida no rol dos

(4)

direitos e garantias individuais, significando a configu-ração de um princípio que ao constituinte estadual é defeso alterar, ainda que seja para elastecê-lo” .

O STF, em resposta, ementou:

“Decisão: Julgada a Representação: Improcedente quanto ao art. 10, I, contra os votos dos Ministros Luiz Gallotti, Bilac Pinto e Eloy da Rocha, que davam pela procedência, quanto a todo o dispositivo, e do Presidente, que declarou procedente só a cláusula relativa aos Municípios” . (Gri- fos)

2.2. A Suprema Corte, pois, por maioria, decidiu que o art. 10, I, da Constituição de Minas Gerais, era patível com

a Constituição Federal, mesmo após a emenda nç 1/69. De conseguinte, sendo VÁLIDO E EFICAZ o dispositivo cons-tante da Constituição do Estado-membro, há que ser respeitado e acatado pelos Governadores e Prefeitos até e enquanto vigorar.

3. O SIGNIFICADO JURÍDICO DO PRINCÍPIO DA

ANUALIDADE OU DO PRESSUPOSTO DA “PRÉVIA AUTORIZAÇÃO ORÇAMENTÁRIA” , SEGUNDO

ALIOMAR BALEEIRO EU SEU LIVRO “LIMITAÇÕES AO PODER DE TRIBUTAR”

3.1. Houve tempo nesta República em que o princípio da anualidade teve guarida na Constituição Federal. O velho princípio, erradicado pelo regime autoritário, nos vem desde o Império, passando pela primeira República. Foi ignorado pelo Estado Novo, logo voltando à tona com a Constituição Democrática de 46, para novamente sumergir na redação obscurantista que a outorgada emenda nç 1 deu à Constituição de 67, sem embargo de a Jurisprudência, antes disso, vir processando a sua erosão.

3.2. Terá cabimento portanto tracejar a sua reportagem nos supedâneos dos juristas e juizes pátrios e, quiçá, nos aportes peregrinos dos povos cultos. Por sem dúvida o seu

(5)

PRINCIPIO DA ANUALIDADE TRIBUTARIA 231

talhe será o mesmo com que se veste e persiste na Consti-tuição, neste ponto sábia e democrática, do povo das Gerais, e que, tomara, inspire a Constituinte-86, até porque até lá estarão unificados os três orçamentos, o fiscal, o monetário e o das estatais e reestabelecido o controle congressual.

3.3. Sobre o princípio da anualidade, inserto no art. 141, § 34 da Constituição democrática de 46, de ver a

disseca-ção que dele fez o constituinte ALIOMAR BALEEIRO, depois Ministro do STF:

“Parece-nos que a boa interpretação do art. 141, § 34, leva às seguintes conclusões lógicas:

a) a lei material, que decreta ou majora tributo, ressal-vados a tarifa aduaneira e o imposto de guerra, há de ser anterior ao Orçamento, pois não se autoriza nem se condiciona o que ainda não existe;

b) a lei do tributo não pode ser alterada ou retificada, depois do Orçamento, para vigência no exercício a que este se refere;

c) o Orçamento, na parte relativa à autorização para cobrança de tributos, não pode ser modificado ou alterado depois do prazo constitucional fixado para sua sanção

(Constituição, art. 74, combinado com o art. 70, e pará-grafo) ;

d) a lei material do imposto cuja vigência se esgotou pela revogação ou pelo decurso do prazo fixado no texto de suas próprias disposições, não é revigorada pela sim-ples autorização orçamentária para cobrança em exercício posterior;

e) a lei tributária, revogada por outra, não volta a vigorar pela revogação desta última;

f) a lei que aplica especialmente tributo à manutenção de órgão paraestadual, ou parafiscal, não pode delegar a este a fixação ou alteração do objeto da prestação, isto é, do quantum a ser exigido dos contribuintes, nem dispen-sar a autorização orçamentária para a cobrança em cada exercício;

(6)

232 REVISTA DA FACULDADE DE DIREITO

g) prorrogado o Orçamento, por força do art. 74 da Constituição, permanecem autorizados os impostos nele previstos, resultantes de leis ainda em vigor, sem que possa realizar a cobrança dos decretados posteriormente à aprovação do mesmo orçamento;

i) vetado o Orçamento nos dias posteriores a 30 de novembro, não se prorroga o do exercício em curso, pois o art. 74 da Constituição determina a prorrogação pleno

jure somente se os autógrafos do novo não tiverem sido

enviados à sanção até aquela data: não se poderá realizar a cobrança de quaisquer tributos” .

3.4. Do livro de BALEEIRO, clássico sobre a matéria, colhi, ademais, os seguintes escólios, que passo a narrar:

O Ministro ARMANDO PRADO, em sua luminosa passa-gem pela Suprema Corte, teve oportunidade de expressar o conteúdo do axiológico e técnico-jurídico do princípio da anualidade:

“Não é lícito, portanto, criar imposto para ser colhido no mesmo exercício. Seria a surpresa tributária, que a moral administrativa condena. Para que se possa cobrar o imposto, não basta que esteja incluído no Orçamento, documento contabilístico, mero plano de previsão de receita e fixação de despesa, ato-condição que não subsiste sem a preexistência de lei formal e materialmente elabo-rada. Só a lei especial, contendo as condições em que o imposto há de ser havido, desacompanhada da norma orçamentária, que indica a época da cobrança do encargo, não é suficiente para determinar e legalizar a coleta do tributo. É indispensável a conjugação das duas peças, na ordem em que a Constituição as exige” . (Ac. do TFR no MS 90 — Rev. Forense, vol. 123, pág. 117, s s .).

Certa feita São Paulo tentou cobrar tributo com base em lei posterior à votação do Orçamento. Alegou o Governo Paulista que a autorização orçamentária era “qualitativa” e não “quantitativa” , isto é, basta referir-se ao nome do tributo

(7)

PRINCIPIO DA ANUALIDADE TRIBUTARIA 233

nada importando o quantum. Mostrou Rubens Gomes de Sousa como a aprovação concedida pela Lei do Orçamento para a cobrança dos tributos é condicionada à situação legal então existente, inclusive no que se refere às alíquotas pelas quais se terá de fazer a cobrança dos mesmos tributos e demais condições legais existentes à data da promulgação da lei orçamentária.

(RUBENS GOMES DE SOUZA, Estudos — Rev. Foren-se, vol. 123, pág. 369).

Não menos incisivo foi JOÃO MANGABEIRA, outro constitucionalista de escol, empenhado na defesa do princípio da anualidade:

“ Se não houver novo Orçamento, o contribuinte, desde 14 de novembro de cada ano, saberá que tem de pagar, sem possibilidade de surpresa, o que já estava pagando no exercício vigente. O texto não podia ser mais claro nem mais preciso.

A situação jurídica, uma vez firmada pela sanção ou pela prorrogação do Orçamento, é imodificável dentro do ano financeiro. Só no Orçamento subseqüente poderá o legis-lador autorizar a arrecadação do novo tributo ou do aumento, não inscritos na lei orçamentária. Fora aí a anualidade do Orçamento seria um contrasenso.

Pode o legislador criar quando quiser novos impostos, ou aumentar os existentes. Está nas suas atribuições. Mas a arrecadação de tais impostos ou aumentos só poderá ser autorizada pelo novo Orçamento, se uns e outros não estiverem inscritos no vigente ano financeiro. E o gover-no não pode arrecadar senão os impostos cuja arrecada-ção o Orçamento vigente autorizou” .

Rev. Forense, vol. 124, pág. 376).

Igualmente FRANCISCO CAMPOS, broslou, com rara sabedoria, os fundamentos axiológicos do princípio da ANUA- LID AD E:

(8)

234 REVISTA DA FACULDADE DE DIREITO

“A alegação de que a autorização orçamentária exigida pela Constituição é apenas qualitativa e não quantitativa estabelece uma discriminação arbitrária, sem fundamento algum no critério de senso comum. A Constituição exige, com efeito, que se englobem obrigatoriamente na Receita não somente pela sua denominação técnica ou usual, mas também pela sua taxa ou tais como se acham definidos, qualitativa e quantitativamente, na lei especial de sua criação.

Mediante a discriminação arbitrária que se pretende fazer, para efeitos orçamentários, entre qualidade e quantidade do imposto para o fim de, somente pela menção do seu título, se satisfazer a exigência de figurarem no Orça-mento todos os impostos cuja arrecadação fica autorizada no exercício, aniquila-se de uma só vez todo o sistema do Direito Orçamentário, particularmente as suas funda-ções constitucionais” .

“De que valeria, então, a regra constitucional relativa à anualidade do imposto, se reduzida à mofina e fútil exi-gência de se reproduzir no Orçamento pelo título que lhe cabe na nomenclatura dos impostos, apenas a sua quali-dade ou a espécie da matéria designada à sua incidental?”

(Rev. Dir. Adm., vol. 14, pág. 467).

O Eminente e também Ministro do STF, BILAC PINTO, não discrepava:

“A anualidade do imposto consiste, pois, essencialmente, em que o tributo para poder ser cobrado precisa ser incluído, anualmente, no Orçamento.

A lei fiscal, como diz DAMERVALLE, é uma lei imper-feita que somente se completa quando intervém um ato- condição, que é o Orçamento.

Se determinado tributo não é incluído no Orçamento, a lei fiscal que o criou não se torna, somente por isso, inconstitucional. A conseqüência jurídica dessa não-inclu- são no Orçamento é apenas a inexigibilidade do tributo, durante o respectivo ano fiscal. Sendo permanente a lei

(9)

PRINCIPIO DA ANUALIDADE TRIBUTARIA 235

instituidora do tributo, poderá este vir a ser incluído em um Orçamento futuro, tornando, desse modo, exigível o imposto em ano fiscal ulterior, nunca, porém, retroativa-mente” .

(Rev. Forense, vol. 1230, Fascículo 545, pág. 37, idem Est. de Dir. Público, Forense, pág. 189).

3.5. O Histórico remoto da anualidade entre nós mere-ceu de BALEEIRO as doutas e sucintas considerações a seguir transcritas:

“A tradição brasileira forjara o Orçamento desse modo na Constituição de 1824. Recorda ULHÔA CANTO o art. 315 do Projeto Antônio Carlos, pelo qual, “todas as contribuições devem ser cada ano estabelecidas ou confir-madas sem o que cessa a obrigação de pagá-las” , assim como a lei de 1862: “anualidade não está na decretação anual dos impostos, pois estes devem constar de leis per-manentes, cabendo às leis ânuas a autorização para sua cobrança no exercício” .

Não deve haver disposição no Orçamento que não seja autorizada por lei — pontificava CASTRO CARREIRA ao proclamar-se a República.

No fim do século passado, AMARO CAVALCANTI, no primeiro compêndio geral de Finanças escrito no Brasil, fiel ao método histórico, referiu-se às práticas fiscais então em uso no País. Em relação ao Orçamento, seu testemunho confirma a vetustez da regra da anualidade com todas as características com que depois veio a batizar-se de ato- condição:

“O imposto é votado em leis permanentes ou nas leis anuais da receita pública, conforme a prática seguida nos diversos Estados. No Brasil a regra seguida é: uma vez criado o imposto por lei especial ou por disposições perma-nentes da própria lei orçamentária da receita, considera- se vigente, enquanto não for declaradamente revogado; mas é indispensável para a sua arrecadação que nas leis anuais referidas se repita a autorização implícita da mes-ma, pela inscrição do respectivo título no Orçamento” .

(10)

236 REVISTA DA FACULDADE DE DIREITO

3.6. Ainda do livro de Baleeiro, esta ligeira resenha de direito comparado:

“ em França o funcionário que pretender cobrar o tributo sem licença orçamentária é passível de incriminação, a teor da Lei de Finanças, que guarnece o Orçamento” . E, assim:

“Toutes contributions directs ou indirects autres que celles qui sont autorisées par les lois en vigueur et par la présente loi, à quelquer titre ou sous quelque denomi- nation qu’elles se perçoivent, sont formellement interdites, à peine, contre les autorités qui les ordonneraient, contre les employés qui confectionneraient les roles et tarifs et ceux qui en feraint le recouvrement, d’être poursuivis pendant trois années contre tous receveurs, percepteurs ou individus qui en auraient fait la perception” .

(ESMEIN: Elements de Droit Constitutional Français et Comparé, 7» ed., Tit. II, Paris, 1924).

O art. 111 da Constituição Belga é taxativo:

“Art. 111 — Les impôts au profit de l’Etat son votés annuellement. Les lois qui les établissent n’ont de force que pour un an, si elles ne sont renouvelées” .

No México, vigora a regra da anualidade, tal como em França e Bélgica.

“La Ley de Ingresos contiene tan solo el catálogo en las leyes tributarias que van a estar con vigor en el ejercicio para el que se expide la de Ingressos; lo que constituye la renovación de vigência, en ausência de la cual, la ley tributaria particular deja de ser obligatoria” .

E ainda:

“ ... las leyes tributarias son distintas y autônomas en cada ejercicio y solo se explica su aparente continuidad por la renovada vigência que les impone la Ley de Ingre- sos de la Federación para cada ejercicio” .

(11)

PRINCIPIO DA ANUALIDADE TRIBUTARIA 237

3.7. Sobre a Inglaterra e os E.E.U.U., de tradição jurí-dica não Latina, escreveu ALIOMAR BALEEIRO:

“Na Inglaterra, historicamente, desde a Idade Média, certos tributos gozavam de tradição imemorial, de sorte que a reação dos parlamentos, através dos séculos, era dirigida contra as inovações e majorações fiscais. Isso explica, provavelmente, o fato de serem permanentes algumas receitas, como, aliás, também a autorização para as despesas de fundo consolidado em contraste com a renovação anual de outras notadamente o income tax, que ocupa lugar de relevo na arrecadação britânica.

A prática atual, nesse país, é votar-se com o Orçamento, em cada ano, uma lei separada, o Finance Act, onde são concedidas várias receitas, majorado o quantum de algu-mas e reduzido o de outras. O Finance Act, 1948, por exemplo, consta de 90 páginas, com inúmeras alterações dos impostos de consumo, direitos alfandegários, imposto de compras (purchase tax), o income tax e o profits tax, o de heranças etc.

Nos Estados Unidos, a Constituição não oferece regra semelhante à do art. 141, § 34, quanto à anualidade, e explicam os autores que os impostos são permanentes. Não há, na jurisprudência copiosa da Corte Suprema, decisões fundadas na anualidade, ao que saibamos. Mas a prática atual é semelhante à inglesa: com o Orçamento, que, aliás, vem acompanhado da tabela 6, onde figura o rol de todas as receitas e suas estimativas comparadas com as da arrecadação no ano anterior, “based on existing an proposed legislation” , vota o Congresso o Revenue Act, que sempre modifica o quantum dos vários impostos. DELETRÉE menciona como Estados americanos que consagram a regra da anualidade para todos os impostos: Califórnia, Indiana, Kansas, Mississipi, Nebraska e

(12)

238 R E VISTA DA FACULDADE DE DIREITO

Tennessee. Adotavam-na, parcialmente, para quase todas imposições fiscais, Michigan, Nevada, Utah, Montana e New Hampshire. Não nos foi possível verificar a exatidão dessas afirmações na atualidade e, além disso, os méto-dos financeiros diferem muito méto-dos nossos e méto-dos fran-ceses” . (BALEEIRO, ob. c it.).

4. O PRINCIPIO DA ANTERIORIDADE N A A TU A L CONSTITUIÇÃO FEDERAL, N A DOUTRINA E N A PRAXIS JUDICIÁRIA — RETÓRICA E FORMALISMO 4.1. BALEEIRO sempre esteve certo quando profligando a substituição da ANUALIDADE PE LA ANTERIORIDADE, iniciada ainda sob a égide da Constituição de 46, prenunciava graves lesões ao sistema constitucional de contenção ao poder de tributar. Ã Carta de 67 com suas inúmeras emendas, logo se acrescentaram novas feridas ao já combalido sistema de contenção, apequenando o nível de proteção jurídica à comu-nidade dos contribuintes. Presentemente os outrora respeita-dos princípios da legalidade da tributação e da anterioridade da lei fiscal, principalmente este último, apresentam elevado conteúdo retórico, sendo, portanto, ineficazes ao nível da praxis.1

4.2. Ao meu sentir quatro fatores concorreram para que nos anos oitenta chegássemos a tão desalentadora situa-ção:

1. Antecipando a análise do princípio da anterioridade em nosso direito, devo dizer que apesar do ICM não se enquadrar naa ressalvas

do art. 153, § 29 da CF e em Minas, submeter-se ao art. 10, I da Constituição Mineira, o ICM fere aos princípios da ANUALIDADE, ANTERIORIDADE e LE G ALID AD E . Os convênios de Estados, DE RESTO NAO HOMOLOGADOS PELOS LEGISLATIVOS ESTADUAIS, ENTRAM SISTEM ATICAM ENTE EM VIGOR UM MÊS DEPOIS DE PUBLICADOS NO ÓRGAO OFECIAL (Lei Complementar n" 24). O que fazem estes convênios ? — Aumentam e diminuem o quantum

debeatur do ICM através de isenções, reduções de bases de cálculo,

concessão de créditos presumidos e deduções fictas, contra a Consti-tuição.

(13)

PRIN C IPIO DA AN U ALID AD E TR IB U TAR IA 239

a) A anterioridade entendida como mera edição da lei fiscal antes do início do exercício financeiro que se lhe seguir, desvinculada da lei ânua (anualidade), em detrimento do controle congressual.

b) A previsão expressa de manejo dos tributos através de Decreto-lei, em casos de urgência ou interesse público relevante, motivos de apreciação estritamente política.

c) O abandono do conceito legal de tributo inserto no art. 3 do CTN para admitir-se, destituídas de natureza tribu-tária, a existência de prestações pecuniárias compulsórias instituídas em lei, não sancionantes, em favor do Poder Pú-blico ou de suas instrumentalidades.

d) As excessivas ressalvas liberatórias à disciplina do art. 153, § 29 da Constituição Federal, confirmadas e amplia-das pelas franquias dos artigos 21 e 22 da mesma.

— Quanto ao motivo da alínea (a ) desse ensaio, falaram com eloqüência e sabedoria BALEEIRO e os demais juristas trazidos a colação AB IN ITIO .

— No concernente a alínea (b) a admissão, em sentido amplo, de que a expressão “inclusive normas tributárias” constante do art. 55 da Constituição, AUTORIZA AO CHEFE DO EXECUTIVO, a instituição e a majoração de tributos por Decreto-lei2, presentes os requisitos de urgência ou interesse

2. A lei, em sentido formal e material, está na base do principio da legalidade e que, afinal, significa «o povo se tributando a si próprio», no dizer de PONTES DE M IRAN D A. Eqüivale a afirmar que o LEGISLATIVO deve não só discutir como decidir o an e o quantum

debeatur dos tributos. Entre nós, o Decreto-lei não permite emenda,

deve ser aprovado ou rejeitado em bloco, valendo a ausência volitiva como aprovação (decurso de prazo). Estas características tomam o Decreto-lei um instrumento de força e até de confronto entre poderes da república e retira ao Legislativo o poder de discutir e produzir as leis fiscais, contrariando dessarte o velho brocardo vazado em ALBION ao Tempo de João-sem-terra: «N o tributation, without representation». A luz de valores éticos, econômicos, técnico-jurídicos, políticos e histó-ricos, entendo que o Judiciário deveria ter feito um escolástico «DIS- TINGUO» face ao art. 55 da CF, a modo de evitar a instituição o a majoração de tributos por Decreto-lei.

(14)

240

REVISTA DA FACULDADE DE DIREITO

público relevante, ensejou contra a opinião respeitada e pro-funda de G ER ALD O A T A L IB A ,3 um esmaecimento ainda maior dos princípios constitucionais da legalidade e da anterioridade.

3. A TA LIB A (Instituições de Direito Público e República — SP — 1984) esclarece: «A tributação — em seus princípios básicos e fórmu-las mais gerais — é matéria constitucional. Não só porque justificou e esteve na essência do primeiro documento constitucional moderno — a Magna Carta de 1215 — mas também porque envolve tensão entre o poder estatal e dois valores fundamentais para o homem: a liberdade e o patrimônio. Estes bens jurídicos, precipuamente protegidos pelas Constituições modernas, são mesmo a sua razão de ser. Se a ação estatal de tributar (tributação) atinge a liberdade e o patrimônio — e se estes bens encontram na sua proteção a própria razão de ser da Constituição — é bem de ver que aquela faculdade que ao estado se reconhece há de ser disciplinada estritamente em termos constitucionais. Em outras palavras, é matéria substancialmente constitucional. Se assim é, desde que se adotou o princípio republicano — que postula que a função política é desempenhada por órgãos representativos, com mandato periódico e debaixo de um estatuto de responsabilidades — impõe-se o pleno prestígio do princípio do consentimento dos tributos, ao lado dos princípios da legalidade, generalidade e proporcionalidade da tributação. A estes se acrescente, como reforço, o controle jurisdi- cional da administração (de que magistralmente cuidou SE ABRA F A -GUNDES) . E como consectário necessário do princípio do consenti-mento da tributação — que se traduz na aprovação orçamentária dos

tributos — está a fiscalização popular sobre a atividade arrecadadora

e sobre a aplicação dos dinfteiros públicos. Todos esses ingredientes, inclusive o consentimento — tecnicamente designado por princípio de anualidade da tributação — se contém no Texto Constitucional brasi-leiro. Se o Consentimento se exige para tudo e se é presumido nos atos dos mandatários do povo, de modo geral, o Texto Magno, entre-tanto, quer que seja explicitamente expresso e renovado, quando o de que se cuida seja a exigência, pelo estado, aos seus cidadãos (e terceiros a eles, nisso, equiparados), de prestações de cunho patrimonial. Daí não só a reiterada consagração do princípio da legalidade estrita dos tributos (art. 19, I e 153, § 29, primeira parte), como a adoção siste-mática do princípio da autorização orçamentária, anualmente renovável, dos tributos, tão bem sustentada pela pena viril e firme de FLÁVIO NOVELLI (RDA 137/1 a 41) a despeito de precipitadas conclusões em contrário, que jamais tiveram o abono de PONTES DE MIRANDA

(Comentários..., Emenda 1/69, vol. V, pp. 615 e ss.). Efetivamente, a despeito do aparente intentio legislatoris no sentido de abolir a autori-zação orçamentária, como esta deflui necessariamente do espírito do

(15)

PRINCIPIO DA ANUALIDADE TRIBU TARIA

241

4.3. O motivo sob (c) do item 8.2, retro, já conside-radas as elevadas e compreensíveis razões que inspiraram os doutos Ministros, “data maxima venia”, trabalha contra o melhor direito. Com efeito, considerar a — tributárias presta-ções pecuniárias compulsórias, ex lege, não sancionantes, em favor do Poder Público, em tudo iguais aos tributos, concorre para obnubilar o regime constitucional de proteção aos direi-tos individuais além de desorganizar a disciplina jurídica da imposição fiscal. É que sendo tais exigências a — tributárias, ipso facto escapam das regras constitucionais que comandam a disciplina tributária, a não ser que a Suprema Corte pela via da “construction” elabore para logo um sistema de condi-cionamentos atinentes a tais contributos, até agora sem parâ-metros no ordenamento jurídico.4

sistema, de modo inequívoco, deve ser entendida como persistente. Na verdade, ,ela «decorre do regime» republicano representativo e dos princípios adotados pela Carta Magna vigente (art. 153, § 36); foi esse irresistível raciocínio que fundou, irretorquivelmente, o irrefutável ensaio do notável discípulo e continuador de BALEEIRO, mestre FLA -

VIO NOVELLI. Falta-nos exigir a sua obediência estrita, o que seria

alcan-çável por instante exigência de sua observância, aos órgãos

parlamenta-res e aos tribunais. Isto não é feito sistematicamente, por ignorância,

comodismo, oportunismo, inércia e omissão dos que, de modo ou doutro, têm títulos e ocasião para fazê-lo. Disso tem-se aproveitado o Executivo, para, invadir seara legislativa e afrontar os direitos individuais. Deve-ras, dentre as mais graves aberrações a que estamos assistindo — e muitos até mesmo dando aprovação tácita — está a criação de tributos por obra de decretos-leis. Isto é flagrantemente inconstitucional e fere fundamente o sistema jurídico, exatamente na sua essência e nos seus fundamentos, onde se situa conspicuamente o princípio republicano. Há quem o admita, ao argumento de que há necessidade de alterar o Texto Constitucional, para repelir tal atentado ao próprio arcabouço funda-mental do nosso constitucionalismo. Ora, basta que se interprete a Constituição de acordo com os cânones postos pela hermenêutica tradi-cional, perfeitamente consonante com nosso direito positivo, acatando as diretrizes exegéticas traçadas por RUI BARBOSA, CARLOS MAXI- MILIANO, SAMPAIO DÓRIA e ALIOMAR BALEEIRO, mestres do nosso Direito Público». (Grifos)

4. O que ontologicamente distingue em nosso direito o tributo de outras prestações pecuniárias compulsoriamente impostas ex lege são precisamente as notas do «compósito normativo» que lhe confere

(16)

identi-242 REVISTA DA FACULDADE DE DIREITO

4.4. Sobre o minguamento do princípio da anualidade (alínea d), já se pronunciou o eminente Min. Moreira Alves,

quando do julgamento do RE n9 97.749-0 - SP, relativo a cobrança do I.O .F . no mesmo exercício em que foram insti-tuídas novas incidências e majoradas outras.

“Não há dúvida de que o princípio da anualidade não tem mais a extensão que tinha anteriormente.

Pelo § 34 do artigo 141 da Constituição de 1946 apenas dois tributos escapavam à incidência desse princípio:

“Nenhum tributo será exigido ou aumentado sem que a lei o estabeleça: nenhum será cobrado em cada exercício sem prévia autorização orçamentária, ressalvada, porém, a tarifa aduaneira e o imposto lançado por motivo de guerra” .

A vigência desse parágrafo 34, na parte em que exigia a prévia autorização orçamentária para a cobrança de tributo em cada exercício, ficou suspensa até 31 de dezembro de 1964, por força da Emenda Constitucional n9 7, de 22 de maio de 1964.

A Emenda Constitucional n9 18, publicada em 6 de dezembro de 1965, no dizer de BALEEIRO (Limitações Cons-titucionais ao Poder de Tributar, 5» ed., pág. 22, Rio de

dade legal, quais sejam: (I) Estatuição por lei (unilateralidade e hete-ronomia obrigacional) além da (II) compulsoriedade garantida pelo aparato estatal administrativo (III) tendo por «causa» FATO LICITO

(caráter não sancionatório) gerando (IV ) dever pecuniário com paga-mento em moeda. Estas «notas» distinguem o tributo da multa (sanção pecuniária de ato ilícito) da indenização (reparação pecuniária do dano) do preço público (obrigação contratual, ainda que por mera adesão) da obrigação de alimentar e outros de direito privado (que embora ex lege são executadas pelas partes, sem interferência da administração) dos deveres públicos de fazer: votar, servir o exército, etc. (conteúdo não pecuniário) das cauções, depósitos, fianças, (garantias) e das apropria-ções em pecúnia (atos unilaterais, não prestacionais). Ê o que expressa o art. 3Ç do CTN, que ademais, não VALORA O NOME NEM O DESTI-NO DA ARRECADAÇÃO.

(17)

Janeiro, 1977), “feriu profundamente o princípio da anuali-dade, aplicando-o apenas aos impostos sobre o patrimônio e a renda, no sentido de que não poderiam ser cobrados com base em lei posterior à data inicial do exercício financeiro a que corresponda, isto é, l 9 de janeiro do ano em curso” . O princí-pio da anualidade, nela, passou, na realidade, a ser exceção, e se adstringiu ao inciso II do artigo 29, verbis:

“Art. 2’ — É vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos municípios:

PRINCIPIO DA ANUALIDADE TRIBUTARIA 243

II — cobrar imposto sobre o patrimônio e a renda, com base em lei posterior à data inicial do exercício financeiro a que corresponda” .

E, no artigo 25, preceituava: “Ressalvado o disposto no artigo 26 e seus parágrafos, ficam revogados ou substituídos pelas disposições desta Emenda... o § 34 do artigo 141... da Constituição. . . ”

A Constituição de 1967, porém, retomou ao sistema da Constituição de 1946, como se vê do disposto no § 29 do artigo 150:

“ § 29 — Nenhum tributo será exigido ou aumentado sem que a lei o estabeleça nem cobrado, em cada exercício, sem que a lei que o houver instituído ou aumentado esteja em vigor antes do início do exercício financeiro, ressalva-dos a tarifa alfandegária e a de transporte, o imposto sobre produtos industrializados e o imposto lançado por motivo de guerra e demais casos previstos nesta Cons-tituição” .

Essa ampliação foi dilatada, finalmente, pela redação dada a esse dispositivo pela Emenda Constitucional n9 8, de 14 de abril de 1977:

“ § 29 — Nenhum tributo será exigido ou aumentado sem que a lei o estabeleça nem cobrado, em cada exercício, sem que a lei que o houver instituído ou aumentado

(18)

244 REVISTA DA FACULDADE DE DIREITO

esteja em vigor antes do início do exercício financeiro, ressalvados a tarifa alfandegária e a de transporte, o impostos obre produtos industrializados e outros especial-mente indicados em lei complementar, além do imposto lançado, por motivo de guerra e demais casos previstos nesta Constituição” .

Como se vê, o princípio da anualidade persiste como regra geral, embora se haja dilatado o campo de suas exceções, o qual abrange:

l 9) Os tributos especificados no próprio § 29: a tarifa alfandegária e a de transportes, o imposto sobre produtos industrializados e imposto lançado por motivo de guerra;

29) Os “especialmente indicados em lei complemen-tar” ; e

S’ ) “Os demais casos previstos nesta Constituição” . 4.5. A conexão dessas quatro causas acabou por tomar o princípio da anterioridade, no Brasil de nossos dias, um princípio altamente retórico, destituído de real eficácia e que concede ao contribuinte, e ao povo em geral, um “minimum” de proteção jurídica, nisso desconforme com o padrão axioló- gico que historicamente informa a regra constitucional da anualidade, como se demonstrará.

4.6. Rápido exame dos tributos e competências federais isto aclarará de maneira insofismável. Doze são os impostos federais, a saber:

1. imposto de importação, liberado do princípio da ante-rioridade (art. 153, § 29 c/c o art. 21, I da CF);

2. imposto de exportação, liberado do princípio da ante-rioridade (art. 21, II da C F );

3. imposto sobre a propriedade territorial rural, sujeito a anterioridade;

(19)

PRINCIPIO DA ANUALIDADE TRIBUTARIA 245

4. imposto sobre a renda e proventos de qualquer natu-reza, aparentemente sujeito ao princípio da anterioridade; 5. imposto sobre produtos industrializados, livre do prin-cípio da anterioridade (art. 21, V da CF);

6. imposto sobre operações de crédito, câmbio e seguro ou relativas a títulos ou valores mobiliários, sujeitado ao princípio da anterioridade;

7. imposto sobre transportes de natureza não estrita-mente municipais, liberado do princípio da anterioridade

(art. 153, § 29 “TARIFA DE TRANSPORTES” );

8. imposto sobre comunicações, salvo se de natureza estritamente municipal, sujeito “in these” ao princípio da anterioridade;

9. imposto único sobre a produção, importação, circula-ção, distribuição ou consumo de lubrificantes líquidos e gasosos, sujeito “in these” ao princípio da anterioridade; 10. imposto único sobre a produção, importação, circula-ção, distribuição ou consumo de energia elétrica, sujeito “in these” ao princípio da anterioridade;

11. imposto único sobre a extração, circulação, distribui-ção ou consumo de minerais do país, sujeito “in these” ao princípio da anterioridade;

12. “taxa rodoviária única” , em verdade imposto sobre a propriedade de veículos automotores, com esforço na competência residual da União (art. 18, § 5) e cujas alíquotas e bases de cálculo são fixadas por portaria do Ministro da Fazenda, livre, pois, do princípio da anterio-ridade, sequer transitando pelo orçamento...

4.7. Dos doze impostos federais, CINCO escapam do princípio da anterioridade: importação, exportação, IPI, ISTR

e TRU. Dos sete restantes, o imposto sobre a renda, além de escapar ao princípio da anterioridade, é RETROATIVO e, os impostos únicos — três — por se apoiarem em preços admi-nistrados, tornam irrelevante o princípio da anterioridade, face a competência do Executivo Federal para FIXA-LOS.

(20)

246 REVISTA DA FACULDADE DE DIREITO

4.8. Dos sete acima mencionados, remanescem TRÊS. Um deles, igualmente escapa ao princípio da anterioridade, o sobre comunicações, eis que aderente a preço administrado ou seja a tarifa fixada pelo Poder Público Federal. . . 5

4.9. Alfim, somente dois impostos federais restariam sujeitados aos princípios da anterioridade e da legalidade. São o ITR e o ISOF. Admitido, com espeque na urgência, o manejo de qualquer deles por Dec.-Lei “de fim-de-exercício” , a anterioridade reduz-se a quase nada. Paradoxalmente quan-to mais perquan-to do final do ano venha o Dec.-lei menos vale o princípio da anterioridade. Entre l 9 de dezembro — em recesso o Congresso Nacional — e 1? de janeiro, medeia um tempo excessivamente curto para acautelar os interesses dos jurisdicionados.

4.10. Quanto aos impostos que aderem a preços admi-nistrados, urge que o LEGISLATIVO E A COMUNIDADE DE CONTRIBUINTES TENHAM ACESSO E CONTROLE SOBRE OS ÓRGÃOS DO EXECUTIVO que tomam as deci-sões majorativas.6

4.11. Todavia a competência da União vai além. Pode INSTITUIR CONTRIBUIÇÕES e EMPRÉSTIMOS COMPUL-SÓRIOS (Artigo 21, § 2, I e I I ) .

4.12. Quanto aos empréstimos compulsórios, contem-plados em dois sítios da Constituição, tem-se por assente que são de dois tipos. Os previstos no art. 21, § 2, item n, se submeteriam integralmente às disposições constitucionais rela-tivas aos tributos e às normas gerais de direito tributário, porque DEFINIDOS EM LE I COMPLEMENTAR e, só por esta via, seriam instituíveis. Mas os EMERGENCIAIS, com

5. Certoe impostos «flutuam» por aderência aos preços de mercado: ICM, ITBI, ISS — todos do Município ou do Estado. Outros «flutuam» por ATOS DO PODER PÚBLICO: TRU, IUM, IUSEE, IULLG, ISC.

6. Os preços públicos pelo que representam como ônus, sobre serem remuneradas por TA R IF A S (contraprestações) devem,

(21)

PRIN C IPIO D A AN U ALID AD E TR IB U TAR IA 247

sede constitucional no § 3 do art. 18 da Carta, escapariam por inteiro das restrições da Constituição de natureza tribu-tária, até mesmo pela EMERGENCIALIDADE dos motivos consignados na Lei Complementar mater, o Código Tributário Nacional, que no art. 15 prevê possam vir a ser instituídos, em casos de guerra externa ou sua iminência, calamidade pública que exija auxílio federal impossível de atender com os recursos orçamentários disponíveis ou conjuntura que exija absorção temporária do poder aquisitivo.7 Vale dizer, emprés-timo compulsório do tipo do que foi instituído em favor da Eletrobrás, exigiria lei complementar e submissão aos cânones constitucionais. Outros, emergenciais, libertos dos pré-requisi-tos constitucionais, desde que presentes os motivos tabelados para a sua instituição no art. 15 do CTN, poderão ser veicula-dos sem catar submissão ao princípio da anterioridade, por simples Dec.-lei ou mesmo Decreto.8

4.13. No concernente as contribuições ditas para-fiscais cujo rol já extremamente dilargado não cessa de crescer; quanto a esta LEGIÃO DE TRIBUTOS, cuja carga tributária é pesadíssima, NÃO ATU A O PRINCIPIO DA ANTERIORI- DADE, seja pela ressalva do art. 21, § 2, item I da CF, seja pela licença do STF que considera a — tributárias algumas dessas contribuições, como a previdenciária, do empregado e do empregador e a para o PIS.

4.14. Registre-se finalmente a tradicional insubmissão a princípios constitucionais dos impostos extraordinários de guerra.

7. Sobre a natureza tributária dos empréstimos compulsórios, ao meu sentir, IMPOSTOS RESTITUÍVEIS, existe toda uma literatura, donde refulge o clássico ensino de AM1LCAR DE ARAOJO FALCAO, de todos conhecido.

8. A LIO M AR BALEEIRO jamais concedeu natureza a-tributária aos empréstimos compulsórios, quer como doutrinador quer como Minis-tro do STF, contra a súmula 418, a meu ver superada pela vigente ordem constitucional e que reza: «o empréstimo compulsório NAO E TRIBUTO e sua arrecadação não está sujeita à exigência constitucional da prévia autorização orçamentária».

(22)

248 REVISTA DA FACULDADE DE DIREITO

4.15. Quê do princípio da anterioridade, versão atual do princípio da anaualidade, patrimônio de toda a humani-dade após ingente pugna para submeter à lei o arbítrio dos Governantes ?

4.16. Dentre todas as exceções ao princípio da anterio-ridade, duas merecem exame mais aprofundado: a que expres-samente libera as CONTRIBUIÇÕES PARAFISCAIS, simples impostos com destinação específica e a que torna retroativo o imposto sobre a renda. Tanto as contribuições quanto o imposto de renda, atingem a totalidade da população, cabendo, por isso, maiores considerações em tomo dos referidos assuntos.

4.17. Devo começar pelo imposto de renda das pessoas físicas e jurídicas. Aqui tornou-se praxe distinguir entre o ANO-BASE e o EXERCÍCIO DO PAGAMENTO e, desavisa- damente, convencionou-se que o exercício seguinte para o efeito de se aplicar o princípio da anterioridade é justamente o do pagamento.9 Então tem-se o seguinte paradoxo. Em 1* de janeiro de 1984, por suposto, começam a praticar os contri-buintes os fatos tributáveis, tendo por farol jurídico a Lei vigente em 31 de dezembro de 1983, ou seja, a vigente no ano anterior. Ocorre que em 31 de dezembro de 1984 — ano- base — sobrevem Dec.-lei MUDANDO AS REGRAS TRIBU-TÁRIAS, AS ISENÇÕES, A BASE DE CÁLCULO, AS A L Í-QUOTAS, AS INCIDÊNCIAS E TUDO MAIS. Dito Dec.-Lei, catando submissão ao princípio da anterioridade, entrará em vigor com sentido de eficácia em l 9 de janeiro de 1985, ou seja, 24 horas depois. Ao calcular o imposto devido em 84

9. Entendo, no que pertine ao SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, que deve impor-se sem contraste, interpretando as leis ao lume dos grandes princípios retores da ordem jurídica. Vale a pena recordar o que disse certa feita UM TRIBUNAL DE NOVA IORQUE: «TODAS AS LEIS ASSIM COMO TODOS OS CONTRATOS PODEM SER CONTROLADOS EM SUA APLICAÇAO PELAS MAXIMAS GENÉRI-CAS DO «COMMON LA W » (RIGGS V.S. — Palmer — 115 N Y — 506; 22 NE — 188).

(23)

PRINCIPIO DA ANUALIDADE TRIBUTARIA 249

para pagamento em 85, o contribuinte estará sujeito a este Dec.-lei e não à Legislação anterior ao fato gerador da obriga-ção tributária. Ocorre, verdadeiramente, a retroatividade da Lei Fiscal. No entanto, para sanar o mal, bastaria distinguir o ANO DO FATO GERADOR DO EXERCÍCIO DO PAGA-MENTO DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO, decorrente da OBRI-GAÇÃO. O pagamento é ato formal. O importante é a data do fato gerador que por sua vez faz surdir no mundo jurídico a obrigação. A lei aplicável deveria ser a vigente no ano ante-rior ao da realização do fato gerador.

4.18. Cedo de bom grado a palavra a LUCIANO DA

SILVA AMARO, professor de Direito Tributário da Faculdade Mackenzie, em São Paulo (Resenha Tributária — Edição n9 77 — Ano XIV — 1983, Seção 1.13 — págs. 555 e segts.):

“A Constituição Federal insere, no capítulo dos Direitos e Garantias Constitucionais, além do princípio da legali-dade (art. 153, § 2r>), o enunciado — que é desdobra-mento desse princípio — segundo o qual “a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada” (art. 153, § 3’ ).

É da essência do Estado de Direito não apenas a sujeição do próprio Estado às leis, mas também o respeito ao direito adquirido e ao ato jurídico perfeito, a par da submissão à coisa julgada, o que traduz princípios funda-mentais, como o da lealdade nas relações entre o Estado e os indivíduos, o da certeza e segurança do direito aplicável. ( Sublinhei).

Por essas razões, ALBERTO XAVIER vê, nas dobras do princípio da legalidade ( “Nullum tributum sine lege praevia” ), o fundamento constitucional específico da irretroatividade das leis tributárias.

O problema, neste passo, consiste em saber se, à vista do citado princípio e dos postulados que o informam, é possível aplicar-se a lei nova, editada no curso de determi-nado ano (freqüentemente, nos últimos dias de dezembro) para a tributação da renda auferida desde o início desse

(24)

250 REVISTA DA FACULDADE DE DIREITO

mesmo ano (ou, no caso de pessoas jurídicas, auferida desde o ano anterior, se o seu exercício social não coinci-dir com o ano civ il).

Tem-se respondido que sim, de modo, a nosso ver, equivo-cado. Parece ter contribuído para esse equívoco a conju-gação de dois fatores principais: a natureza do fato gerador como fato jurídico stricto sensu, e a natureza periódica do fato gerador do imposto de renda” .

E, prossegue:

“Todo fato gerador, como acontecimento histórico, corre no tempo; o fato gerador periódico ocorre em certo perío-do de tempo e consuma-se o término desse períoperío-do, do mesmo modo que a representação de uma peça teatral não ocorre somente ao final do último ato; ela (a repre-sentação) se põe no tempo, como fato que é, ao longo do período que vai do início do primeiro ato ao término do último; e se consuma não na última cena, mas com o término desta. Permitindo-nos outra metáfora, o fato gerador do imposto de renda não é a fotografia estática da última cena da vida fiscal do contribuinte em certo ano; é o filme dessa vida fiscal da personagem, desenro-lada ao longo do mesmo ano (filme que será revelado no ano seguinte, com o lançamento do tributo) . (Subli-nhados pelo autor) .

O fato gerador do imposto de renda coloca-se, temporal- mente, num período e não num momento. Isso não é antinômico com a afirmação, feita acima, de que o fato se consuma com o término do período.

Sem acolher a crítica que autorizada doutrina (GERAL-DO ATALIBA, PAULO DE BARROS CARVALHO) faz à classificação dos fatos geradores em instantâneos e periódicos, deve reconhecer-se que o tributo incide sobre a soma algébrica de diversos dados pertinentes ao ano- base (ou ao exercício social, no caso de pessoas jurídicas), e, portanto, só se pode afirmar a consumação ou o aper-feiçoamento do fato gerador com o término do período de sua formação. Ou seja, é necessário que se esgote o

(25)

PRINCIPIO DA ANUALIDADE TRIBUTARIA 251

ciclo de sua formação (prevista na lei), para que ele se repute perfeito como fato gerador. Os ganhos obtidos, por exemplo, no início do período podem ser absorvidos por deduções ou abatimentos que se realizem posterior-mente, até o final do ciclo; por isso, não se pode susten-tar que, desde o primeiro rendimento auferido no ano já se instaura a relação obrigacional tributária; se o fato gerador periódico ainda não se consumou, inexiste a obri-gação. Enfim, é preciso aguardar-se o término do período de formação para que se possa atestar a própria existên-cia do fato gerador (e não apenas sua dimensão)” .

Conclui incisivamente, e ao meu ver, de modo correto: “É realmente inacreditável que se continue insistindo em que a renda que não foi ganha em 31 de dezembro (ou 1? de janeiro) “considera-se ganha nessa época” , e que, portanto, a lei que seria retroativa considera-se não retroativa e, em decorrência, o que a Constituição exigia considera-se não mais exigido — tudo por força das virtualidades mágicas da lei ordinária.

Isso revela profunda desconsideração pela Lei Funda-mental, desprezo que culmina — quando se traz à colação o princípio da anterioridade — com a assertiva de que só se exige lei anterior ao lançamento do tributo, como se, transpondo a questão para o Direito Penal, bastasse lei anterior ao “lançamento da pena” pelo Estado, no lugar de lei anterior ao delito.

Não podemos compactuar com equívocos tão gritantes quanto antigos e, de costas voltadas para a Constituição, continuar a construir aquilo que ela, solenemente, proíbe”

(G rifos).

4.19. O Autor das citas possui certamente autoridade. Nas XI Jornadas Latino Americanas de Direito Tributário promovidas pela Associação Brasileira de Direito Financeiro entre 15 e 20 de maio de 1983, logrou aprovação de tese nesse sentido, presentes delegações de todo o continente. Decidiu- se então:

(26)

252 REVISTA DA FACULDADE DE DIREITO

“A aquisição da disponibilidade de renda resulta de fatos (voluntários ou não) que se produzem ao longo do período, e que são fatos jurídicos relevantes para efeito da lei tributária. Por isso e em face dos princípios da anterioridade, da irretroatividade e da segurança do direito (a não surpresa, a evitação do arbítrio), bem como as demais implicações do estado de direito, é vedada a alteração da lei, para criar ou aumentar o imposto, após iniciado o período” .

4.20. Ê pertinente notar que BALEEIRO sempre lutou para que o nosso imposto de renda fosse estruturado em bases correntes. Se o fosse, certamente a falácia da anterioridade em tema de imposto sobre a renda restaria, por esta via parcialmente superada. De todo modo, compreendo indulgen-temente a LUCIANO AMARO quando, candente, verberou a súmula 584, confirmatória do que entendeu ser uma “velhís-sima e empedernida inconstitucionalidade, que mercê de estra-nha síndrome de inércia da doutrina, contaminou os espíritos, instalou-se nas mentes e cristalizou-se a tal ponto que mereceu consagração em súmula” , (ob. c it.).

Vem a pelo transcrevê-la:

“Ao imposto de renda calculado sobre os rendimentos do ano-base, aplica-se a lei vigente no exercício financeiro em que deve ser apresentada a declaração” . (Súmula 584 do STF) .

4.21. Não me sinto desalentado com a referida súmula e creio na Suprema Corte que pode mudá-la. Por certo a modificação dessa situação não está adstrita a alteração da técnica de cobrança do imposto sobre a renda, como praticada entre nós. Ã disposição do Pretório Excelso estão princípios constitucionais vetustos e sobranceiros que, se aplicados, devolverão à sociedade a segurança e a certeza a que faz jus em tema de imposto de renda.

(27)

PRINCIPIO DA ANUALIDADE TRIBUTARIA 253

4.22. Nem se duvide da capacidade dos eminentes

Ministros da Suprema Corte, os mais solitários de todos os homens, com a enorme responsabilidade de decidir casos de múltiplas ubiquações e de conseqüências tremendas, mor-mente quando curam controvérsias fiscais, muita vez, criados desnecessariamente por um Executivo trêfego e irresponsável, mas cujas repercussões afetam até mesmo a res 'publica. Positivamente, não estou advogando para a Suprema Corte o descortês papel de um “corpo de bombeiros” jurídico a apagar incêndios ateados pelo FISCO. É preciso sentir o tempo e o modo, como predicava MOUNIER. Agora mesmo o STF vem de aplicar ao Executivo severa reprimenda com a Jurispru-dência reparativa que mesmo sabendo possuir o Decreto-Lei EFICÁCIA IMEDIATA submete o tributo decretado ou a sua majoração ao princípio da anterioridade. Louvo esta reação dos pretórios superiores e aprovo irrestritamente a razão de decidir, harmonizando ao lume de valores caros, o aparente conflito entre o art. 55 da CF com o art. 153, § 29, este encartado em capítulo dedicado a DIREITOS E GARANTIAS INDIVIDUAIS. Certo, tendo o Decreto-lei VÃRIOS OBJE-TOS MATERIAIS e sendo um deles a DECRETAÇÃO DE TRIBUTOS, neste particular a sua VIGÊNCIA IMEDIATA encontra óbice na hipervalidade normativa do princípio da anterioridade da lei fiscal, enquanto valor jurídico maior.10 Em nota de rodapé anterior, GERALDO ATALIBA explorou este ponto a partir dos princípios republicano e federativo, com rara maestria, como visto.

10. Todavia, em que pese o aplauso ao posicionamento do STF não me furto a discorrer sobre efeitos perversos que possam vir a

ense-jar, como o de acostumar o Executivo a só baixar Decretos-leis em fim de ano, quando em recesso o Congresso, estreitando o «prazo de cogm- ção» da tributação nova pela sociedade. O recente posicionamento do STF iguala o Decreto-lei à lei formal e material. Todavia a adoção do principio da anterioridade em lugar do principio da anualidade inviabi-liza o VALOR SEGURANÇA E A NAO-SURPRESA em Tema de Tributação, pois que, entre o final de um exercício e o início de outro, correm dias ou horas. Mas o Decreto-lei é mais pernicioso. Este pode surdir até dia 30 de dezembro, enquanto que lei, só até novembro pode ser votada, face ao recesso parlamentar...

(28)

254 R E V IS T A D A FAC U LD AD E DE DIREITO

4.23. Devo prosseguir com as chamadas “ contribuições parafiscais” que podem ter suas alíquotas e bases de cálculo ALTE R A D AS POR ATO AD M INISTRATIVO COM VIG ÊN-C IA E EFIÊN-C ÁÊN-C IA IMEDIATAS, a teor do art. 21 da ÊN-Carta Magna combinado com o § 29, item I do mesmo artigo.

4.24. É dizer todas as contribuições parafiscais — e não são poucas — formadoras de um formidável “orçamento paralelo” e que gravam um universo fantástico de contri-buintes, estão livres da ANTERIORIDADE, relativamente à MAJORAÇÁO de suas respectivas cargas impositivas.

4.25. Perde a comunidade dos contribuintes que se vê a mercê do improviso dos Governantes e sujeitada à incerteza e à insegurança.

4.26. Não vejo nenhuma razão para excepcioná-las. Ao contrário, pelas características que possuem, deveriam estar sujeitadas às regras constitucionais de contenção ao poder de tributar11 e submetidas ao controle congressual, via orça-mento .

11. Quanto à classificação jurídica da contribuição parafiscai dissertou B A LE EIR O com notável argúcia: «Ora, da elaboração

doutri-nária até agora conhecida, quatro elementos são apontados como características das contribuições parafiscais: a) Delegação do poder fiscal do Estado a um órgão oficial ou semi-oficial autônomo; b) desti- nação especial ou «afetação» dessas receitas aos fins específicos cometidos ao órgão oficial ou semi-oficial investido daquela delegação; c) exclusão dessas receitas delegadas do orçamento geral (seriam, então «para-orçamentárias», «parabudgetaires», segundo L A F E R R IÊ R E ); d) conseqüentemente, subtração de tais receitas à fiscalização do Tribunal de Contas ou órgão de controle da execução orçamentária. Os dois primeiros caracteres, afinal, resultam apenas de peculiaridades técnicas sem maiores conseqüências de ordem política. Bem diversa é a conse-qüência da aceitação dos dois últimos. Impostos com aplicação especial existiram e continuam a existir nos diversos países desde séculos. A especialização ou destinação do imposto a certo fim, ou serviço, era a regra geral nas finanças antigas. Os princípios do ancien régime quando decretavam um tributo novo ou um empréstimo forçado sempre pretextavam uma necessidade imperiosa, a cuja satisfação destinavam especificamente a receita pretendida. Portugal não procedia de outro

(29)

P R IN C IP IO D A A N U A LID A D E T R IB U T A R IA 255

Ao propósito, dizia BALEEIRO :

“Parece-nos que o conceito da parafiscalidade se enqua-draria no velho tema, ainda hoje controvertido, da clas-sificação das receitas.

Cobradas por ato de autoridade, sem qualquer adesão voluntária do contribuinte, as receitas parafiscais entra-riam no gênero dos tributos ou ingressos coativos.

Importa indagar-se se a parafiscalidade é espécie nova e diferente do gênero tributo, ou se está compreendida nos impostos, como querem MERIGOT e LAFERRLÊRE. Ou poderá ser imposto, nalguns casos, e taxa nos outros casos ?

modo quando impunha ao Brasil, então colônia, tributos através das Câmaras Municipais. Ainda hoje o imposto com aplicação específica figura no sistema fiscal de vários Estados. A delegação do poder fiscal e a destinação específica do tributo, pois, como já observou MERIGOT, não bastam por si só para assegurar à parafiscalidade qualidades distintivas, que a diferenciam dos impostos e taxas. Há, na parafisca- lizaçâo, o elemento coativo peculiar a todos os tributos e conseqüente-mente o problema consiste na justificação ou explicação de como ela possa afastar os princípios jurídicos que, por motivos políticos e históricos, se cristalizaram numa prática secular em todas as nações policiadas. Ou, por outras palavras, o importante é investigar-se se há fundamento jurídico para a não-inclusão das contribuições parafiscais no rol dos impostos e tributos dependentes de autorização orçamentária e de fiscalização pelo Tribunal de Contas, nos Estados que adotam esse tipo de controle das receitas e despesas públicas. Circunscrita àqueles quatro caracteres, a contribuição parafiscal não se assinalaria por qualquer outro traço próprio. Contra essa opinião se insurgiu o Prof. MORSELLI, que sustenta existir na parafiscalidade uma atividade financeira de natureza diversa daquela que o Estado exercita normal-mente desde séculos. Ela não se fundaria na capacidade contributiva, mas inspirar-se-ia em princípios éticos de solidariedade social. Os efeitos econômicos dessas arrecadações processar-se-iam também de modo outro e bem diferente, segundo esse financista italiano. Essa construção não

se ajusta rigorosamente aos fatos. Algumas das contribuições

parafis-cais são especialmente destinadas à manutenção de órgãos de defesa de limitados interesses de classe, profissão ou setor da produção, sem qualquer matiz de solidariedade humana ou elevação ética. Uma análise mais rigorosa pode identificar, na política desses órgãos de

(30)

represen-256 R EVISTA D A FACULDADE DE DIREITO

Teríamos, então, de investigar, em relação a cada contri-buição parafiscal, se os respectivos contribuintes recebem ou não uma contraprestação efetiva, quer pelo gozo dum serviço, quer porque este haja sido colocado à disposição deles; ou tenha sido provocada, por atividade deles, a despesa relativa a esse serviço. No caso afirmativo, a contribuição parafiscal estará identificada como taxa stricto sensu.

PROSSEGUE:

“Em contraste, vários serviços públicos, inspirados em motivos morais, são mantidos pelos tributos ordinários, isto é, pelo FISCO.

Por outro lado, as reações econômicas dos contribuintes não se modificam por ação de qualquer dos quatro elementos característicos da parafiscalidade. As evasões, repercussões e demais efeitos econômicos de cada contribuição parafiscal

tação profissional ou econômica, restritos interesses de grupos de indi-víduos, sem maior conexão com os princípios de solidariedade humana ou social. Bem longe desta andam os desejos dos produtores desta ou daquela mercadoria quando se congregam, sob as vistas do Estado, para que lhes sejam garantidas condições favoráveis de crédito bancário, preços vantajosos, equilíbrio estatístico da produção, controle de expor-tações ou imporexpor-tações, etc. A análise histórica indica que a parafisca-lidade é expediente político e não categoria econômica. Embora a prática se houvesse difundido por muitos países, em verdade, assumiu

vulto na Itália, durante a era fascista, e na França, durante a ocupação e o regime de Vichy. A parafiscalidade corresponde, pois, a um eclipse das instituições democráticas entre as duas guerras e durante a última delas. Nos Estados Unidos, o seguro social, organizado em proporções

gigantescas pela União e pelos Estados federados, é suportado pelo Fisco ordinário, isto é, pelo «pay-roll-tax» arrecadado à base da folha de pagamento dos assalariados. Note-se a circunstância de que, na França, após o restabelecimento e consolidação das instituições demo-cráticas, depois de 1946, o Parlamento vem reagindo contra a parafis-calidade, não só determinando que sobrevivam apenas as contribuições

parafiscais criadas ou mantidas em lei, mas ainda submetendo ao controle do Tribunal de Contas as entidades autônomas beneficiadas com essas receitas». — (G rifo s). BALEEIRO — Uma introdução à

(31)

PR IN C IPIO DA AN U A LID A D E TR IB U TA R IA 257

decorrem do fato gerador escolhido para base da imposição, condições de mercado e outras circunstâncias já expostas pelos que estudam os fenômenos de traslação dos gravames fiscais.

É certo que, como ponderou o Prof. LAUFENBURGER, a maior massa de receitas parafiscais provém da previdência ou seguro social, envolvendo os problemas econômicos das despesas de transferência por oposição às despesas reais, no sentido que PIGOU atribui à transfer expenditure — aquela que não corresponde à utilização de recursos reais, pelo Estado, mas apenas à deslocação desses recursos dos contri-buintes para outros indivíduos, assim beneficiados com pen-sões etc. (cap. XI, n9 4). Este fato é deveras importante como aspecto do mecanismo econômico de redistribuição da renda nacional, mas não altera a natureza das contribuições parafis-cais nem tira destas os elementos substanciais, que as identi-ficam com os tributos.

Visto sumariamente o conceito de parafiscalidade, parece- nos que ela, teoricamente, em que pese à douta opinião do Prof. MORSELLI, não oferece fisionomia distinta daquela que identifica os tributos em geral, pois a delegação e a aplicação especial são aspectos meramente técnicos.

Ora, em vários casos, tributos para aplicação especial aos fins dos órgãos aos quais o Estado os delegou são exigidos exclusivamente dos grupos ou indivíduos que se beneficiam com as atividades de tais órgãos paraestatais. Teríamos, então, como taxas, as contribuições dos trabalhadores e profis-sionais para institutos de seguro social, sindicato e órgãos de defesa dos interesses de classe.

Noutros casos, porém, não há qualquer nexo entre o contribuinte e a finalidade a que se destina a cotização para-fiscal. Se esta recai sobre o custo da mercadoria, ou qualquer elemento desse custo (material, mão-de-obra etc.), nada im-porta que, afinal, a arrecadação se destine especialmente ao fomento da produção daquela mercadoria, educação profissio-nal ou técnica de futuros operários para fabricá-la etc. Há, então, imposto.

(32)

258 REVISTA DA FACULDADE DE DIREITO

O exame dos fatos mostra que a contribuição parafiscal em alguns casos se identifica com as taxas stricto sensu, e noutros casos com impostos com destinação especial a um fim. A taxa, por sua natureza, envolve aplicação especial.

Do ponto de vista jurídico e político, em ambos os casos, como arrecadações coativas, haveria lugar para decretação

exclusivamente por lei do Parlamento.

Esses aspectos da parafiscalidade indicam que os proble-mas por ela suscitados são de ordem política e jurídica, desde que envolvem a renúncia do Parlamento à função tradicional que o criou e robusteceu.

Se é possível, a pretexto de delegação do poder tributário e aplicação especial da receita, estabelecer-se uma finança excepcional paralelamente ao Fisco, sem que suas respectivas arrecadações sejam votadas pelos representantes do povo, nem suas aplicações sofram a fiscalização dos órgãos de controle de contas, então as instituições democráticas receberam, em

pleno coração, um golpe bastante perigoso.

O conceito de parafiscalidade é útil, do ponto de vista exclusivamente didático, metodológico ou terminológico, para designar impostos ou taxas que se distinguem dos demais pela delegação a um órgão paraestatal a fim de serem aplica-dos aos fins deste” . (G rifos).

(Uma introdução à Ciência das Finanças, 139 Edição, Forense, Rio — 1981 — pág. 273).

4.27. Assim sendo, DEVEM AS CONTRIBUIÇÕES

sujeitar-se ao controle do Parlamento, pois além de serem TRIBUTOS, estão dedicadas a órgãos paraestatais, daí a necessidade ainda maior de sujeitá-las a severos condiciona-mentos, seja na instituição seja na gestão seja nos resultados. Desse modo LEGALIDADE E ANTERIORIDADE SÃO PRIN-CÍPIOS que devem, necessariamente, regrar tais contributos. Sobre o assunto o eminente Professor IVES GANDRA DA SILVA MARTINS, em seu incansável labor, reuniu em cole-tânea notável, as opiniões de juristas pátrios e estrangeiros, sobre a NATUREZA TRIBUTARIA DAS CONTRIBUIÇÕES

(33)

PRINCIPIO DA ANUALIDADE TRIBUTARIA 259

ESPECIAIS, SOCIAIS, PREVTDENCIÃRIAS, DE INTER-VENÇÃO, et caterva, certo que nomem juris é o que menos importa.

(Contribuições Especiais, sob a coordenação de Ives Gandra da Silva Martins — Caderno de Pesquisas Tributárias, n9 2 — co-edição do Centro de Estudos de Extensão Universitária e Resenha Tributária, S. Paulo — 1977).

5. ADVOGANDO, EM HOMENAGEM A BALEEIRO, UM RETORNO PURO E SIMPLES AO PRINCIPIO DA ANUALIDADE DA CONSTITUIÇÃO DE 46 E A

SUPERAÇÃO DA SÜMULA 66 DO STF

5.1. Revistar o passado recente, recomeçar a construir o sistema tributário, são tarefas urgentes. A próxima consti-tuinte, a seu turno, não pode deter-se apenas em remensurar a CARGA TRIBUTÁRIA ou só distribuí-la melhor entre as pessoas políticas, quebrantando o centralismo e a hipertrofia da União.

5.2. Antes de mais nada há que robustecer os princípios de contenção ao poder de tributar, a modo de devolver à sociedade a SEGURANÇA, A CERTEZA, A LEALDADE E A JUSTIÇA, que lhe são devidas em suas relações fiscais com o Poder Público, como predicava BALEEIRO e hoje predicam os PUBLICISTAS de nosso país.

É ouvir RUY BARBOSA NOGUEIRA, EROS ROBERTO GRAU, CELSO ANTÔNIO BANDEIRA DE MELO, IVES GANDRA DA SILVA MARTINS, GERALDO ATALIBA, EDVALDO BRITO, JOSÉ SOUTO MAIOR BORGES, FLÃ- VIO BAUER NOVELLI, JOSÉ AFONSO SILVA, JOSA- FAT MARINHO, o eminentíssimo GILBERTO DE ULHOA CANTO, ALBERTO PINHEIRO XAVIER e tantos outros, cuja nominação seria fastidiosa.

(34)

260 REVISTA DA FACULDADE DE DIREITO

5.3. Lembro-me da profética advertência do meu colega de Faculdade, Professor CELSO CORDEIRO MACHADO, devotado epigono de ALIOMAR BALEEIRO, em seu livro “Limites e Conflitos de Competência Tributária no Sistema Brasileiro” , em idos de 1968:

“O sistema de competências tributárias, por mais nume-rosos e até minuciosos sejam os dispositivos que o inte-gram, só pode funcionar adequadamente graças a um esforço de hermenêutica construtiva, em que, analisados globalmente e coerentemente, os ditames constitucionais e legais possam ser interpretados, não só à luz dos seus fundamentos doutrinários e teóricos, dentro do direito tributário, mas ainda no contraste com os princípios políticos e econômicos que informam todo o regime

federativo.

Se esse esforço não for empreendido, conjuntamente, pelos professores, na cátedra, através da investigação cientí-fica, pelos legisladores, nas assembléias, com o instru-mento da lei ordinária ou complementar, perfeitamente sintonizada com os alicerces constitucionais, pelos admi-nistradores, na área executiva, influídos do propósito de fidelidade ao sistema, na adoção das medidas destinadas à sua efetivação, pelos juizes, nos tribunais, por via da

construção jurisprudencial, toda aquela arquitetônica

formal, internacionalmente reconhecida como a mais perfeita de quantas se conhecem, acabará se esvaziando de conteúdo, se esterilizando, se marginalizando, para ceder lugar ao empirismo das improvisações, ao abuso

das autoridades, ao conformismo inconsciente dos

contri-buintes, ao beneplácito acomodatício do judiciário” . (G rife i).

(Celso Cordeiro Martins, ob. cit. — BH/1968 __ pág. 115).

Parece-me que não lhe seguimos o sábio conselho. O proscênio em que, ao nível de praxis, se desenvolve a trama da tributação no Brasil, aconselha um novo começo. Para

(35)

PRINCIPIO DA ANUALIDADE TRIBUTARIA 261

tanto, a par de outras providências, nada melhor que um retorno ao princípio da anualidade, em sua extrema e singela eficácia, nos moldes de 46.

Dirão muitos que o princípio é anacrônico e incompatível com o estágio atual da sociedade brasileira ou com o DIN

A-MISMO do Executivo, suas finalidades intervencionistas, seus

quereres extrafiscais. Nada mais falso. Em tese aprovada em Manaus, por ocasião do Congresso Nacional dos Advogados do Brasil, tive oportunidade de dizer o que agora repito.

Os princípios jurídicos da legalidade, anualidade, anterio-ridade e irretroatividade da lei tributária encontram justifi-cação singela e promanam diretamente da experiência dos povos.

a) O princípio da legalidade significa que a tributação deve ser decidida não pelo chefe do Governo mas pelos repre-sentantes do povo, livremente eleitos para fazer as leis.

b) O princípio da anterioridade expressa a idéia de que a lei tributária seja conhecida com antecedência, de modo que os contribuintes, pessoas naturais ou jurídicas, saibam com certeza e segurança a que tipo de gravame estarão sujeitos no futuro imediato, podendo dessa forma organizar e planejar seus negócios e atividades.

c) O princípio da irretroatividade da lei tributária, deflui da necessidade de assegurar-se às pessoas segurança e certeza quanto aos seus atos pretéritos em face da lei nova.

d) O princípio da anualidade traduz a necessária inserção da lei tributária na lei do orçamento, dela extraindo legitimação ânua (para o ano vindouro).

Indiretamente, a existência desses princípios obriga os governantes a planejarem com um mínimo de seriedade e antecedência a política tributária.

Sabedor o Executivo de que a sua política tributária para o próximo ano seria necessariamente discutida nos parla-mentos, certamente procuraria fundamentar sua proposta sopesando os reflexos econômicos, sociais e políticos que

Referências

Documentos relacionados

No entanto, a preparação desse professor é fundamental para que a educação dê o salto de qualidade e deixe de ser baseada na transmissão de informação para

Este estudo tem o intuito de apresentar resultados de um inquérito epidemiológico sobre o traumatismo dento- alveolar em crianças e adolescentes de uma Organização Não

Este procedimento foi realizado tanto para a obtenção do modelo simplificado da altura efetiva da coluna ( ℎ), como para a vazão de água necessária para absorver CO 2

Muito embora este dispositivo tenha sido criticado por reduzir a importância prática do direito à vida ( TSHOSA, 2001, p. 15 Defensores da pena de morte podem, portanto, sustentar

No mês, o fundo apresentou desempenho negativo, com perdas nos mercados de bolsa, mercados globais e no book long-short, compensadas por pequenos ganhos no mercado de juros.. Segundo

Diante desse quadro, o Instituto de Pesquisa, Assistência Técnica e Extensão Rural (Incaper) desenvolveu o presente estudo sobre os custos de produção do café das montanhas do

Como parte de uma composição musi- cal integral, o recorte pode ser feito de modo a ser reconheci- do como parte da composição (por exemplo, quando a trilha apresenta um intérprete

Esse requisito acabou gerando muita polêmica. O problema ocorreu com os professores que, por determinado tempo, exerciam atividade de direção, coordenação ou