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TEORIA DA DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA NO BRASIL THEORY OF THE PIERCING THE CORPORATE VEIL IN BRAZIL

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TEORIA DA DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE

JURÍDICA NO BRASIL

THEORY OF THE PIERCING THE CORPORATE VEIL IN BRAZIL

Maiara dos Santos Noronha1

Karoline Veiga França2 RESUMO

O presente artigo tem por objetivo apresentar brevemente os aspectos que circundam a aplicação da Teoria da Desconsideração da Personalidade Jurídica (piercing the corporate veil) no cenário brasileiro, principalmente diante de suas implicações nas áreas consumerista, trabalhista, tributária e, em especial, na seara do direito empresarial. Para isso, são apontados os critérios teóricos que viabilizam sua análise, bem como é feita uma breve abordagem da legislação vigente que disciplina o instituto. A metodologia empregada tem como base uma pesquisa qualitativa que utilizou o método indutivo e pesquisa bibliográfica. Além disso, é realizado um estudo doutrinário e jurisprudencial que visa demonstrar, em última análise, que a desconsideração da personalidade jurídica deverá ser a última alternativa para satisfazer os créditos devidos pelas empresas.

PALAVRAS-CHAVE

Desconsideração da personalidade jurídica. Direito empresarial. Legislação. Créditos.

ABSTRACT

This paper aims to introduce aspects of the application of the Piercing the Corporate Veil in the Brazilian scenario, mainly before their implications in the consumer, labor, tax and, especially, in company law. The theoretical criteria that make its analysis feasible are pointed out, as well as a brief approach of the current legislation that governs the institute. The methodology used is based on qualitative research, using the inductive method and the bibliographic research. Besides, a jurist and precedents studies were carried out to show, ultimately, that the piercing of the corporate veil should be the last alternative to satisfy the credits owed by companies.

KEYWORDS

Piercing the corporate veil. Company Law. Legislation. Credits.

1 Mestranda em Direito e Justiça Social pela Universidade Federal do Rio Grande – FURG. Bacharel em Direito pela Universidade Federal do Rio Grande com período de estudos na Universidade de Coimbra – UC Portugal. E-mail: maiaranoronha@hotmail.com.

2 Mestranda em Direito e Justiça Social na Universidade Federal do Rio Grande – FURG. Graduada em Direito pela Universidade Anhanguera – Rio Grande. Especialista em Direito Público pela Verbo Jurídico. Mestre em letras pela Universidade Católica de Pelotas. Graduada em Letras Universidade Estadual do Maranhão. E-mail: karolveigaf@hotmail.com.

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INTRODUÇÃO

O presente artigo aborda os principais aspectos da teoria da desconsideração da personalidade jurídica, conhecida como “disregard douctrineveil-piercing” ou “of the legal entitypiercing the corporate veil”, associada ao direito norte-americano. Na sua égide, tem como pressuposto inibir situações de abuso quanto à proteção dos efeitos da personalidade jurídica de sociedades empresariais. O instituto possui maior respaldo na legislação brasileira por estar disciplinado no art. 50 do Código Civil de 2002, bem como, ainda que de maneira mais singela, no Código de Defesa do Consumidor, no Código Tributário Nacional e na Consolidação das Leis Trabalhistas, além de se respaldar na jurisprudência dos tribunais e nas abordagens teóricas que envolvem a sua aplicação.

A desconsideração da personalidade jurídica é um instrumento por meio do qual as obrigações contraídas pela sociedade não ficam à mercê dos poucos ou talvez inexistentes bens da empresa, resultando em inadimplemento e, consequentemente, prejuízo a credores, em situações de comprovada fraude, desvio de finalidade ou abuso de direito por parte dos empresários. O afastamento da personalidade jurídica possibilita a busca de bens particulares das pessoas dos sócios em demandas cíveis, consumeristas, trabalhistas, ambientais e tributárias.

Cabe esclarecer que no Brasil, conforme depreende-se da jurisprudência, não são todas as circunstâncias que ensejam a aplicação da teoria da desconsideração da personalidade jurídica. Para tanto, faz-se indispensável a comprovação de ato ilícito que gere benefício impróprio a uma parte e, em contrapartida, desvantagens a outra, tendo em vista a prática de atos em nome da pessoa jurídica.

O instituto em comento, no que diz respeito à matéria jurídica empresarial, representa a proteção da sociedade empresária e de seus credores a partir do momento em que almeja preservar a sociedade de atos incompatíveis com os seus objetivos sociais por meio da busca direta da responsabilização individual dos agentes que deram origem ao ilícito, possibilitando inclusive, a suspensão temporária dos atos constitutivos da sociedade diante do foco da investigação.

Dentro da temática, existem duas teorias que divergem quanto à responsabilização dos sócios no que diz respeito aos seus bens particulares. São elas: a teoria maior e a teoria menor, as quais serão desenvolvidas ao longo do presente estudo. Cada qual, a sua maneira, aborda as premissas que devem ser observadas na aplicação da teoria da desconsideração da personalidade jurídica como alternativa para satisfazer os créditos devidos pelas empresas.

Desse modo, levando-se em consideração a importância e o impacto do instituto no âmbito jurídico nacional, o presente artigo tem por objetivo abordar seus

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principais elementos, teorias e condições de aplicabilidade. Para isso, a metodologia empregada baseia-se em uma pesquisa qualitativa, utilizando-se do método indutivo e da pesquisa bibliográfica.

1 TEORIA DA DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA

A pessoa jurídica, quando devidamente registrada, além de gozar de personalidade jurídica, dispõe de patrimônio próprio, ou seja, adquire autonomia patrimonial, motivo pelo qual os bens particulares da empresa, em tese, não se confundem com os de seus sócios. Todavia, em casos específicos e diante de alguns pressupostos estabelecidos pela doutrina, assim como pela jurisprudência e pela legislação brasileira, torna-se possível “levantar o véu” da sociedade e responsabilizar os sócios pelo cometimento de fraudes que atentem ao próprio objeto do vínculo societário. Nesses casos, estar-se-á diante da aplicação do instituto da desconsideração da personalidade jurídica, que possui respaldo em duas correntes teóricas chamadas de teoria maior e teoria menor.

Deste modo, a sociedade é responsável por suas obrigações e seus sócios, em caso de responsabilidade limitada, responderão nos limites de suas cotas ou ações. Uma prática que se tem tornado frequente é a utilização deste resguardo legal pelos sócios com o fim de cometer fraudes patrimoniais, excedendo os limites legais na prática de atos afrontosos. Nas palavras de Suzy Khoury (2003, p.83):

[...] a Disregard Doctrine consiste em subestimar os efeitos da personificação jurídica, em casos concretos, mas, ao mesmo tempo, penetrar na sua estrutura formal, verificando-lhe o substrato, a fim de impedir que, delas utilizando-se, simulações e fraudes alcancem suas finalidades, como também para solucionar todos os outros casos em que o respeito à forma societária levaria a soluções contrárias à sua função e aos princípios consagrados pelo ordenamento jurídico.

Desta forma, nas situações em que a pessoa jurídica for usada para fins diversos daquele objetivado legalmente, poderá ser desconsiderada sua personalidade, modificando o alvo de imputação, tendo como consequência a responsabilidade pessoal dos integrantes societários por prejuízos causados a terceiros (ALMEIDA, 2003).

A teoria da desconsideração da personalidade jurídica é relativamente nova na doutrina brasileira, tendo sido apresentada no final da década de 1960 em uma Conferência na Faculdade de Direito da Universidade Federal do Paraná por Rubens Requião, intitulada “Abuso de Direito e Fraude Através da Personalidade Jurídica: Disregard Doctrine”. Nesse sentido, menciona o autor:

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A doutrina desenvolvida pelos tribunais norte-americanos, da qual partiu o Prof. Rolf Serick para compará-la com a moderna jurisprudência dos tribunais alemães, visa impedir a fraude ou abuso através do uso da personalidade jurídica, e é conhecida pela designação disregard of legal entity ou também pela por

lifting the corporate veil [...]. Ora, diante do abuso de direito

e da fraude no uso da personalidade jurídica, o juiz brasileiro tem o direito de indagar, em seu livre convencimento, se há de consagrar a fraude ou o abuso de direito, ou se deva desprezar a personalidade, para, penetrando em seu âmago, alcançar as pessoas e bens que dentro dela se escondem para fins ilícitos ou abusivos (REQUIÃO, 1977, p. 59-61).

Conforme preceitos do ordenamento jurídico pátrio existem quatro previsões legais de aplicação da disregard doctrine veil-piercing, as quais estão dispostas no artigo 28, caput e § 5º do Código de Defesa do Consumidor (CDC), artigo 4º da Lei nº 9.605/98 (Lei dos Crimes Ambientais), artigo 34 da Lei nº 12.529/2011 (Lei Antitruste) e artigo 50 do Código Civil (CC/02). Segundo Fabio Coelho (2012, p. 62), a desconsideração da personalidade jurídica é a superação do embate entre as “soluções éticas, que questionam a autonomia patrimonial da pessoa jurídica para responsabilizar sempre os sócios, e as técnicas, que se apegam inflexivelmente ao primado da separação subjetiva das sociedades”.

Duas teorias foram elaboradas a partir dessa corrente de pensamento. A primeira, denominada de teoria maior, entende que o patrimônio do sócio, apesar de não gozar de proteção absoluta, pode ser objeto da ação. Devendo a desconsideração, portanto, passar por variados ritos de concretização. Já a chamada teoria menor não admitiria a passagem por estes requisitos para sua consolidação e, tão logo, seria considerada ineficaz frente às fraudes de sócios de responsabilidade ilimitada.

O STJ, no Recurso Especial 970.635/SP, posicionou-se no sentido de admissão da teoria maior como regra geral no ordenamento jurídico brasileiro, a qual está prevista no artigo 50 do Código Civil. Além do mais, mencionou a distinção entre desconsideração da personalidade jurídica tanto na vertente objetiva quanto na subjetiva. Assim, apenas seria “possível a desconsideração da personalidade jurídica quando verificado o desvio de finalidade (teoria maior subjetiva da desconsideração), caracterizado pelo ato intencional dos sócios de fraudar terceiros com o uso abusivo da personalidade jurídica”, ou ainda no caso de ser “evidenciada a confusão patrimonial (teoria maior objetiva da desconsideração), demonstrada pela inexistência, no campo dos fatos, de separação entre o patrimônio da pessoa jurídica e os de seus sócios” (BRASIL. Superior Tribunal de Justiça, 2009)3.

3 “A mudança de endereço da empresa executada associada à inexistência de bens capazes de satisfazer o crédito pleiteado pelo exequente não constitui motivos suficientes para a desconsideração da sua personalidade jurídica. A regra geral adotada no ordenamento jurídico brasileiro é aquela prevista no art. 50 do CC/2002, que consagra a teoria maior da desconsideração, tanto na sua vertente subjetiva

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Tem-se, todavia, a aplicação da teoria menor, consagrada no Direito do Consumidor e Ambiental, e que compreende a desconsideração como isenta de demonstrar a intenção de fraude pelo devedor, mas apenas de sua insolvência, tendo em vista que as partes envolvidas no polo ativo, em tais processos, não podem suportar os encargos oriundos dos adimplementos. Nesse sentido, decidiu o Supremo Tribunal de Justiça quando da análise do Recurso Especial 279273/SP, circunstância na qual fora ressaltado que a teoria menor da desconsideração da personalidade jurídica tem amparo no ordenamento jurídico brasileiro, excepcionalmente no direito do consumidor e no direito ambiental, sendo aplicada independentemente da existência de desvio de finalidade ou de confusão patrimonial, bastando apenas a mera prova de insolvência da pessoa jurídica para o pagamento de suas obrigações. “Para a teoria menor, o risco empresarial normal às atividades econômicas não pode ser suportado pelo terceiro que contratou com a pessoa jurídica, mas pelos sócios e/ou administradores desta, ainda que estes demonstrem conduta administrativa proba”, ou seja, ainda que ausente qualquer prova capaz de identificar conduta dolosa ou culposa por parte dos sócios ou administradores da pessoa jurídica (BRASIL. Superior Tribunal de Justiça, 2004)4.

A partir dessas teorias, entende-se que os desvios de conduta dos sócios ou administradores da pessoa jurídica não poderiam ser retificados se não houvesse a efetivação da supramencionada doutrina no direito brasileiro rumo ao objetivo de preservação da sociedade e de seus sócios, visando a preservação do instituto dentro de seus delineamentos essenciais, frente a possibilidades de adulteração, de forma quanto na objetiva. Salvo em situações excepcionais previstas em leis especiais, somente é possível a desconsideração da personalidade jurídica quando verificado o desvio de finalidade (teoria maior subjetiva da desconsideração), caracterizado pelo ato intencional dos sócios de fraudar terceiros com o uso abusivo da personalidade jurídica, ou quando evidenciada a confusão patrimonial (teoria maior objetiva da desconsideração), demonstrada pela inexistência, no campo dos fatos, de separação entre o patrimônio da pessoa jurídica e os de seus sócios. Recurso especial provido para afastar a desconsideração da personalidade jurídica da recorrente” (BRASIL. Superior Tribunal de Justiça, 2009).

4 “ART. 28, § 5º Considerada a proteção do consumidor um dos pilares da ordem econômica, e incumbindo ao Ministério Público a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis, possui o órgão ministerial legitimidade para atuar em defesa de interesses individuais homogêneos de consumidores, decorrentes de origem comum. A teoria maior da desconsideração, regra geral no sistema jurídico brasileiro, não pode ser aplicada com a mera demonstração de estar a pessoa jurídica insolvente para o cumprimento de suas obrigações. Exige-se, aqui, para além da prova de insolvência, ou a demonstração de desvio de finalidade (teoria subjetiva da desconsideração), ou a demonstração de confusão patrimonial (teoria objetiva da desconsideração). A teoria menor da desconsideração, acolhida em nosso ordenamento jurídico excepcionalmente no direito do consumidor e no direito ambiental, incide com a mera prova de insolvência da pessoa jurídica para o pagamento de suas obrigações, independentemente da existência de desvio de finalidade ou de confusão patrimonial. Para a teoria menor, o risco empresarial normal às atividades econômicas não pode ser suportado pelo terceiro que contratou com a pessoa jurídica, mas pelos sócios e/ou administradores desta, ainda que estes demonstrem conduta administrativa proba, isto é, mesmo que não exista qualquer prova capaz de identificar conduta culposa ou dolosa por parte dos sócios e/ou administradores da pessoa jurídica. A aplicação da teoria menor da desconsideração às relações de consumo está calcada na exegese autônoma do § 5º do art. 28 do CDC, porquanto a incidência desse dispositivo não se subordina à demonstração dos requisitos previstos no caput do artigo indicado, mas apenas à prova de causar, a mera existência da pessoa jurídica, obstáculo ao ressarcimento de prejuízos causados aos consumidores” (BRASIL. Superior Tribunal de Justiça, 2009)

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que o juiz possa deixar de aplicar as regras concernentes à separação de patrimônio entre sociedade e seus sócios e, assim, desconhecer a existência de pessoa jurídica. Importante mencionar que tal decisão não importa em dissolução de sociedade, apenas em sua suspensão de atos de constituição. Nessa banda, é pertinente o entendimento de Fábio Coelho (2012, p. 68) no sentido de que “a partir da teoria da desconsideração, podem-se reprimir as fraudes e os atos abusivos sem prejudicar interesses de trabalhadores, consumidores, fisco e outros que gravitam em torno da continuidade da empresa”.

Ainda no tocante a sua aplicação, nota-se cabível o instituto somente se a autonomia patrimonial da sociedade implicar em atribuição de responsabilidade dos sócios ou do administrador; do contrário, não é admissível medida de desconsideração da personalidade jurídica. Assim, quando o ato fraudulento é imputável à sociedade, será ele uma medida adequada; já ao contrário, quando imputados à pessoa do sócio ou administrador, tornar-se-á ato ilícito. Logo, a desconsideração será atribuída aos atos da sociedade. É por este motivo que existe o instituto do pressuposto da ilicitude, que serve justamente para identificar a responsabilidade e verificar se é caso ou não de desconsideração.

Assim, como já mencionado, a desconsideração da personalidade jurídica é a ultima ratio no que diz respeito à satisfação dos créditos devidos pelas empresas, e, mais especificamente, quando verificada sua intenção de fraude, demonstrada por meios escusos, desdobramentos que levem ao entendimento de que foram suprimidos bens para não satisfazer suas dívidas, seja por meio de confusão patrimonial ou desvio de finalidade. De tal forma, busca-se a satisfação dos créditos, tendo em vista que, de acordo com o tipo de responsabilidade de cada empresa, apenas os bens da empresa ou seu capital social respondem por suas dívidas, fazendo, muitas vezes, com que os credores não consigam obter a satisfação de seus créditos.

2 AUTONOMIA PATRIMONIAL: TEORIA MAIOR VS. TEORIA MENOR

A teoria da desconsideração da personalidade jurídica, também conhecida como teoria da penetração ou ainda viel-piercing, como supramencionado, permite a suspensão episódica da eficácia do ato constitutivo da pessoa jurídica (COELHO, 1989, p. 92)5. Existe, assim, a possibilidade de mitigação do dogma da autonomia

absoluta entre o patrimônio de uma pessoa jurídica com os daqueles que a compõe. Diante da maneira e do momento de aplicação da teoria da desconsideração, foram elaboradas por doutrina e jurisprudência duas subteorias acerca do assunto, conhecidas 5 A teoria da desconsideração da personalidade jurídica não se confunde com despersonalização, tendo em vista que esta representa a extinção da pessoa jurídica, enquanto naquela há a suspensão episódica da personalidade jurídica.

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como teoria maior e menor da desconsideração da personalidade jurídica.

O patrimônio dos sócios não goza de proteção absoluta, conforme dispõe o artigo 1.024 do Código Civil brasileiro, pois, em casos pontuais, permite-se a desconsideração da personalidade jurídica para coibir-se o abuso de tal personalidade, seja pela ocorrência de confusão patrimonial, ou pelo desvio de finalidade. Nesse sentido, o artigo 50 do CC/02, em decorrência dos requisitos que cita, é apontado como concordante à teoria maior. Nestes exatos termos:

Em caso de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade, ou pela confusão patrimonial, pode o juiz decidir, a requerimento da parte, ou do Ministério Público quando lhe couber intervir no processo, que os efeitos de certas e determinadas relações de obrigações sejam estendidos aos bens particulares dos administradores ou sócios da pessoa jurídica.

A teoria maior exige a observância de alguns requisitos para que seja permitido adentrar ao patrimônio dos sócios que compõe a pessoa jurídica, tendo em vista a necessidade de adimplemento de obrigações. Assim, faz-se indispensável a demonstração de que ocorreu na pessoa jurídica o desvio de finalidade ou confusão patrimonial. Sobre o assunto, cabe destacar alguns Enunciados do Conselho da Justiça Federal, que corroboram para a compreensão do instituto. Nesse sentido, o Enunciado n° 7, que trata do artigo 50, esclarece que “só se aplica a desconsideração da personalidade jurídica quando houver a prática de ato irregular e, limitadamente, aos administradores ou sócios que nela hajam incorrido” (BRASIL. Conselho da Justiça Federal, 2002).

O Enunciado nº 146, por sua vez, menciona que “nas relações civis, interpretam-se restritivamente os parâmetros de desconsideração da personalidade jurídica previstos no art. 50 (desvio de finalidade social ou confusão patrimonial)” (BRASIL. Conselho da Justiça Federal, 2004). Por fim, cabe mencionar o Enunciado nº 282, segundo o qual “o encerramento irregular das atividades da pessoa jurídica, por si só, não basta para caracterizar abuso de personalidade jurídica” (BRASIL. Conselho da Justiça Federal, 2006).

Alguns princípios são de fundamental observância quando da aplicação da teoria maior. Visando explicá-los a partir da jurisprudência norte-americana, Rolf Serick (2004, p. 35) os enquadra nos seguintes termos:

O primeiro afirma que o juiz, diante de abuso da forma da pessoa jurídica, pode, para impedir a realização do ilícito, desconsiderar o princípio da separação entre sócio e pessoa jurídica. Entende Serik por abuso da forma qualquer ato que, por meio do instrumento da pessoa jurídica, vise frustrar a

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aplicação da lei ou o cumprimento de obrigação contratual, ou, ainda, prejudicar terceiros de modo fraudulento. Ressalta, também, que não se admite a desconsideração sem a presença desse abuso, mesmo que para a proteção da boa-fé. O segundo princípio da teoria da desconsideração circunscreve, com mais precisão, as hipóteses em que a autonomia deve ser preservada. Afirma que não é possível desconsiderar a autonomia subjetiva da pessoa jurídica apenas porque o objetivo de uma norma ou a causa de um negócio não foram atendidos. Em outros termos, não basta a simples prova da insatisfação de direito de credor da sociedade para justificar a desconsideração. De acordo com o terceiro princípio, aplicam-se à pessoa jurídica as normas sobre a capacidade ou valor humano, se não houver contradição entre os objetivos desta e a função daquela. Em tal hipótese, para atendimento dos pressupostos da norma, levam-se em conta as pessoas físicas que agiram pela pessoa jurídica. É este o critério recomendado para resolver questões com a nacionalidade ou raça de sociedades empresarias. O derradeiro princípio sustenta que, se as partes de um negócio jurídico não podem ser consideradas um único sujeito apenas em razão da forma da pessoa jurídica, cabe desconsiderá-la para aplicação de norma cujo pressuposto seja a diferenciação real entre aquelas partes. Quer dizer, se a lei prevê determinada disciplina para os negócios entre dois sujeitos distintos, cabe desconsiderar a autonomia da pessoa jurídica que o realiza com um de seus membros para afastar essa disciplina.

Como já fora mencionado, o Código Civil de 2002 adotou a teoria maior da desconsideração. Todavia, mesmo entendendo o STJ que essa teoria seria a aplicável para o caso de desconsideração da personalidade jurídica, isto não é um obstáculo para a aplicação de outros requisitos quando em sede de viel-piercing em outras áreas do Direito. Vejamos o que dispõe o Enunciado n° 51 do Conselho da Justiça Federal, que disciplina o artigo 50 do CC/02: “a teoria da desconsideração da personalidade jurídica – disregard doctrine viel-piercing – fica positivada no novo Código Civil, mantidos os parâmetros existentes nos microssistemas legais e na construção jurídica sobre o tema” (BRASIL. Conselho da Justiça Federal, 2002).

Realizando uma ponderação entre os valores importantes no ordenamento jurídico brasileiro com a autonomia patrimonial da pessoa jurídica, algumas normas, como é o caso do Código de Defesa do Consumidor e da Lei dos de Crimes e Sanções Ambientais (Lei 9.605/98), dispuseram acerca da desconsideração da personalidade jurídica, estabelecendo um número menor de requisitos para a sua incidência.

É o que ocorre no artigo 28 do Código de Defesa do Consumidor, segundo o qual: “O juiz poderá desconsiderar a personalidade jurídica da sociedade quando, em detrimento do consumidor, houver abuso de direito, excesso de poder, infração da lei, fato ou ato ilícito ou violação dos estatutos ou contrato social”.

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O dispositivo mencionando também traz que “a desconsideração também será efetivada quando houver falência, estado de insolvência, encerramento ou inatividade da pessoa jurídica provocados por má administração”. Cabe ainda citar o §5°, que dispõe: “também poderá ser desconsiderada a pessoa jurídica sempre que sua personalidade for, de alguma forma, obstáculo ao ressarcimento de prejuízos causados aos consumidores”.

Ao encontro da regulamentação existente no §5° do artigo 28 do CDC, o artigo 4° da Lei dos Crimes e Sanções Ambientais prevê que “poderá ser desconsiderada a pessoa jurídica sempre que sua personalidade for obstáculo ao ressarcimento de prejuízos causados à qualidade do meio ambiente”. Assim, resta latente que esses dois ramos do Direito são mais condescendentes à aplicação da teoria menor.

O Superior Tribunal de Justiça e grande parte da doutrina compreendem que o CDC e a Lei de Crimes Ambientais utilizaram a teoria menor para os casos de desconsideração da personalidade jurídica. Assim designada, pois para a sua incidência basta a demonstração de que a personalidade jurídica da sociedade configura obstáculo à reparação de prejuízos, bem como adimplemento de obrigações para com o consumidor ou o meio ambiente. Portanto, a simples insuficiência de patrimônio da pessoa jurídica para satisfazer um crédito pode sim ser a causa para aplicação do viel-piercing no caso da teoria menor.

A jurisprudência sempre foi oscilante no tocante à aplicação do instituto, o que motivou a sua regulamentação no Novo Código de Processo Civil de 2015 (Lei nº 13.105), que almejou organizar e garantir às partes do processo uma maior lisura no caso de aplicação da desconsideração da personalidade jurídica. Assim, o novo diploma processualista resguardou a matéria em um título próprio denominado “Do Incidente de Desconsideração da Personalidade Jurídica”.

Cabe destacar que a redação do artigo 133 do NCPC permite ao magistrado aplicar o instituto em qualquer processo ou procedimento. Ademais, fora estabelecido o contraditório, tendo em vista que se busca preservar também a segurança patrimonial dos sócios da pessoa jurídica. O NCPC buscou evitar o emprego indistinto deste dispositivo, tendo em vista que seus alicerces são ainda casuísticos, mesmo existindo alguns critérios para a sua aplicação, de forma mais latente no caso da teoria maior. Contudo, em muitas circunstâncias utiliza-se a teoria menor, de modo que basta a dificuldade na localização de bens da sociedade para que se volte ao patrimônio da pessoa física, o que de certa maneira se mostra preocupante.

Portanto, a teoria maior tem ampla consistência no que diz respeito à exigência pelo cumprimento de alguns requisitos, exigência esta adotada pelo CC/02. Em contrapartida, na teoria menor, não há necessidade de se atender a requisitos

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específicos como no caso da teoria maior, sendo suficiente a falta de patrimônio da sociedade. Diante deste cenário, Fábio Ulhoa Coelho (2004, p. 46) menciona:

Ela reflete, na verdade, a crise do princípio da autonomia patrimonial, quando referente às sociedades empresárias. O seu pressuposto é simplesmente o desatendimento de crédito titularizado perante a sociedade, em razão da insolvabilidade ou falência desta. De acordo com a teoria menor da desconsideração, se a sociedade não possui patrimônio, mas o sócio é solvente, isso basta para responsabilizá-lo por obrigações daquela. A formulação menor não se preocupa em distinguir a utilização fraudulenta da regular do instituto, nem indaga se houve ou não abuso na forma. Por outro lado, é-lhe todo irrelevante a natureza negocial do direito creditício oponível a sociedade. Equivale, em outros termos, a simples eliminação do princípio da separação entre a pessoa jurídica e seus integrantes. Se a formulação maior pode ser considerada um aprimoramento da pessoa jurídica, a menor deve ser vista como o questionamento de sua pertinência, enquanto instituto jurídico.

Entretanto, há discussão quanto à teoria menor ter como pressuposto a própria inviabilidade da teoria maior, principalmente quando diante de ramos do Direito nos quais há o predomínio de abusos e fraudes, como é o caso do Direito do Consumidor e do Direito do Trabalho. Em tais áreas, a desconsideração da personalidade jurídica muitas vezes não alcança o seu objetivo, circunstâncias nas quais os magistrados recorrem aos legisladores e doutrinadores para justificar a aplicação da teoria menor.

A teoria menor representa um novo pensamento trazido pela moderna doutrina frente aos novos conflitos emergentes em nosso ordenamento, “emprestando-lhe maior funcionalização diante de determinados casos concretos” (RESENVALD, 2008, p. 313).

Mesmo diante das incessantes tentativas das sociedades de impedir a utilização dos bens dos sócios, os tribunais brasileiros têm sido assentes no sentido de que esse instituto deve sim ser utilizado, tendo em vista que fora elaborado para resguardar bens e direitos, sendo que sua aplicação de maneira coesa preservará o princípio da segurança jurídica, bem como promover a penalização daqueles que cometeram ato ilícito fraudando o vínculo social.

Portanto, a discussão que permeia a utilização de ambas teorias elaboradas para disciplinar o instituto da desconsideração da personalidade jurídica nada mais busca que preservar sua aplicação, cada qual a sua maneira, visando defender o interesse de credores e combater a fraude por meio da pessoa jurídica, mas também resguardar o vínculo societário e autonomia patrimonial a partir da observância dos requisitos exigidos por lei para sua efetivação.

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3 A APLICAÇÃO DA TEORIA DA DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA NO DIREITO CONSUMERISTA, TRABALHISTA E TRIBUTÁRIO

A teoria da desconsideração da personalidade jurídica, dentro do Direito Empresarial, exerce uma função de extrema importância no ordenamento jurídico pátrio, conforme referido anteriormente. No entanto, tal teoria ultrapassa a seara empresarial, podendo interferir também em outras esferas jurídicas, razão pela qual é importante analisar sua aplicação em outras áreas do saber normativo.

O Código de Defesa do Consumidor, por exemplo, foi um dos primeiros ramos do direito que incorporou a teoria da desconsideração da personalidade jurídica, sendo claro ao aduzir que, para desconsiderar a personalidade jurídica, é fundamental que haja efetivamente um prejuízo ao consumidor (art. 28 do CDC). O referido artigo, num primeiro momento, pontua de forma mais genérica as hipóteses desta teoria, diferentemente do Direito Empresarial, que é mais objetivo ao apontar as razões para o cabimento da desconsideração da personalidade jurídica. Conforme revela Flávia Maria de Moraes Geraigire Clápis (2006, p. 127):

Muitas das hipóteses previstas no Código de Defesa do Consumidor não se encaixam com a teoria da desconsideração, mas sim com subsídios da teoria da aparência, fato próprio,

ultra vires. É flagrante a pouca correspondência entre a teoria

da desconsideração e o previsto no Código de Defesa do Consumidor. De fato, o texto do art. 28 não segue o defendido pela doutrina da desconsideração, pois mistura conceitos para os quais o nosso ordenamento jurídico já prevê remédios próprios. Ao que tudo indica, o legislador teve a intenção de banalizar, vulgarizar a técnica desconsiderante, para torná-la panaceia nacional na defesa do consumidor.

Com as devidas ponderações, é possível observar de maneira mais objetiva as hipóteses de desconsideração da personalidade jurídica no artigo supracitado: a primeira questão interessante de ressaltar é o abuso de direito presente no referido caput do dispositivo. Observado em seu cerne, é o único que se afeiçoa perfeitamente à teoria da desconsideração da personalidade jurídica; o segundo aspecto constante na lei em que se vislumbra a referida teoria refere-se ao excesso de poder, que, conforme Clápis (2006, p. 128), “caracteriza-se quando o ato causador de lesão perante o consumidor seja praticado por quem não tenha poderes previstos em estatuto ou contrato social, sendo causa de responsabilidade pessoal e direta do administrador”; quando há violação de legislação pátria, caracterizando-se fato ilícito, recaindo sobre o agente causador do dano a responsabilidade de ressarcir o dano provocado.

Quanto à responsabilidade das empresas que, por alguma razão, causaram danos ao consumidor, os parágrafos do artigo referido revelam que a responsabilidade

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ocorrerá de acordo com o tipo de sociedade. No entanto, quando verificado que o grupo societário é o responsável pela lesão e a sociedade, em si, não possui bens que satisfaçam o prejuízo, poderá o lesado cobrar da outra empresa de maneira subsidiária. Cabe destacar que nas sociedades consorciadas, em que há efetivamente solidariedade dentro da empresa, busca-se sempre ressarcir o consumidor. Já nas sociedades coligadas reconhece-se a possibilidade de responsabilidade da empresa quando comprovada a culpa por sua parte.

O parágrafo 5º do artigo 28 do CDC visa ressaltar que tal dispositivo busca apenas atribuir a responsabilidade aos sócios e administradores quando verificado que o consumidor que sofreu a lesão não logrou êxito em recuperar os prejuízos aos quais foi submetido. Por fim, verifica-se que o dispositivo supracitado revela as hipóteses de cabimento da desconsideração da personalidade jurídica, observando que sua aplicação é possível sempre que verificada a lesão ao consumidor causada pela empresa com a qual contratou.

Outra área do direito contemplada pela teoria da desconsideração da personalidade jurídica é o Direito Tributário, sendo que esta decorre do princípio da legalidade, motivo pelo qual deverá ser expressa, de forma clara, para que seja concebida por tal área, além de ser uma forma de barrar fraudes e abusos. O princípio da legalidade basicamente impede o fisco de alcançar terceiros quando a lei expressamente não autorizar. Conforme aduz Clápis (2006, p. 136):

Alguns doutrinadores entendem que a desconsideração não pode ser aplicada no âmbito do Direito Tributário (i) por não haver previsão expressa na legislação tributária – princípio da legalidade; (ii) por acreditarem que o princípio da separação patrimonial persiste mesmo perante as obrigações tributárias; e (iii) por defenderem que os dispositivos legais tributários que tratam da matéria não se utilizam do fundamento da desconsideração, mas da responsabilidade solidária. Já outros doutrinadores perfilham o entendimento de Osmar Vieira da Silva e acreditam que os dispositivos legais trazidos na legislação tributária são casos de aplicação da desconsideração da personalidade jurídica. Marçal Justen Filho e Edmar de Oliveira Andrade defendem que não é aplicável a teoria da desconsideração em matéria tributária, uma vez que não há expressa previsão legal. Gerci Giareta também se enquadra dentre aqueles autores que defendem que a desconsideração não pode ser aplicada em matéria tributária, pois o princípio da separação persiste perante as obrigações tributárias. Segundo ele, “este dispositivo, embora revele indícios da despersonalização, mesmo assim não contraria o princípio da separação. É que, nos casos especiais, os sócios respondem subsidiariamente, por ato próprio, por descumprimento das obrigações para com a sociedade e para com a Fazenda Pública, por ato próprio.

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Conforme mencionado, a desconsideração da personalidade jurídica também está presente no Direito do Trabalho. Nesse contexto, há previsão da responsabilidade solidária das empresas que pertencem ao mesmo grupo financeiro. Entende-se que é aplicável quando verificada qualquer barreira que proteja os interesses do empregado. Importante salientar que, conforme Clápis (2006), os pressupostos da descaracterização não são compatíveis com as hipóteses previstas na CLT, tendo em vista que o rol previsto no §2º do art. 2º da CLT enquadra-se de maneira mais adequada à responsabilidade solidária das empresas.

Alguns discursos mencionam que a CLT busca essencialmente não comprovar a fraude e o abuso de direito perpetrado pela empresa, mas sim, considerando que fazem parte do mesmo grupo econômico, visam a possibilidade de responsabilidade solidária quanto aos débitos trabalhistas. Em outras palavras, pode-se dizer que apenas em caráter excepcional ocorre a aplicação da teoria da desconsideração, “quando constatado o abuso de direito, fraude, ou a tentativa de furtar-se ao cumprimento de uma norma jurídica, o que não se vislumbra no caso do art. 2º da legislação trabalhista” (CLÁPIS, 2006, p. 132).

Dessa forma, para introduzir a desconsideração da personalidade jurídica no Direito do Trabalho devem ser observados os pressupostos previstos no artigo 50 do Código Civil brasileiro, ou seja, confusão patrimonial e desvio de finalidade, de acordo com a teoria maior. Por fim, para verificar de forma sucinta as demais áreas do direito que são contemplados pela desconsideração da personalidade jurídica, devem ser observados aspectos jurídicos presentes nas demais normas, conforme pontua Alberto Viana Ávila (2012). Na Lei 8.884/94 (Lei das Infrações contra a Ordem Econômica), o artigo 18 estatui: “A personalidade jurídica do responsável por infração da ordem econômica poderá ser desconsiderada quando houver da parte deste abuso de direito, excesso de poder, infração da lei, fato ou ato ilícito ou violação dos estatutos ou contrato social”.

Assim, conforme o art. 28, caput, do Código de Defesa do Consumidor, “a desconsideração também será efetivada quando houver falência, estado de insolvência, encerramento ou inatividade da pessoa jurídica provocados por má administração”.

O Código Tributário Nacional, por sua vez, no artigo 116, parágrafo único, estabelece:

A autoridade administrativa poderá desconsiderar atos ou negócios jurídicos praticados com a finalidade de dissimular a ocorrência do fato gerador do tributo ou a natureza dos elementos constitutivos da obrigação tributária, observados os procedimentos a serem estabelecidos em lei ordinária.

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No artigo 135, inciso III, estabelece que:

São pessoalmente responsáveis pelos créditos correspondentes a obrigações tributárias resultantes de atos praticados com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos: [...] III – os diretores, gerentes ou representantes de pessoas jurídicas de direito privado.

Cabe ainda destacar que a Lei 8.620/1993, em seu artigo 13, caput, e parágrafo 1º, tratam do instituto, bem como a Lei 6.404/1976, no artigo 158, caput, e parágrafo 2 º. Por fim, a Consolidação das Leis Trabalhistas, no artigo 2º, parágrafo 2º, preceitua que quando uma ou mais empresas, cada qual com sua personalidade jurídica própria,

[...] estiverem sob a direção, controle ou administração de outra, constituindo um grupo industrial, comercial ou de qualquer outra atividade econômica, serão, para os efeitos da relação de emprego, solidariamente responsáveis a empresa principal e cada uma das subordinadas.

Dessa forma, pode-se observar a utilização da teoria da desconsideração da personalidade jurídica por vários campos do Direito, cada qual realizando as adaptações necessárias à natureza da sua área de atuação, bem como respeitando quesitos de acordo com necessidades relacionadas aos tipos de demandas que se instauram em cada ramo específico.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Pelo acima exposto, pode ser compreendido que a pessoa jurídica, quando devidamente registrada, goza de personalidade jurídica e patrimônio próprio e, portanto, os bens particulares da empresa não se confundem com os de seus sócios. Devido a essa circunstância, o instituto da desconsideração da personalidade jurídica é tido como a ultima ratio no que toca à satisfação dos créditos pleiteados pelos credores das empresas, sendo utilizado quando observada a suspeita de fraude empresarial, ou seja, a adoção de meios escusos que levem ao entendimento de que extinguiu dolosamente bens para não satisfazer dívidas, por meio de confusão patrimonial ou desvio de finalidade.

Deste modo, a sociedade é responsável por suas obrigações e seus sócios, em caso de responsabilidade limitada, respondem nos limites de suas cotas ou ações. Todavia, como tornou-se comum a utilização privilegiada deste resguardo legal pelos sócios com o fim de fraudar o patrimônio, excedendo os limites legais na prática de atos afrontosos, há respaldo para a aplicação da teoria da desconsideração da personalidade jurídica.

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Com a teoria maior vislumbram-se alguns requisitos para que seja admitido penetrar no patrimônio dos sócios que compõe a pessoa jurídica, tendo em vista a necessidade de adimplemento de obrigações, sendo imperativa a demonstração de desvio de finalidade ou confusão patrimonial; ao passo que a teoria menor dispensa maiores rodeios quanto à requisição da desconsideração.

Frente às contínuas tentativas das sociedades de evitarem a utilização dos bens dos sócios, os tribunais têm sido permissivos no sentido de que esse instituto deve ser sim utilizado, visto que fora estabelecido para proteger bens e direitos, sendo que e ao ser aplicado de maneira coerente resguardar-se-á o princípio da segurança jurídica e se promover-se-á a penalização daqueles que cometeram ato ilícito fraudando o vínculo social.

A teoria da desconsideração da personalidade jurídica, apesar de ser instituto recorrente e natural no Direito Empresarial, tem também aplicação em outras esferas do direito brasileiro, tais como Direto do Consumidor, do Trabalho e Tributário. O Código de Defesa do Consumidor primeiramente filiou-se à teoria da desconsideração da personalidade jurídica, na qual, para desconsiderar a personalidade jurídica, é essencial a existência de efetivo dano ao consumidor. Já no Direito do Trabalho, observa-se a responsabilidade solidária de empresas que pertencem ao mesmo grupo financeiro, sendo aplicável quando contemplada qualquer barreira que proteja os interesses do empregado.

Desse modo, ao permitir sua aplicação em outras áreas do Direito, a lógica de proteção da parte hipossuficiente da demanda encontra-se amparada. A desconsideração da personalidade jurídica de empresas afeta todo o sistema de constituição empresarial com o objetivo de coibir fraudes e confusões patrimoniais que, quando constatadas, possibilitam à responsabilidade recair tanto sobre o patrimônio societário quanto sobre o pessoal.

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THEORY OF THE PIERCING THE CORPORATE VEIL IN BRAZIL: IMPLICATIONS IN COMPANY, CIVIL, CONSUMER, LABOR AND TAX LAW

ABSTRACT

This paper aims to introduce aspects of the application of the Piercing the Corporate Veil in the Brazilian scenario, mainly before their implications in the consumer, labor, tax and, especially, in company law. The theoretical criteria that make its analysis feasible are pointed out, as well as a brief approach of the current legislation that governs the institute. The methodology used is based on qualitative research, using the inductive method and the bibliographic research. Besides, a jurist and precedents studies were carried out to show, ultimately, that the piercing of the corporate veil should be the last alternative to satisfy the credits owed by companies.

KEYWORDS

Piercing the corporate veil. Company Law; Legislation; Credits. Recebido: 22 de junho de 2017

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