• Nenhum resultado encontrado

o PAPEL DA VAGUEZA NA CLASSIFICAQAO DOS NaMES

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2021

Share "o PAPEL DA VAGUEZA NA CLASSIFICAQAO DOS NaMES"

Copied!
8
0
0

Texto

(1)

o

PAPEL DA VAGUEZA NA CLASSIFICAQAO DOS NaMES Heronides Maurflio de Melo Moura - UFSC

A vagueza

e

urn fen8meno inerente as lfnguas naturais. N~o

e

urn epifen8meno, QU uma caracterfstica irrelevante da lingua-gem humana.

Os 16gicos normalmente t@m base ado suas formula95es semanti-cas na determina9~0 do sentido, 0 que exclui a vagueza. Frege, p~r exemplo, requer que qualquer palavra-conceito 'X', numa linguagem especffica, determine, para cada objeto, se ou n~o este objeto

e

definido pelo conceito 'X'.

A vagueza ou indetermina9~0 do sentido, nessa perspectiva 1£ ,gica,

e

considerada uma imperfei9~0 das lfnguas naturais, que

deveria ser corrigida para se obter uma linguagem 'ideal' (RuE sell. No Tractatus LOgico-Philosophicus , Wittgenstein chega a afirmar que a vagueza de expressBes lingUfsticas e ilus6ria, ja que os pensamentos que est~o sUbjacentes a estas express5es s~o perfeitamente definidos. Os nossos pensamentos (os signif~ cados) s~o totalmente definidos. Eles representam retratos de-terminados de possfveis estados de coisas. Essa concep9~0 da linguagem como retrato explica tambem uma outra necessidade da determina9~0 do sentido. Trata-se do princfpio da bival@ncia. Cada proposi9~0 divide 0 espa90 16gico. A realidade torna as proposi95es ou verdadeiras ou falsas; nao ha outra oP9~0. Se-gundo a concep9ao expressa no Tractatus, como a proposi9~0 e urn retrato de estados de coisas, ou a proposi9ao representa 0 estado de coisas, ou n~o representa.

Posteriormente, como sabemos, Wittgenstein rejeitou as con-cep9Bes do Tractatus, e em conseqU@ncia negou que a determina-9aO do sentido seja essencial a linguagem. N~o pretendemos aqui avaliar os vArios aspectos dessa modifica9~0 te6rica.Di-remos apenas que, para 0 Wittgenstein das Investigac5es

(2)

Filo-s6ficas, as expressoes n~o precisam ser completamente defini-das para transmltir urn sentido. Uma expressao vaga pode ex-pressar urn significado com a me sma efici8ncia que uma expres-s~o precisa, por exemplo a ordem 'Pare mais ou menos aquil' (Investiga9oes Filos6ficas, § 71).

Todavia, a n09~0 de vagueza que adotaremos aqui sera· a de Quine (1960). A vagueza ocorre quando n~o se pode determinar se urn objeto especlfico corresponde ou n~o

a

defini9~0 de uma determinada express~o predicativa (ou termo). Ou seja, trata-se de casos nebulosos para os quais a analise n~o e conclusiva por falta de evid@ncia. Em fun9ao disso, n~o e posslvel, a pa£ tir da analise do objeto, determinar se a express~o predicati-va a ele se aplica. Assim, por exemplo, urn diamante sera con-siderado urn objeto 'duro', a geleia urn objeto 'n~o duro', mas o que dizer de uma bola de futebol? Quanto a este ultimo caso, faltam evid@ncias para determinar se a bola de futebol e dura ou nao, ou seja, trata-se de urn objeto nebuloso em fun9aO da defini9aO de 'duro'. Note-se que faltam evid@ncias a priori.

De acordo com Quine, uma express~o pode ser vaga de duas ma-neiras. Primeiro, quanto aos diversos limites dos objetos que ela 'Cf&nota. Segundo, quanto

a

inclus~o ou exclus~o de objetos marginais. Assim, seguindo os exemplos de Quine, 0 termo ge-ral 'montanha' e vago, quanto ao primeiro fator, em fun9~0 dOG limites da area de uma montanha, ou seja, se urn determinado terreno ja faz·parte da montanha , ou se ainda

e

parte do pl~ nalto·indiferenciado.Quanto ao segundo fator, 0 termo 'monta-nha' e vago quanto

a

altura· necessaria para se considerar uma eleva9~0 de terra uma montanha ou nao. Esse segundo fator de vagueza e efetivamente muito forte na defini9~0 de 'montanha' , chegando a exemplos muito drasticos. 0 irm~o do autor disse que seu professor de geografia afirmara que no Brasil n!o exis ten montanhas. EVidentenente, esse professor exige das monta-u~ porte nao inferior aos Andes, Alpes ou Himalaia.

(3)

A partir dessa concep9ao de vagueza,

e

preciso distingui-la da ambigUidade. A ambigUidade lexical abrange a homonlmia e a polissemia. Nao nos deteremos aqui na diferen9a entre homonl-mia e pOlissemia, ou seja, se devemos atribuir a urn termo am-blguo mais de urna entrada lexical (homonlmia) ou apenas uma entrada lexical (polissemia), com diferentes signific~dos. 0 que nos interessa

e

tra9ar uma distin9ao entre vagueza, por um lado, e ambigUidade, por outro.

A vagueza, como ja vimos, ocorre quando nao se determina, por falta de evid@ncias, se urn objeto especlfico

e

abrangido ou nao por uma expressao predicativa. Assim, por exemplo, ao observar uma lama barrenta, ou barre lamacento, podemos ficar na duvida se definimos 0 observado como 'barro' ou como 'lama' Qual a evid@ncia que devo averiguar para determinar onde come-9a 0 'barro' e on de termina a 'lama'?

A ambigUidade nao cria esse tipo de caso nebuloso. Segundo a defini9ao de Quine, urn termo amblguo pode ser claramente ve£ dadeiro de determinados objetos e claramente falso desses mes-mos objetos. Dado urn objeto x, nao havera duvidas em conside-rar 0 termo amblguo inteiramente verdadeiro, ou inteiramente falso quanto ao objeto x, desde que 0 termo seja interpretado de uma maneira ou de outra. Quer dizer, nao havera casos nebu-loses em que 0 objeto seja indeterminado quanto aos sentidos do termoamblguo. Por exemplo, 'lama' (nao considerando 0 $@-nero gramatical)

e

urn termo amblguo, podendo ser entendido co-mo a) argila mole, lodo b) monge tibetano. Ou seja, dado urn objeto x, 'lama' sera inteiramente verdadeiro aplicado a esse objeto, ou inteiramente falso, dependendo do sentido atribul-do ao termo amblguo. Fornecida a interpreta9ao do termo ambl-guo (0 que se faz mediante diferentes pistas lingUlsticas), a atribui9ao de valor de verdade

e

uma questao de sim ou nao, vale dizer, verdadeiro ou falso.

E

evidente que existem casos

(4)

em que n!o ha interesse em desfazer a ambigUidade, 0 que acarreta que n!o se podera atribuir

a

senten9a com 0 termo ambiguo qualquer valor de verdade.

Na vagueza, por sua vez, n!o temos uma quest!o de tudo ou nada. Na vagueza , ha objetos em rela9!0 dos quais n!o se p£ de dizer, a priori,se determinadas express5es predicativas s!o verdadeiras ou falsas, a n!o ser que se obtenham mais e-vid@ncias, reduzindo a vagueza.

A partir dessa distin9!0 entre vagueza e ambigUidade,

e

preciso analisar agora os adjetivos sincategorematicos que ad-mitem compara9!0, como 'pequeno', 'gordo', 'alto', etc. Quine

(1960) parece argumentar que esses termos est!o mais ligados

a

ambigUidade do que

a

vagueza. Aocontrario, pensamos, confo£ me Kamp(1975), que esses adjetivos s!o essencialmente vagos. Analisemos 0 adjetivo 'grande'. Pode-se dizer que existe uma classe de objetos 'grandes', como (baleias, elefantes, metres edificios,etc) e que esse

e

0 senti do atributivo do termo

'grande', quer dizer, esse termo, nesse caso, forma uma cate-goria pr6pria de objetos, que se combinariam com os substanti vos a que se aplicam. Por outro lado, teriamos um uso n!o mais atributivo, mas sincategorematico do termo, como em 'bor boleta grande', com 0 significado de 'grande para a classe das borboletas'. Nessa hip6tese, teriamos uma ambigUidade en-tre 0 uso atributivo e 0 uso sincategorematico do termo, tor-nando am~igoo 'grande', que significa coisas inteiramente di~ versas em '0elefante

e

grande' e 'borboleta gran-de'. Todavia, essa argumenta9!0 s6

e

possivel porque se toma como exemplo de objetos, para os quais 'grande'seria verdadel ro independente da sincategorematicidade, aqueles termos que indicam pontos polares numa escala (elefante como extremo dos animais terrestres, metre como extremo de meio de locom09!0, etc). Porem, se excluirmos os termos polares, 0 significado de 'grande' e completamente vago e nao vai permitir analises conclusivas antes da redU9ao da vagueza. Nao temos, pois , am

(5)

115

gUidade,ja que nAo se pode determinar de urn objeto se ele

e

ou n!o referido pela express!o predicativa 'grande', a n!o ser nos casas polares. Se 0 valor de verdade de urn termo depe~ de de mais evidSncias, temos vagueza e n!o ambigUidade. Veja-mos urn exemplo de classe de termos, e a possivel atribui~!o de 'grande , a esses termos:

S!o Paulo ] ] ] ] Belo Horizonte -Campinas Jo!o Pessoa Florian6polis Jundiai Canapi

As chaves indicam as diferentes classes que se podem formar a partir do termo 'grande'. S6 a cidade de 'S!o Paulo' esta em todas as classes, e 56 Canapi esta excluida de qualquer classe. 'Grande' e vago em rela~lo a todas as outras cidades (pois pode ou nlo ser ap11cado a e1as), ate 0 momento em que se criem parlmetros para que se processem as analises corretas Wlo e possive1, portanto, afirmar que 'grande' nlo e urna'ex-press!o vaga apenas porque se aplica sempre a S!o Paulo e nu~ ca a Canapi, ja que ela e vaga em todas as outras situa~5es.

~Io aos outros elefantes, ou 'elefante pequeno' em rela~!o aos din6ssauros, por exemp10.

Analisemos agora uma situa~!o de reconhecimento vago, pois a partir dela poderemos avaliar melhor como funcionam substan tivos e adjetivos em rela~!o

a

vagueza.

Imaginemos uma testemunha tentando identificar 0 criminoso. -Ela viu 'vagamente' , no escuro, 0 assassino. Ou seja, n!o ai~

p5e de evid@nc1as completas. Mas ela conseguiu perceber os se guintes dados:era urn homem, estava de camiseta, era magro, mas n!o viu 0 rosto, a n!o ser de perfil, e seu nariz

(6)

116

era adunco e comprido. 0 dado mais precise talvez seja 0 na-riz. Azar do delegado se houver dois suspeitos de nariz adun-co adun-comprido.

Como a testemunha organizou sua perceP9ao a partir da carSn cia de evidSncias? Ela tragou limites referenciais e enquadrou o observado (0 assassino) em classes conceptuais. Assim, 0 assassino era 'homem' , e nao 'mulher' ou 'crian9a' , esta-va de 'camiseta', e nao de 'camisa' ou 'terno', era 'magro' e nao 'gordo', etc. Observe-se que a testemunha parte de uma situa9ao inicial de muita vagueza; para determinar se era ho-mem ou mulher, por exemplo, ela utilizou algumas evidSncias (a largura dos ombros, a roupa, etc). 0 objeto de percep9ao foi representado verbalmente a partir de urna serie de ind!cios com base nos quais ela tra90u limites refere~ciais, assim co-mo fazemos quando dizemos se se trata de 'barro' .ou 'lama',

'morro' ou 'montanha'.

Segundo Kamp (1975), 0 que ocorre com os substantivos(como 'homem', 'lama' ou 'montanha') e que, ap6s a determina9ao dos criterios de identifica9ao ou definigao, 0 objeto sera reco-nhecido como definltivamente dentro da extensao do substanti-YO, ou entao como definitivamente fora. A vagueza, embora perceptualmente evidente, na pratica lingU!stica sera reduzi-da ao m!nimo, nos substantivos.

Seria estranho se 0 delegado, ap6s a descri9ao da testemu-nha, perguntasse: 'Mas ele era muito homem? Era completamente homem?' A nao serinum sentido figurado, que analisaremos a seguir, esta pergunta carece de sentido. Tra9ar urn limite com 'mulher' ou 'crian9a',

e

tudo que 0 predicado 'homem', no exemplo citado, pode fazer.

Com os adjetivos, ocorre algo bem diferente. A testemunha estabeleceu urn limite entre 'gordoXmagro', a partir dos pa-droes de nossa sociedade, e isso ja

e

uma primeira evid@ncia com a qual trabalhou no sentido de reduzir a vagueza desses termos. Nao obstante, ao contrario do que se passa com os

(7)

117

substantivos, a vagueza nao se torna irrelevante na expressao 'homem magro'. A vagueza perdura ai como uma possibilidade de especifica~ao de mais eVid~ncias, com 0 objetivo de estreitar os limites extensionais do objeto referido. Ou seja, ao dizer

'homem magro', a testemunha resolveu uma boa parte da vagueza do termo 'magro'. 'Magro', ai, eVidentemente, delimita uma e~ tensao diferente de express5es como 'gato magro' ou 'elefante magro'. Mas ainda permanece a possibilidade de se tentar res-tringir a extensao de 'magro', de precisar 0 seu significado. Essa procura de precisao, atraves de mais eVid~ncias, pode se dar por meio dos processos gramaticais de intensifica~ao e corJ para~ao. t nesse senti do que 0 delegado poderia perfeitamente perguntar:'O homem era muito magro? ' 'Era tao magro quanto lIarco Maciel?'. Em suma, quanto aos adjetivos, novas especifi-ca~5es, maiores evid~ncias podem ser fornecidas, 0 que nao ocorre com os substantivos, que sao muito mais rigidos nos seus limites extensionais. Mais um exemplo: imaginemos ,que se-ja determinada uma altura x para se considerar uma eleva~ao' de terra uma montanha. Com isso, reduziriamos a vagueza do termo

'montanha', mas na verdade, acima dessa altura x, teriamosuma infinidade de valores diferentes, e para lidar com essa vague-za remanescente, dizemos montanhas 'altas', 'muito altas',

'extremamente altas' , ou seja, utilizamos adjetivos.

Nos termos de Kamp, isso significa que os adjetivos vagos sao aqueles que possibilitam 0 estabelecimento dos diferentes graus pelos quais diferentes objetos satisfazem ou nao 0 con-ceito expresso pelo adjetivo. Quanto aos substantivos, s6 te-riamos, em regra geral, a atribui~ao dos vQlores 'verdadeiro' ou 'falso', e nao teriamos a possibilidade de valores de verda de intermediarios e graduados.

A no~ao de redu~ao de vagueza nao significa que a vagueza se ja uma falha ou defeito das linguas naturais •.A vagueza, ao contrario, pode ser uma vantagem para a comunica~ao. Quine ci-ta Richards, para quem um pintor com uma paleta limitada pode

(8)

118

Qbter, atraves da atenua9Ao e mistura de suas cores, represe~ ta9~es mais precisas do que um montador de mosaicos, que tra-balha com uma precisa mas limltadavariedade de azulejos. Quer dizer, 0 pintor explora ao maximo a vagueza das cores de sua paleta, ao passo que, trabalhando com azulejos bem gefin! dos, a artista de mosaicos nAo pode obter a me sma variedade e precisAo de representa95es. A linguagem funcionaria como a paleta do pintor.

PALAVRAS-CHAVE

Vagueza - Adjetivos - Substantivo - Sentido - L6gica

KAMP, Hans (1975) "Two theories about adjectives". In Keenan (ed) Formal Semantics of Natural Languages. Cambridge, Mass., Cambridge U. Press.

QUINE, W.O. (1960) Word and Object. Cambridge, Mass., MIT Press.

WITTGENSTEIN, LUdwig (1984) Investiga90es Filosoficas. SAo Paulo, Abril Cultural (Col. Os Pensadores).

(1987) Tratado L6gico-Filos6fico. Lisboa, Calouste Gulbenkian.

Referências

Documentos relacionados

Este estudo integra a pesquisa sobre a Matemática Moderna em Porto Alegre, que busca traços de cotidianos escola- res deixados nas práticas dos professores ao tempo desse

Dentre os efeitos das condições de corte na formação das rebarbas destacam o modelo geométrico da ferramenta/peça, o nível de desgaste e geometria da ferramenta

Este equipo genera, usa e irradia energía de radiofrecuencia, y si no se instala y se usa de acuerdo con las instrucciones, puede causar interferencias perjudiciales en

Nesse  passo,  mesmo  que  a  decisão  combatida  tenha  se  subsumido  na 

A utilização de um site como ferramenta no ensino de aprendizagem pode levar à introdução de um novo conceito, o e-portefólio, servindo este espaço de repositório de trabalhos

Este era um estágio para o qual tinha grandes expetativas, não só pelo interesse que desenvolvi ao longo do curso pelas especialidades cirúrgicas por onde

este volume contém os contos escritos por sir Arthur Conan doyle que guardam algumas de suas histórias mais famosas e queridas: As aventuras de Sherlock Holmes, Memórias de Sherlock

Não caia nessa armadilha. Seu cérebro, seu maravilhoso cérebro, é capaz de se tornar cada vez mais inteligente, de senvolvendo cada vez mais habilidades e