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POLÍTICA NO SEGUNDO REINADO

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Academic year: 2021

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POLÍTICA NO SEGUNDO REINADO

* Cristiano Luís Christilino Resumo:

A política no Segundo Reinado visa analisar as principais obras sobre a política imperial naquele período. Para isso realisamos uma análise na historiografia que trata sobre o tema, para mostrarmos as interpretações presentes. São analisadas as obras do sociólogo colombiano Fernando Uricoechea e Raimundo Faoro, ligados a uma visão weberiana mais tradicional, também José Murilo de Carvalho e Richard Graham, vem inovar a mesma corrente, e o trabalho de Ilmar Rohloff de Mattos, ligado ao marxismo revisionista e que aborda a temática. Assim procuramos mostrar as divergências e as proximidades das mesmas obras que são referencias em torno do tema no campo da historiografia. Também fazemos uma discussão em torno de temas inerentes a estes como é o caso do clientelismo, estado burocrático e o estamento, visando buscar o entendimento de uma estrutura chave para a análise da política noSegundo Reinado, um elemento básico para a orientação de nossas análises.

A discussão em torno do Estado Imperial, aqui tomado enquanto intermediador das relações sociais, tem gerado visões diferenciadas em torno do mesmo, o que se dá, principalmente, mais em função dos diferentes referenciais teóricos adotados. Raimundo Faoro defende a existência de um Estado patrimonialista no qual estaria assentado o estamento burocrático, segundo o autor:

Comércio e quadro político administrativo se reencontram, depois de um período de alheamento, mutuamente se escorando. O Estado volta às suas origens e fundamentos patrimonialistas, alimentando o comércio, colhendo, na longa caminhada, cores renovadas, sem enfraquecer a sua linha central, que a especulação vela e conduz, ao estilo do mercantilismo. Ele se reequipa para as funções de condutor da economia,

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com o quadro de atribuições concentradas no estamento burocrático, armado em torno do Senado, dos partidos, do conselho de Estado, do Conselho de Estado e da política centralizadora.1

Nessa mesma linha Fernando Uricoechea vai fazer algumas ressalvas, mostrando que não é possível enquadrar totalmente à realidade brasileira o conceito weberiano de Estado Patrimonial. Para ele:

O patrimonialismo brasileiro, contudo, não se desenvolveu totalmente. A noção de patrimonialismo está ligada à institucionalização de formas tradicionais de autoridade e numa forma ideal-típica, também à criação de uma ordem estamental, i. e., uma ordem social onde os direitos e obrigações são alocados, basicamente, de acordo com grupos estamentais.2

Richard Graham defende que o Estado Imperial brasileiro, durante o Segundo reinado, era centralizado e relativamente forte, não em da sobreposição do mesmo à elite dominante, mas a partir da necessidade de fortalecimento da hierarquia social existente

"... os homens de posses escolheram esse caminho porque o Império, ao lhes conceder uma sólida autoridade legal e legitimar essa autoridade com o peso de uma monarquia tradicional, servia-lhe melhor do que poderiam esperar de repúblicas fragmentadas...Essa aliança entre o governo central e os que detinham o poder local explica a longevidade do sistema." 3

Para Ilmar Rohloff de Mattos não havia o domínio do setor burocrático na direção do Estado, antes pelo contrário, havia uma estratégia da "direção Saquarema" em até mesmo direcionar a educação daquele direcionar a sua atuação profissional. Nesse sentido:

... a coroa não só promovia a restauração da hierarquia existente entre os interesses dominantes nas diferentes regiões, herdadas do processo de colonização, como também aprofundava a diferença no interior da região de agricultura mercantil-escravista, por meio do priveligiamento dos interesses ligados à expansão cafeeira.4 Para o autor esse privilegiamento, empreendido pela Direção Saquarema, visava não só a construção de um Estado, como a constituição de uma classe, havendo uma íntima relação entre estas.

Inerente a questão do Estado, enquanto intermediador dos interesses da sociedade, vem à tona o debate em torno da centralização política empreendida pelo Estado Imperial no Segundo Reinado. esta é praticamente consensual nos autores que viemos analisando. Ela já pode ser visualizada nos trabalhos de orientação weberiana "mais fechados", como é o caso de

1 FAORO, op. cit., p. 329. 2 URICOECHEA , op. cit., p. 303. 3 GRAHAM, op. cit. p.100-101. 4

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Raimundo Faoro e Fernando Uricoechea. O primeiro defende a centralização no Segundo Reinado na "... reação centralizadora e na supremacia burocrático monárquica"5, e o segundo visualiza a mesma na cooptação da elite local através da Guarda Nacional, o Minotauro Imperial, que seria controlada e supervisionada, o que impediu a consolidação de uma ordem burocrática no Brasil. José Murilo de Carvalho defende que a concentração e a centralização do poder visavam a manutenção da hierarquia e da ordem social, as quais teria sido ameaçada durante as revoltas liberais. na década de 40 daquele século, no que vem ao encontro Richard Graham. Ilmar Rohloff de Mattos mostra a centralização a partir de uma série de atos e leis que teriam a propiciado. Seriam elas: a subordinação da guarda Nacional quando colocou esta sob o comando do ministro da justiça e dos presidentes de província, a Lei de terras de 1850, as intervenções contra Oribe e Rosas, o que organizava o corpo diplomático brasileiro, e também a relação do Governo com os empregados públicos, em relação aos quais se cercaria de garantias, principalmente em relação às reformulações do código criminal

Estas determinações do código criminal, que tanto buscavam garantir os agentes da administração em seus diferentes níveis de atuação quanto estabeleciam um controle sobre eles, eram contempladas, por uma infinidade de leis, decisões, regulamentos, regimentos, avisos e demais textos legais, quase sempre de caráter normativo, dirigido aos corpos policiais, aos guardas nacionais, às autoridades judiciárias, aos professores e demais funcionários civis e eclesiásticos... E deste embate entre o exercício da administração e as normas que insistiam em disciplinar a atuação daqueles por ela diretamente responsáveis resultava a teia de Penélope.”6 “

A Teia de Penélope seriam os vários laços existentes entre o grupo dirigente e o funcionalismo, o que teria possibilitado o atrelamento ao primeiro. A teia teria sido a estratégia que os Saquaremas teriam traçado para alcançar a centralização, visando transformar os empregados públicos também em dirigentes seus. Ilmar Rohloff de Mattos conclui dizendo que a centralização do poder político foi o principal fator que assegurou a recunhagem da moeda colonial, na qual a Coroa se sobrepõe à Região, mas concedendo prerrogativas aos seus chefes.

Paralela a questão da centralização política empreendida pelo Estado Imperial, o partido político revela-se fundamental para a compreensão daquela. O principal debate em torno deste se dá em relação à semelhança ou a diversidade entre o Partido Liberal e o partido Conservador. Raimundo Faoro defende que o Partido Liberal, dos luzias, seria composto de elementos ligados à propriedade rural, enquanto no Partido Conservador, dos Saquaremas, estariam à frente os comerciantes e os senhores de crédito. Mas Faoro também assinala que na

5 FAORO, op. cit., p. 393. 6 MATTOS, op. cit., p. 204.

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prática nada separava um saquarema de um luzia, em relação aos quais o poder os confundiria e os embaraçaria. José Murilo de Carvalho partilha da visão de Faoro quanto à proximidade entre liberais e conservadores, que se daria em vários pontos básicos, principalmente em meio ao contexto de instabilidade política da década de 40 do século XIX. O autor acrescenta que a proximidade entre os partidos pode ser vista também na ausência de programas pelos partidos, segundo ele:

Quanto aos programas partidários, somente em 1864 foi elaborado o primeiro deles pelo Partido Progressista. A década de 60 foi fértil em programas, culminando com o do Partido Republicano de 1870. O Partido Conservador, no entanto, nunca apresentou qualquer programa escrito. Os programas de conservadores e liberais antes de 1864 devem ser inferidos de afirmações de líderes, de programas governamentais, de escritos teóricos e de grandes debates parlamentares em torno de problemas-chave como a reforma das leis de descentralização, restauração do Conselho de Estado, a abolição do tráfico, a Lei de Terras etc...7

Apesar de partilhar da idéia central de Faoro em relação aos partidos políticos, José Murilo de carvalho vai desconstruir a versão do mesmo sobre a origem social dos políticos, mostrando, em gráficos, que até mesmo os proprietários rurais não se filiavam predominantemente em um ou outro partido monárquico, distribuindo-se quase igualmente entre os dois (Partido liberal e Conservador).

Richard Graham vem corroborar com a tese de José Murilo de carvalho, para ele os partidos eram de natureza personalística, pois não definiam um programa específico e suas principais ações eram no sentido de angariar a lealdade de indivíduos particulares. Para tal ilustrar tal exemplo o autor mostra que muitos dos deputados de maior potencial intelectual sentiam o peso e a força de seus protetores, que eram muitas vezes analfabetos. Graham também defende que na ausência de um programa partidário, os partidos se constituíam a partir das alianças clientelísticas, onde:

... as incontáveis pirâmides locais de clientelismo dariam lugar a duas maiores, enfrentando-se entre si. Assim como o chefe de uma localidade alargava seu séqüito, unindo famílias para formar uma facção, o chefe nacional formará seu partido unindo as facções locais.8

O autor tente, com isto, mostrar que o clientelismo vigorava no meio político e era a grande barganha dos chefes políticos nacionais na conquista de adeptos, pois os cargos públicos eram os principais empregos almejados pelos filhos letrados da elite no século XIX. Graham também aponta o clientelismo como o responsável pelo equilíbrio político da monarquia,

7 CARVALHO, op. cit., p. 185. 8

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sendo que esta agia através daquele para assegurar, até mesmo, a lealdade dos gabinetes. O autor conclui dizendo que:“o sistema partidário, ou melhor, a falta de um sistema facilitava a comunicação entre a elite política. O Governo continuava sendo um arranjo entre amigos.”9 Este arranjo entre amigos não só reflete a intensa difusão do clientelismo, como também o coloca como o principal, ou único, meio de acesso às benesses dos órgãos públicos. Esta caracterização de Graham, nós já podemos encontrar na própria literatura do século XIX, onde a obra de Manuel Antônio de Almeida intitulada Memória de um sargento de milícia.10 Nesta o autor narra o caso de um sargento que, diante da necessidade de conseguir um “favor” do meio público, vai se valer de seus contatos juntos a tais organismos para conseguir o seu intento. Para tal precisa percorrer uma longa hierarquia de “contatos”, a qual inicia com uma prostituta e vai, através de uma extensa rede de relações pessoais, até o Imperador. Neste caso narrado por Manuel Antônio de Almeida é possível perceber a importância do clientelismo naquela sociedade, o que justifica o trabalho de Graham.

Em contraposição aos trabalhos descritos anteriormente, Ilmar Rohloff de Mattos vai sublinhar as diferenças existentes entre os liberais e conservadores, luzias e saquaremas, e a hegemonia dos últimos no período de 1834 a 1860. Segundo o autor:

A um só tempo, os saquaremas deixaram claro porque eram diferentes dos luzias, embora ambos fizessem parte do Mundo do Governo; marcavam a posição de vencedores, propondo uma relação distinta entre o Executivo e a Câmara, maneira de levar a Cabo uma direção- a um só tempo, repetimos.11

Dessa maneira vai mostrar a trajetória do grupo saquarema, da região de agricultura mercantil escravista(fluminense), dentro do partido conservador e a partir daí a sua hegemonia junto ao mesmo, descrevendo uma série de alianças e estratégias, já descritas anteriormente. Isso os leva a garantir a sua hegemonia junto ao Governo, o que ocorre paralelamente à centralização deste. Outra tese levantada por Ilmar Rohloff de Mattos é de que a Coroa, no âmbito de sua direção, também se constitui enquanto um partido. Para ele:

A íntima relação entre a construção do Estado Imperial e a constituição da classe senhorial faz com que a Coroa assuma, deste modo, o papel de partido, nos termos em que Antônio Gramsci o propõe. E este papel define a sua modernidade. Por se construir na expressão e forma mais avançada dos interesses da classe em constituição, a Coroa enquanto um partido não se reduz a figura do imperador...Como um partido, a Coroa deve lidar com as fissuras e as divergências no interior da classe,

9 GRAHAM, op. cit., p. 220.

10 ALMEIDA, Manuel Antônio. Memórias de um sargento de milícias. Rio de Janeiro: expressão e Cultura,

2001.

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com os afastamentos daqueles que se constituem em aliados, com os movimentos daqueles contingentes que se lhe opõem, dando-lhes o tratamento de divisão entre governantes e governados, dirigentes e dirigidos, e, ao assim proceder, propicia a unificação e a homogeneização dos representantes políticos da classe senhorial, habilitando-a para o exercício de uma direção e de uma dominação.”12

Com isso Ilmar Rohloff de Mattos mostra a sua postura frente ao papel da Coroa. Esta ao buscar o equilíbrio político em meio a uma sociedade heterogênea, revela a importância e o peso do poder moderador. Nesse mesmo sentido Lilia Moritz Schwartz afirma que "...não há como entender a centralidade do poder local, sem destacar a relevância e a originalidade do poder moderador e mesmo o caráter frágil dos partidos locais..."13

Ilmar Rohloff de Mattos também coloca sua discordância com a historiografia voltada á homogeneidade do grupo social dominante frente à política:

Nestes termos, afirmamos nossa distinção com relação àqueles autores- como Raimundo Faoro- que consideram os grupos dirigentes imperiais(o estamento burocrático) um simples prolongamento ou transposição dos grupos dirigentes da antiga metrópole, insistindo pois numa continuidade, e também com relação àqueles outros- como José Murilo de Carvalho (A construção da ordem. A elite política imperial)- que referem a homogeneidade deles aos aspectos de formação e treinamento, ao invés de busca-la no conjunto do sistema de relações no qual as atividades de direção se inscrevem.”14

Outro debate importante, já expresso na citação de Ilmar de Mattos, que surge em torno da Política Imperial é a classificação do grupo social dominante articulado em torno do plano político, seria ele um estamento, uma classe ou simplesmente uma elite?Raimundo Faoro defende, para a caracterização deste grupo social dominante no meio político, a aplicação do conceito weberiano de estamento burocrático, o qual não seria uma simples classe, camada ou grupo. Este estamento é que teria se apropriado dos benefícios gerados pelos cargos públicos, criando uma íntima conexão entre a carreira dos empregos e da política.

Na matriz weberiana houve uma considerável revisão a cerca da posição acima descrita com o trabalho de José Murilo de Carvalho. Ele vai defender que a burocracia imperial não era um estamento, não estaríamos em um estado feudal ou mercantilista,

Não se tratava, no entanto, de um estamento, mas de uma elite política formada em processo bastante elaborado de treinamento, a cuja formação se chegava por vários caminhos, o principal sendo alguns setores da burocracia, como a magistratura. Ao longo do período imperial outros caminhos se abriam além da burocracia, como as profissões liberais- advocacia e medicina- o jornalismo, o magistério, quando não o

12 MATTOS, op. cit., p. 88.

13 SCHWARCZ,Lilia Moritz. Um debate com Richard Graham ou: “com Estado mas sem nação: o modelo

imperial brasileiro de fazer política.Revista Diálogos. Vol. 01, nº 05, 2001.

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simples favor imperial. O segredo da duração dessa elite estava, em parte, exatamente no fato de não ter a estrutura rígida de um estamento, de dar a ilusão de acessibilidade, isto é, estava em sua capacidade de cooptação dos inimigos potenciais.”15

A partir disso o autor vai mostrar a falta de embasamento empírico para comprovar a existência de estamentos na sociedade imperial. Também não haveria estamentalização por parte dos proprietários rurais, pois:

Não podiam viver eles de rendas e serviços prestados por camponeses, disponíveis no ócio para os serviços militares e administrativos do Estado, como acontecia com a elite inglesa. Os proprietários brasileiros eram produtores e homens de negócio que não podiam dedicar-se em tempo integral às tarefas do Governo. A falta de estamentalização reduzia a sua coesão que também não era favorecida pela dependência do mercado externo. Só nos raros momentos em que eram postos em jogo alguns de seus interesses básicos como a propriedade da terra e de escravos, é que eles se uniam em frente única. A raridade desses momentos pode ser aferida pelo fato que nenhuma das rebeliões da Regência, à exceção da revolta dos mal~es na Bahia, pregou a abolição da escravidão ou a desapropriação dos latifúndios.”16 Desta forma José Murilo de carvalho mostra que é preciso analisar o Brasil a partir das suas especificidades históricas, e não ajustá-la a modelos teóricos fechados se contemplar tal dinamismo, como é o caso de Raimundo Faoro.

Richard Graham não trabalha, em sua obra analisada, o conceito de estamento, ele utiliza o termo classe. Mas o utiliza através de expressões como “dominação de classe” e “posição de classe” para designar o grupo social dominante, sem o especificar ou fazer referência teórica do conceito:

...as nomeações para os cargos na estrutura governamental permitiam aos ricos fortalecer a sua posição de classe e ampliar suas clientelas individuais. Eles se apropriariam do Governo Central, contando então com o clientelismo ara manter localmente a sua dominação.17

Já Ilmar Rohloff de Mattos utiliza o conceito de classe desenvolvido por Edward P. Thompson para classificar a elite dirigente, mostrando a formação da classe a partir de suas experiências, para ele:

A vivência de experiências comuns, experiências essas que lhes possibilitam sentir e identificar seus interesses como algo que lhes era comum, e desta forma contrapor-se a outros grupos de homens cujos interesses eram diferentes e mesmo antagônicos aos seus constituía-se, sem dúvida, na condição para a transformação. Intimamente ligados ao aparelho de Estado,expandiam seus interesses, procuravam exercitar uma direção e impunham uma dominação. No momento em que se propunham a tarefa de

15 CARVALHO, op. cit., p. 137. 16 CARVALHO, op. cit., p. 212. 17 GRAHAM, op. cit., p.67.

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construção de um Estado soberano, levam a cabo o seu próprio forjar de classe, transbordando da organização e direção da atividade econômica meramente para a organização e direção da sociedade, gerando o conjunto de elementos indispensáveis á sua ação de classe dirigente e dominante. Não se constituindo unicamente dos plantadores escravistas, mas também dos comerciantes que lhes viabilizam, e, por vezes, com eles se confundiam de maneira indiscernível, além dos setores burocráticos que tornavam possíveis as necessárias articulações entre política e negócios, a classe senhorial se distinguiria nesta trajetória por apresentar o processo no qual se forjava por meio do processo de construção do estado Imperial.18

Esta citação mostra não só a concepção de classe adotada pelo autor como a sua visualização na sociedade brasileira do XIX. O autor também trabalha elementos que levam a comprovação tanto da experiência de classe, como da consciência, visualizando as mesmas nas discussões políticas do período. Isto é realizado com grande coerência num momento em que as interpretações marxistas começavam a sofrer intensas críticas.

Outro aspecto importante da política no Segundo reinado são as estruturas de poder local e o seu peso naquele período. Ilmar Rohloff de Mattos, como já destacamos, mostra que a centralização empreendida pela Coroa, e seu séquito, vai garntir a sobreposião desta à região. Mas o mesmo também mostra que ela vai se afirmar em relação à última, mas sem ignora-la totalmente, pois o seu atrelamento era de vital importância ao Império. Em contraposição à visão do autor, Richard Graham vai mostrar uma estrutura de poder que estava assentada nos chefes locais, os quais buscavam assegurar o maior numero de cargos possíveis para, com isso, estender a sua clientela e, conseqüentemente, aumentar o seu poder. Graham afirma que até mesmo o gabinete mostrava suas limitações diante dos chefes locais, pois necessitava das concessões desses últimos para controlar as eleições. E seria isto que condicionaria o enraizamento de uma realidade política que depois se chamaria coronelismo. Nesse sentido:

...os membros do Congresso atuavam como clientes de chefões locais, ou porta-vozes de seus próprios parentes mais ricos, mesmo quando serviam obedientemente ao gabinete. Os que conseguiam levar adiante alguma reforma liberal faziam-no apenas quando apoiados por um segmento significativo de ricos.19

A análise de Graham, em nossa opinião, interessante em função de sua riqueza empírica e pela sua contemplação do plano estrutural, não leva em conta muitos empreendimentos da Coroa que não contemplavam os interesses imediatos desse grupo dominante local, como seria o caso da Lei de Terras, embora, na maioria dos casos, esta tenha ficado apenas no papel, e da gradual abolição da escravatura. Faltaria ao autor, neste aspecto, a abordagem de outros aspectos constitutivos da política imperial, ara além do clientelismo presente na

18 MATTOS, op. cit., p. 54. 19

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distribuição dos cargos públicos. Mesmo na análise deste último, observamos que faltaria a uma maior análise da inserção dos chefes locais numa estrutura de poder no âmbito do Estado, que mostre que não era apenas o último que buscava o apoio dos primeiros, mas que também havia um movimento no sentido inverso e isso pode ser comprovado em pesquisas recentes(para não citarmos alguns exemplos pesquisados por nós). Mas é preciso salientar que, apesar de nossas críticas com relação às estruturas de poder local, a obra de Richard Graham trouxe importantes contribuições a cerca da história do século XIX, tanto no que diz respeito ao clientelismo como a política de alianças. Em relação ao nosso tema de pesquisa, a mesma traz importantes análises em torno de aspectos que pretendemos desenvolver: a fonte de capital político presente na família, o estímulo do sistema fundiário à prática do clientelismo e as redes do último, que muitas vezes partiam do indivíduo local e se estendia até o Imperador, embora não partilhamos totalmente da visão do autor a cerca do último. Neste sentido, falando em relação a especificidade de nosso objeto de pesquisa, é possível aproximar Richard Graham da análise de Ilmar Rohloff de Mattos, na medida em que este último também aborda essas questões, destacando temas como a política de casamentos e de relações familiares, e as redes de relações pessoais, ou seja, a teia necessária à manutenção daquele sistema.

Em vista do que foi apresentado, percebemos a complexidade e a gama variada de temas que envolvem a política no Segundo Reinado. Da mesma forma, fica claro a necessidade de um número maior de pesquisas regionais articuladas com a conjuntura política da época, para melhor analisar a validade daquelas interpretações e vir acrescentar elementos que melhor abarquem o dinamismo da sociedade política do período.

Neste trabalho também percebemos os problemas das interpretações que visam enquadrar a realidade brasileira em modelos teóricos “fechados’, principalmente no que diz respeito aos conceitos de Estado patrimonial e de estamento burocrático. Nos referimos aos trabalhos de Raimundo Faoro e de Fernando Uricoechea, mas ressalvamos a importância que essas obras tiveram na renovação historiográfica nas suas épocas de produção. Nesse sentido também apontamos algumas obras de orientação marxistas que da mesma forma não levam em conta as especificidades internas da sociedade brasileira daquele período. Dentro das duas matrizes teóricas analisadas, a marxista e a weberiana, destacamos a importante renovação legada, respectivamente, pelas obras de Ilmar Rohloff de Mattos e de José Murilo de Carvalho. Os mesmos conseguiram não só contemplar o dinamismo interno da sociedade imperial, como mostraram as inconsistências analíticas daqueles trabalhos, principalmente no que diz respeito às insuficiências empíricas dos mesmos, inovando as já mencionadas vertentes. Richard

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Graham, como já mencionamos, a pesar de trabalhar um tema específico da sociedade imperial, o clientelismo, consegue trabalhar uma série de temas a cerca do período imperial, que nos mostram uma sociedade complexa e imbricada de redes de relações pessoais. Em nossa opinião a sua obra é mais importante por aquilo que ela não menciona, pois abre uma gama variada de possibilidades de análises daquele período, assim como mostra a significativa contribuição que um maior embasamento empírico pode trazer às nossas pesquisas.

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