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Academic year: 2021

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* Professora Doutora da Faculdade de Computação e Informática e da Faculdade de Comunicação e Artes da Universidade Presbiteriana Mackenzie.

E-mail: iminardi@uol.com.br

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Resumo: O artigo enfatiza a influência educacional dos pioneiros

norte-americanos no Brasil, as bases ideológicas e o sonho do processo civilizatório em terras sul-americanas. A pedagogia protestante com novos métodos de ensino nos projetos educacionais que resultaram em São Paulo na criação da Escola Americana em 1870 – origem do Instituto Mackenzie com repercussões na Escola Pública no início da República brasileira.

Abstrat: This article emphasizes the American pioneers educational

influences in Brazil, the ideological bases and the dream of American Southern lands civilization. The protestant pedagogy, with new educational methods projects, resulted in the creation, in São Paulo, of the American School in 1870 – the Mackenzie Institute – with repercussions at the Public School system in early Brazilian Republican period.

Palavras-chave: Educação; mulheres; missionários protestantes. Keywords: Education; women; protestant missionary.

1. INTRODUÇÃO

A

imigração norte-americana, na segunda metade do século XIX, tem raízes no pós-Guerra de Secessão, na frustração, na decepção e na ruína econômica no Sul dos Estados Unidos. A motivação foi o sonho do processo civi-lizatório que seria transportado por esses imigrantes median-te seus valores, no normedian-te do Brasil-província do Pará (Santa-rém) e no sul – Rio de Janeiro – São Paulo – Paraná, tentando recriar no Brasil o perfil de sociedade que a guerra destruíra:

A CONTRIBUIÇÃO EDUCACIONAL DAS

MISSIONÁRIAS NORTE-AMERICANAS NA

CIDADE DE

SÃO

PAULO

THE EDUCATIONAL CONTRIBUTION OF

THE NORTH AMERICAN MISSIONARIES IN

THE CITY OF

S

ÃO

P

ULO

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Na verdade, a emigração se sustentava na esperança de reconstrução e perpetuação da sociedade sulista ante-bellum e, conseqüentemente, na possibilidade de reprodução de seus mitos [...] Amalgamados pela base religiosa e ideológica, os norte-americanos ao mesmo tempo que negavam suas convivências, promoviam o sentido do destino comum, ou seja de unidade na expansão para cumprir os desígnios de Deus mediante um novo processo civilizatório. A pretensão da maio-ria se assentava na busca de um espaço coerente de vida. A coerência pretendida encerrava a idéia de missão, como pos-sibilidade de vivência de um ideal político assumido como correto. Entretanto, ao lado de toda uma proposta idílica de conquista dos trópicos ou de recriação dos critérios de vida de lá, na nova terra ficavam os compromissos cotidianos (OLIVEIRA, 1999).

O heterogêneo grupo imigrante, formado de profissionais liberais, militares, negociantes e fazendeiros depauperados, dedicou-se às mais variadas atividades e teve sua criatividade testada na adaptação ao novo ambiente. Ao chegar, eram vistos pelos brasileiros da época como representantes do progresso e do desenvolvimento, tão apreciados entre nós.

A historiadora Ana Maria Costa Oliveira (1995, p. 2) levanta, em sua análise, as razões pelas quais esse tema foi tão pouco tra-balhado tanto por nossa historiografia quanto pela norte-americana. O desinteresse de norte-americanos e de brasileiros sobre o tema da imigração, as posições nacionalistas desenvolvidas em nosso país que assumiam uma postura crítica sobre o conceito de fronteira e sobre a própria tese do “destino manifesto” que se baseava numa visão expansionista norte-americana, sobretudo em relação à América Central, justificariam em parte a ausência de trabalhos significativos e as abordagens políticas e ideológicas que surgiram sobre o assunto na historiografia brasileira e norte-americana, nos anos 50 e 60 do século XX, em ambos países.

O contexto brasileiro da época, por sua vez, corresponde ao período de desenvolvimento do Segundo Reinado cujas características eram: a expansão da lavoura cafeeira, a substituição da mão-de-obra escrava pela imigração, esta vista como purificadora da raça e transmissora de novas técnicas agrícolas, fatos estes que justificavam o empenho do governo imperial em atrair trabalhadores livres para o Brasil.

Na década de 1870, várias colônias foram criadas, mas nem todas sobreviveram, lutando contra dificuldades físicas e culturais. Já nos anos 80 e 90 do século XIX, surgiram inúmeras escolas e igrejas organizadas por protestantes de várias correntes: presbiterianos, metodistas, batistas que aqui se estabeleceram para atender os imigrantes, fixando-se entre nós mesmo após o fracasso de algumas dessas colônias, pois a educação com apoio das igrejas passou a ser vista como forte possibilidade de viabilizar a permanência de norte-americanos no Brasil.

A instalação dessas escolas portadoras de novas idéias e associadas à proposta da ideologia liberal converteu-se numa alternativa para a sociedade brasileira, que vivia, nesse período, uma fase de mudanças, dentre elas o advento da Repúbli-ca. As relações com os Estados Unidos tornaram-se mais próximas após a instalação do regime republicano, e as forças políticas liberalizantes no Brasil encontravam na presença norte-americana, no campo educacional, o apoio às idéias de modernidade, liberdade e progresso.

Impulsionados pelo meio social em que agora viviam, os imigrantes norte-americanos passaram a apoiar e a defender valores presentes em sua cultura, tais como: a individualidade, a liberdade, o trabalho e as novas tecnologias. A coinci-dência favoreceu a ambos: o Brasil acomodava-se a novos tempos, e o final da Guerra de Secessão, frustrante para mui-tos, trazia a nosso país esse contingente que tentaria recriar os valores da cultura distante, sendo que suas maiores contri-buições estão situadas nos campos educacional, religioso e agrícola.

2. CONCEITO HISTÓRICO

A Revolução Industrial introduziu mudanças que produziram uma redivisão internacional do trabalho. O Brasil adap-tando-se aos novos tempos: a escravidão era indesejável porque o novo capitalismo precisava de mercado consumidor. Além disso, os excedentes de mão-de-obra nos países centrais poderiam ser deslocados para outras áreas do mundo, com possibilidades de crescimento econômico, evitando, assim, crises sociais em seus países de origem. A Inglaterra, liderando o capitalismo mundial, pressionava pela abolição da escravidão, utilizando a ideologia liberal para impor as condições que interessavam à ordem burguesa. O tráfico escravo, violentamente reprimido pelos britânicos, criou constrangimentos entre o governo inglês e o governo brasileiro até a aprovação da Lei Eusébio de Queirós, que extinguia definitivamente o tráfi-co para o Brasil em 1850.

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O declínio da escravidão gerava instabilidade da mão-de-obra, fato que estimulou a política da imigração subvencio-nada pelo Estado. Várias sociedades promotoras da imigração, sobretudo em São Paulo e no Rio de Janeiro, foram criadas fazendo propaganda em países europeus. Os defensores do imigrantismo exaltavam as qualidade e as virtudes do traba-lhador imigrante, portador de valores capitalistas, ordeiro, alfabetizado, produtivo, e menosprezavam o trabatraba-lhador nacio-nal, considerado vadio, doente, preguiçoso, apoiando-se em teses racistas que o consideravam inferiorizado perante o euro-peu. Curiosamente, toda a riqueza produzida pela nação, até então, saíra do braço do trabalhador nacional, agora desqualificado na visão das elites.

O aprimoramento e branqueamento da raça eram valores difundidos pela corrente imigrantista, mormente em São Pau-lo. A formação de colônias, sobretudo no sul do país, passava a ser incentivada, atraindo imigrantes com a ideologia do camponês livre europeu que, ansiosos por possuir terra própria, para aqui se deslocavam.

Os norte-americanos viveram as duas formas de experiência: a imigração subsidiada e a particular. Enfrentando enor-mes dificuldades, como moradia, escoamento da produção, falta de atendimento de saúde, de educação e de assistência religiosa, acreditavam que se fixar no Brasil constituía uma possibilidade de recriação da maneira sulista de viver, enquan-to o governo brasileiro e a elite reconheciam os norte-americanos como portadores de uma visão liberal progressista, capa-zes de contribuir para a construção do novo Brasil que se anunciava em fins do século XIX.

O governo brasileiro depositava grandes esperanças na imigração norte-americana que acarretaria o rompimento com a monocultura cafeeira, diversificando a produção agrícola, a introdução de novas técnicas, o desenvolvimento da cultu-ra algodoeicultu-ra e até a purificação da cultu-raça, que de acordo com as teses cultu-racistas da época, justificavam o atcultu-raso bcultu-rasileiro pela colonização portuguesa, considerada miscigenada e retrógrada.

Sem dúvida, suas maiores contribuições como sujeitos históricos na construção da nova sociedade que surgia ocorre-ram no campo educacional, no desenvolvimento de novas técnicas aplicadas à agricultura e à industrialização nascentes.

3. A CONTRIBUIÇÃO DOS MISSIONÁRIOS PRESBITERIANOS PARA A EDUCAÇÃO

BRASILEIRA

A liberdade de culto, a tradução de textos bíblicos e o desejo pelo trabalho missionário em outras terras aumentam o fluxo imigratório dos norte-americanos no Brasil. É de se destacar o movimento de emancipação política do Brasil em 1822, confirmado na primeira Constituição brasileira, de 25 de março de 1824, proporcionando regalias aos súditos ingle-ses residentes no país e, até mesmo, àqueles que se encontravam de passagem. Tais regalias estendem-se para estrangei-ros de diversas nacionalidades que professavam outra fé que não a católica. Essa Constituição, em seu art. 179, parágrafo 4º, facilitava a liberdade de propaganda do protestantismo ao determinar que “todos podem comunicar seus pensamentos por palavras, escritos e publicá-los pela imprensa, sem dependência de censura, contanto que hajam de responder pelos abusos que cometeram no exercício desse direito”1.

Não obstante, vale lembrar que a Constituição outorgada oficializava a religião católica e subordinava a Igreja ao con-trole do Estado, sendo seus membros considerados funcionários públicos, o padroado. Esse sistema determinava o susten-to dos religiosos pelo governo, assim como a construção de igrejas. O clero brasileiro não estava subordinado à aususten-torida- autorida-de do papa em Roma, poautorida-dendo o Imperador adotar ou não no Brasil uma autorida-decisão do papa por meio da concessão ou não de seu “beneplácito”.

As idéias da Igreja Reformada encontraram acolhida na conjuntura do Brasil da metade do século XIX, composta por um quadro de aparente estabilidade política e de profunda exclusão social, sendo o Brasil marcado por intenso processo de urba-nização e de moderurba-nização. Tal fato sobre a não contribuiu para diminuir os abismos existentes entre as cidades do campo.

O governo brasileiro assume um caráter liberal acerca da questão religiosa para estimular a imigração desses europeus e o trabalho na agricultura brasileira, estando aberto e receptivo às interferências culturais e sociais, demonstrando-se favo-rável à tarefa de estimular cada vez mais a imigração que poderia contribuir para o desenvolvimento do Brasil.

É nesse contexto social e cultural que chega Simonton, primeiro missionário presbiteriano, ao Brasil. Em 22 de abril de 1860, cerca de oito meses após sua chegada, Simonton, com a presença de cinco crianças, forma em sua própria casa uma classe bíblica. Inicia as aulas da primeira Escola Dominical brasileira.

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Desde o início do ano, recebia cartas de casa informando que sua irmã Elizabeth e seu cunhado Blackford2, conforme o planejado pela Junta das Missões Estrangeiras, já se preparavam para embarcar para o Brasil, com o objetivo de ajudá-lo no trabalho missionário. Em 6 de junho, recebe cartas dizendo que os Blackford embarcariam para o Brasil no dia 25 de abril.

Assim que o casal chega, aluga uma casa maior na rua São Pedro, onde passaram a conviver com Simonton e a desen-volver uma pequena escola de inglês. O curso iniciou com apenas três alunos. Constroem também um depósito para rece-ber Bíblias em português, enviadas pela Junta Board of Foreing Missions of the Presbyterian Church de New York3.

Simonton planejava viajar para os Estados Unidos a fim de providenciar material impresso em língua portuguesa, e acreditava que Blackford e Elizabeth, por dominarem melhor a língua portuguesa, estariam em excelentes condições de substituí-lo na direção do trabalho missionário no Brasil.

Em novembro de 1862, apresentara-se ao senhor Blackford um rapaz de 25 anos, George Whitehill Chamberlain4, que, em seu breve período no Rio de Janeiro antes de se fixar por um ano em Porto Alegre, tornou-se assíduo freqüentador da missão, impressionando-se com os trabalhos desenvolvidos no Brasil.

Com a morte de Simonton, o reverendo Blackford transferiu-se para a Igreja do Rio de Janeiro, e o local de pregação consti-tuiu a célula-mater do Colégio Presbiteriano, que em 1878 mudou seu nome para Escola Americana. Os missionários se revezaram na tarefa de consolidar as frentes de trabalho, e a cada dois meses, Blackford rumava para as frentes, prestando auxílio aos mis-sionários, assim como ao jovem Chamberlain, objetivando manter viva a semente plantada nessa parte do território brasileiro.

Os missionários organizaram a Obra Educacional da Igreja por meio da evangelização, objetivando a alfabetização dos adultos e dos simpatizantes da nova religião. Muitos aprenderam a ler a partir das páginas da Bíblia. É nesse contexto que o casal Chamberlain iniciou a tarefa, recebendo meninas de pais protestantes em sua sala de jantar. Esse local, com o tem-po, ficou conhecido como “Escolinha” e passou a incorporar também as meninas filhas de republicanos abolicionistas e positivistas, que sofriam os efeitos da intolerância religiosa nas escolas públicas:

Desvinculado do grupo imigrante de Santa Bárbara mas responsável pelo atendimento a muito de seus filhos, Mr. Cham-berlain abriu em São Paulo um pequeno estabelecimento de ensino, a Escola Americana. Seu sucesso resultou no Colé-gio Mackenzie, hoje Universidade que contou entre seus alunos com a maior parte da segunda e terceira gerações dos imigrantes sulistas(OLIVEIRA, 1999, p. 164).

Nos livros de Atas da Igreja5, o reverendo Chamberlain registra sua preocupação com o recrudescimento da

intolerân-cia religiosa no Brasil, em virtude da adesão ao protestantismo de personagens da Corte, em Minas Gerais, Bahia e Per-nambuco, além de realizar a primeira referência sobre a “Escolinha” nos anais da Igreja Presbiteriana do ano de 1870, na sessão do mês de outubro da Igreja, e a necessidade de sua ampliação.

4. OS NOVOS MÉTODOS EDUCACIONAIS INTRODUZIDOS NO BRASIL

Mary Annesley Chamberlain, pouco mais de um ano após sua vinda para o Brasil, ampliou seu trabalho educacional, que iniciara em sua sala de jantar. Seus esforços resultaram na fundação de uma escola mista dirigida por professoras de caráter permanente.

Segundo os relatórios encontrados nos livros de Atas das sessões da Igreja Presbiteriana pelo reverendo Chamberlain, Mary indignava-se com os métodos empregados no desenvolvimento da aprendizagem no Brasil. Os métodos de ensino utilizados se constituíam na memorização, no pronunciamento em voz alta, na cópia do que o professor escrevia e no cas-tigo físico. Inconformada com tais procedimentos educacionais, Mary luta arduamente contra a diferença entre os méto-dos pedagógicos de seu país de origem e aqueles com os quais estava tomando contato por meio de suas alunas

brasilei-[ 144 ]

2 – Alexander Latimer Blackford, nascido em 6 de janeiro de 1829, formou-se em Teologia no Wetern Theological Seminary, em 1859. Ao se formar, inscreveu-se na junta das Missões Estrangeiras. Por intermédio do Ver. J. Leighton Wilson, conheceu Ashbel G. Simonton, quando este se preparava para vir ao Brasil. Desse encontro nasceu uma forte amizade, reforçada pelo casamento com Elizabeth Simonton, em 8 de agosto de 1860.

3 – A Board of Foreing Missions of the Presbyterian Church dos Estados Unidos era mantida pelas Igrejas Presbiterianas dos Estados do Norte; A junta das Missões sustentada pelas Igrejas dos Esta-dos do Sul era a Commitee of Nashvile; ambas mantinham trabalhos no Brasil. Os missionários das missões de Nova York organizaram a primeira Igreja Presbiteriana e fundaram o hoje denominado

Instituto Presbiteriano Mackenzie, as Missões do Sul tiveram seu núcleo inicial na cidade de Cam-pinas e organizaram os Colégios Morton e Internacional.

4 – George Whitehill Chamberlain e a sua esposa, Mary Annesley Chamberlain, fundaram em 1870 a Escola Americana em São Paulo, a qual, depois, foi anexada ao Instituto Mackenzie quando este foi organizado. Evangelista itinerante, pastor em São Paulo e representante da Junta de Nova York. [L0]Artigo 8, p. 7, Oliveira que ano? A qual livro se refere aqui?

5 – Nos registros de Atas da Igreja Presbiteriana encontram-se informações meticulosas sobre a preocupação e situação política e religiosa do Brasil da época.

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ras. Passa a adotar os métodos educacionais norte-americanos, da leitura em silêncio, estudo intuitivo e transformação da escola em um lugar de desenvolvimento do conhecimento de maneira prazerosa e feliz (LESSA, 1938, p. 12-16). Propu-nha-se a desenvolver na Escolinha o ideal da moderna pedagogia em marcha nos Estados Unidos, que criava a escola mis-ta regida por professoras, visando a maior sociabilidade de seus integrantes e o desenvolvimento do conceito de liberda-de e liberda-de bons costumes.

O trabalho educacional desenvolvido por essas norte-americanas indicam uma direção na transformação dos métodos educacionais e na ampliação do trabalho feminino no âmbito escolar, no espaço público brasileiro, fato que já vinha ocor-rendo no país. As novas propostas educacionais norte-americanas e o êxito dos trabalhos missionários norte-americanos repercutem na cidade de São Paulo, provocando a ampliação física do estabelecimento de ensino protestante. A Escola pas-sou a receber crianças de diversas famílias que sofriam discriminação social, étnica ou religiosa:

A Igreja Presbiteriana foi a primeira a organizar a escola para atender os filhos de imigrantes. Fundada em 1869, pelos Reverendos M. Norton e E. Lane, a Escola Internacional instalou-se em Campinas, ponto central e em plena expansão, graças ao desenvolvimento da lavoura do café e a recente construção da estrada-de-ferro. Essa primeira escola missio-nária norte-americana na América do Sul prosperou até 1893, quando foi fechada devido a uma epidemia de febre ama-rela que se irradiou na região (OLIVEIRA, 1999, p 162).

As determinações educacionais no Brasil obedeciam a divisões étnicas, de gênero, religiosas e de classe. As meninas ricas poderiam ingressar em colégios religiosos católicos especiais para moças, assim como os rapazes em colégios destinados a eles. A educação das mulheres das classes menos privilegiadas, no século XIX, era realizada em colégios particulares ou reli-giosos, nos quais permaneciam confinadas e protegidas de possíveis vícios e do desvio do bom caminho. “A educação era, portanto, extratificada, dividida entre a destinada às camadas populares e a elitizada” (ALMEIDA, 1998, p. 41).

O número de mulheres que chegavam a cursar o que denominamos hoje ensino médio era muito pequeno, consideran-do que a expectativa limitava-se à conclusão consideran-do ensino primário. “As mulheres deviam ser mais educadas consideran-do que instruí-das” (DEL PRIORI, 1997, p. 446).

Com a ampliação dos ideais republicanos e positivistas, propunha-se desenvolver um povo instruído. A crença no poder da educação para o crescimento do país identificava-se às idéias positivistas, uma vez que o país se situava em condições extremamente atrasadas perante a América do Norte e a Europa nessa visão. Tornou-se aceitável para as mulheres que necessitavam trabalhar algumas tarefas, como atividades no magistério, pois mantinha a representação e o significado de “nobreza” ao cuidar de alguém e formar o caráter da nova nação. O magistério foi considerado “normal” dentro dos padrões da época (COIMBRA, 1972). Serviria de complementação para a formação de esposas e mães educadoras de seus filhos numa sociedade carente de desenvolvimento, um meio caminho entre o público e o privado.

Nesse período, as expectativas com a educação cresceram, em decorrência do processo de urbanização e de industria-lização, além do crescimento dos setores sociais médios e da presença de imigrantes no cotidiano do espaço público bra-sileiro. Nesse setor social médio, os trabalhadores nacionais e os imigrantes necessitavam estudar para ampliar as ativida-des comerciais e para acompanhar as novas exigências ocorridas a partir das transformações econômicas, sociais e políticas do Brasil. Essa necessidade promove o desenvolvimento de estabelecimentos educacionais como a Escola Americana, por apresentar uma alternativa perfeitamente compatível aos ideais de progresso.

A regência educacional realizada por mulheres não implicaria dificuldades no país diante da decrescente procura mas-culina por essa atividade no período, da formação de docentes, do fato de outras carreiras serem mais atraentes financei-ramente e do crescimento da feminização do magistério. Esse fato impunha a exigência de permissão para que as mulhe-res ministrassem aulas também para os meninos. Foi dentro desse quadro que se construiu a imagem da mulher trabalhadora do magistério fora de casa com ocupação nobre de educadora até a chegada do casamento e da maternidade:

Ao lado da enfermeira, o magistério primário consistia, no século passado, a outra via de acesso respeitável no mercado de trabalho para uma jovem de classe média. Inicialmente no Brasil o ensino das primeiras letras era uma esfera de atua-ção masculina. Convém lembrar a existência de um conjunto de restrições ao acesso das mulheres às escolas, no papel de alunas; até o início do século XIX elas não possuíam mesmo habilitação para pretender ensinar. Somente em 1827 surgiu a primeira regulamentação referente à educação feminina, na qual se permitia o acesso da mulher ao nível

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cacional elementar; mas não aos mais avançados. No Brasil a primeira Escola Normal foi fundada em 1835 em Niterói, seguida da Bahia em 1836. Posteriormente foi criada a de São Paulo em 1846. Esta ultima destinava-se apenas a rapa-zes, não aceitando moças em seus quadros de alunos. Entretanto no final do século a profissão de educador primário era tanto masculina como feminina (PENA, 1981, p. 114).

É nesse contexto que a Escola Americana passou a se ampliar e a receber inclusive filhos de escravos em seu estabele-cimento bem como todos aqueles que nela desejassem ingressar, independentemente de condição racial, religiosa e políti-ca. O impacto educacional da proposta norte-americana tornou-se relevante a ponto de os jornais de grande circulação da época publicarem em seus editoriais comentários sobre os métodos utilizados pela Escola Americana6.

Em pouco tempo, a Escola Americana, instalou um internato para as meninas, filhas de pais residentes no interior da Província. A missionária Miss Elmira Kuhl foi sua primeira diretora. O internato obtém grande aceitação por parte dos pais dessas meninas, que vem a possibilidade de aperfeiçoamento educacional das filhas pelo ensino, já que o governo brasi-leiro não havia cumprido os acordos com os imigrantes norte-americanos de proporcionar nas cidades do interior escolas para as crianças.

A Board of Foreing Missions of the Presbyterian Church, que já havia financiado a Escola Americana, contribuiu para a criação da Escola Normal para a formação de futuros professores de ensino primário nos moldes norte-americanos com currículo para o ensino de: higiene escolar, psicologia aplicada, direção e prática de ensino, pedagogia, matemática, por-tuguês, história, geografia, música e educação física.

As moças da época poderiam freqüentar as Escolas Normais, mas não desejar a Universidade, pois a liberdade conquis-tada era extremamente vigiada e não representaria a quebra dos grilhões domésticos com sua atuação no espaço público a partir da execução de outras atividades profissionais.

O magistério exercido por mulheres significaria a chance de sustento digno para essas moças, sem a obrigação do casa-mento ou a humilhação de viver do sustento de parentes por parte de mulheres pobres, solteiras ou viúvas. Representaria a continuação da missão feminina de educar, nos moldes propostos pelos positivistas e higienistas no século XIX e de acor-do com o imaginário acor-do papel feminino na sociedade brasileira.

O êxito do internato feminino favoreceu a instalação de um internato masculino, para atender os meninos do interior da cidade de São Paulo. D. Maria Antonia da Silva Ramos, interessada na ampliação da escola, que havia acolhido sem discri-minação racial e religiosa as filhas de sua escrava, vendeu uma parcela da área de sua chácara. Nesse mesmo contexto, a Igreja Presbiteriana recebeu a doação de mais três áreas na região da chácara da Baronesa de Antonina, ampliando consi-deravelmente o espaço propiciado do projeto educacional dos missionários presbiterianos norte-americanos no país.

A Brazil Mission, observando os êxitos da educação norte-americana presbiteriana por meio do ensino primário da Escola Americana e da boa formação de professores pela Escola Normal, resolveu fundar, na cidade de São Paulo, o Cur-so Superior da Escola Americana. Em 1886, assume em São Paulo, como presidente da obra educacional, o Dr. Horácio Manley Lane. No ano seguinte, o departamento educacional da Brazil Mission recebeu a visita de uma comissão de edu-cadores, indicada pela Board, para verificar os êxitos dos trabalhos desenvolvidos pelos missionários presbiterianos no Bra-sil e a possível ampliação do projeto educacional, com a construção de uma Escola de Engenharia, para atender às neces-sidades técnicas do período.

Horácio Lane, no ano de 1887, deslocou-se para os Estados Unidos, a fim de receber a doação de 30 mil dólares, feita à Igreja Presbiteriana de Nova York pelo falecido John Mackenzie. Com esse recurso, foi construído um edifício denominado Mackenzie, em gratidão, nas terras compradas ou recebidas por doações na região da chácara do alto de Higienópolis. A partir desse momento, a obra educacional da Brazil Mission na cidade de São Paulo passou a se denominar Mackenzie.

5. CONCLUSÕES

O artigo procurou demonstrar as razões da escolha do Brasil por imigrantes norte-americanos e o interesse brasileiro nessa imigração. Discute a relevância dos trabalhos educacionais desses missionários e missionárias norte-americanos na alfabetização de adultos, ensino primário e intermediário, voltados a segmentos sociais, alguns deles discriminados por

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6 – Em agosto de 1872 os jornais, O Correio Paulistano, A República e o Jornal do Comércio do Rio de Janeiro publicaram editoriais sobre os métodos utilizados pela Escola Americana, escola mista dirigida por mulheres.

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religião, etnia e classe social. Analisa também o papel que os novos métodos educacionais introduzidos por esses imigran-tes tiveram na própria reforma da escola pública brasileira. O artigo procurou enfatizar a ampliação do espaço público de trabalho para as mulheres por meio do magistério feminino e as restrições sofridas por esses sujeitos históricos. Verifica-se que, apesar do êxito dessas educadoras, a visibilidade do Verifica-seu trabalho foi modesta em função da construção dos papéis femininos e da própria inserção da mulher na sociedade da época.

O diretor da Escola Normal Caetano de Campos convidou para seu corpo docente as professoras D. Maria Guilhermina Loureiro de Andrade, para o cargo de administração da Escola Modelo, e a norte-americana Miss Márcia Brown, para com-por a parte técnica da mesma escola pública. Mais tarde, Miss Brown assumiu também a responsabilidade de administrar a Escola Normal do Mackenzie College, dando continuidade às experiências inovadoras já desenvolvidas. A presença femi-nina na obra educacional foi destacada desde a criação da “Escolinha”, passando pela Escola Normal, pelo Jardim da Infân-cia e pelo Internato. Novos métodos educacionais foram também desenvolvidos pelas professoras envolvidas na educação presbiteriana que, em fins do século XIX e início do século XX, abriram para a sociedade brasileira outra proposta de esco-la e de educação, posteriormente reconhecidas peesco-las reformas impesco-lantadas na escoesco-la pública brasileira.

REFERÊNCIAS

ALMEIDA, J. S. A mulher e educação: a paixão pelo possível. São Paulo: Unesp, 1998.

COIMBRA. C. A educação. Fenomenologia da cultura brasileira, São Paulo: Lisa Livro Irradiante, 1972 p. 159-202. CONSTITUIÇÃO BRASILEIRA de 1824.

DEL PRIORI, Mary. História das mulheres no Brasil. São Paulo: Contexto, 1997.

LESSA, Vicente Themudo. Annaes da 1ª Igreja Presbyteriana de São Paulo (1863-1903). São Paulo: Edição da 1ª Igreja Presbyteriana Independente de São Paulo, 1938.

MALUF. M. Recônditos do mundo feminino. História da vida privada no Brasil. São Paulo: Cia das Letras, 1997 v. 3. OLIVEIRA, Ana Maria Costa. Migrações nas Américas: a experiência dos norte-americanos no Brasil In: HOLANDA; CAPE-LATO, Relações de gênero e diversidades culturais nas Américas. São Paulo. Edusp, 1999.

_______. Migrações nas Américas. A experiência dos norte-americanos no Brasil. Relações de gênero e diversidades

Cul-turais nas Américas. São Paulo: Edusp, 1999.

_______. O destino não manifesto: os imigrantes norte-americanos no Brasil. São Paulo: União Cultural Brasil Estados Uni-dos, 1995.

PENA, Maria Valéria Junho. Mulheres e trabalhadoras: a presença feminina na constituição do sistema fabril. Rio de Janei-ro: Paz e Terra, 1981.

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Referências

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