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– PósGraduação em Letras Neolatinas

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO CENTRO DE LETRAS E ARTES

FACULDADE DE LETRAS

ANNE KATHERYNE ESTEBE MAGGESSY

A SIGNIFICAÇÃO ASPECTUAL ITERATIVA DA PERÍFRASE

“ESTAR” + GERÚNDIO NO PORTUGUÊS DO BRASIL E NO

ESPANHOL DO MÉXICO

RIO DE JANEIRO

(2)

UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO

A SIGNIFICAÇÃO ASPECTUAL ITERATIVA DA PERÍFRASE

“ESTAR” + GERÚNDIO NO PORTUGUÊS DO BRASIL E NO

ESPANHOL DO MÉXICO

Anne Katheryne Estebe Maggessy

Dissertação de Mestrado apresentada ao

Programa de Pós-Graduação em Letras

Neolatinas da Universidade Federal do Rio de

Janeiro como quesito para a obtenção do

Título de Mestre em Letras Neolatinas

(Estudos Linguísticos Neolatinos, opção:

Língua Espanhola)

Orientadora: Profa. Doutora Maria Mercedes

Riveiro Quintans Sebold

Rio de Janeiro

(3)

A SIGNIFICAÇÃO ASPECTUAL ITERATIVA DA PERÍFRASE

“ESTAR” + GERÚNDIO NO PORTUGUÊS DO BRASIL E NO

ESPANHOL DO MÉXICO

Anne Katheryne Estebe Maggessy

Orientadora: Maria Mercedes Riveiro Quintans Sebold

Dissertação de Mestrado submetida ao Programa de Pós-Graduação em Letras

Neolatinas da Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ, como parte dos

requisitos mínimos para a obtenção do Título de Mestre em Letras Neolatinas

(Estudos Linguísticos Neolatinos, opção: Língua Espanhola)

Aprovada por:

_____________________________________________________________________

Presidente, Profa. Doutora Maria Mercedes Riveiro Quintans Sebold – UFRJ

_____________________________________________________________________

Profa. Doutora Adriana Leitão Martins – UFRJ

_____________________________________________________________________

Profa. Doutora Viviane C. Antunes Lima – UFRRJ

_____________________________________________________________________

Profa. Doutora Maria Aurora Consuelo Alfaro Lagorio – UFRJ, Suplente

_____________________________________________________________________

Prof. Doutor Celso Vieira Novaes – UFRJ, Suplente

Rio de Janeiro

(4)

M193s Maggessy, Anne Katheryne Estebe.

A significação aspectual iterativa da perífrase "estar" + gerúndio no português do Brasil e no espanhol do México / Anne Katheryne Estebe Maggessy. – Rio de Janeiro: UFRJ, 2013.

131 f. : il. ; 30 cm.

Orientador: Dra. Maria Mercedes Riveiro Quintans Sebold.

Dissertação (Mestrado) – Departamento de Letras Neolatinas, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2013.

Bibliografia: f. 118-121.

1. Gramática gerativa. 2. Perífrase. 3. Aspecto iterativo. Título. II. Sebold, Maria Mercedes Riveiro Quintans.

(5)

Dedico esta dissertação à minha

mãe Conchita, que fez nascer em

mim o amor pela língua espanhola e

(6)

AGRADECIMENTOS

Ao Deus a quem amo e sirvo, que vem mudando a minha historia de uma

maneira singular, me dando bênçãos imerecidas e sendo a minha força no caminhar.

À minha família tão dedicada por me dar a estrutura psicológica e financeira

para investir nessa carreira tão bonita e difícil. Particularmente ao meu pai George

pelos pés no chão, à minha mãe Conchita por me socorrer em qualquer dificuldade, à

minha irmã Ana Paula e ao meu cunhado Claudio pela torcida e ao meu irmão Junior,

cunhada Keyla e sobrinhas lindas Isabella e Sophia pela alegria que me proporcionam

e pela saudade que me humaniza.

Ao meu namorado Vitor tão paciente, companheiro e carinhoso, que

participou de todo o processo de feitura desta dissertação, sendo capaz de aprender conceitos de teoria gerativa e aspecto, ouvindo todas as reclamações, frustrações e

conquistas que o mestrado é capaz de proporcionar. À sua família pela torcida, pelo

carinho e orações tão importantes.

Aos meus amigos da Igreja Presbiteriana do Riachuelo que acompanharam

todo o meu crescimento intelectual e espiritual, intercedendo e agradecendo a Deus

pela minha vida. Especialmente às minhas amigas Alice, Ingrid, Rossana e Daiane por

serem as irmãs que eu escolhi e por receberem tantas negativas a seus convites devido

aos meus estudos. Aos meus amigos Rosinha, Renato, Bruninho, Daniel, Gabriel,

Rodrigo, Dudu e Raphael pelas inteligentes e divertidas conversas, também essenciais

para o meu crescimento.

À amiga do peito Tássia pela amizade de sempre, às amigas do francês

Adriana, Carla Marins, Verônica, Renata, Natasha e Carla Nascimento que

tornaram-se amigas da vida toda e que me tornaram-servem de grandes exemplos acadêmicos. Assim

como as amigas do grupo bioling como Imara, Thaís, Débora, Juju, Estrelinha,

Fernandinha, Lessa, Letícia e Patrícia por me ajudarem a entender melhor as ideias de

Chomsky de maneira tão gostosa, demonstrando companheirismo e amizade. Sem

esquecer dos queridos companheiros de mestrado como Diego, Carol Parrini, Flávia,

Mariana, Raquel, Gabriel, Gisele, Bruno, Carol, Prisicila e Taiana por dividirmos

aflições e ajudas tão importantes neste processo. Agradeço especialmente à querida

(7)

À minha orientadora Mercedes, pela sua competência, pelos seus

ensinamentos e paciência que foram os pilares desta dissertação. Assim como também

os ensinamentos e o carinho do professor Celso que me deram segurança em

prosseguir. À professora Consuelo, pelas suas sugestões no começo deste projeto e à

professora Letícia, por tantos ensinamentos para a minha carreira de professora.

Agradeço também à professora Teresa Wachowicz que me enviou prontamente sua

tese para que eu pudesse estudá-la e ao professor Valdecy também pelo envio de

importante material.

À CAPES por financiar esta conquista e a todo o departamento de Letras

(8)

RESUMO

A SIGNIFICAÇÃO ASPECTUAL ITERATIVA DA PERÍFRASE

“ESTAR” + GERÚNDIO NO PORTUGUÊS DO BRASIL E NO

ESPANHOL DO MÉXICO

Anne Katheryne Estebe Maggessy

Orientadora:Maria Mercedes Riveiro Quintans Sebold

Resumo da Dissertação de Mestrado submetida ao Programa de Pós-Graduação em Letras Neolatinas da Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ, como parte dos requisitos necessários para a obtenção do título de Mestre em Letras Neolatinas (Estudos Linguísticos Neolatinos, opção: Língua Espanhola).

O nosso objetivo principal é verificar os fatores relevantes na composição do aspecto iterativo em sentenças com a perífrase “estar” + gerúndio (EG), em variedades do português do Brasil (PB) e do espanhol do México (EM). Consideramos o aspecto iterativo como um aspecto imperfectivo que representa um evento escalonado no decorrer do tempo. A nossa hipótese é de que fatores como tipologia verbal, argumentos pluralizados e presença de advérbio quantificador, serão relevantes na significação aspectual iterativa em sentenças com EG, tanto no PB quanto no EM.

Para tanto, selecionamos para a análise do português do Brasil um corpus oral formado por oito entrevistas transcritas do projeto NURC-RJ e para o espanhol do México, outro corpus oral também formado por oito entrevistas transcritas do projeto PRESEEA México. Ambos recopilados na década de 90, com informantes homens e mulheres, de nível superior, compreendendo a faixa etária jovem (entre 20 e 35 anos). Na seleção e tratamento dos dados, foram utilizados os programas WordSmith Tools 5.0 e GoldVarb X.

Os resultados confirmam a grande semelhança entre essas línguas, sugerindo poucas diferenças na expressão aspectual iterativa em sentenças com EG nessas línguas. Para o PB, os fatores que parecem mais relevantes são a tipologia verbal, o argumento interno plural e a presença do advérbio quantificador. Já para o EM, os fatores que parecem mais relevantes são apenas a presença de argumento interno plural e de advérbio quantificador. Além disso, a significação aspectual no PB parece estar mais estendida que no EM, pois obtivemos 53,4% de sentenças iterativas no PB, frente a 34,7% no EM.

Palavras-chave: aspecto iterativo, perífrase “estar” + gerúndio, gramática gerativa.

(9)

RESUMEN

A SIGNIFICAÇÃO ASPECTUAL ITERATIVA DA PERÍFRASE

“ESTAR” + GERÚNDIO NO PORTUGUÊS DO BRASIL E NO

ESPANHOL DO MÉXICO

Anne Katheryne Estebe Maggessy

Orientadora:Maria Mercedes Riveiro Quintans Sebold

Resumen da Dissertação de Mestrado submetida ao Programa de Pós-Graduação em

Letras Neolatinas da Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ, como parte dos requisitos necessários para a obtenção do título de Mestre em Letras Neolatinas (Estudos Linguísticos Neolatinos, opção: Língua Espanhola).

Nuestro objetivo principal es investigar los factores relevantes en la composición del aspecto iterativo en sentencias con la perífrasis “estar” + gerundio (EG), en variedades del portugués de Brasil (PB) y del español de México (EM). Consideramos el aspecto iterativo como un aspecto imperfectivo que representa un evento escalonado en el paso del tiempo. Nuestra hipótesis es que factores como tipología verbal, argumentos pluralizados y presencia de adverbio cuantificador, serán relevantes en la significación aspectual iterativa en sentencias con EG, tanto en PB como en EM.

Para tanto, seleccionamos para el análisis del portugués de Brasil un corpus oral formado por ocho entrevistas transcritas del proyecto NURC-RJ y para el español de México, otro corpus oral también formado por ocho entrevistas transcritas del proyecto PRESEEA México. Ambos recopilados en la década de 90, con informantes hombres y mujeres, de nivel superior, comprendiendo un grupo joven (entre 20 y 35 años). En la selección y tratamiento de los datos utilizamos los programas WordSmith Tools 5.0 y GoldVarb X.

Los resultados confirman la gran semejanza entre esas lenguas, sugiriendo pocas diferencias en la expresión aspectual iterativa en sentencias con EG en esas lenguas. Para el PB los factores que parecen más relevantes son la tipología verbal, el argumento interno plural y la presencia de adverbio cuantificador. Mientras para el EM, los factores que parecen más relevantes son solamente la presencia de argumento interno plural y de adverbio cuantificador. Además de eso, la significación aspectual en el PB, parece estar más extendida que en el EM, ya que obtuvimos 53,4% de sentencias iterativas en el PB, frente a 34,7 en el EM.

Palabras Clave: aspecto iterativo, perífrasis “estar” + gerundio, gramática generativa.

(10)

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ... 11

1. A ABORDAGEM DA TEORIA GERATIVA 1.1. SOBRE A LÍNGUA COMO SISTEMA MENTAL ... 14

1.2. SOBRE O PROGRAMA MINIMALISTA ... 17

1.3. SOBRE O LUGAR DA VARIAÇÃO LINGUÍSTICA ... 19

2. O ASPECTO 2.1. A CATEGORIA DO ASPECTO ... 24

2.2. A COMPOSICIONALIDADE ASPECTUAL ... 44

3. ESTUDOS DESCRITIVOS SOBRE A PERÍFRASE EG 3.1. NO PORTUGUÊS DO BRASIL ... 47

3.2. NO ESPANHOL ... 54

4. A EXPRESSÃO ASPECTUAL DA PERÍFRASE EG 4.1. ESTUDOS DE REFERÊNCIA ... 60

4.2. A PROPOSTA ASPECTUAL ADOTADA ... 70

5. CORPUS E METODOLOGIA 5.1. SOBRE O PRESEEA-MÉXICO ... 78

5.2. SOBRE O NURC-RJ ... 80

5.3. AS FERRAMENTAS DE ANÁLISE ... 82

5.4. GRUPO DE FATORES ... 83

6. ANÁLISE DOS DADOS E RESULTADOS 6.1. ANÁLISE QUANTITATIVA ... 84

6.2. ANÁLISE QUALITATIVA ... 95

6.3. ANÁLISE SEGUNDO A PERSPECTIVA DA GRAMÁTICA GERATIVA...110

7. CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 114

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ... 118

(11)

INTRODUÇÃO

O estudo da linguagem humana pode nos levar para as qualidades distintivas

da mente que são, até onde sabemos, exclusivas do homem e inseparáveis de qualquer

fase crítica da existência humana, pessoal ou social. Detentores de um sistema cognitivo inato, nós, seres humanos, nascemos aptos para adquirir qualquer língua

natural. Os estudiosos do gerativismo, um dos programas de investigação dentro da

linguística, tentam definir o conjunto de propriedades inatas do nosso sistema

cognitivo linguístico, a partir de dados linguísticos observados na expressão das

nossas gramáticas particulares.

A Teoria Gerativa, inaugurada pelo linguista Noam Chomsky (1957), é

considerada uma teoria mentalista e universalista, pois é uma teoria que se propõe a

entender a mente através da linguagem e que considera que todos nós somos dotados

de uma Gramática Universal (GU), que é um conjunto de princípios inatos que regem

todas as línguas. Além disso, segundo Chomsky (1986), as línguas têm mais

semelhanças que diferenças entre elas. Para o autor, se um cientista marciano viesse

ao nosso planeta sem conhecer nada sobre linguagem e observasse como nos

comunicamos, concluiria que haveria apenas uma única linguagem humana, com

diferenças apenas marginais.

Nesta dissertação, adotamos a visão de linguagem da Teoria Gerativa e nos

propomos a confirmar esse caráter de semelhança entre as línguas, particularmente

entre as variedades do português do Brasil (PB), da cidade do Rio de Janeiro, e do

espanhol do México (EM), da capital Cidade do México. Faremos isso a partir do

estudo da expressão aspectual iterativa da perífrase “estar” + gerúndio (EG) em

sentenças provenientes de corpora orais, formados por entrevistas transcritas.

Consideramos o estudo de Comrie (1976) sobre o Aspecto, que o define em

função dos diferentes modos de observar a constituição temporal interna de uma

situação. Além disso, para esse autor, esta categoria se opõe à noção de Tempo.

Segundo Comrie (1976), Tempo é uma categoria que marca nas línguas a oposição

que os fatos referidos ocupam no tempo físico e que geralmente toma como ponto de

partida o ponto dêitico da enunciação. Enquanto que Aspecto, segundo esse mesmo

autor, se opõe à noção de tempo externo, pois é uma categoria não dêitica.

(12)

de Tempo, o Aspecto parece ser menos estudado. Dentro da Teoria Gerativa, o estudo

da noção de Aspecto ganhou maior relevância a partir do Programa Minimalista de

Chomsky (1995), pois passou a ser considerado por alguns autores como um nódulo

na árvore sintática por ser uma categoria conceptualmente motivada, assim como a

categoria de Tempo.

Com isso, a questão que nos propomos a responder é sobre quais são os fatores

em sentenças com “estar” + gerúndio do PB e do EM que favorecem a expressão

aspectual iterativa. A nossa hipótese é de que esses fatores favorecedores serão a

presença de advérbio quantificador, de argumentos pluralizados e a tipologia

semântica do verbo, como verificado em outros trabalhos. Além disso, nos propomos

verificar se há uma interseção de traços entre os aspectos iterativo e durativo e que

traços seriam esses. Assim, pretendemos colaborar com o conhecimento sobre a categoria do aspecto dentro dos estudos linguísticos, principalmente com a ampliação

do conhecimento sobre o aspecto iterativo, e também na ampliação do conhecimento

sobre a semelhança entre as línguas e a hipótese da universalidade dos traços.

Nosso interesse pela expressão aspectual iterativa em sentenças com a

perífrase “estar” + gerúndio (EG) se dá por sua questão interpretativa, pois apresenta

uma interessante variação de comportamento. Inicialmente, a perífrase EG foi descrita

como a que expressa somente o aspecto progressivo. O aspecto iterativo, também em

seus primeiros estudos, seria expresso somente pelo pretérito perfeito composto (“ter”

+ particípio). No entanto, atualmente é possível encontrar estudos que afirmam sobre

a possibilidade de EG também expressar o aspecto iterativo, tanto no PB quanto no

espanhol. Mas o contexto em que isso se apresenta ainda é muito pouco descrito,

principalmente em relação à língua espanhola.

Finalmente, podemos dizer que esta dissertação se enquadra nas investigações

mais recentes da teoria gerativa, o Programa Minimalista (1995), e também nos

estudos sobre a variação da leitura aspectual iterativa em sentenças com EG no

português do Brasil e no espanhol do México. Esta combinação nos proporciona um

quadro teórico que entende a língua como um sistema mental com componentes

invariáveis, cuja aquisição é regida pela Gramática Universal, por exemplo, e comuns

a todos os seres humanos. Mas que, além disso, valoriza o lugar do aspecto na

(13)

Para compreendermos melhor as questões aqui introduzidas, subdividimos esta

dissertação em sete capítulos. No primeiro, trataremos de maneira mais geral os

estudos da Teoria Gerativa, focando no Programa Minimalista e no tratamento dado à

questão da variação na perspectiva gerativista. No segundo, apresentaremos alguns

estudos sobre a categoria do Aspecto e, especificamente, os estudos de Verkuyl

(2003) sobre a composicionalidade aspectual. No terceiro, faremos menção a alguns

trabalhos do português e do espanhol sobre a expressão aspectual da perífrase “estar”

+ gerúndio. No quarto capítulo, traremos os trabalhos de Wachowicz (2003) e de

Mendes (2005) e apresentaremos mais detalhadamente as características dos aspectos

durativo e iterativo. No quinto capítulo, apresentaremos o corpus e a metodologia

utilizada no tratamento dos dados e, no sexto capítulo, a análise dos dados de forma

quantitativa, qualitativa e segundo a perspectiva da gramática gerativa, com seus respectivos resultados. E, finalmente, no sétimo capítulo, traremos as considerações

finais.

(14)

CAPÍTULO 1

A ABORDAGEM DA GRAMÁTICA GERATIVA

Neste capítulo, apresentaremos um panorama geral da Teoria Gerativa,

focando na sua versão mais atual que é o Programa Minimalista e no tratamento dado

à variação nesta perspectiva de análise linguística.

1.1. SOBRE A LÍNGUA COMO SISTEMA MENTAL

Segundo Chomsky (1928), o estudo da linguagem é bastante antigo e desperta

o interesse de investigadores desde a Índia e a Grécia clássicas. Um interessante trabalho que consta do século XVI é o do médico espanhol Juan Huarte, que,

publicado em diversas línguas, fala sobre a natureza da inteligência humana. O que

despertou a curiosidade em Huarte foi o fato de que a palavra para “inteligência”,

ingenio, parece ter a mesma raiz latina que várias palavras com significado de

“engendrar” ou “gerar”. Para o autor, isso forneceria uma pista sobre a natureza da

mente, pois o ingenio seria um poder gerador e o entendimento, uma faculdade

gerativa. Dessa forma, na época seguinte, torna-se típica a referência ao uso da

linguagem como um indício da inteligência humana, o que distingue o homem dos

animais e, especificamente, sua ênfase na capacidade criativa da inteligência

racionalista.

Mesmo com o avanço dos estudos linguísticos, pouco dessas ideias germinou

nos períodos seguintes. Só obtivemos real propulsão na década de 50, com o linguista

norte americano Noam Chomsky, que introduziu a teoria da Gramática Gerativa. Essa

teoria tem como pressuposto teórico que as propriedades essenciais da linguagem são

determinadas por propriedades mentais e, consequentemente, estudar a linguagem

humana é estudar as propriedades da mente humana. Seu programa de investigação,

então, pretende desenvolver as três seguintes questões (Chomsky 1988:15):

(1) O que existe na mente do falante que lhe permite falar/compreender e

(15)

(2) Como este sistema de conhecimento se desenvolve na mente do

falante?

(3) Como o sistema de conhecimentos adquiridos é posto em uso?

Buscando responder a essas perguntas, Chomsky (1988) parte da hipótese de

que nossa mente é modular, ou seja, que ela é um sistema complexo, com uma

estrutura altamente diferenciada e com “faculdades” separadas, como por exemplo, a

faculdade da linguagem e a faculdade dos conceitos. Com isso, podemos dizer que a

linguagem é um módulo independente e com seus próprios princípios. Em outras

palavras, a faculdade da linguagem é considerada um sistema autônomo,

independente dos outros sistemas cognitivos da mente humana, mas que mantém com

eles uma interação complexa em pontos específicos. Além disso, podemos afirmar também que esse sistema autônomo da faculdade da linguagem é inato

(geneticamente determinado) e exclusivo da espécie humana, possuindo “normas”

mentalmente representadas em nosso cérebro.

Em sua teoria, Chomsky chama o estado inicial da faculdade da linguagem de

Gramática Universal (GU), e a define como a soma dos princípios linguísticos

geneticamente determinados, específicos à espécie humana e uniformes através da

espécie. Uma das evidências a favor do inatismo, ou seja, da existência de uma GU,

considerada também como núcleo inato, é o argumento da pobreza de estímulos ou

Problema de Platão, que propõe que os dados primários são insuficientes para explicar

o sistema de conhecimentos que adquirimos no final. O que quer dizer que o falante

adulto tem conhecimentos sobre a sua língua e um potencial criativo sobre ela que não

podem ser explicados exclusivamente pelo ambiente linguístico inicial durante o

curso normal do processo de aquisição.

Portanto, a GU precisa ser suficientemente flexível para acomodar a variação

entre as diferentes línguas. Mas, ao mesmo tempo, precisa ter a rigidez necessária

para explicar as propriedades altamente específicas que caracterizam o conhecimento

final dos falantes. O fato de termos diferentes línguas naturais faz com que os

linguistas multipliquem os mecanismos descritivos da gramática, sem se preocuparem

com o estabelecimento de princípios que os restrinjam. Contudo, segundo Chomsky

(16)

consideravelmente o número de gramáticas que podem ser derivadas do sistema

inicial.

No entanto, restringindo a GU, os gerativistas propõem a diminuição da sua

capacidade descritiva, possibilitando a explicação da natureza altamente restritiva das

gramáticas finais e o fato de muitas das suas propriedades serem adquiridas sem

instrução explícita, correção de erros ou explicação gramatical. Sem essa restrição à

GU, por outro lado, acomodamos a variação linguística, mas corremos o risco de

perder a sua capacidade explicativa. Dessa forma, o ideal para a gramática gerativa é

chegar a um equilíbrio exato entre esses dois polos, ou seja, devemos buscar um

sistema que seja ao mesmo tempo flexível para permitir a variação linguística, mas

também restrito para explicar a rigidez final do sistema de conhecimentos adquiridos.

Segundo Raposo (1992), foi a partir dessas ideias que Chomsky, na década de 70, retirou da formulação das regras particulares os aspectos que podiam ser

convertidos em princípios gerais da linguagem e passou a atribuí-los à GU. Surgindo,

assim, o modelo da Teoria Standard Alargada. De acordo com Raposo (1992), essa

teoria propõe que a gramática contém um número distinto e independente de

componentes, cada um deles com uma organização própria caracterizada por um

pequeno número de regras e por princípios que restringem a aplicação dessas regras.

Esses componentes podem ser do tipo lexical, de interpretação de pronomes, de

anáforas, e etc. A organização interna de cada componente é simples, mas as suas

interações podem ser relativamente complexas.

Na década seguinte, segundo os estudos de Raposo (1992), Chomsky (1981)

apresenta o modelo de Princípios e Parâmetros. Esse modelo incorpora boa parte dos

resultados teóricos da Teoria Standard Alargada e potencializa a tendência para

eliminar as regras. Desse modo, fica composto essencialmente por princípios

extremamente gerais, distribuídos pelos vários componentes, e cuja interação

determina representações muito complexas. Além dos princípios rígidos que tínhamos

até aqui, existe agora um sistema de princípios abertos, chamados de parâmetros.

Estes são uma espécie de comutadores linguísticos cujo valor definitivo apenas é

atingido durante o processo de aquisição, através da sua fixação em uma de duas

posições possíveis com base na informação obtida a partir do meio ambiente

(17)

parâmetros por fixar) a um estado completamente especificado (com os parâmetros

fixados), funcionando assim como um sistema computacional.

Para representar esse sistema, a Gramática Gerativa se utiliza da representação

sintática em árvore. A árvore é uma estrutura hierárquica composta por nódulos

binários da “estrutura de constituintes”1. Inicialmente, essa representação sintática era

proposta para o nível sintagmático. Com o intuito de que essa estrutura sintagmática

fosse também estendida à estrutura sentencial, os gerativistas propuseram que o

auxiliar (AUX) fosse o núcleo da sentença. Entretanto, como em algumas sentenças

ao invés do auxiliar tem-se apenas uma flexão agregada ao verbo, sugeriram, mais

tarde, que a flexão (FLEX ou I2) fosse o núcleo da sentença.

No entanto, esse tipo de representação com a flexão no núcleo da sentença,

abrigando as informações flexionais do verbo, foi muito discutido e, ao longo do tempo, surgiram várias propostas de mudanças. Uma das propostas de grande

relevância para os estudos na área da linguística gerativa se refere à constituição da

camada flexional e foi desenvolvido por Pollock em 1989. Em seu trabalho, Pollock

(1989) tinha como objetivo encontrar uma explicação que desse conta da posição dos

verbos em relação aos advérbios, às partículas de negação e aos quantificadores no

francês e no inglês. Sua intenção era conseguir que uma mesma árvore pudesse conter

todos os nódulos necessários para todo tipo de movimento do verbo.

A partir de diversos exemplos extraídos das duas línguas e de assumir que o

advérbio tem posição fixa na sentença e que a posição de origem é [Adv + V], Pollock

(1989) fez algumas observações. Uma delas é que, em sentenças finitas no francês, o

verbo sempre se deslocava para a esquerda do advérbio quando havia, por exemplo,

um marcador de negação ou um quantificador. Enquanto no inglês, não havia tal

movimento, salvo com verbos não lexicais (be / have). Já nas orações não-finitas com

verbos lexicais, o verbo segue o marcador de negação (Neg + V) e antecede o

advérbio (V + Adv) no francês e, em inglês, a negação antecede o verbo (Neg + V).

Com verbos não lexicais o verbo pode anteceder ou se pospor à negação no francês.

Enquanto no inglês a possibilidade de [V + Neg] seria duvidável.

Pollock (1989) propôs, então, que haveria dois sítios de aterrisagem para o

verbo, e não apenas um. Esses sítios ficaram conhecidos como aqueles que abrigam o

      

1 Organização de uma frase em grupos hierárquicos complexos construídos a partir de elementos de

níveis inferiores incluídos em estruturas maiores.

(18)

movimento curto e o movimento longo. O movimento curto ocorre quando os verbos

não-finitos do francês se movem para uma posição entre a partícula de negação e a

posição ocupada pelo advérbio / quantificador, esse sítio de aterrissagem seria o

nódulo que abrigaria as informações de concordância (AGRP3). Já os verbos lexicais

finitos do francês realizariam os movimentos longos e o sítio de aterrissagem

abrigaria as informações de tempo verbal (TP). Dessa forma, para dar conta do

comportamento do verbo em orações finitas e não-finitas e, após observar tais

movimentos, Pollock (1989) percebeu que uma única posição na camada flexional

não poderia dar conta das diferentes posições do verbo no francês. E concluiu que era

necessário cindir o nódulo flexional em dois: tempo (TP) e concordância (AGRP).

O estudo de Pollock (1989) se faz importante nesta dissertação, porque

modifica o olhar sobre a camada flexional e dá início a uma nova perspectiva dentro da Teoria Gerativa, que se consolida com os estudos do Programa Minimalista, como

veremos a seguir.

1.2. SOBRE O PROGRAMA MINIMALISTA

Com o advento do Programa Minimalista (PM) na década de 90, Chomsky

(1995) propõe que a linguagem seja descrita em termos de economia e simplicidade, e

por isso pontuou que categorias que não eram conceptualmente motivadas eram

elementos supérfluos na camada flexional.

Assim, a linguagem passa a ser descrita como formada por dois componentes

básicos: o léxico e o sistema computacional. O léxico seria responsável pelas

diferenças entre línguas e estaria constituído por elementos substantivos, com

propriedades idiossincráticas (nomes, verbos, etc.), e por algumas categorias funcionais (marcador de tempo, complementizador, determinante e marcador de

concordância, por exemplo). Já o sistema computacional estaria composto por

princípios invariáveis e seria responsável por utilizar os itens fornecidos pelo léxico

para gerar as derivações linguísticas.

O PM entende o léxico como “uma lista de exceções”, ou seja, uma entrada

lexical deveria fornecer propriedades idiossincráticas que são minimamente

suficientes para se derivar uma representação para os componentes de Forma Lógica

      

(19)

(LF) e Forma Fonética (PF)4. Com isso, para o PM, cabe às entradas lexicais

especificar os traços que não são predizíveis a partir de outras propriedades da entrada

lexical. Enquanto cabe ao sistema computacional verificar os traços.

Ao contrário da visão de Pollock (1989) de que os verbos se moviam para

incorporar afixos, no PM, o movimento do verbo ocorre para checar os traços que já

estariam presentes no verbo desde o início. Dessa forma, há uma mudança de foco, da

afixação de morfologia verbal para a checagem de traços. Pois, no PM, já não se

defende mais a operação de movimento do verbo como servindo para a incorporação

de afixos verbais ao radical.

O movimento agora é compreendido como uma operação para a checagem dos

traços flexionais presentes nos verbos de uma determinada língua – informação já

disponível na entrada lexical – com os traços invariáveis presentes nas categorias flexionais das línguas. Portanto, antes se defendia a ideia de que o verbo vinha do

léxico nu e se movimentava para incorporar os morfemas de tempo, concordância,

etc., depois se passou a defender que o verbo já viria flexionado e se movimentaria

para checar a compatibilidade desse morfema com os traços especificados na

categoria funcional.

Esses traços, segundo o PM, são binários, marcados positivamente para um

traço presente e marcados negativamente para um traço ausente. Um verbo seria

classificado, portanto, como [+V] e [-N]. Além disso, para o PM há dois tipos de

traços lexicais: aqueles que recebem interpretação apenas na interface fonológica (se

começa por consoante ou vogal, por exemplo) e aqueles que recebem interpretação

somente na interface semântica (se é roupa, alimento e etc.). Há também os traços

formais, que são acessados no decorrer da computação, como por exemplo,

[±Passado] e [±Plural]. Dentro do grupo de traços formais, alguns são intrínsecos,

estritamente determinados por propriedades enumeradas na entrada lexical. Outros

são opcionais, acrescentados no momento em que o item lexical entra na computação.

Sendo assim, um traço formal pode ser forte ou fraco. Caso seja forte, esse

traço desencadeia uma operação visível, ou seja, uma operação antes de Spell-out5

para que seus traços sejam eliminados através da sua verificação antes que uma

estrutura maior seja formada. Caso contrário, a derivação fracassa nas interfaces. Por

      

4 A LF e PF são níveis da interface com os sistemas externos, fornecedores das representações de som e

significado que serão lidas pelos sistemas de desempenho.

(20)

isso, se diz que a propriedade de força de um traço seria um dos elementos de

variação linguística. Dessa forma, a questão dos traços tem uma grande importância

para a sintaxe minimalista uma vez que, nessa abordagem, cada traço projetaria um

nódulo na árvore e isso teria consequência direta na hierarquia ou sequência das

categorias funcionais.

Finalmente, com o intuito de atender às condições impostas pelo sistema

conceptual-intencional6, somente traços interpretáveis, ou seja, conceptualmente

motivados, projetariam nódulos relevantes na árvore sintática. Com isso, Chomsky

(1995) observou que a concordância verbal (AGR) não seria uma categoria

conceptualmente motivada, já que o fato de um verbo estar no singular ou no plural

não interferiria na interpretação desse verbo, nem mesmo na interpretação do sujeito

sentencial como singular ou plural. E, por isso, AGR não se justificaria como um nódulo na árvore sintática. Então, surgiu a necessidade de eleger uma nova categoria

para ocupar esse lugar e Koopman e Sportiche (1991, apud Carvalho 2007) foram os

primeiros a propor que a categoria funcional de aspecto (ASP) ocuparia essa posição.

A partir daí, os estudos sobre o aspecto passam a ganhar maior relevância dentro da

teoria linguística.

O Programa Minimalista é relevante para este trabalho, não só pelo seu

entendimento de língua como sistema mental, mas também pela relevância dos traços

linguísticos. Além disso, neste momento da teoria, a categoria funcional de aspecto

passa a ocupar um nódulo na árvore sintática, o que dá a essa categoria um caráter

importante no estudo do funcionamento da língua na mente. A dissertação que aqui

se apresenta considerará para a perífrase “estar” + gerúndio a expressão dos traços

aspectuais [+ durativo] e [+ iterativo] e investigará a possibilidade de interseção

desses traços.

1.3. SOBRE O LUGAR DA VARIAÇÃO LINGUÍSTICA

A Gramática Gerativa é uma teoria que advoga a favor do universalismo, ou

seja, para essa teoria as línguas humanas são mais semelhantes do que diferentes. No

entanto, é possível falar de variação em uma teoria como a da Gramática Gerativa?

      

(21)

A variação linguística que aqui trataremos se refere à expressão aspectual da

perífrase “estar” + gerúndio na variedade carioca do português do Brasil e na

variedade da Cidade do México do espanhol do México. Queremos observar quais os

contextos nas sentenças com essa perífrase que propiciam o aspecto ora durativo e ora

iterativo. E acreditamos que a teoria gerativa nos dará a base teórica para tal, como

veremos a seguir.

Segundo Menegotto (2003), é no final da década de 60 que surge o real

conflito entre a teoria gerativa e os estudos da variação. O modelo gerativo elaborado

a partir de “Estruturas Sintáticas” (1957) e “Aspectos da Teoria da Sintaxe” (1965)

descrevia adequadamente a existência de diferentes estruturas. Entretanto, tal modelo

não explicava o porquê da existência dessas diferenças e o porquê de alguns casos

obedecerem a uma regra e outros casos obedecerem à outra. Como vimos anteriormente, a evidente falta de adequação explicativa do modelo gerativo standard

nas suas diferentes versões exigiu que se restringissem os sistemas de regras e

transformações. Foi, então, com a teoria de Princípios e Parâmetros (P&P) que

começou a haver algum equilíbrio entre os estudos da variação e a gramática gerativa.

Nessa teoria de P&P, Chomsky sugere que a GU é um conjunto de princípios

muito gerais, em que alguns princípios serão parametrizados, ou seja, sujeito a um

certo grau de variação. Os parâmetros, então, são alternativas concretas oferecidas à

GU e que vão permitir que, ao atuar com o meio, a criança que está adquirindo a

língua selecione automaticamente as opções pertinentes para a língua a que está

exposta. Com isso, podemos dizer que, nessa teoria, a variação linguística é entendida

como uma variação interlinguística, ou seja, entre as diferentes línguas humanas,

como consequência da existência de diferenças entre as diferentes línguas I7. Logo,

graças a esses parâmetros, a GU dá a possibilidade de que adquiramos qualquer língua

humana. Dessa forma, enquanto os princípios explicarão aquilo que todas as línguas

têm em comum, os parâmetros explicarão em que aspectos essas línguas diferem.

Na teoria de Regência e Ligação (1981), que dá origem à teoria de P&P,

Chomsky (1981) já apresenta um modelo mais restritivo que os anteriores, posto que

os sistemas de regras e princípios propostos se relacionam e cooperam para permitir

um número mínimo de representações linguísticas. Nesse sentido, a teoria de

      

7 A língua I é o objeto de estudo da gramática gerativa. É um conceito individual e interno à mente, ou

(22)

Regência e Ligação tem mais força explicativa que os modelos anteriores, porque se

assumimos que essas regras e princípios se encontram na etapa inicial da

aprendizagem linguística, podemos dar conta do fato de que uma criança desenvolve

um sistema tão complexo como sua gramática em condições não muito favoráveis

para o aprendizado em um tempo bastante curto.

Com relação à variação na teoria da Regência e Ligação (1981), os

parâmetros são apenas sintáticos, ou seja, a possibilidade de que a língua I de

diferentes falantes fosse diferente entre si é uma propriedade constitutiva do sistema

computacional. A preocupação pela identificação e a caracterização precisa de cada

parâmetro proposto levou cada vez mais à comparação de variedades próximas, com a

expectativa de encontrar duas variedades que se diferenciassem em apenas um

parâmetro. Esses estudos de variação, em geral, segundo Menegotto (2003), têm o objetivo de demonstrar se é válido ou inválido um determinado parâmetro, ou

confirmar uma certa reformulação da teoria geral. Quer dizer, esses estudos têm um

objetivo estritamente teórico de identificar com precisão um conjunto de fenômenos

sintáticos associados, de tal maneira que, se na língua existe um desses fenômenos,

necessariamente devem aparecer outros.

Também de acordo com Menegotto (2003), a mudança da teoria de Regência e

Ligação para o modelo do PM resultou em uma grande mudança com relação ao lugar

da variação na teoria gerativa. Se aceitarmos a hipótese de que o sistema

conceptual-intencional é também comum à espécie humana, a consequência imediata é que a

representação na Forma Lógica deve ser idêntica em todas as línguas. Ou então, se as

representações na Forma Fonética fossem universalmente idênticas, não haveria

diferenças evidentes entre as línguas. Assim, segundo Chomsky (1995), uma fonte

importante de origem da variação interlinguística será encontrada na forma fonética.

A outra fonte de variação linguística é o léxico. Chomsky (1999 apud

Menegotto 2003), já inserido no PM, afirma que estão na GU os princípios invariáveis

do S0 (o estado inicial) e a gama de variação possível. Para ele, a variação tem que ser

determinada a partir dos dados linguísticos primários adquiridos pela criança. Dessa

forma, é esperado que se encontre certo grau de variação no componente da Forma

Fonética e em alguns aspectos do léxico, como na flexão e no parâmetro do núcleo,

por exemplo. A variação na sintaxe explícita ou no componente da forma lógica, segundo Chomsky, seria mais problemática, posto que a evidência só pode ser muito

(23)

Forma Fonética e das partes não substantivas do léxico e das propriedades gerais dos

elementos léxicos. Concluímos, então, que só há um sistema computacional e um

léxico, que possui um número limitado de variedades.

E onde estariam as possíveis diferenças na expressão aspectual iterativa em

sentenças com a perífrase “estar” + gerúndio entre as variedades do português do

Brasil e do espanhol do México? Como já sabemos que a forma de expressar a

categoria do Aspecto é a mesma em português e em espanhol, havendo diferenças,

essas seriam apenas de caráter composicional, como o fato do tipo de verbo

influenciar em uma língua e na outra não. Essa variação, então, pensando na

afirmação de Chomsky (1999 apud Menegotto 2003), possivelmente estaria dentro

das propriedades gerais do léxico.

Ainda assim, por mais que haja variação entre as línguas, Chomsky (1986) afirma que há mais semelhanças do que diferenças entre elas. Segundo ele, se um

cientista marciano viesse ao nosso planeta e porventura observasse a nossa forma de

comunicação, estaria certo de que só haveria uma linguagem humana e que as

diferenças seriam apenas marginais, como no léxico, por exemplo. Estudos

gerativistas, a partir da segunda metade do século XX, têm realizado comparações

entre as línguas e observado componentes invariáveis entre todas as línguas. Mas os

estudos sobre suas diferenças nunca perderam seu verdadeiro espaço.

Finalmente, podemos dizer que a existência de variação interlinguística é

consequência direta das propriedades da GU. Segundo Menegotto (2003), a variação

interlinguística dentro do PM propõe que as diferenças paramétricas entre as línguas I

são o resultado da presença ou da ausência de traços formais nas peças léxicas:

particularmente, de traços paramétricos ativos ou inertes que podem, por sua vez,

serem marcados ou não, ou seja, que a existência de variação interlinguística é uma

consequência de propriedades formais da gramática universal. Com isso, esta

dissertação tentará verificar que traços estão envolvidos na possível variação da

expressão aspectual iterativa das variedades do português do Brasil e do espanhol do

(24)

CAPÍTULO 2

O ASPECTO

Neste capítulo, apresentaremos o tratamento dado ao aspecto pelos autores

mais relevantes para o estudo que aqui se apresenta, que é o caso de Comrie (1976),

Vendler (1967), De Miguel (1999) e Castilho (1968). Além disso, trataremos do tema

da composicionalidade aspectual, através dos estudos de Verkuyl (2003), que dará a

base para o entendimento do processo de análise dos dados.

2.1. A CATEGORIA DO ASPECTO

2.1.1. COMRIE (1976)

O trabalho de Comrie (1976) é um dos mais citados quando o tema é aspecto.

Segundo este autor, o aspecto se define em função dos diferentes modos de observar a

constituição temporal interna de uma situação. O aspecto se opõe à noção de tempo

externo, que está relacionada à noção de Tempo, uma categoria dêitica. Ou seja, para

esse autor, o Tempo (do inglês, tense) é uma categoria que marca nas línguas a posição que os fatos referidos ocupam no tempo físico e que toma como ponto de

partida, por exemplo, o ponto dêitico da enunciação.

Embora tempo e aspecto representem conceitos diferentes, muitas vezes eles

são representados em um mesmo morfema verbal nas línguas. Por exemplo, os verbos

do português conjugados no Pretérito Imperfeito representam no mesmo morfema

verbal as categorias de tempo e de aspecto. No caso da palavra “andava”, percebe-se

que a desinência “-va” acumula os valores de passado e de imperfectivo, um dos

aspectos das línguas que será discutido mais adiante.

Entretanto, nem toda a expressão aspectual manifestada nos verbos apresenta o

tempo e o aspecto no mesmo morfema. Uma das manifestações aspectuais presente

nas línguas é a que indica que uma ação está em andamento no momento do ato da

fala. No caso do português do Brasil, essa manifestação aspectual é comumente

representada pela perífrase formada pelo verbo auxiliar “estar” mais o verbo principal

no gerúndio. Por exemplo, na sentença “Alice está escrevendo uma carta”, o tempo

(25)

claramente representado no verbo principal, que está no gerúndio.

Além do aspecto gramatical, Comrie (1976) trata do aspecto semântico ou

lexical, que, para a literatura atual, refere-se às propriedades aspectuais inerentes às

raízes verbais e a outros itens lexicais empregados pelo enunciador para descrever

uma dada situação. As distinções aspectuais relativas a essa categoria não seriam

codificadas por meio de marcas gramaticais visíveis. Para tanto, Vendler (1967)

organiza um modelo de categorias verbais levando em consideração certos traços

semânticos inerentes às raízes dos verbos. Tal estudo é bastante importante para esta

dissertação e será explicado com detalhes mais abaixo.

Em seu estudo sobre o aspecto, Comrie (1976) afirma haver dois aspectos

básicos nas línguas, o aspecto perfectivo e o imperfectivo. O aspecto perfectivo trata a

situação ou evento como um todo, completo. E o aspecto imperfectivo se refere essencialmente à estrutura interna de uma situação, vendo-a de dentro. Essa oposição

é gramaticalizada em diversas línguas, como por exemplo, no português e no

espanhol. Ao observarmos os exemplos “Vitor estava lendo um livro” e “Vitor leu um

livro”, percebemos que ambas as sentenças referem-se ao passado. Contudo, há uma

diferença no modo como a constituição interna da situação é vista, ou seja, há uma

diferença aspectual entre elas. Enquanto na primeira o aspecto é imperfectivo, na

segunda é perfectivo.

O autor também propõe uma subdivisão para o aspecto imperfectivo em dois

conceitos distintos: habitual e contínuo/durativo. O primeiro refere-se a uma situação

que ocorre habitualmente num determinado período de tempo de maneira não

acidental, como na primeira oração do exemplo: “Vitor fazia comida todos os dias”. O

segundo representa uma ação em andamento, em progresso, durante determinado

período de tempo, como na oração do exemplo: “Vitor estava fazendo comida quando

tocou o telefone.” Nesses últimos exemplos, temos o que Comrie (1976) denomina de

“aspecto gramatical”, ou seja, a distinção aspectual é expressa pela morfologia verbal,

através do morfema “–ia” (imperfectivo habitual) e da perífrase “estar” + gerúndio

(imperfectivo contínuo).

Com relação às ações contínuas ou durativas, o autor afirma que são aquelas

descritas como em andamento em determinado período de tempo. O autor propõe

ainda que o imperfectivo durativo se subdivida em progressivo, como é expresso pelo verbo “jogar” em “Todas as tardes, quando Vitor chegava a casa, as crianças estavam

(26)

“jogar” em “Todas as tardes, quando Vitor chegava a casa, as crianças jogavam no

computador”. Além disso, Comrie (1976) destaca que uma definição geral de

progressividade pode ser mais bem entendida como uma combinação de sentido

progressivo e não estativo, uma vez que as características de um verbo de estado

seriam incompatíveis com a noção de progressividade, já que a ideia fornecida por um

verbo estático é incompatível com o caráter essencialmente dinâmico do progressivo.

Entretanto, o autor acrescenta que cada língua tem suas próprias regras de quais

verbos podem aparecer na forma progressiva.

Quanto ao imperfectivo habitual, Comrie (1976) explica que o que é comum a

todas as ações habituais é o fato delas serem características de um determinado

período de tempo, de modo que elas não sejam vistas como acidentais. O autor chama

a atenção para que não sejam igualados os conceitos de habitualidade e iteratividade, ocorrência sucessiva de uma mesma situação, pois uma ação habitual não é

necessariamente iterativa. Sentenças com a expressão “used to” do inglês são

utilizadas pelo autor como exemplos típicos de ações habituais: “Jones used to live in

Patagonia” (Jones morava na Patagonia). Entretanto, Comrie (1976) não deixa claro

se a iteratividade seria um aspecto ou se estaria dentro do aspecto imperfectivo como

a habitualidade ou até mesmo se estaria dentro da habitualidade. O autor só quer

esclarecer que a habitualidade e a iteratividade são conceitos diferentes, embora

apresentem traços semelhantes.

Além dos aspectos perfectivo e imperfectivo, Comrie (1976) propõe um

terceiro aspecto, o aspecto perfeito (perfect). O autor também não esclarece se esse

faz parte de um dos aspectos básicos definidos por ele anteriormente. Mas define o

aspecto perfeito como o que estabelece uma relação entre dois pontos do tempo: o

tempo do estado resultante da situação e o tempo da situação. Segundo esse autor, o

aspecto perfeito é expresso pelo pretérito perfeito composto, tanto no português

(tenho estudado) quanto no espanhol (he estudiado).

É interessante notar que estudos do português, como o de Travaglia (2006),

afirmam que a perífrase “ter” + particípio (tenho estudado) expressa canonicamente o

aspecto iterativo, o que nos faz relacionar o aspecto perfeito com o iterativo,

observando uma possibilidade de interseção de traços entre esses aspectos. Já que o

iterativo, além de representar um evento escalonado, também representa um evento que começou no passado, mas que continua tendo relevância no presente, assim como

(27)

progressivo, pois, para essa autora, ambos representam um prolongamento da ação.

Acreditamos que essas relações ocorrem porque esses aspectos, no caso o

progressivo, o iterativo e o perfeito, possuem traços semelhantes devido à relação que

há entre eles e o aspecto imperfectivo. Embora Comrie (1976) não esclareça essa

relação, a não ser a do progressivo como subtipo do imperfectivo, observamos que ela

é bastante possível para o português e o espanhol. Por isso, propomos, nesta

dissertação, que os aspectos perfeito e iterativo, assim como o progressivo, também

estão inseridos dentro do aspecto imperfectivo.

Seguindo com o trabalho de Comrie (1976), esse ainda descreve algumas

distinções aspectuais relacionadas a determinados tempos verbais e afirma que o

tempo que mais frequentemente apresenta distinções aspectuais é o tempo passado.

Além disso, ele sugere que o presente, por ser um tempo essencialmente descritivo, normalmente carrega um significado imperfectivo. Vejamos abaixo o diagrama das

oposições aspectuais segundo Comrie:

Figura 1: Quadro aspectual de Comrie (1976, p. 25)

Nesta dissertação, investigamos o imperfectivo progressivo com o auxiliar

(28)

iterativo. Como observamos anteriormente, o autor não deixa claro o status aspectual

do iterativo. Embora o relacione com o habitual, Comrie (1976) não considera a

diferença estabelecida entre habitual e progressivo como uma distinção aspectual

básica nas línguas, posto que habitual e progressivo seriam subdivisões do aspecto

imperfectivo. Entretanto, neste estudo, o progressivo, o habitual e o iterativo serão

tratados como aspectos verbais. Além disso, seguindo Martins (2006), utilizaremos o

termo progressivo, ao invés do termo contínuo, pelo fato dos verbos investigados

terem sentido não-estático. E, conforme discutido anteriormente, segundo Comrie

(1976), uma ação contínua expressa por verbos não-estáticos caracteriza o valor

progressivo dos verbos nas línguas.

A seguir trataremos do trabalho de Vendler (1967), que apresenta uma

tipologia verbal interessante e coerente, que organiza um modelo de categorias verbais levando em consideração certos traços semânticos inerentes às raízes dos

verbos. Esta tipologia verbal de Vendler (1967) é bastante usada nos estudos

linguísticos mais recentes e também será adotada nesta dissertação.

2.1.3. VENDLER (1967)

Vendler (1967) baseia seu estudo no comportamento dos verbos dentro de

certos tempos cronológicos e considera o verbo um lexema atemporal. Segundo o

autor, sua classificação traz de forma sistemática uma discussão iniciada, na

antiguidade, por Aristóteles e retoma os trabalhos de outros pesquisadores como Ryle

e Kenny (apud Vendler 1967).

Sua classificação separa os verbos em quatro categorias, de acordo com o tipo

de situação que expressam: states – estados pois expressam uma propriedade

inalienável do sujeito e fatos não modificáveis (como “acreditar”, “amar”, “querer”),

activities – atividades, pois descrevem um processo que envolve algum tipo de

atividade mental ou física (como “caminhar”, “correr”, “nadar”), accomplishments

processos culminados, pois informam sobre uma duração intrínseca com estágios

sucessivos (como “ler um livro”, “construir uma casa”, “fazer um bolo”) e

achievements – culminações, pois se referem a eventos instantâneos apresentando o começo ou o clímax do evento (como “cair”, “começar”, “encontrar”).

(29)

próprio Vendler (1967) reconhece que a diferença entre uma e outra classe de verbos

não pode ser explicada em termos somente de tempo (presente, passado e futuro).

Pois, de acordo com o autor, há outros fatores importantes a serem considerados,

como a presença ou ausência de objeto, condições e estados de coisas pretendidos. Ou

seja, é necessário observar as especificidades de outros elementos envolvidos no

predicado, ou, em outras palavras, no nível da sentença. Além disso, sua classificação

envolve a detecção de um esquema temporal que se baseia em três oposições que

permitem definir cada tipo de aspecto como um conjunto de traços:

1- A dinamicidade que opõe os estados ([ - dinâmico]) aos demais tipos ([ +

dinâmico]);

2- O fato de ser pontual que opõe a culminação ([ + pontual ]) aos demais ([ -

pontual], ou seja, durativo);

3- A telicidade que opõe processos culminados e culminações ([ + télico]) às

atividades e estados ([- télico]).

E o que seria essa telicidade? Uma situação é télica se existe um final inerente

à mesma, que deve ser alcançado para que se possa dizer que tal situação aconteceu

(como em “Escreveu um livro”). E uma situação é atélica quando não possui um fim

inerente, tem lugar desde o momento que começa e a partir daí pode prolongar-se

indefinidamente ( como em “Ele escreveu livros”).

Com isso, podemos dizer que os verbos de atividade são aqueles que

descrevem processos dinâmicos, durativos e atélicos, ou seja, o final da ação não é

intrínseco ao verbo, e a ação, em si, tem duração temporal indefinida; a atividade não

envolve culminância ou resultado antecipado e são homogêneos. Em outras palavras,

se um VP8 atividade é verdadeiro para um determinado intervalo de tempo, será

verdadeiro para qualquer um dos subintervalos desse intervalo. Numa frase como

“Alice cozinhou o dia todo”, a existência de pequenos lapsos de tempo em que ela não

cozinhou não impede a leitura de cozinhar como um processo.

Com relação aos verbos de estado, podemos afirmar que ocorrem ao longo da

linha do tempo e sem um ponto final, não são considerados ação, não constituem

mudanças e também são homogêneos como os de atividade. O que quer dizer que, no

exemplo “João ama Alice”, em qualquer subdivisão temporal possível dessa oração,

(30)

será verdade que João ama Alice, ou seja, A amou B durante um intervalo de tempo I,

significa que em qualquer subintervalo de I, A amou B.

Os verbos cujo aspecto lexical é de processo culminado são verbos com

duração intrínseca, com estágios sucessivos e um ponto de culminância, que

representa a finalização do processo com uma mudança de estado, como por exemplo:

“Alice cozinhou um bolo”. Se A cozinhou um bolo em um intervalo de tempo I,

existe um subintervalo I em que A começou a cozinhar o bolo e existe um

subintervalo I que é o momento exato em que A terminou de cozinhar o bolo.

Enquanto os verbos de culminação são os que descrevem eventos instantâneos, não

possuem estágios e são heterogêneos, o que quer dizer que o valor de verdade de sua

totalidade não pode se estender para suas partes. Opõem-se aos de processo

culminado por referirem-se ao fim da ação e não ao processo inteiro, como no exemplo: “Alice caiu”.

Em relação aos verbos de atividade e aos de processo culminado, observamos

que ambos têm traços muito próximos ([+ durativo] e [+ dinâmico]) e se diferenciam

apenas pela telicidade. Dessa forma, um verbo de atividade pode se tornar facilmente

de processo culminado, a partir do uso de um complemento. Isso quer dizer que a

atividade de “pintar” pode se transformar em um processo culminado uma vez que se

estabeleça uma faixa limítrofe ou uma meta a partir da inserção de um complemento,

como em “pintar um quadro”.

Como observamos acima, algumas características são compartilhadas por

essas categorias. Uma das distinções que o autor fez foi separar os verbos do tipo

atividade e processo culminado como pertencentes a um gênero e os do tipo estado e

culminação pertencentes a outro. O critério usado para isso foi o fato de, segundo ele,

os verbos do tipo estado, assim como os do tipo culminação, não assumirem o

progressivo. Mas esse é um critério que, se aplicado ao português ou ao espanhol, por

exemplo, não funciona. Pois, verbos do tipo estado como “ser”, “estar” e outros, nas

diferentes línguas românicas, admitem o progressivo, como vemos nos exemplos em

(10) e o mesmo ocorre com os verbos do tipo culminação, como vemos em (11).

(10) a. Alice está querendo comer um doce.

(31)

d. Juan está odiando la idea de ir a la fiesta.9

(11) a. Chame os bombeiros que o prédio está caindo.

b. Alice está resolvendo um problema.

c. Maria está empezando a caminar.

d. Los jóvenes están descubriendo la libertad.10

O que acontece, na verdade, e que já foi apontado por Comrie (1976 apud

Gabardo 2001), é que tanto os verbos do tipo estado como os verbos do tipo

culminação, nessas situações, assumem a função do verbo do tipo atividade, no

sentido que a ação se torna um evento iterativo. O que confirma o que De Miguel

(1999) propõe e que será apresentado mais abixo, de que, se um verbo estativo apresenta uma leitura dinâmica, não homogênea, poderá apresentar-se na forma

progressiva, sem estranheza de sentido. E, dependendo da presença de determinados

modificadores adverbiais, poderá sim apresentar uma leitura aspectual iterativa.

Nesta dissertação, consideramos que, para haver a expressão do aspecto

iterativo em sentenças com “estar” + gerúndio, é necessário mais do que um

determinado tipo de verbo na forma do progressivo. Consideramos o aspecto iterativo

como a representação de um evento com escalonamento no decorrer do tempo, com a

possibilidade de serem inseridos adjuntos de frequência como “repetidas vezes” e

“frequentemente”.

2.1.2. DE MIGUEL (1999)

Outro importante estudo sobre o aspecto é o de De Miguel (1999). A autora

trata o aspecto a partir de seu caráter composicional. Na distinção entre tempo e

aspecto, De Miguel (1999) afirma que tanto tempo quanto aspecto são noções

relacionadas à temporalidade dos eventos verbais. Para a autora, o tempo localizaria o

evento em um tempo externo, orientando-o em relação ao momento de fala, ou seja,       

9 (10) c. A cada dia Alice está gostando mais de Juan.

d. João está odiando a ideia de ir a festa.

10

(11) c. Maria está começando a caminhar. d. Os jovens estão descobrindo a liberdade.  

(32)

marcando se o evento ocorreu antes do momento da enunciação (passado), se ocorre

naquele momento (presente) ou se ainda ocorrerá (futuro). O tempo seria, portanto,

uma categoria dêitica. Já o aspecto trataria essa temporalidade como uma propriedade

inerente ou interna do próprio evento, sem fazer referência ao momento da fala. Com

isso, o aspecto seria, então, definido como uma categoria não dêitica, uma vez que

nele há uma visão do evento como um todo, sem fazer referência ao momento da

enunciação.

Em seu trabalho, De Miguel (1999) apresenta o aspecto léxico e o aspecto

flexivo. Segundo a autora, o aspecto léxico, de forma geral, se refere à informação

aspectual contida nas unidades léxicas que constituem os predicados, como sujeito,

complementos e outros elementos como modificadores adverbias e etc., ou seja, é um

aspecto que possui uma natureza composicional. Já o aspecto flexivo se refere à informação relativa ao modo em que tem lugar um evento que vem proporcionado

pelos morfemas flexivos do verbo. Esses aspectos podem ser comparados ao aspecto

gramatical e ao aspecto flexivo de Comrie (1976) que vimos acima.

Para De Miguel (1999) os significados aspectuais podem ser expressos no

interior do verbo ou em estruturas mais amplas, enumerando os diferentes elementos

que influenciam na especificação aspectual de um predicado. O primeiro elemento

que a autora cita é a raiz verbal, pois defende que os diferentes significados aspectuais

podem ser trazidos pelo verbo, mais especificamente pela raiz verbal. Exemplifica

mostrando verbos que expressam eventos que não mudam (como “odiar” e “saber”,

por exemplo), que depois dará o nome de estativos. Apresenta verbos que trazem a

ideia de eventos que acabam (como por exemplo “nascer” e “morrer”), que poderão

ser do tipo processo culminado ou culminação. E apresenta também, entre outros,

verbos que não acabam (como “andar” e “viajar”, por exemplo), que podem ser

considerados verbos de atividade.

O segundo elemento citado pela autora que poderá influenciar na

especificação aspectual de um predicado seria o afixo derivativo. A autora

exemplifica com o prefixo re-, que estaria dotado de um valor intensificador. Quando

utilizado com um verbo que indica um evento delimitado, esse prefixo admite

repetição, dando ao verbo um valor iterativo, portanto “reconstruir” é voltar a

construir. Entretanto, quando o verbo indica um evento não delimitado, o valor que acrescenta é o intensivo, sendo assim “reter” não indicaria a repetição da ação, e sim

(33)

certos verbos delimitados como “cortar” ou “matar” com os quais o prefixo “re-”

apenas traria o valor intensivo. Isso se daria devido ao fato de que os objetos desses

tipos de verbos deixam de existir uma vez que o evento acaba, sendo assim a ação não

poderia ser feita da mesma forma sobre o mesmo objeto (não se pode matar alguém

pela segunda vez - “rematar”).

O terceiro elemento que influencia na especificação aspectual de um predicado

no espanhol, segundo a autora, é o “se” (me, te...) delimitador. Esse “se” traz uma

marca aspectual que informa a delimitação de um evento. Segundo ela, o “se”

aparecerá com verbo que marque que o evento tem um limite, um fim e esse pronome

só poderá aparecer se o verbo tiver um complemento direto. Observe os exemplos que

a autora utiliza (p.2995):

(1) a. Juan (*se) come normalmente en este bar.

b. Juan (*se) come tortilla siempre que puede.

c. Juan #(se) comió una tortilla él solo11.

Para De Miguel (1999), apenas será possível utilizar o “se” na sentença (1c),

uma vez que o complemento “una tortilla” traz um limite para o evento. Embora nessa

sentença o uso de “se” não seja obrigatório, ele reforça a ideia de limite do evento.

Outro uso do “se”, dado pela autora, é com verbos inacusativos, entretanto ainda será

necessário que haja alguma delimitação do evento para que esse pronome possa ser

utilizado. Nesses casos, o que trará essa delimitação será um sintagma que marque

explícita ou implicitamente o início do evento, ou seja, com verbos inacusativos, o

“se” também traz uma marca aspectual de limite, embora seja um limite inicial. Em

El libro #(se) ha caído del estante12”, o sintagma preposicional “del estante” marca o

ponto de partida do evento, sendo assim é permitido o uso do “se”, ao contrário do

que ocorre em “La lluvia (*se) cae”13. No entanto, se pensamos no português,

verificamos que todos os usos de “se” acima seriam impossíveis nessa língua. O que

nos leva a crer que esse critério não seria válido para o português.

       11 

(1) a. Juan (*se) come normalmente neste bar. b. Juan (*se) como omelete sempre que pode. c. Juan #(se) comeu um omelete ele sozinho. Essa sentença em português é agramatical. 12 

Imagem

Figura 1: Quadro aspectual de Comrie (1976, p. 25)
Figura 2: Manifestação da aspectualidade em espanhol de De Miguel (1999, p. 2993)
Figura 3: Modelo semântico para o aspecto de Castilho (1984 apud Sousa 1998, p. 53)
Figura 4: Quadro aspectual do Português segundo Travaglia (2006, p. 76)
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