Superior Tribunal de Justiça
MEDIDA CAUTELAR Nº 25.024 - SP (2015/0258023-1)
RELATOR : MINISTRO MARCO AURÉLIO BELLIZZE REQUERENTE : ALISSON VASCONCELOS
ADVOGADO : MATHEUS BORTOLETTO RADDI - DEFENSOR PÚBLICO REQUERIDO : BANCO FIBRA S/A
EMENTA
MEDIDA CAUTELAR VISANDO A ATRIBUIÇÃO DE EFEITO SUSPENSIVO A RECURSO ESPECIAL AINDA PENDENTE DE JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE. SÚMULAS 634 E 635/STF. AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO. APLICAÇÃO DA TEORIA DO ADIMPLEMENTO SUBSTANCIAL. EXISTÊNCIA DE FUNDAMENTO NÃO ATACADO DO ACÓRDÃO RECORRIDO. SÚMULA 283/STF. ALEGAÇÃO DE OFENSA AOS ARTS. 421, 422 E 475 DO CÓDIGO CIVIL. FALTA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULAS 282 E 356/STF. PROCESSO EXTINTO SEM JULGAMENTO DO MÉRITO.
DECISÃO
Trata-se de medida cautelar apresentada por Alisson Vasconcelos, com requerimento liminar, visando à atribuição de efeito suspensivo ao recurso especial - ainda pendente de juízo de admissibilidade na origem - interposto contra acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferido nos autos da ação de busca e apreensão proposta por Banco Fibra S.A., assim ementado (e-STJ, fl. 155):
AGRAVO DE INSTRUMENTO - ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA - BUSCA E APREENSÃO - INADIMPLEMENTO COMPROVADO - POSSIBILIDADE DE DEFERIMENTO DA LIMINAR - INAPLICABILIDADE DA TEORIA DO ADIMPLEMENTO SUBSTANCIAL - RECURSO NÃO PROVIDO. Diante da comprovação do inadimplemento das prestações avençadas e da notificação do devedor, configurado está o esbulho possessório, a justificar a concessão de liminar de busca e apreensão. Não se aplica a teoria do adimplemento substancial, vez que o réu teve chance de pagar o débito quando foi notificado, mas não o fez.
Nas razões do apelo excepcional, fundamentado na alínea a do
permissivo constitucional, o ora requerente alega violação dos arts. 421, 422 e 475 do
Código Civil, sustentando, em síntese, que houve o adimplemento substancial do
contrato entabulado entre as partes, tendo em vista que pagou 40 de 48 prestações
de R$ 2.006,74 (dois mil seis reais e setenta e quatro centavos), de modo que o credor
elegeu a via processual inadequada para a satisfação de seu direito creditício, tudo a
conduzir à extinção do processo de busca e apreensão sem resolução do mérito, sob
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pena de se vulnerar os princípios da função social do contrato e da boa-fé objetiva, notadamente se considerado o desequilíbrio econômico-financeiro existente entre as partes.
Afirma, outrossim, "que o credor fiduciário pode (e deve, no específico caso sob análise) se valer de meios menos gravosos para o recebimento de seu crédito, sem que, para isso, alije o devedor fiduciante de seu instrumento de trabalho e meio de subsistência (registra-se, por oportuno, que o recorrente formulou proposta de pagamento das prestações em aberto, através de peticionamento nos autos digitais de 1ª Instância, ainda pendente de manifestação pelo recorrido). (e-STJ, fl. 178)
Pede a concessão de liminar, a fim de suspender o acórdão recorrido, que determinou a busca e apreensão do veículo, para o fim de assegurar que o devedor fiduciante mantenha a posse do objeto até o final julgamento do recurso especial, argumentando, a esse fim, que o fumus boni iuris encontra-se na plausibilidade das alegações deduzidas nas razões do apelo nobre, tendo em vista que o uso desequilibrado do direito de resolução do contrato pelo credor viola os princípios da função social do contrato e da boa-fé objetiva, pilares principiológicos do Código Civil de 2002.
Já o periculum in mora está presente devido ao risco iminente de apreensão do veículo alienado fiduciariamente, privando o devedor de sua utilização como meio de trabalho e de manutenção de sua dignidade existencial, quando poderia o credor fiduciário se valer de meio menos gravoso para a satisfação de seu crédito.
É o relatório.
Busca o requerente, com a presente medida, obter a concessão de efeito suspensivo ao recurso especial, ainda pendente de juízo de admissibilidade, para que seja determinada a suspensão da possível ordem de busca e apreensão do veículo financiado.
Esta Corte, em regra, não tem competência para deferir efeito suspensivo a recurso especial ainda pendente do exame prévio de admissibilidade pelo Tribunal de origem. Nesse sentido o Pretório Excelso editou as Súmulas 634 e 635, que se aplicam, por analogia, ao recurso especial.
É bem verdade que, nesses casos, este Tribunal tem admitido, em
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situações excepcionalíssimas, a concessão de efeito suspensivo ao apelo excepcional a fim de evitar decisões teratológicas, o que não se verifica na hipótese.
De outra parte, em medida cautelar exige-se a demonstração do periculum in mora , consubstanciado na urgência da prestação jurisdicional, assim como a presença do fumus boni juris , consistente na plausibilidade do direito alegado.
No caso, ainda não houve manifestação do Tribunal local quanto ao processamento do recurso, de modo que a questão, por ora, ainda é da competência do Tribunal a quo . É uma questão sob a jurisdição do Estado, não uma questão de jurisdição nacional.
Por sua vez, há que se ressaltar que, na verificação dos pressupostos da medida, é de se ter em conta que o fumus boni iuris “está relacionado intimamente com a presença dos requisitos de admissibilidade do recurso especial e com a possibilidade de sucesso deste, daí que, na cautelar, convém se aprecie, ainda que superficialmente, os requisitos e o mérito do especial.” (AgRg na MC 1.311, rel. Min.
Carlos Alberto Menezes Direito, DJU 13.10.98).
No caso, contudo, tais requisitos não estão demonstrados, como é necessário ao sucesso da medida cautelar – medida excepcional, que, relembre-se, deve apresentar-se com evidência que praticamente pressupõe a teratologia da decisão atacada.
Postas à parte as discussões a respeito da admissibilidade do recurso, tem-se, em análise perfunctória, que ao negar provimento ao agravo de instrumento interposto na origem, confirmando o deferimento da liminar de busca e apreensão, o Colegiado estadual embasou a sua decisão no art. 3º, e parágrafos, do Decreto-Lei n.
911/69, o qual não foi objeto de impugnação específica nas razões do recurso especial, atraindo a incidência da Súmula 283 do Supremo Tribunal Federal, por aplicação analógica.
Ademais, a despeito de suscitada a discussão nas razões do agravo de instrumento, a Corte estadual não enfrentou a matéria controvertida sob o enfoque dos arts. 421, 422 e 475 do Código Civil, indicados violados, ressentindo-se o recurso especial, no ponto, do requisito do prequestionamento (Súmulas 282 e 356/STF).
No que se refere ao tema de fundo, o aresto hostilizado encontra-se
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alinhado com o entendimento desta Corte firmado no REsp n. 1.418.593/MS, julgado sob o rito do art. 543-C do CPC, segundo o qual, "nos contratos firmados na vigência da Lei n. 10.931/2004, compete ao devedor, no prazo de 5 (cinco) dias após a execução da liminar na ação de busca e apreensão, pagar a integralidade da dívida – entendida esta como os valores apresentados e comprovados pelo credor na inicial –, sob pena de consolidação da propriedade do bem móvel objeto de alienação fiduciária" (REsp n. 1.418.593/MS, Relator o Ministro Luis Felipe Salomão, Segunda Seção, DJe de 27/5/2014).
Confiram-se, ainda, os seguintes precedentes:
PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DECLARATÓRIOS. PRINCÍPIO DA FUNGIBILIDADE. AGRAVO REGIMENTAL. AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO. PURGAÇÃO DA MORA. NÃO CABIMENTO.
PAGAMENTO DA INTEGRALIDADE DO DÉBITO. DECRETO-LEI N.
911/1969. REDAÇÃO DA LEI N. 10.931/2004.
1. Admitem-se como agravo regimental embargos de declaração opostos a decisão monocrática proferida pelo relator do feito no Tribunal, em nome dos princípios da economia processual e da fungibilidade.
2. De acordo com o art. 3º do Decreto-Lei n. 911/1969, na redação dada pela Lei n. 10.931/2004, não mais se admite purgação da mora em ação de busca e apreensão, uma vez que, no novo regime, cinco dias após a execução da liminar, a propriedade e posse do bem passam a ser do credor fiduciário.
3. O devedor, nesse prazo, poderá pagar a integralidade do débito remanescente com base nos valores apresentados na inicial, hipótese na qual o bem lhe será restituído livre de ônus.
4. Embargos de declaração recebidos como agravo regimental, ao qual se nega provimento.
(EDcl no REsp n. 1.402.014/RS, Relator o Ministro João Otávio de Noronha, Terceira Turma, DJe de 15/12/2014);
AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO. PURGAÇÃO DA MORA. PAGAMENTO DA INTEGRALIDADE DO DÉBITO.
1. A jurisprudência do STJ possui entendimento assente de que com o advento da Lei n° 10.931/2004, cinco dias após a execução da liminar a propriedade do bem fica consolidada com o credor fiduciário, não havendo que se falar em purgação da mora, pois independentemente de percentual mínimo de adimplemento, o devedor tem que pagar a integralidade do débito remanescente, ou seja, as parcelas vencidas e as vincendas.
2. Agravo regimental a que se nega provimento.
(AgRg no REsp n. 1.446.961/MS, Relatora a Ministra Maria Isabel Gallotti, Quarta Turma, DJe de 2/6/2014).