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OS PROFESSORES E O CINEMA: CONCEPÇÕES, PRÁTICAS CULTURAIS E PEDAGÓGICAS

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Academic year: 2021

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OS PROFESSORES E O CINEMA: CONCEPÇÕES, PRÁTICAS CULTURAIS E PEDAGÓGICAS

AZEVEDO, Ana Lúcia /UFMG DIAS, Marília Souza/UFMG

Resumo

O estudo aqui apresentado é parte de uma investigação mais ampla, intitulada “Enredos da vida, telas da docência: os professores e o cinema”, realizada mediante apoio de Edital Universal do CNPQ (2011/2013), sob responsabilidade de uma equipe de pesquisadores de seis universidades brasileiras - da Bahia, Minas Gerais e Rio Grande do Sul. Entende-se que a investigação das práticas docentes com cinema contidas neste trabalho, constitui e concretiza o trabalho docente no dia a dia das salas de aula, sendo este um tema relevante, necessário e pertinente para o campo da educação e da docência. Nesse artigo apresentaremos reflexões realizadas em Minas Gerais e Rio Grande do Sul, pela riqueza de suas análises. Quanto às conclusões do estudo, o texto discorre sobre as descobertas e reflexões que resultaram do levantamento empírico relativas aos motivos, às finalidades, aos significados e às metodologias implementadas pelos docentes para a realização das atividades com cinema na sala de aula e na escola.

Analisam-se, ainda, os fatores que dificultam ou impedem a realização de práticas pedagógicas com cinema na perspectiva dos professores investigados. Completando o estudo são apresentadas descobertas que procuram apreender os sentidos que aqueles professores atribuem ao próprio trabalho docente, suas dimensões simbólicas, bem como as tensões, as alegrias e dores, as emoções e sentimentos nele implicados.

Pensamos, enfim, diante do que nos contam as docentes sobre a formação ético-moral por meio dos filmes, que talvez essa prática pudesse ser mais enriquecedora se o cinema fosse trazido para escola como um “elemento perturbador” tanto de referências estéticas, quanto de visões de mundo em geral, ou seja, se as atividades com cinema fossem a porta pela qual entrassem também na escola novos sujeitos e novas ou diferentes formas de perceber o que nos rodeia.

Palavras-chave: Educação; Cinema; Práticas pedagógicas.

Partindo de indagações relativas ao trabalho docente e procurando nele

compreender as práticas pedagógicas dos professores em sala de aula e na escola, o

estudo formula indagações acerca da presença ou ausência do cinema nesses territórios,

palcos das relações, encontros e desencontros dos professores com as crianças,

adolescentes, jovens e adultos. No caso da presença desta arte na sala de aula e na

escola, trazida pelas mãos dos professores, o estudo interroga as formas como eles e elas

entendem e trabalham com cinema em seu ofício, procurando analisar suas concepções,

seus propósitos, suas metodologias, suas dificuldades relativas à realização de

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atividades com cinema na docência. Nos casos da não utilização do cinema pelos professores em suas práticas, procura-se identificar e analisar as razões desta ausência e os fatores ou circunstâncias que lhes dão origem.

Quanto às conclusões do estudo, o texto discorre sobre as descobertas e reflexões que resultaram do levantamento empírico relativas aos motivos, às finalidades, aos significados e às metodologias implementadas pelos docentes para a realização das atividades com cinema na sala de aula e na escola. Analisam-se, ainda, os fatores que dificultam ou impedem a realização de práticas pedagógicas com cinema na perspectiva dos professores investigados. Completando o estudo realizado são apresentadas descobertas que procuram apreender os sentidos que aqueles professores atribuem ao próprio trabalho docente, qual seja, suas dimensões simbólicas, bem como as tensões, as alegrias e dores, as emoções e sentimentos nele implicados.

Entende-se que a investigação das práticas docentes com cinema contidas neste trabalho, constitui e concretiza o trabalho docente no dia a dia das salas de aula, sendo este um tema relevante, necessário e pertinente para o campo da educação e da docência. Tanto pelo que pode aportar de conhecimentos que contribuam para a expansão e consolidação da pesquisa educacional no Brasil, quanto pelas contribuições que poderá oferecer à melhoria da educação básica no país. Nesse artigo apresentaremos reflexões realizadas em Minas Gerais e Rio Grande do Sul, pela riqueza de suas análises.

Panorama geral da relação dos professores com o cinema em Santa Maria-RS Numa análise dos questionários respondidos pelos professores de escolas públicas de Santa Maria, primeiramente se buscou saber o perfil dos professores, para saber quem são esses sujeitos. A segunda parte dos questionários foi composta por várias perguntas que buscavam abarcar significações dos professores com o cinema, dessa forma foram analisadas tais perguntas, fechadas e abertas: Você costuma assistir filmes?

Com que frequência você assiste filmes? Onde costuma assistir filmes? Com quem você costuma assistir filmes? Você utiliza filmes em seu trabalho como professor? Por quê?

Qual a importância do cinema na vida do professor? Por quê? Você faria uma formação relacionada ao cinema?

Por meio dos questionários, propomos-nos relatar o panorama geral da relação

dos professores com o cinema e fazendo um levantamento geral podemos observar que

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foram respondidos 645 questionários dos 1.500 enviados as escolas. Concluímos que a maioria são professoras entre 31 e 40 anos, casadas, possuem regime de trabalho de 40 horas, não possuem outra atuação profissional, gostam de ler, viajar, passear, acessar a internet, assistir televisão e assistir filmes nas horas livres. Esse foi o perfil dos professores das escolas municipais de Santa Maria que responderam os questionários, e a partir deste contorno que tivemos a oportunidade de nessa primeira parte da pesquisa ter ideia do público envolvido, bem como, saber o que eles gostam de fazer no tempo livre.

A segunda parte do questionário contemplou a relação do professor com o cinema.

O professor-sujeito-pessoa está interligado não podendo ser separado, desta forma, pensando a partir do questionamento voltado para o cinema e vida do professor, tentamos saber como o professor percebe essa relação e se realmente o cinema faz parte da vida e da profissão dele. Ao perguntarmos se costumam assistir filmes, 85%

responderam que sim, 14% não costumam e 1% não responderam. Também nos interessou saber a frequência que esses professores assistem filmes, então obtivemos 36% das respostas afirmando que assistem 2 vezes por semana ou mais, 27% costumam assistir filmes 1 vez por semana, 19% assistem raramente que significa menos que uma vez por mês, 10% assistem 2 vezes por mês e 8% assistem uma vez por mês.

Foi possível observar que os professores costumam assistir filmes em sua grande maioria e o fazem com frequência, sendo este um resultado que nos motivou a continuar a pesquisa, pois não teria sentido dar seguimento se os professores não tivessem o cinema em suas vidas.

Consideramos relevante saber o local e com quem os professores assistem aos filmes, para saber se o meio pessoal ou profissional prevaleceria e visualizamos que quase a totalidade dos professores assiste em casa representando 94%, mas também assistem em cinemas e no trabalho, juntos representam 6%. A maioria dos professores assiste em companhia dos familiares, significando 56%, seguido dos amigos e colegas de trabalho somando juntos 13%, mas também os que assistem sozinhos representam uma porcentagem significativa de 31%. Constatamos que os professores assistem filmes tanto em casa como no trabalho, estando na sua vida pessoal e profissional.

Chama-nos a atenção de que os professores não costumam assistir filmes em

cineclubes, justamente num local que exibe os filmes gratuitamente, não comerciais e

que buscam produzir um pensamento crítico possibilitado pelo filme e pela riqueza do

debate que há em torno da temática desenvolvida, diferente daqueles com intuito

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comercial. Assim, ficamos intrigados para saber a causa dos professores não frequentarem cineclubes, sendo que nossa cidade possui várias opções.

Em âmbito profissional perguntamos se os professores utilizavam os filmes em seu trabalho, então 91% disseram que sim, 5% não utilizam e 4% não responderam esta pergunta. Seguindo foi levantado 57% utilizam os filmes como um recurso didático, 28% não especificaram, 8% não utilizam, pois concebem que o cinema é uma forma de lazer e 7% não especificaram. Dessa forma percebemos que mesmo o cinema estando presente na vida e na profissão do professor, o filme é visto apenas como um recurso didático que ilustra conteúdos, como um apoio nas aulas, não utilizando todo o potencial cultural e formativo para o ser humano.

“Para dar ênfase aos resultados, selecionamos algumas formas de como o professor utiliza os filmes em seu local de trabalho e as repostas foram as seguintes:

“integrando-o ao que está sendo trabalhado” “quase sempre com o tema estudado em aula”,” adequando o conteúdo e nível dos alunos”,” de acordo com o tema de estudo, o filme é um ótimo recurso”,” utilizo o filme para enfatizar o conhecimento sobre algum assunto”,” de uma maneira que eu possa ilustrar meu trabalho, para que o assunto ensinado seja melhor assimilado”. Percebe-se então, que todas as respostas têm em comum o filme visto como um recurso didático.

A pergunta talvez que mais nos indica a relação do cinema na vida do professor

foi: você acha importante o cinema na vida do professor? 94% responderam que sim,

4% responderam que não e 2% não responderam. Logo pedimos porque achava

importante o cinema na vida do professor e 36% responderam porque serve de recurso

didático, não contemplando o real sentido da pergunta que era na vida e não na

profissão, logo percebemos que o profissional está muito presente, sendo difícil mostrar

o lado pessoal. Outros 21% não responderam, 20% consideram importante, pois é uma

forma de lazer, 15% consideram ser cultura e 8% atribuíram outros fins. Nessa parte

percebemos que se somarmos o percentual de professores que veem o cinema como

lazer e cultura, não teríamos tantos professores utilizando filmes como recurso didático

em sala de aula, assim essa contradição nos mobiliza a pensar outras questões a serem

trabalhadas na formação. Na perspectiva de tecer alguns traços comparativos com a

pesquisa realizada com professores de Belo Horizonte, onde encontramos dados muito

semelhantes aos encontrados na cidade de Santa Maria, Ramos e Teixeira (2010, p. 16)

conversam com Alain Bergala que em A Hipótese-Cinema propõe pensar esta arte como

a experiência de encontro com a alteridade. “Aponta um caminho inventivo e fértil para

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este trabalho, ao mostrar como o cinema pode deixar de ser apenas um recurso didático para se tornar uma oportunidade para o encontro com a arte.”

Para ilustrar a relação do professor com o cinema acima mencionado trazemos fragmentos das respostas dos professores “sim, é importante na vida de todas as pessoas, pois é uma forma de cultura e lazer”, “sim, porque podemos utilizá-lo como um meio de recurso para a vida escolar”, “sim, através dos filmes podemos explorar muitos assuntos em sala de aula” e “sim, pois considero um importante recurso para a introdução dos temas a serem trabalhados”. As respostas foram parecidas com as anteriores, mas ainda prevaleceu a ideia de que o cinema é importante, pois serve de aporte para as aulas.

Finalizando nossas análises dos questionários a última pergunta consistia numa espécie de convite, perguntando se os professores gostariam de participar de uma formação sobre cinema. Então, dos 645 questionários respondidos, 371 professores responderam que gostariam de participar, pouco mais de 50% dos professores, fato considerado positivo se não fossem o número de professores que estão fazendo a formação sobre cinema, que totalizam 24 participantes.

Assim, nos questionamos sobre a importância do cinema na vida do professor de não querer participar de uma formação com essa temática? Será que para a utilização de filmes em sala de aula não precisa de formação? Esses poucos participantes realmente querem e estão abertos a participar, discutir e compartilhar conhecimentos e vivências sobre o cinema, tanto na sua vida como em sua profissão.

Cabe destacar um elemento da cultura docente local que, a propósito dos docentes da rede municipal não estarem recebendo o piso nacional para os salários de professores, decidiram como manifestação de resistência, não aderir a nenhum projeto de formação continuada. Ainda, cabe sempre lembrar que as condições desfavoráveis a que são submetidos os professores “à realização de um bom trabalho, tanto do ponto de vista das condições salariais, ritmos e jornadas laborais, quanto face às bases materiais e infraestrutura das escolas e redes de ensino” (RAMOS e TEIXEIRA, 2010, p.16)

Após o levantamento destes dados, convidamos todos os professores a participarem da formação. Como já foi dito, somente 24 professores aceitaram o convite. Os encontros estão acontecendo aos sábados pela manhã. Estes acontecem intercalando atividades à distância com presenciais, utilizando textos, curtas-metragens, filmes e outros dispositivos para refletirmos as temáticas.

As atividades propostas iniciam com exercícios corporais e no primeiro encontro

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realizamos uma dinâmica de apresentação, onde, conversando em duplas, os participantes teriam de buscar algumas informações para apresentar seu colega aos demais integrantes da roda. Esse foi o primeiro momento de interação que propomos, o contato inicial com colegas de outras escolas, que foi avaliado como muito significativo, pois ouvir o outro, saber quem é, o que faz, onde trabalha, o que gosta é um importante exercício de cuidar do outro.

Em seguida, em um dos encontros, projetou-se o curta-metragem “O guarani“. O curta é uma produção cinematografia que propõe uma reflexão no que se refere à relação da população com o cinema, fazendo-nos pensar nas diferenças e semelhanças da relação cinema-pessoa(s), pensando a implantação do primeiro cinema no Brasil. A discussão que se seguiu ao curta foi muito significativa, sendo destacados alguns elementos importantes para o debate, como a desvalorização do cinema brasileiro em detrimento do estrangeiro; o entendimento que os filmes servem apenas como dispositivos para a diversão, pois há uma redução do cinema a um programa de fim de semana, em que o que se prioriza em muitos casos é a ida ao shopping para fazer compras, lanches e, como mais uma opção de divertimento, a ida ao cinema.

Neste sentido, é possível pensar o cinema como algo maior do que a simples projeção, como provocador de questionamentos, dispositivo para pensar a nossa vida, inserida em uma cultura, como nos aponta Almeida (2001):

Momento estético em que um objeto artística e tecnicamente produzido vai ao encontro do imaginário do espectador, relacionar- se intimamente com seus desejos, ressentimentos, vontades, ilusões, raivas, prazeres, traumas, vivências, e sobre o qual só teremos nossa objetividade restituída após o término da projeção.

Só então discutimos e falamos sobre ele, como memória, inextricavelmente ligado à nossa história, à história do mundo em que vivemos à história do cinema. (ALMEIDA, 2001, p.41)

É por essa via que entendemos o cinema, como objeto estético para pensarmos o mundo da cultura, como também nos permite refletirmos, falarmos, escrevermos sobre nossa vida, nossa história, associada ao contexto em que estamos. Consideramos que a experiência estética na formação do docente possibilita outro olhar aos sentidos que perpassam os sujeitos e que necessitam ser (re)visitados. Pesquisar esses processos de significação se configura num caminho cheio de possibilidades, que conferem à formação um lugar propositivo, não apenas estático. Possibilita olhar o professor como um “Si” sensível, que percebe sua subjetividade.

Nos primeiros encontros realizados algumas questões importantes já estão sendo

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percebidas, como a presença na formação de professores que realmente gostam de cinema e que estão se envolvendo nesse processo. Isso ressalta a ideia de que escolhemos temas que estão atravessados na nossa vida. Esta característica faz toda a diferença na participação durante as atividades, a presença nos encontros e para a qualidade das discussões.

A singularidade dos sujeitos não pode ser compreendida na perspectiva do plano geral cinematográfico – paradoxalmente, na sua generalidade é um imenso fragmento.

Por isso, esse trabalho se estreita pelo viés da criação, da experiência estética, da subjetivação do sujeito aprendente sobre/de si e sobre suas vivencias formativas.

Queremos encontrar saberes que se configuram para além da formação - existem ai processos de recriação, autorrecriação que remetam à arte de estar na vida em criação, obra, obra de arte.

Diferentemente, uma vida que só comunica, que vive de comunicar – “comunico que, faço tal, penso assim, ajo por, sinto como, reajo para, resolvo que, destino as coisas para”, bem pode ser uma vida pobre de conceitos. Nada nela se autorrecria. Uma vida comunicante é uma vida que decorre da informação, da comunicação.

Por outro lado, uma vida que necessita ver-se a si, que necessita causar-se, que incorre a si, que necessita dos atributos do inesquecível e os conceitos novos que ele traz uma vida assim é a de uma formação que viu (vê) o cinema – uma formação para si, por si, em si, de si. Uma singela obra de arte.

Práticas pedagógicas com cinema em escolas públicas da Região Metropolitana de Belo Horizonte.

No contexto das reflexões no âmbito da Escola, da Docência e do Cinema,

importa esclarecer que em torno de 40 professores de 15 escolas públicas mineiras da

cidade de Belo Horizonte e de Betim responderam ao questionário durante a

participação no sub projeto: Além dos muros da escola: cinema na cidade para

crianças, adolescentes, jovens, adultos e seus professores, que constitui uma parte da

pesquisa Enredos da vida, telas da docência: os professores e o cinema realizado com o

apoio do CNPQ. O trabalho foi uma parceria entre a Faculdade de Educação

(FAE/UFMG), o Grupo de Pesquisa Sobre Condição e Formação Docente (PRODOC)

e o Projeto Cine Aberto 104 (Lei Estadual de Incentivo à cultura CA:0675/001/2010).

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O questionário aplicado possui dois blocos. O primeiro bloco apresenta questões relativas ao cinema no dia-a-dia dos professores, fora da escola e dados referentes ao uso de filmes na escola e na sala de aula. No segundo bloco, foram obtidas informações sobre as características dos professores, tais como: sexo, etnia/cor, estado civil, número de filhos, formação profissional e a situação de trabalho, além da renda individual e familiar e tempo de atuação na docência.

Para esse artigo, elegemos compreender como os professores entendem e trabalham com cinema em seu ofício, procurando analisar suas concepções, seus propósitos, suas metodologias e suas dificuldades. Nos casos da não utilização do cinema pelos professores em suas práticas, procura-se identificar e analisar as razões desta ausência e os fatores ou circunstâncias que lhes dão origem.

Segundo Teixeira (2007), reconhecer a dimensão humana da docência é reconhecer que na determinação da identidade do professor e na sua atuação profissional, os tempos da aula e da sala de aula se articulam e se desdobram sobre outros tempos da vida dos professores. Por conseguinte, para se conhecer estes sujeitos, é fundamental considerá-los em sua totalidade, reconhecendo que o processo pelo qual eles se constituem como docente é resultado de diferentes experiências vivenciadas em vários momentos de sua vida. Ancorada nesse pensamento, apresentamos as reflexões realizadas.

A análise dos primeiros campos, do segundo bloco, dos questionários aplicados em nossa investigação mostra o equivalente a 87,5% dos professores, do sexo feminino, refletindo a já conhecida predominância feminina na docência. Essa diferença não é apenas uma questão numérica, produzindo também efeitos dessa presença feminina na escola, seja na forma de ensino, nas características dos grupos e nas relações estabelecidas entre os diversos atores da instituição.

Dentre os respondentes da pesquisa, 40,9% se autodeclararam brancos, 6,8% negros, 38,6% pardos e 4,5% não responderam. Destaca-se na análise dos dados, 60% dos professores casados, sendo que 54% deles têm filhos. Grande parte reside em Belo Horizonte, aproximadamente, 82,4%, e os demais residem na região metropolitana.

De acordo com a GATTI(2004), algumas questões como a aceitação de novas

concepções pedagógicas, estão relacionadas à idade dos professores. A maioria dos

professores desta investigação apresenta idade entre 41 a 55, representando 65,% do total de

professores. Com prevalência de nove anos de magistério (68,2%), podemos conjecturar

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que a experiência docente, a idade e o reconhecimento da importância de práticas pedagógicas inovadoras na escola e na sala de aula, foram determinantes para a participação desses professores nos encontros de formação do projeto Além dos muros da escola: cinema na cidade para crianças, adolescentes, jovens, adultos e seus professores.

Com relação à formação acadêmica dos professores, 28 participantes especificaram a graduação que cursaram. Os docentes se formaram em diversas áreas, sendo Letras (28.57%), Pedagogia (25%), Matemática (14,28%), História (7,14%), Geografia (7,14%), Ciências Biológicas (3,57%), Educação Física (3,57%) e Psicologia (3,57%).

Dois ainda estão cursando a graduação (matemática e pedagogia) e apenas um é formado em Normal Superior. A pesquisa também revelou que 60% dos docentes estão cursando ou possuem especialização, 5% estão no mestrado ou já o concluíram, dois docentes são doutorandos e os demais não informaram.

Prosseguindo com as análises, os dados revelaram que metade dos profissionais trabalha em uma única escola, 36,4% dos trabalhadores atuam em duas instituições de ensino e 4,5% não responderam. Com relação ao nível de ensino em que atuam a maior parte dos docentes de Belo Horizonte (56%) atua no ensino fundamental, 35% na educação infantil e 8,5% na educação de jovens e adultos. Os dados também revelaram diferenças com relação à renda mensal dos docentes, sendo que 5% dos docentes recebem entre 1 a 2 salários mínimos no mês e 22,4% têm rendimentos de 2 a 4 salários mínimos. Em torno de 35,7% ganha de 4 a 7 salários mínimos, 17,5% recebem de 7 a 10 salários mínimos e 5% dos sujeitos recebem mais de 10 salários mínimos. Explorando o contexto familiar dos entrevistados, o maior número de docentes (34,1%) possuem uma renda familiar de 04 a 08 salários mínimos.

Analisando a presença do cinema na sala de aula e na escola, trazido pelas mãos dos professores mineiros, nossa pesquisa revela que 70% dos professores em Minas exibem filmes para seus alunos na escola com uma frequência considerável, pois 11% o fazem mensalmente e 14% semestralmente. Esses dados sugerem uma integração considerável dos filmes nos currículos escolares, indicando que os professores como reconhecem o potencial pedagógico das práticas educativas que incorporam artefatos culturais de grande significação social.

Dentre as descobertas que resultaram do levantamento empírico, relativas aos

motivos e às finalidades que levam os docentes realizarem atividades com cinema na

sala de aula e na escola, identificamos que os docentes mineiros exibem filmes para

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seus alunos, nas fases da introdução ou do encerramento de algum conteúdo disciplinar e com frequência também utilizam os filmes para complementar ou ratificar informações encontradas textos escritos e também como uma forma de lazer, para tornar as aulas menos enfadonhas. Alguns sujeitos afirmaram ainda que usavam os filmes para substituir algumas aulas (ou seriam professores?) e para suprir a falta de outros materiais pedagógicos.

Os fatores que dificultam ou impedem a realização de práticas pedagógicas com cinema na perspectiva dos professores investigados foram a falta de apoio dos gestores, inclusive de certos docentes, falta de equipamento em número suficiente e em condições adequadas de funcionamento, demonstrando o quadro de fragilidade material com o qual ainda sofrem muitas escolas públicas brasileiras, sobretudo as do interior ou as da periferia das grandes cidades, visto que a desigualdade ainda é uma das características marcantes da realidade brasileira em vários âmbitos, especialmente o educacional.

Uma análise mais abrangente da relação entre cinema e escola nas redes de ensino público de Minas Gerais, no entanto, nos coloca ainda uma questão muito importante, que vem a ser o sentido atribuído pelos professores aos seus trabalhos com os filmes na sala de aula. Partindo do principio de que a simples exibição de filmes, não parece contribuir, por si só, para a renovação e o aperfeiçoamento das práticas educativas escolares e pode ser mesmo deseducativa em determinadas circunstâncias, procuramos por meio dessa pesquisa obter informações sobre as formas como os docentes e as docentes entendem e trabalham com cinema em seu ofício, procurando analisar suas concepções e expectativas em relação a esse dispositivo. Os dados da investigação apontam que os docentes mineiros colocam sobre o cinema, grandes esperanças em termos educacionais. Os mesmos afirmam que, com a exibição dos filmes, pretendem estimular a imaginação, o autoconhecimento, a sensibilidade de seus alunos, explorando outras dimensões do ser humano para além da racionalidade. Acreditam que levar o cinema à escola possa trazer mais prazer e alegria, reflexão e criticidade para os processos que ali se desenvolvem. Querem também oferecer vivências escolares que sejam interessantes e diferenciadas para os estudantes, mas, sobretudo esperam que o cinema exerça uma influência significativa na formação moral das crianças e dos jovens que educam.

Os dados dessa pesquisa evidenciam que os filmes se constituíram em

instrumentos privilegiados para o trabalho escolar explicitamente dedicado ao

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tratamento das questões ético-morais, que refletem os dilemas do mundo na contemporaneidade.

Conforme esses indícios, ao serem inquiridos sobre as razões de terem optado pela exibição de certos filmes para os estudantes e as atividades que realizam a partir deles, nossos sujeitos de pesquisa, frequentemente, forneceram respostas como essas:

“Acredito que (o filme) tem muito a ver com a realidade deles e passa uma mensagem de postura diante da vida que gosto muito de vê-los debater:

importância de valores como disciplina, determinação, esforço, sonho, trabalho, respeito, união, etc.”.

“Ambos (os filmes foram escolhidos) pela capacidade de sensibilização da condição humana”. “Superação, limitações, solidariedade, cuidados, preconceitos.”

“(Os filmes) incentivam os estudantes a se tornarem mais companheiros, tendo cumplicidade um com o outro e com a escola, onde estudam.”

Essas afirmativas expressam as expectativas das professoras em relação ao potencial educativo do cinema e revelam também muito das concepções que essas profissionais têm sobre a potência desse dispositivo, dois aspectos que estão evidentemente relacionados.

Há certamente uma crescente expectativa social sobre o trabalho da escola no que diz respeito à apresentação e a aceitação pelos mais jovens das regras gerais de convivência estabelecidas pela sociedade, sem que se perca de vista, a importância de se desenvolver também ou principalmente, a capacidade de discernimento entre os atos considerados bons ou maus, justos ou injustos diante de situações específicas com as quais eles se deparam ao longo da vida. Pois uma educação que se pretende transformadora tem, dentre outras atribuições, a tarefa de proporcionar aos educandos e aos educadores oportunidades de reflexão e crítica sobre seu comportamento e suas relações.

Tentando compreender essa opção, lembramos que o cinema, desde seu nascimento, tornou-se um dispositivo valorizado ou temido pelos poderes de seduzir e influenciar fortemente o comportamento do público. Além desse fato, deve ser considerado que existe um reconhecimento acadêmico da capacidade apresentada pelos discursos midiáticos em promover determinados comportamentos, provocar desejos de consumo diversos, produzir e/ou legitimar conhecimentos, valores e representações.

(GIROUX,2000;LOURO, 2000).

Entendemos, então, que um há sentido pedagógico em exibir filmes com o

objetivo de promover a reflexão sobre os valores e as condutas humanas,

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principalmente com a preocupação de apresentar aos estudantes obras que possam lhes causar algum tipo de estranhamento, que os façam pensar a exceção, o extraordinário e promova rupturas no modo de ver os diferentes aspectos que constituem aquilo que consensualmente denominamos realidade.

Para agir eticamente em tempos de incerteza, faz-se necessário um esforço no sentido de provocar, de duvidar de nós mesmos e das diversas posições estabelecidas para os indivíduos e grupos nas famílias, nas escolas, na cidade e em todos os espaços nos quais existimos que nos formam e ao qual formamos por meio de nossas ações cotidianas.

Pensamos, enfim, diante do que nos contam as docentes sobre a formação ético- moral por meio dos filmes, que talvez essa prática pudesse ser mais enriquecedora se o cinema fosse trazido para escola como um “elemento perturbador” (Bergala, 2008, p.29) tanto de referências estéticas, quanto de visões de mundo em geral, ou seja, se as atividades com cinema fossem a porta pela qual entrassem também na escola novos sujeitos e novas ou diferentes formas de perceber o que nos rodeia.

REFERÊNCIAS

ALMEIDA, Milton José de (2001). Imagens e sons: a nova cultura oral. São Paulo: Cortez.

BERGALA, Alain (2008). A Hipótese-Cinema: pequeno tratado de transmissão do cinema dentro e fora da escola. Rio de Janeiro: UFRJ.

DELEUZE, Gilles (1992). Conversações. São Paulo, Editora 34, 1992.

GATTI, B. O perfil dos professores brasileiros: o que fazem, o que pensam, o que almejam. UNESCO/BRASIL,Ed. Moderna, INEP/MEC, 2004. p. 34.

GIROUX, Henry. Memória e Pedagogia no Maravilhoso Mundo da Disney. In:

Alienígenas na Sala de Aula. Petrópolis, Rio de Janeiro: Vozes, 2002.

LOURO, Guacira. O cinema como pedagogia. In: LOPES, Eliane M. T.;

FARIAS FILHO, Luciano Lopes Mendes de; VEIGA, Cynthia Graive.

500 anos de educação no Brasil. Belo Horizonte: Autêntica, 2000.

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RAMOS, Ana Lúcia Azevedo e TEIXEIRA, Inês Assunção de Castro (2010).

Os professores e o cinema na companhia de Bergala. Revista Contemporânea de

Educação, 5 (10), pp.7-22.

Referências

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