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PERSPECTIVAS PERSPECTIVES 1

Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro, 30(11):1-3, nov, 2014 http://dx.doi.org/10.1590/0102-311XPE011114

Questões éticas no manejo de pacientes

com doença pelo vírus Ebola

Ethical issues in the management of patients

with Ebola virus disease

Cuestiones éticas en el manejo de los pacientes con

la enfermedad del virus Ebola

1 Instituto Nacional de Infectologia Evandro Chagas, Fundação Oswaldo Cruz.

Correspondência

J. Cerbino Neto Vice-Direção de Serviços Clínicos, Instituto Nacional de Infectologia Evandro Chagas, Fundação Oswaldo Cruz.

Av. Brasil 4365, Rio de Janeiro, RJ 21040-900, Brasil. jcerbinoneto@gmail.com

José Cerbino Neto 1

No dia 10 de outubro de 2014, o Instituto Nacio-nal de Infectologia Evandro Chagas da Fundação Oswaldo Cruz (INI/Fiocruz) recebeu o primeiro caso suspeito de doença pelo vírus Ebola iden-tificado no Brasil. Vinte e quatro horas após a in-ternação, o primeiro resultado de pesquisa do vírus Ebola pela reação em cadeia da polimerase (PCR) foi negativo. Seguindo a recomendação do protocolo vigente 1 nova amostra foi coletada 48h depois, e em 13 de outubro, com o segundo PCR para Ebola negativo, o caso foi descartado e as medidas de biossegurança foram suspensas. A experiência de manter internado em isolamen-to um caso suspeiisolamen-to de Ebola permitiu algumas conclusões sobre o preparo da unidade e os pro-cedimentos durante a internação. Por outro la-do, evidenciou também dúvidas que envolvem não apenas questões técnicas e científicas, mas a própria forma como a sociedade entende que de-vam ser encarados os desafios lançados por uma doença com as características do Ebola. Algumas dessas dúvidas são abordadas aqui.

Direitos individuais

versus

risco coletivo

O isolamento do paciente com doença pelo vírus Ebola é fundamental para conter a transmissão durante o período sintomático 2. Junto com o monitoramento de contactantes, formam a

ba-se da estratégia de enfrentamento e controle do Ebola. Têm sido extensivamente discutidos a es-trutura física e os Equipamentos de Proteção In-dividual (EPIs) adequados para que o isolamento seja efetivo e seguro, mas todas as recomenda-ções pressupõem a colaboração do paciente 3.

Caso o paciente não queira permanecer no isola-mento, como proceder? O isolamento compulsó-rio precisa ser discutido na dimensão conceitual/ legal e também na operacional 4, dentro de uma

estratégia de comunicação. Caso se decida pelo isolamento compulsório é preciso definir quais os mecanismos de contenção poderão ser utili-zados e qual o anteparo legal para a sua utiliza-ção. É importante lembrar que a forma de trans-missão do vírus torna arriscada qualquer medida que envolva contato físico, e que a maioria dos hospitais não possui estrutura física ou pessoal habilitado para restringir a movimentação desses pacientes de forma coercitiva. Caso o paciente se recuse a permanecer internado a equipe deve-rá chamar a polícia? Os policiais deverão vestir os EPIs para conter o paciente? O paciente será colocado sob vigilância no próprio hospital de referência?

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respon-Cerbino Neto J

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Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro, 30(11):1-3, nov, 2014

sável pelo monitoramento dos contactantes, que deverá ser instruída sobre como proceder. Existe a meu ver uma situação ainda mais complexa, pelas consequências que poderão advir – a qua-rentena de profissionais de saúde. A recomenda-ção do Ministério da Saúde do Brasil é prudente ao fazer uma distinção entre profissionais com exposição conhecida a secreções do paciente ou que o atenderam sem os EPIs recomendados, e os profissionais que realizaram o atendimento com todas as medidas de biossegurança e os EPIs adequados, sem exposição direta conhecida 5. Esses profissionais são classificados como de alto e baixo risco, respectivamente. Todos deverão ter a temperatura e outros sinais e sintomas asso-ciados a doenças pelo vírus Ebola monitorados por 21 dias, mas apenas os de alto risco sofre-rão restrição de deslocamento não podendo, por exemplo, utilizar transportes públicos. No entan-to, alguns estados nos Estados Unidos já adota-ram a quarentena compulsória para pessoas que cheguem ao país vindos de áreas de transmissão, inclusive profissionais de saúde sem história de exposição desprotegida a paciente com doença pelo vírus Ebola 6. Além do elevado risco de in-fecção ao qual estará submetido, o profissional ainda terá a sua liberdade de ir e vir cerceada, mesmo que tenha realizado o atendimento de forma correta e sem quebras de barreira de bios-segurança. Isso pode ser um grande desencoraja-dor, prejudicando não apenas o envio de profis-sionais para a área da epidemia como também a assistência a eventuais casos importados no país.

Contenção da doença versus cuidados

intensivos

Considerando a alta taxa de ataque secundário e a elevada taxa de letalidade da doença pelo vírus Ebola, do ponto de vista da saúde pública evitar a transmissão passa a ter maior impacto do que o próprio desfecho do caso índice. Por conta disso, até o início da epidemia na África Ocidental, o contato da equipe de saúde com os pacientes era restringido ao mínimo, o que impedia até mes-mo um tratamento de suporte básico 7. Mesmo

a literatura que mais recentemente sugere que deve haver maior ênfase no cuidado ao paciente, recomenda a utilização de hidratação e medica-mentos parenterais, identificação e correção de distúrbios hidroeletrolíticos e suporte nutricio-nal, ainda muito distante do que hoje se conside-ra suporte avançado a pacientes gconside-raves 8,9.

Habitualmente, a decisão pela realização ou não de procedimentos invasivos é baseada em uma análise de risco versus benefício para o pa-ciente. No caso do Ebola, adiciona-se a essa

aná-lise o risco para os profissionais envolvidos no cuidado ao paciente. Realizar essa análise é um grande desafio por várias razões. Primeiro por-que, como o registro clínico dos casos de Ebola é dificultado pelas medidas de biossegurança re-comendadas, existe muito pouca evidência cien-tífica sobre a evolução clínica de formas graves, com apenas alguns relatos de casos com acesso ao suporte avançado de vida, todos sem impacto no prognóstico e portanto sem documentação de benefício destas medidas 10. Em segundo

lu-gar, embora o risco para os profissionais de saúde na assistência aos pacientes seja bem documen-tado 11, a quantificação de risco especificamente associado aos procedimentos invasivos não está bem estabelecida.

Recentemente, foi publicado o primeiro re-lato detalhado de um caso grave de doença pelo vírus Ebola com boa resposta ao suporte com cuidados intensivos 12. Entretanto, a internação ocorreu em uma unidade com nível de biosse-gurança quatro, muito acima do que vem sendo recomendado para internação de pacientes em hospitais de referência, e mesmo assim, apesar de existir indicação de entubação orotraqueal foi feita a opção por ventilação não invasiva, procedimento de menor risco para os profis-sionais envolvidos 12. A chave dessa questão pa-rece estar na necessidade de aumentar o nível de proteção dos profissionais, para permitir um cuidado intensivo de forma segura. Ainda assim é preciso que a sociedade e os órgãos de ética médica definam até que ponto deve-se investir em pacientes graves dentro das condições de biossegurança disponíveis em cada unidade. Es-sa resposta tem de ser dada antes que exista um paciente grave com a doença pelo vírus Ebola e essa decisão recaia exclusivamente sobre a equi-pe médica responsável.

Terapias experimentais

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Sani-QUESTÕES ÉTICAS NA DOENÇA PELO VÍRUS EBOLA 3

Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro, 30(11):1-3, nov, 2014 tária (ANVISA) e a Comissão Nacional de Ética

em Pesquisa (CONEP), para que se defina pre-viamente se será autorizada a importação e uti-lização dessas drogas em pacientes com doença pelo vírus Ebola. Essa decisão deve ser tomada previamente, e todo o procedimento para dis-ponibilizar a droga deve estar pronto para que o fornecimento seja feito oportunamente.

Outras questões como responsabilidade e destinação de um eventual cadáver, ou translado de pacientes infectados em áreas com transmis-são, ainda precisam ser abordadas.

A discussão desses temas irá resultar certa-mente em um amadurecimento civilizatório, com aplicação nesta e em futuras epidemias que venham a desafiar a nossa sociedade.

1. Ministério da Saúde. O plano de contingência para doença pelo vírus Ebola, 2014 http://portalsaude. saude.gov.br/index.php?option=com_content& view=article&id=14228&catid=429&Itemid=18 (ac-cessed on 29/Oct/2014).

2. Cohen J. When Ebola protection fails. Science 2014; 346:17-8.

3. Fischer II WA, Hynes NA, Perl TM. Protecting health care workers from Ebola: personal protective equipment is critical but is not enough. Ann Intern Med 2014; [Epub ahead of print].

4. Phua K-L. Ethical dilemmas in protecting individ-ual rights versus public protection in the case of infectious diseases. Infect Dis (Auckl) 2013; 6:1-5. 5. Ministério da Saúde. Protocolo de identificação e

monitoramento de contactantes de casos de doen-ça pelo vírus Ebola (DVE). 2014 http://portalsaude. saude.gov.br/images/pdf/2014/outubro/10/proto colo-de-contactantes-09-10-2014.pdf (accessed on 26/Oct/2014).

6. US Department of Health and Human Services. New York, New Jersey to quarantine all travelers with Ebola contacts http://healthfinder.gov/News/ Article.aspx?id=693087 (accessed on 26/Oct/2014). 7. Roddy P, Colebunders R, Jeffs B, Palma PP, Herp MV,

Borchert M. Filovirus hemorrhagic fever outbreak case management: a review of current and future treatment options. J Infect Dis 2011; 204 Suppl 3:S791-5.

8. Fowler RA, Fletcher T, Fischer WA, Lamontagne F, Jacob S, Brett-Major D, et al. Caring for critically ill patients with Ebola virus disease. Perspectives from West Africa. Am J Respir Crit Care Med 2014; 190:733-7.

9. Bausch DG, Feldmann H, Geisbert TW, Bray M, Sprecher AG, Boumandouki P, et al. Outbreaks of filovirus hemorrhagic fever: time to refocus on the patient. J Infect Dis 2007; 196 Suppl 2:S136-41. 10. Clark DV, Jahrling PB, Lawler JV. Clinical

manage-ment of filovirus-infected patients. Viruses 2012; 4:1668-86.

11. Fisher-Hoch SP. Lessons from nosocomial viral haemorrhagic fever outbreaks. Br Med Bull 2005; 73-74:123-37.

12. Kreuels B, Wichmann D, Emmerich P, Schmidt-Chanasit J, de Heer G, Kluge S, et al. A case of se-vere Ebola virus infection complicated by gram-negative septicemia. N Engl J Med 2014. http:// www.nejm.org/doi/full/10.1056/NEJMoa1411677. 13. World Health Organization. Ethical considerations

for use of unregistered interventions for Ebola virus disease. Report of an advisory panel to WHO. 2014 http://www.who.int/csr/resources/publications/ ebola/ethical-considerations/en/ (accessed on 30/ Oct/2014).

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