• Nenhum resultado encontrado

NO PROCESO D E FA L ÊNCIA

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2018

Share "NO PROCESO D E FA L ÊNCIA"

Copied!
74
0
0

Texto

(1)

Diego Leonardo Andrade de Oliveira

A

A

I

I

N

N

T

T

E

E

R

R

V

V

E

E

N

N

Ç

Ç

Ã

Ã

O

O

D

D

O

O

M

M

I

I

N

N

I

I

S

S

T

T

É

É

R

R

I

I

O

O

P

P

Ú

Ú

B

B

L

L

I

I

C

C

O

O

N

N

O

O

P

P

R

R

O

O

C

C

E

E

S

S

S

S

O

O

D

D

E

E

F

F

A

A

L

L

Ê

Ê

N

N

C

C

I

I

A

A

F

FOORRTTAALLEEZZAA––CCEEAARRÁÁ

2

(2)

Diego Leonardo Andrade de Oliveira

A

A

I

I

N

N

T

T

E

E

R

R

V

V

E

E

N

N

Ç

Ç

Ã

Ã

O

O

D

D

O

O

M

M

I

I

N

N

I

I

S

S

T

T

É

É

R

R

I

I

O

O

P

P

Ú

Ú

B

B

L

L

I

I

C

C

O

O

N

N

O

O

P

P

R

R

O

O

C

C

E

E

S

S

S

S

O

O

D

D

E

E

F

F

A

A

L

L

Ê

Ê

N

N

C

C

I

I

A

A

Monografia apresentada ao Curso de Graduação em Direito da Universidade Federal do Ceará, como requisito parcial para obtenção do grau Bacharel em Direito.

Orientador: Prof. Jorge Ferraz

F

FOORRTTAALLEEZZAA––CCEEAARRÁÁ

2

(3)

Título do Trabalho: A Intervenção do Ministério Público no Processo de Falência.

Autor: Diego Leonardo Andrade de Oliveira.

Defesa em: 11/12/2007 Conceito Obtido: Satisfatório

Banca Examinadora

_____________________________________________________ Jorge Ferraz, Profº.

Orientadora - UFC

_____________________________________________________ Luiz Eduardo dos Santos, Profº.

Examinador - UFC

_____________________________________________________ Antônio Carlos dos Santos

(4)

Dedico este trabalho primeiramente a Deus por me

inspirar durante sua elaboração e por me abençoar em todos

os passos que percorri para aqui chegar. Dedico também à

minha família, que sempre me apóia e incentiva em todos os

(5)

Primeiramente a Deus por toda a inteligência, sabedoria e capacidade

que Ele me concedeu. Por toda a saúde para conseguir realizar esse projeto;

Aos meus amados pais, José Gilberto de Oliveira e Gracy Maria Andrade

de Oliveira, por me ajudar e aconselhar nas decisões importantes, pela educação e

apoio financeiro;

Aos meus queridos irmãos, Gilberto Bruno Andrade de Oliveira, José

Gilberto de Oliveira Júnior e Renata Patrícia Bezerra;

À minha namorada, Mirian Brasil Magalhães, por todo incentivo, apoio,

compreensão, amor e companheirismo durante minha longa jornada;

Ao Profº Jorge Ferraz por toda a ajuda, orientação, conhecimentos

transmitidos, confiança e amizade;

Ao professor Luiz Eduardo dos Santos e ao bacharel em Direito Antônio

Carlos dos Santos por terem aceitado participar da banca examinadora;

Ao acadêmico de Direito Ivan de Icaraí Frota Gomes Neto, por aceitar a

função de secretário; e

A todos que, de alguma forma, contribuíram, direta ou indiretamente, para

(6)

O Ministério Público é instituição essencial à função jurisdicional do Estado encarregado da defesa dos interesses precípuos da sociedade, a saber: a ordem jurídica, o regime democrático, os direitos constitucionalmente assegurados, os interesses sociais e individuais indisponíveis, o patrimônio público e social, o meio ambiente, entre outros. Ao

Parquet compete a tutela do interesse público primário (o bem comum), o qual não se

confunde com a vontade dos órgãos públicos (interesse público secundário). No âmbito do processo civil, o Ministério Público poderá atuar como parte ou como fiscal da lei (custos legis). A principal forma de intervenção ministerial na falência é como fiscal da lei, mas, em

certas hipóteses, poderá funcionar como autor. A falência é uma situação fático-jurídica de insolvência do empresário ou da sociedade empresária que enseja a instauração do juízo concursal, a fim de arrecadar todo o patrimônio do devedor que será, posteriormente, liquidado para satisfazer os credores, proporcionando tratamento igualitário e justo. No âmbito do processo de quebra, é interesse de toda a coletividade a proteção dos consumidores e clientes do falido; o amparo aos trabalhadores e a manutenção dos postos de trabalhos gerados pela empresa; a fiscalização do patrimônio do falido; a efetivação da

par conditio creditorium; a preservação da atividade empresarial e sua função social; o

saneamento do meio empresarial com a eliminação do empresário ou sociedade empresária falida; e a repressão ao devedor desonesto mediante sanções penais. Durante a vigência do Decreto-lei nº 7.661/45, a intervenção do Ministério Público no processo de liquidação era excessiva. Além das hipóteses de atuação obrigatória no âmbito da falência, a legislação também exigia a ingerência ministerial em todas as causas em que figurasse a massa falida. A Lei nº 11.101/05 introduziu significativas mudanças na disciplina jurídica da intervenção ministerial no processo de falência, reduzindo consideravelmente as hipóteses em que é exigida. Essa evolução legislativa deveu-se, principalmente, ao veto presidencial ao art. 4º do Projeto de Lei aprovado pelo Congresso Nacional. No atual regime jurídico, a audiência do promotor de justiça não é necessária em todos os passos do processo, ademais, as causa em que a massa falida for parte prescindem, via de regra, da atividade ministerial. Ao órgão ministerial assegura-se, todavia, a possibilidade de uma atuação mais incisiva e minuciosa, tanto no juízo concursal como nos processos em que a massa falida figurar, a depender da relevância do interesse público e das circunstâncias que revestem a causa, cujo fundamento encontra respaldo nos princípios constitucionais que regem a instituição e nas regras gerais do Direito Processual Civil, especialmente a do art. 82, inciso III. Nas hipóteses de audiência obrigatória expressamente determinada por lei, a ausência de intimação do Parquet, enseja a nulidade do ato, uma vez comprovado o prejuízo. Diante da

(7)

1. INTRODUÇÃO ... 8

2. PERFIL CONSTITUCIONAL DO MINISTÉRIO PÚBLICO ... 11

2.1. POSICIONAMENTO CONSTITUCIONAL ... 11

2.2. DEFINIÇÃO CONSTITUCIONAL ... 12

2.3. FUNÇÕES INSTITUCIONAIS ... 13

2.4. CLASSIFICAÇÃO ... 14

2.5. PRINCÍPIOS E GARANTIAS ... 15

3. O MINISTÉRIO PÚBLICO COMO DEFENSOR DO INTERESSE PÚBLICO ... 17

4. A ATUAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO NO PROCESSO CIVIL BRASILEIRO ... 21

4.1. O MINISTÉRIO PÚBLICO COMO PARTE ... 21

4.2. O MINISTÉRIO PÚBLICO COMO FISCAL DA LEI ... 22

5. UM BREVE CONCEITO DE FALÊNCIA ... 24

6. O INTERESSE PÚBLICO NO PROCESSO DE FALÊNCIA ... 26

6.1. O INTERESSE DOS CONSUMIDORES ... 27

6.2. A TUTELA DOS TRABALHADORES E A BUSCA PELO PLENO EMPREGO .. 29

6.3. A INDISPONIBILIDADE DOS BENS FALIDO E A INABILITAÇÃO EMPRESARIAL ... 31

6.4. A REALIZAÇÃO DOS FINS DA FALÊNCIA ... 32

6.5. A PERSECUÇÃO PENAL ... 37

7. A INTERVENÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO NA FALÊNCIA ... 39

7.1. O REGIME JURÍDICO DO DECRETO-LEI Nº 7.661/45 ... 39

7.2. ASPECTOS GERAIS DO REGIME JURÍDICO DA LEI Nº 11.101/05 ... 42

7.3. AS HIPÓTESES DE INTERVENÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO NA LEI Nº 11.101/05 ... 47

7.4. OUTRAS HIPÓTESES DE INTERVENÇÃO ... 59

7.5. COMPETÊNCIA ... 64

8. CONCLUSÕES ... 67

(8)

1. INTRODUÇÃO

O Ministério Público que, segundo a Constituição Federal de 1988, é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado e guardião da ordem jurídica, do regime democrático e dos direitos sociais e individuais indisponíveis, ocupa lugar destacado no estudo da falência. A Instituição desempenha a nobre missão de fiscalizar a lisura do processo falimentar.

Amador Paes de Almeida sintetiza bem o papel do Parquet no processo

falimentar:

“Cumprindo-lhe, pois, tutelar os interesses da sociedade, em nome da qual, aliás, promove a aplicação da lei, o Ministério Público está presente na falência e na recuperação judicial, por meio de seu representante, com o propósito manifesto de evitar que a falência se transforme em meio de exploração lucrativo, com graves prejuízos para economia e, conseqüentemente, para a sociedade...”1

Com o advento da Lei 11.101/2005 (Nova Lei de Falências), que revogou o Decreto-Lei nº 7.661/45, a atuação do Ministério Público foi sensivelmente reduzida, passando a atuar apenas nas fases mais relevantes do procedimento falimentar. Fábio Ulhoa Coelho, ao destacar as principais alterações implementadas pela nova lei, ressalta:

“Muda substancialmente a participação do Ministério Público na falência. Agora, ele não precisa intervir em todos os processos de que seja parte ou interessada a massa falida. Também não participa do pedido de falência. Salvo algumas intervenções específicas (impugnação à venda, rescisão de crédito admitido, etc.), o Ministério Público só deve participar do processo de falência quando houver fatos como indício de crime, desobediência à lei ou ameaça de lesão ao interesse público.”2

Ademais, vale avultar que o texto original do Projeto de Lei aprovado pelo Congresso Nacional e que resultou na Lei nº 11.101/2005 trazia, em seu art. 4º, a

1. ALMEIDA, Amador Paes de. Curso de Falência e Recuperação de Empresa: de acordo com a Lei 11.101/2005 – 22 ed. rev. e atual. - São Paulo, 2006. p. 214.

(9)

seguinte disposição:

"Art. 4o O representante do Ministério Público intervirá nos processos de recuperação judicial e de falência.

Parágrafo único. Além das disposições previstas nesta Lei, o representante do Ministério Público intervirá em toda ação proposta pela massa falida ou contra esta."

Entretanto, o dispositivo supracitado foi objeto de veto presidencial, sob a alegação, em apertada síntese, de que seria contrário ao interesse público. Apresenta-nos, portanto, uma contradição: o Congresso Nacional avaliou importante a intervenção do Parquet em todas as fases do processo falimentar, assim como em

todas as ações em que a massa falida figurasse como parte; no entanto, o Presidente da República, seguindo recomendações dos Ministros da Justiça e da Fazenda, julgou dispensável tal interferência.

Com base nessa breve argumentação, concluímos que merece apreço o estudo do interesse público e da atuação do Ministério Público no contexto da Nova Lei de Falências. Julgamos interessante, por conseguinte, a definição de critérios objetivos para circunscrever essa intervenção ministerial ao campo do interesse público.

E, para arrematar, se considerarmos o papel fiscalizador desempenhado pelo Parquet e o pensamento do ilustre Trajano de Miranda Valverde acerca da

evolução da legislação falimentar, in verbis:

“Uma lei de falências gasta-se depressa no atrito permanente com a fraude. Os princípios jurídicos podem ficar, resistir, porque a sua aplicação não se esgota nunca. As regras práticas, que procuram impedir o nascimento e desenvolvimento da fraude, é que devem evoluir.”3

Reputamos indispensável à análise das mudanças e inovações trazidas pela Lei nº 11.101/2005 no que diz respeito ao objeto desta obra, a fim de encontrar respostas a certas dúvidas e indagações, a saber:

a) Onde repousa o interesse público na falência?

b) O que faz o Ministério Público ser invocado na falência?

3. VALVERDE, Trajano de Miranda. A falência no direito brasileiro. Rio de Janeiro: Freitas

(10)

c) Quando o Ministério Público deve intervir?

d) O Ministério Público pode intervir nas fases pré-falimentares?

e) Quando o Ministério Público poderá intervir nos processos em que a massa falida for parte?

Nesse contexto, o escopo da presente monografia é compreender, com base na Lei nº 11.101/2005, o papel desempenhado pelo Ministério Público no processo de falência, identificando o interesse social inerente a esse procedimento. Pretendemos, assim, demonstrar ao leitor onde repousa o interesse público na falência; apresentá-lo as principais inovações trazidas pela nova legislação ao regular a atuação do Parquet no processo falimentar; analisar o veto presidencial ao

art. 4º da Nova Lei de Falências; e discutir quando é necessária a intervenção do representante ministerial na falência, abordando as hipóteses previstas na lei e evidenciando em que outras circunstâncias ela poderá ocorrer.

Iniciaremos esta obra com uma análise do perfil constitucional positivo do Ministério Público, inteirando o leitor das características intrínsecas fundamentais. Nesse momento, discutiremos como a Carta Magna define a instituição, assim como quais atribuições a delega. Identificaremos também as garantias e os princípios basilares que norteia a atuação ministerial.

Em um momento intermediário, com a finalidade de fundamentar com maior propriedade discussões futuras acerca do objeto desta obra, estudaremos o papel do Ministério Público como defensor dos interesses públicos em geral. Exibiremos, posteriormente, um quadro universal acerca da atuação do Parquet no

âmbito do Processo Civil Brasileiro. Por fim, de forma bastante simplória, conceituaremos o instituto da falência.

(11)

2. PERFIL CONSTITUCIONAL DO MINISTÉRIO PÚBLICO

Antes de debater acerca da intervenção ministerial no processo de falência, é de bom alvitre uma exposição sucinta a respeito dos contornos constitucionais do Ministério Público e de sua missão institucional. Por conseguinte, nos deteremos em aspectos que reputamos pertinentes ao eficiente desenvolvimento do tema objeto desta monografia.

2.1. POSICIONAMENTO CONSTITUCIONAL

A Constituição da República de 1988 foi o primeiro texto constitucional a disciplinar o Ministério Público de forma orgânica, estabelecendo as principais regras atinentes à suas autonomias, funções, garantias e vedações. A disciplina constitucional do Ministério Público encontra-se na Seção I, do Capítulo IV (Das Funções Essenciais À Justiça), do Título IV (Da Organização Dos Poderes) da Constituição, mais especificamente, nos artigos 127 a 130-A. O texto constitucional, portanto, disciplinou o Ministério Público em capítulo diverso dos dedicados aos Três Poderes do Estado, traduzindo uma independência não apenas no aspecto formal e técnico, mas também substancial.

Nesse contexto, uma questão controversa que se nos apresenta é compreender se as funções desempenhadas pelo Parquet estão inseridas no Poder

Legislativo (visto que atua como fiscal da lei), no Poder Judiciário (pois normalmente oficia junto dele), ou no Poder Executivo (tendo em vista o desempenho de funções administrativas), ou, ainda, se tais funções corresponderiam a um quarto poder desvinculado dos demais.

Entendemos, todavia, que o constituinte de 1988 atribuiu ao Ministério Público um elevado status constitucional, ao estabelecer certas garantias especiais

– como, por exemplo, a vitaliciedade, a inamovibilidade e a irredutibilidade de subsídios – e ao dedicá-lo um capítulo específico desvinculado dos Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário. Destarte, o Ministério Púbico desfruta hoje de um arcabouço de independência e autonomia que o credencia ao efetivo desempenho de suas funções na defesa dos interesses sociais e individuais indisponíveis.

(12)

podemos qualificá-las, segundo o critério residual, como administrativas, visto que a função precípua da instituição de proporcionar o cumprimento da lei não se identifica com a atividade jurisdicional nem com a elaboração das leis. Nesse sentido é o entendimento de Hugo Nigro Mazzili:

“Analisando suas principais funções institucionais, vemos que todas têm natureza administrativa: incumbências como promover a ação civil pública ou opinar como custos legis não são atividades jurisdicionais (atuar junto ao

judiciário não significa prestar jurisdição) nem legislativas (fiscalizar ou promover a observância das leis não se confunde com a atividade de sua elaboração).”4

2.2. DEFINIÇÃO CONSTITUCIONAL

A Constituição Federal estabelece que “o Ministério Público é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis”.5

Percebemos, por conseguinte, que o Ministério Público, diante dos contornos delimitados pelo texto constitucional, não é apenas o mero titular do direito de ação penal pública, não é, sequer, um representante dos interesses individuais ou dos governantes, mas, está, hoje, consagrado, com autonomia e independência funcional, à defesa dos interesses precípuos da sociedade. E, segundo leciona Hugo Nigro Mazzilli: “passou, pois, a ser órgão de proteção das liberdades públicas constitucionais, dos direitos indisponíveis e do contraditório penal.”6

O Ministério Público é instituição permanente, pois, ao lado dos Três

Poderes do Estado, também exerce parcela da soberania, ademais, é instituição fundamental para a estrutura do Estado e para a sociedade a quem cabe defender. Nos dizeres de Sérgio Gilberto Porto, o Ministério Público passou a ser “organismo

4. Introdução ao Ministério Público – 5ª ed., rev., ampl. e atual., à luz da reforma do Judiciário (EC 45/2004). – São Paulo: Saraiva, 2005, p. 61.

5. Art. 127, da CF/88.

(13)

integrante da essência do Estado”7

O Ministério Público é essencial à função jurisdicional do Estado, posto

que sua atuação não se dissocia da atividade desempenhada pelo Poder Judiciário. É perante o Judiciário que o Parquet promoverá as ações em defesa dos direitos

sociais e individuais indisponíveis e, perante o qual, atuará como fiscal da correta aplicação da lei (custos legis). Vale ressaltar que suas atividades institucionais não

se resumem à atuação judicial, mas engloba, também, a não menos importante atividade extrajudicial, como a investigativa, fiscalizatória, etc.

A defesa da ordem jurídica e do regime democrático é dever institucional

do Ministério Público, que, em outras palavras, deve zelar pela correta aplicação das leis e pela soberania e representatividade popular, resguardando sempre o interesse público e o bem geral.

Os interesses sociais e individuais indisponíveis que reclamam a atuação

ministerial são aqueles de elevada relevância para a coletividade como um todo, quais sejam o respeito aos direitos constitucionalmente assegurados, os interesses sociais e individuais indisponíveis, o patrimônio público e social, o meio ambiente, além de outros interesses difusos, coletivos. Esses interesses que clamam a atenção do ministerial serão objeto, neste trabalho, de posterior discussão minuciosa.

2.3. FUNÇÕES INSTITUCIONAIS

A atual Constituição Federal expandiu consideravelmente as funções institucionais do Ministério Público, atribuindo à instituição não apenas a titularidade privativa da ação penal pública, como tradicionalmente ocorreu em textos constitucionais anteriores, mas, sobretudo, conferindo meios de fiscalizar a atuação dos Poderes Públicos e defender a legalidade e a moralidade administrativas, tal quais a ação civil pública e o inquérito civil.

Nesse diapasão, a Carta Magna determina que são funções institucionais do Ministério Público: promover, privativamente, a ação penal pública, na forma da lei; zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos e dos serviços de relevância pública aos direitos assegurados nesta Constituição, promovendo as medidas

(14)

necessárias a sua garantia; promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos; promover a ação de inconstitucionalidade ou representação para fins de intervenção da União e dos Estados, nos casos previstos na Constituição; defender judicialmente os direitos e interesses das populações indígenas; expedir notificações nos procedimentos administrativos de sua competência, requisitando informações e documentos para instruí-los, na forma de lei complementar respectiva; exercer o controle externo da atividade policial, na forma de lei complementar; requisitar diligências investigatórias e a instauração de inquérito policial, indicados os fundamentos jurídicos de suas manifestações processuais; exercer outras funções que lhe forem conferidas, desde que compatíveis com sua finalidade, sendo-lhe vedadas a representação judicial e a consultoria jurídica de entidades públicas.8

Do exposto, infere-se o constituinte delegou à nobre instituição a relevante incumbência de resguardar os direitos e garantias constitucionalmente assegurados. Destarte, conforme leciona Alexandre de Morais, é função do Ministério Público, juntamente com os Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário, a defesa do status constitucional do indivíduo, garantindo-lhe a fruição total dos

direitos fundamentais.9

Por fim, cumpre salientar que outras funções e meios de atuação podem ser conferidos aos Ministérios Públicos dos Estados pelas respectivas constituições estaduais, desde que preservada a sua finalidade constitucional.

2.4. CLASSIFICAÇÃO

Segundo o art. 128, da Constituição da República de 1988, o Ministério Público abrange o Ministério Público da União e o Ministério Público dos Estados. Por sua vez, o Ministério Público da União compreende o Ministério Público Federal, o Ministério Público do Trabalho, o Ministério Público Militar e o Ministério Público do Distrito Federal e Territórios.

O Chefe do Ministério Público da União é o Procurador-Geral da República, nomeado pelo Presidente da República dentre integrantes da carreira,

8. Art. 129, da CF/88.

9

(15)

maiores de trinta e cinco anos, após a aprovação de seu nome pela maioria absoluta dos membros do Senado Federal, para mandato de dois anos, permitida a recondução.

Quanto ao Ministério Público dos Estados, o Chefe da instituição é o Procurador-Geral de Justiça, nomeado a partir de uma lista tríplice formada dentre integrantes da carreira, na forma da lei respectiva, pelo Chefe do Poder Executivo, para mandato de dois anos, permitida uma recondução.

Como veremos adiante, para efeitos de atuação junto ao juízo falimentar, nos interessará notadamente o Ministério Público do Distrito Federal e Territórios e o Ministério Público dos Estados, em razão da repartição da competência jurisdicional adotada pela Carta Magna.

2.5. PRINCÍPIOS E GARANTIAS

A instituição do Ministério Público subordina-se fundamentalmente a três princípios constitucionais básicos:

a) o princípio da unidade, que preceitua que os membros do Parquet

pertencem a uma só corporação, para fins institucionais;

b) o princípio da indivisibilidade, segundo o qual qualquer membro do Ministério Público poderá substituir outro em suas atividades funcionais, sem que exista alteração subjetiva nos processos que atua o Parquet; e

c) o princípio da autonomia funcional, que institui a independência dos membros do Ministério Público no exercício de suas funções institucionais e na formação de sua própria consciência.

A Constituição Federal, visando à efetividade dos princípios supracitados e à eficiência no exercício da missão institucional, outorgou aos membros do Ministério Público as seguintes garantias: autonomia institucional e financeira10; a estruturação em carreiras11; o ingresso na carreira mediante concurso de provas e títulos, exigindo-se do bacharel em direito, no mínimo, três anos de atividade jurídica12; vitaliciedade após dois anos de exercício, não podendo perder o cargo

10. Art. 127, § 2º, da CF/88.

11. Art. 128, §§ 1º e 3º; e 129, § 2º, da CF/88.

(16)

senão por sentença judicial transitado em julgado13; inamovibilidade, salvo por

motivo de interesse público, mediante decisão do órgão colegiado competente do Ministério Público, por voto da maioria absoluta de seus membros, assegurada a ampla defesa14; e irredutibilidade de subsídios15.

13. Art. 128, § 5º, inciso I, a, da CF/88.

14. Art. 128, § 5º, inciso I, b, da CF/88, com redação dada pela Emenda Constitucional nº 45, de

8/12/2004.

(17)

3. O MINISTÉRIO PÚBLICO COMO DEFENSOR DO INTERESSE PÚBLICO

Conforme mencionado anteriormente, uma das principais missões institucionais do Ministério Público é zelar pelo interesse público. Assim, a atuação ministerial no processo civil brasileiro tem por escopo fundamental defesa ou resguardo do interesse de toda a coletividade. Ressaltemos, entretanto, que a expressão “interesse público” mostra-se, por vezes, incerta, o que reclama, por seu turno, uma rápida digressão.

Muito embora impreciso, a utilização do termo tem sido preferível diante da possibilidade de uma temerária tentativa de enumerar as hipóteses onde os interesses dessa natureza estariam presente. Ademais, a simplória contraposição entre o interesse público (cujo titular é o Estado) de um lado e o interesse individual (cujo titular é o cidadão) de outro, como usualmente se faz, não identifica claramente o seu significado.

A princípio, podemos conceituar interesse público como o interesse relevante de que toda a sociedade compartilha, é o interesse social, o bem comum, como, por exemplo, o interesse à segurança pública ou à ordem pública. Nesse contexto, Antônio Cláudio da Costa Machado o define: “é o interesse ou o direito material indisponível que se revela objetivamente, por sua essencialidade social, independentemente de quem seja seu titular”.16

Eventualmente, o interesse público manifestado pelo Estado (pelos governantes) não corresponde ao que seria o bem comum, ao interesse da sociedade. Algumas situações, como obras públicas prejudiciais ao meio ambiente ou políticas econômicas desastrosas, expõem uma contradição entre o interesse dos governantes e o dos governados. Em razão desse fortuito desacordo, a doutrina passou a distingui-lo em duas espécies, a saber: interesse público primário e interesse público secundário. Aquele identifica-se propriamente com o interesse de toda a coletividade, este, por seu turno, diz respeito ao interesse das pessoas jurídicas de direito público, dos governantes, em última instância, é a forma como o Estado vê o interesse público primário. Essa distinção merece elevado apreço, pois, no que se refere à atuação judicial e extrajudicial do Ministério Público, apenas os interesses socialmente relevantes, nos moldes dos artigos 127 e 129 da

(18)

Constituição Federal – isto é, apenas o interesse público primário –, reclamam a intervenção ministerial.

Por outro lado, existe também uma gama de interesses situados numa posição intermediária entre o interesse público e privado, os quais são compartilhados por grupos, classes ou categorias de pessoas, conhecidos como interesses transindividuais ou, como alguns doutrinadores chamam, metaindividuais. São interesses que, embora excedam o campo estritamente individual, não chegam a constituir efetivamente interesse público, como bem observa Hugo Nigro Mazzilli.17 Esses interesses são de três espécies: coletivos, difusos e individuais homogêneos.

O Código de Defesa do Consumidor define como difusos os interesses ou direitos transindividuais, de natureza indivisível, de que sejam titulares pessoas indeterminadas e ligadas por circunstâncias de fato.18 São exemplos de interesses difusos a preservação do meio ambiente e a proteção contra a propaganda enganosa.

Cumpre salientar, entretanto, que os interesses difusos não são uma espécie de interesses público. Existem interesses difusos os quais, a despeito de apresentarem uma certa abrangência, não chegam a identificar-se com o interesse de toda a coletividade, como é o caso do interesse dos consumidores de determinado produto. Em outras situações, os direitos difusos podem até chocar-se com o interesse do Estado, enquanto pessoa jurídica, como no caso do interesse dos contribuintes. Há casos, porém, que tais interesses são de tamanha abrangência que passam a constituir verdadeiros interesse público, como é o caso da preservação do meio ambiente como um todo. Nesses casos de maior repercussão para a coletividade, a atuação do Ministério Público é imprescindível para resguardar os anseios gerais.

Interesses coletivos podem ser definidos em duas acepções. Em sentido amplo, diz respeito aos próprios interesses transindividuais, de grupos, de classes ou de categorias de pessoas. No sentido mais restritivo, o Código de defesa do Consumidor conceitua que coletivos são interesses transindividuais indivisíveis de um grupo determinado ou determinável de pessoas, reunidas por uma relação

(19)

jurídica básica comum.19 A Constituição Federal, ao encarregar o Ministério Público

da proteção dos interesses coletivos mediante inquérito civil ou ação civil pública20, o

faz em sentido amplo, referindo-se a todas as espécies de interesses transindividuais de repercussão social.

Os interesses individuais homogêneos são aqueles de um grupo, categoria ou classe de pessoas determinadas ou determináveis, cujo objeto é divisível e de origem como, oriunda das mesmas circunstâncias de fato.21 São os interesses, por exemplo, de consumidores que adquirem um televisor com um mesmo defeito de série. Esses consumidores são determinados, ou, pelo menos, determináveis; e o prejuízo suportado por cada um é divisível (aquele que comprou dois aparelhos terá direito a duas indenizações). O Ministério Público, via de regra, não deve tutelar os interesses individuais homogêneos, ressalvados, todavia, os casos de grande repercussão, onde o clamor público pode ser evidenciado.

Conforme vimos e não é demais repetir, o constituinte de 1988 definiu o Ministério Público como defensor da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis e, mais adiante, cometeu-lhe a missão de propor privativamente a ação penal pública e de tutelar os direitos constitucionalmente assegurados, bem como os interesses difusos e coletivos socialmente relevantes. Concluímos, portanto, à vista do texto constitucional, que, seja como parte, seja como fiscal da lei, o Ministério Público funciona sempre como guardião do interesse público, nas suas mais diversas manifestações – seja ele evidente, com dimensões nacionais, ou de menor monta, como os proveniente de direitos individuais homogêneos.

Hugo Nigro Mazzilli, analisando o interesse público passível de tutela, descreve claramente quais seriam as situações em que o Ministério Público deve atuar junto ao Poder Judiciário, in verbis:

“Podemos distinguir basicamente duas hipóteses em que é cabível a intervenção ou a iniciativa ministerial em juízo: a) é o Ministério Público essencial à prestação jurisdicional, sem dúvida, sempre que se trate de feitos nos quais estejam em jogo os chamados interesses sociais e individuais indisponíveis; b) quando, ainda que a rigor não haja

19. Art. 81, parágrafo único, inciso II, do CDC. 20. Art. 129, inciso III, da CF/88.

(20)

indisponibilidade de interesses, a lei considere conveniente a atuação em defesa do bem geral. Verdade é que, em estudos anteriores, vínhamos centralizando a atuação do Ministério Público apenas na defesa de interesses indisponíveis. Contudo, à vista do novo campo advindo principalmente em face da LACP e da Constituição de 1988, deve-se reconhecer sua atuação ou intervenção também em hipóteses nas quais não haja propriamente uma indisponibilidade de interesses, mas sim a conveniência de que a instituição tenha atuação socialmente proveitosa, como quando haja grande dispersão dos lesados (interesses difusos, coletivos e individuais homogêneos). EEmm oouuttrraass ppaallaavvrraass,, ddeessddee qquuee hhaajjaa

a

allgguummaa ccaarraacctteerrííssttiiccaa ddee iinnddiissppoonniibbiilliiddaaddee ppaarrcciiaall oouu aabbssoolluuttaa ddee uumm i

inntteerreessssee,,oouuddeessddeeqquueeaaddeeffeessaaddeeqquuaallqquueerriinntteerreessssee,,ddiissppoonníívveelloouunnããoo,,

c

coonnvveennhhaa àà ccoolleettiivviiddaaddee ccoommoo uumm ttooddoo,, aaíí sseerráá eexxiiggíívveell aa iinniicciiaattiivvaa oouu aa i

inntteerrvveennççããooddooMMiinniissttéérriiooPPúúbblliiccoojjuunnttooaaooPPooddeerrJJuuddiicciiáárriioo..””2222

2

222.. RReeggiimmeejjuurrííddiiccooddooMMiinniissttéérriiooPPúúbblliiccoo::aannáálliisseeddaaLLeeiiOOrrggâânniiccaaNNaacciioonnaallddooMMiinniissttéérriiooPPúúbblliiccoo,,

a

apprroovvaaddaappeellaaLLeeiinn..88..662255,,ddee1122ddeeffeevveerreeiirrooddee11999933..––33..eedd..rreevv..,,aammppll..eeaattuuaall..ààlluuzzddaa L

(21)

4. A ATUAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO NO PROCESSO CIVIL BRASILEIRO

A atuação do Ministério Público em feitos judiciais pode ser de duas ordens: (a) como parte, em geral promovendo ações como a ação civil pública ou a ação penal pública; ou (b) como interveniente (custos legis), fiscalizando o estrito

cumprimento da lei e resguardando o interesse público no seio de uma demanda judicial.

4.1. O MINISTÉRIO PÚBLICO COMO PARTE

O Ministério Público atua como parte nos casos em que lhe é deferido por lei o poder de ação, figurando, portanto, quase sempre como sujeito ativo, porquanto não pode ser demandado como sujeito passivo ou réu. Como agente, ao Ministério Público cabem os mesmos poderes e ônus que competem às partes,23 ressalvadas algumas prerrogativas como a dispensa de recolhimento antecipado das custas processuais e a contagem de prazo em quádruplo para contestar e em dobro para apelar.24

Podemos enumerar, entre outras, algumas hipóteses em que o Ministério Público age como parte: na ação de nulidade de casamento (art. 1.549, do Código Civil de 2002); na ação de dissolução de sociedade civil (art. 670 do Código de Processo Civil de 1939); na ação direta de declaração de inconstitucionalidade (art. 129, inc. IV, da Constituição Federal de 1988); no pedido de interdição (art. 1.177 do Código de Processo Civil); na ação civil pública, para defesa de interesses difusos (Lei nº 7.347/85).

Conforme veremos detalhadamente, no plano da falência, basicamente, o Ministério Público agirá como parte para propor a impugnação de crédito, a ação rescisória de crédito admitido, ação revocatória, bem como para oferecer as ações penais contra crimes previstos na Lei de Falências, chamados pela doutrina de crimes falimentares e nas hipóteses de interposição de recursos, entre outras hipóteses.

(22)

4.2. O MINISTÉRIO PÚBLICO COMO FISCAL DA LEI

Além de atuar como parte, o Ministério Público também pode intervir no processo civil como fiscal da lei.

Alguns doutrinadores defendem uma intervenção amplíssima, alegando que o órgão ministerial deveria atuar em todos os processos cíveis, promovendo a adequada composição da lide conforme o direito objetivo, garantindo, assim, a satisfação do interesse público, o qual seria inerente a todo e qualquer processo judicial. Por outro lado, a excessiva intervenção do Parquet em todos os processos

cíveis poderia acarretar mais desvantagens do que vantagens, visto que tal burocracia provocaria uma maior demora no desdobrar dos processos, segundo bem adverte Alexandre Freitas Câmara.25

O Código de Processo Civil determina que compete ao Ministério Público intervir nas causas em que há interesses de incapazes, nas causas concernentes ao estado da pessoa, pátrio poder, tutela, curatela, interdição, casamento, declaração de ausência e disposições de última vontade, nas ações que envolvam litígios coletivos pela posse da terra rural e nas demais causas em que há interesse público evidenciado pela natureza da lide ou qualidade da parte.26

Esse rol enumerado pelo referido diploma processual não é taxativo, uma vez que existem hipóteses outras, previstas no mesmo código, que determinam a citação do Parquet, como no caso, por exemplo, dos procedimentos especiais de

jurisdição voluntária.27

A identificação da existência ou não do interesse público cabe sempre ao órgão ministerial, o qual deverá ser intimado para manifestar-se nos autos sobre a questão. Como dissemos, apenas o interesse público primário deve ser tutelado pelo

Parquet, considerando suas mais diversas manifestações.

Atuando como fiscal da lei, o representante ministerial terá vista dos autos depois das partes, sendo intimado de todos os atos do processo e poderá juntar documentos e certidões, produzir prova em audiência e requerer medidas ou diligências necessárias ao descobrimento da verdade.28 Ademais, assim como nos

2

255.. LLiiççõõeessddeeDDiirreeiittooPPrroocceessssuuaallCCiivviill..––1111..eedd..,,rreevv..eeaattuuaall..sseegguunnddooooCCóóddiiggooCCiivviillddee22000022..––

R

RiiooddeeJJaanneeiirroo::LLuummeennJJuurriiss,,22000044,,pp..222200..

(23)

processos em que é parte, goza de legitimidade para recorrer também nas causas em que funcionar como custos legis,29 mesmo que não haja recurso da parte,

segundo entendimento do Superior Tribunal de Justiça positivado na súmula 99. Nos processos em que a lei considera a intervenção do Ministério Público obrigatória, a parte deve promover a intimação do órgão ministerial sob pena de nulidade.30 Daí, inferimos, seguindo o mesmo fundamento, que o Parquet também é

parte legítima para propor a ação rescisória de sentença, nos casos em que não tenha sido ouvido em processo para o qual lei considere sua intervenção obrigatória.31 Entretanto, a jurisprudência é uníssona no sentido de que não se decreta nulidade processual por falta de intervenção ministerial sem a demonstração de efetivo prejuízo para as partes.32

No processo de falência, que adiante estudaremos, a maior parte da atuação do órgão do Ministério Público se dá na condição de fiscal da lei. As regras e princípios gerais que disciplinam a intervenção do Parquet no Processo Civil, como

não poderia deixar de ser, aplicam-se também ao juízo falimentar.

29. Art. 499, § 2º, do CPC. 30. Art. 84, do CPC.

31. Art. 487, inciso III, a, do CPC.

(24)

5. UM BREVE CONCEITO DE FALÊNCIA

Uma das grandes preocupações da sociedade, desde épocas remotas, consistia em solucionar os gravames derivados da insolvência de um indivíduo. Em, outras palavras, como evitar que alguns credores fossem completamente satisfeitos em detrimento de outros, uma vez que os bens do devedor não fossem mais suficientes para saldar todas as suas dívidas. Seria necessário, então, criar um meio eficiente para proporcionar um tratamento igualitário a todos os credores, ordenando o patrimônio ativo do insolvente, apurando-se o seu patrimônio passivo e procedendo-se a uma distribuição do montante arrecadado conforme determinados critérios preferenciais pré-estabelecidos.

A solução para essa questão surgiu com a submissão obrigatória de todo o patrimônio do insolvente a uma execução coletiva, isto é, um procedimento onde concorressem todos os seus credores, a fim de compor os interesses inerentes a esse conflito multifacetado. Nasce, portanto, o instituto da falência, que, ao lado da insolvência civil, é uma das modalidades de execução coletiva adotadas pelo nosso ordenamento jurídico.

O conceito de falência pode ser construído a partir de três concepções: como um instituto de direito substantivo, ressaltando o aspecto da insolvência; como um instituto de direito processual, privilegiando-se os aspectos procedimentais; e, por fim, como um instituto meramente administrativo, onde o juiz administraria a distribuição dos bens do falido.

Nesse contexto, cumpre transcrevermos algumas definições. Para Fábio Ulhoa Coelho, “falência é o processo judicial de execução concursal do patrimônio do devedor empresário, que, normalmente, é uma pessoa jurídica revestida da forma de sociedade por quotas de responsabilidade limitada ou anônima”33. Esse é um conceito que se nos apresenta com uma concepção apenas processual da falência, desconsiderando os aspectos substantivos da situação de insolvência.

Gladston Mamede, por outro lado, afirma que “a falência é a execução

coletiva judicial do empresário ou da sociedade empresária insolvente”34 Nesse

mesmo sentido, o professor da Disciplina de Falências e Recuperações de

33. Comentários à nova Lei de Falências e de recuperação de empresas. São Paulo, Saraiva, 2005, p. 192.

(25)

Empresas da Universidade Federal do Ceará, Luiz Eduardo dos Santos, a define como “o estado de insolvência do empresário ou sociedade empresária, quando este conceito fático se torna público e jurídico, por sentença, havendo um processo de execução concursal e coletiva.”35 Os dois últimos conceitos já apresentam uma

mescla entre a natureza substantiva (situação de insolvência) e a adjetiva (processo de execução coletiva).

Enfim, corroborando com este último entendimento, em nosso entender, a falência é situação de insolvência do empresário ou da sociedade empresária que enseja a instauração do juízo concursal a fim de arrecadar todo o patrimônio do devedor que será, posteriormente, liquidado para satisfazer os credores. Concluímos, por conseguinte, tratar-se de instituto de natureza híbrida, com traços de direito material e processual, assim como caracteres de procedimento administrativo.

A nova Lei de Falências e Recuperações de Empresas, por sua vez, disciplina que a falência é o instituto jurídico que, ao promover o afastamento do devedor de suas atividades, visa a preservar e otimizar a utilização produtiva dos bens, ativos e recursos produtivos, inclusive os intangíveis, da empresa, observando os princípios da celeridade e da economia processual.36 Essa definição ressalta os

efeitos e finalidades da falência.

(26)

6. O INTERESSE PÚBLICO NO PROCESSO DE FALÊNCIA

Nos capítulos anteriores, ao realizarmos o estudo acerca do perfil constitucional do Ministério Público e de sua atuação no âmbito do Processo Civil Brasileiro, concluímos que o órgão ministerial deve funcionar, seja como parte, seja como fiscal da lei, sempre que ficar evidenciado a presença do interesse público. Dissemos também que esse interesse público (conhecido como interesse público primário) pode ser compreendido como o interesse da sociedade como um todo, o bem comum, e que, nem sempre, se confunde com o interesse das pessoas jurídicas de direito público, dos órgãos governamentais (o chamado interesse público secundário).

Nesse diapasão, é de expressiva relevância para a compreensão da intervenção do Ministério Público no processo de liquidação, a assimilação de como o interesse público se evidencia no âmbito da falência. Em outras palavras, queremos destacar o que levou o legislador a determinar a interferência do Parquet

nessa espécie de procedimento.

A falência, a princípio, por tratar de interesses patrimoniais e, em geral, disponíveis, não transpareceria qualquer manifestação de interesse público. De tal sorte que o Ministério Público apenas estaria apto a intervir quando houvesse indícios de crimes falimentares. Nesse sentido é a doutrina de Carvalho de Mendonça, segundo o qual, a intervenção deveria limitar-se tão somente à parte penal da falência.

No entanto, a doutrina pátria, em sua esmagadora maioria, identifica sim, no processo falimentar, além da persecução criminal, a existência de interesses públicos outros a determinar a fiscalização por parte do Parquet. Para Rubens

Requião, “o instituto é marcadamente de ordem pública, muito embora vise resolver em massa questões de interesses essencialmente privados.”37

É bem verdade que os autores em geral resumem esses interesses aos aspectos meramente econômicos que envolvem a falência. Entendemos, porém, que o interesse público apresenta-se muito mais amplo, compreendendo também outros setores da sociedade. Dedicaremos, assim, este esta parte de nosso trabalho à análise dessas questões.

(27)

6.1. O INTERESSE DOS CONSUMIDORES

O constituinte de 1988 elevou a defesa do consumidor a categoria de direitos e garantias fundamentais, determinando que é dever do Estado promovê-la.38 Adiante, ao tratar da ordem econômica, elegeu a defesa do consumidor como um de seus princípios norteadores e fundamentais.39 Com isso, percebemos que a defesa das relações de consumo representa um dos preceitos basilares da sociedade abrigados pela Constituição Federal. A proteção do consumidor, a partir do texto constitucional acima referido, pode e deve ser considerada como interesse supremo, de ordem pública.

Reconhecida a relevância social, é inegável que, em geral, os direitos dos consumidores representam direitos difusos. Destarte, a partir das idéias sobreditas e considerando a competência constitucional do Parquet para defender tais direitos,

chegamos à indubitável conclusão de que a proteção dos direitos consumeristas é incumbência institucional do Ministério Público. Ademais, o Código de Defesa do Consumidor, reforçando o mandamento constitucional, sagrou o Ministério Público, ao lado de outros entes, como órgão legitimado para defender os interesses e direitos dos consumidores.40

É bem verdade que, em regra, a defesa do direito dos consumidores se dá por meio das chamadas ações coletivas, que estão disciplinadas no próprio Código de Defesa do Consumidor (ação civil pública é um exemplo de ação coletiva). Nesse sentido, Paulo Roque Khouri analisa com muita propriedade o objeto a ser tutelado por meio dessas ações:

"[...] O legislador referiu-se expressamente ao termo interesses ao tratar da

defesa do consumidor em Juízo. O mesmo termo, aliás, no mesmo sentido, foi utilizado pelo Constituinte na redação do art. 129, inciso III, da Constituição Federal. Entretanto, como se sabe, o interesse em si, por mais relevante, seja de natureza moral ou econômica, não é considerado um direito, exatamente porque não tem qualquer reflexo no ordenamento. A partir do momento que o interesse ganha relevância jurídica, ele deixa de ser tratado simplesmente como interesse e passa a ser tratado propriamente como direito. Ora, a ação coletiva, então, não é propriamente

(28)

para a defesa de interesses dos consumidores, mas, verdadeiramente, de direitos. É nesta acepção que o legislador trata os interesses dos

consumidores...”41

Não obstante o entendimento acima transcrito, julgamos que a atuação do Ministério Público não deve se restringir apenas à defesa de direitos em sentido restrito, considerados interesses juridicamente relevantes; mas abranger, outrossim, interesses, sob um acepção ampla, correspondendo os anseios consumeristas de grande disseminação.

Assim, no âmbito da falência, inequívoca é a constância do interesse geral do mercado consumidor, que se manifesta de variadas formas. Das relações de consumo, por exemplo, é possível emergir o interesse na continuidade provisória das atividades empresariais durante o processamento da liquidação, circunstância que poderá ser permitida pelo juiz ao proferir a decisão de quebra.42 Tais interesses também podem ser identificados nas hipóteses de lesão a direitos consumeristas provocada por fraudes que eventualmente o empresário falido venha a cometer para preservar vantagens pessoais. Enfim, não é difícil imaginar circunstâncias onde esses interesses possam vir a ser ameaçados ou mesmo molestados.

É preciso ressaltar ainda que o Código de Defesa do Consumidor não prescreve qualquer proteção ao consumidor em caso de falência do fornecedor, ademais, a Lei de Falências, ao disciplinar os efeitos da quebra sobre as obrigações do falido, também não estabelece tratamento diferenciado para as relações de consumo. Nesse contexto, manifesto é o desamparo do sujeito mais vulnerável nas relações dessa natureza. Então, para que os anseios consumeristas não sejam suprimidos, a presença ministerial torna-se imprescindível.

Por esses motivos, e a partir dos argumentos aduzidos inicialmente, o órgão ministerial deve permanecer vigilante e interceder pelos consumidores na falência sempre que necessário, conforme sua missão constitucional e atribuições delimitadas por normas infraconstitucionais.

Cumpre esclarecer, no entanto, que o Ministério Público não atua no processo de falência para, eventualmente, tutelar os direitos coletivos dos consumidores contra o empresário ou sociedade empresária falida, uma vez que o

41. Direito do consumidor: contratos, responsabilidade civil, e defesa do consumidor em juízo. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2006, p. 206.

(29)

meio apropriado para tanto seria a ação coletiva, ou mesmo, individualmente, cada consumidor lesado interpor ação própria contra o falido ou habilitar o crédito já existente no juízo concursal. A atuação ministerial é necessária, tão somente, para garantir que os interesses consumeristas gerais, socialmente considerados, também sejam observados, pois – persistimos –, tais aspirações, mesmo que não configurem direitos propriamente ditos, prescindem sim de tutela.

Do exposto, concluímos que a falência do empresário ou da sociedade empresária comumente representa a frustração dos interesses dos consumidores. Compete, portanto, ao Parquet, seguindo sua função institucional, a intervenção

fiscalizatória no âmbito do processo de quebra, com o escopo de efetivar a defesa do consumidor, que, como dissemos, representa um dos princípios basilares do ordenamento jurídico pátrio.

6.2. A TUTELA DOS TRABALHADORES E A BUSCA PELO PLENO EMPREGO

A busca pelo pleno emprego é um dos princípios da ordem econômica esculpidos na Constituição Federal.43 O intérprete desavisado certamente concluiria

que tal norma principiológica apenas procura assegurar que toda a força de trabalho disponível seja absorvida pelo mercado de trabalho. Todavia, a isso não se resume. O que se busca efetivamente é a justiça social, ou seja, a proporção de uma existência digna a todos, com um ofício a partir do qual possa extrair o seu sustento e o de sua família. O constituinte, portanto, não pretendeu simplesmente dizer que toda mão-de-obra disponível deve estar empregada, mas, imprimiu um sentido muito mais amplo, elevando o trabalho, em uma primeira acepção, à condição de principal fonte produtora de riquezas e, em uma segunda acepção, ao status de direito social inerente à pessoa humana. José Afonso da Silva esclarece a verdadeira essência desse princípio constitucional, in verbis:

“A busca do pleno emprego é um princípio diretivo da economia que se

opõe às políticas recessivas. Pleno emprego é expressão abrangente da utilização, ao grau máximo, de todos os recursos produtivos. Mas aparece, no art. 170, VIII, especialmente no sentido de propiciar trabalho a todos que estejam em condições de exercer uma atividade produtiva. Trata-se do

(30)

pleno emprego da força de trabalho capaz. Ele se harmoniza, assim, com a regra de que a ordem econômica se funda na valorização do trabalho humano. Isso impede que o princípio seja considerado apenas como mera busca quantitativa, em que a economia absorva a força de trabalho disponível, como o consumo absorve mercadorias. Quer-se que o trabalho seja a base do sistema econômico, receba o tratamento de principal fator de produção e participe do produto da riqueza e da renda em proporção da sua posição na ordem econômica.”44

Após essa rápida exposição, é evidente que a busca por um maior número de empregos é objetivo não só do Estado, mas da própria sociedade como um todo. Cada novo emprego gerado ou cada frente nova de trabalho aberta representa a otimização da capacidade produtiva do Estado, implicando, em última instância, no aumento da riqueza do país – lembramos que o trabalho é a única fonte inesgotável de riquezas – e na diminuição das diferenças sociais. Ademais, proporcionaria a um número cada vez maior de pessoas a oportunidade de prover o próprio sustento e de sua família, melhorando a sua condição social e atribuindo-lhes dignidade.

Não é difícil compreender que a falência de um empresário ou de uma sociedade empresária implica, quase sempre, em redução do número de postos de trabalho. Cada empresa que fecha as portas deixa empregar certo número de mão-de-obra, prejudicando, assim, a efetivação do princípio constitucional ora mencionado.

O interesse na continuidade da atividade empresarial, por conseguinte, não se restringiria apenas ao grupo específico de trabalhadores daquela empresa em particular, mas, sobretudo, representa o interesse de toda a sociedade. Uma empresa econômica e financeiramente saudável, além de beneficiar os próprios empregados, poderá vir a empregar mais pessoas no futuro.

Destarte, identificamos que, no processo falimentar, é de interesse geral a preservação da atividade empresarial. É fundamental que os postos de trabalho existentes sejam mantidos, em respeito aos princípios constitucionais ora aduzidos. Nesse diapasão, cumpre ao Ministério Público fiscalizar tal procedimento, resguardando esses anseios e impedido que o instituto se preste ao cometimento de

(31)

fraudes.

Conforme a mesma idéia esposada na ressalva realizada com referência aos consumidores, aqui, também, o órgão ministerial não atuará no processo de falência para defender o direito individual de cada trabalhador da empresa falida, nem fiscalizar as verbas trabalhistas a que têm direito, todavia, funciona, como fiscal da ordem social, de interesses sociais mais abrangentes, segundo sua função institucional, e conforme os princípios ora aduzidos.

6.3. A INDISPONIBILIDADE DOS BENS FALIDO E A INABILITAÇÃO EMPRESARIAL

A Lei de Falências determina que o devedor seja afastado de suas atividades, a fim de preservar e otimizar a utilização produtiva dos bens, ativos e recursos produtivos, inclusive os intangíveis, da empresa. Seguindo esse critério cautelar, o mesmo diploma legal ainda estabelece que, desde a decretação da falência ou do seqüestro preliminar, o devedor perde o direito de administrar os seus bens ou deles dispor.45 Essa medida visa a resguardar o patrimônio do devedor contra possíveis fraudes, impedindo que ele promova a sua liquidação e obstaculizando qualquer frustração aos fins falimentares. Essa regra é, pois, essencial para que os fins da execução coletiva sejam atingidos.

É importante esclarecer que, não obstante perder o direito de dispor de seus bens, o direito de propriedade do devedor se mantém. Ademais, a sua capacidade civil não é suprimida, apenas restringida, podendo praticar normalmente quaisquer atos da vida civil, salvo, evidentemente, aqueles ora referidos.

A despeito da indisponibilidade dos bens, outro efeito da sentença de quebra é a inabilitação do devedor para exercer qualquer atividade empresarial.46

Essa precaução apresenta como fundamento o receio social quanto à atuação do empresário ou sociedade empresária falida no mercado, evitando que comprometa os interesses de consumidores, fornecedores, credores, trabalhadores e do próprio Estado como entidade arrecadadora. O comedimento em tela é de tamanha relevância que o legislador considerou crime o exercício de atividade empresarial

45. Art. 103, da Lei nº 11.101/05.

(32)

pelo inabilitado, cominado penas severas de um a quatro anos e multa.

Nessa conjuntura, surge o papel do Ministério Público, uma vez que a instituição deve permanecer vigilante, intervindo de forma eficiente sempre que surjam riscos à efetividade do processo de liquidação. Trata-se, em outras palavras, de verdadeiro fiscal da sociedade, evitando que a fraude e a má-fé fragilizem o desempenho do juízo concursal, que, em última instância, representa a vontade geral, o bem comum. Assim, é fundamental que o promotor de justiça conserve-se cauteloso na fiscalização dos atos praticados pelo falido.

Apenas a título de informação, há quem sustente que, considerando a incumbência constitucional conferida ao Ministério Público para defender os direitos individuais indisponíveis, a principal razão de o legislador admiti-lo no processo de falência seria, justamente, com o escopo de tutelar tais direitos – o direto de propriedade do devedor, haja vista a perda da disponibilidade dos bens. Discordamos, entretanto, desse posicionamento, visto que a Constituição Federal faz referência, não à indisponibilidade circunstancial, conforme ocorre na falência, mas, alude aos direitos individuais que, por sua natureza, o titular não pode deles dispor. São, por exemplo, os direitos dos incapazes e os inerentes à personalidade: direito à vida, à imagem, à liberdade, etc. Ressalte-se que, mesmo diante dessa idéia por nós defendida, a indisponibilidade dos bens do devedor ainda manifesta sim o interesse social, de acordo com as razões inicialmente suscitadas.

6.4. A REALIZAÇÃO DOS FINS DA FALÊNCIA

(33)

É para evitar esse quadro de injustiça, privilegiando os mais necessitados, garantindo a eficácia das normas legais e contratuais e proporcionando tratamento igualitário a todos os credores de mesma categoria, que o direito criou o instituto da execução concursal, ou seja, o concurso de credores. A falência é, portanto, uma execução concursal contra o devedor empresário que visa a garantir a todos um tratamento conforme o princípio de igualdade – tratar os iguais igualmente e os desiguais desigualmente na medida de sua desigualdade.

Podemos afirmar, com muita propriedade, que a principal finalidade do procedimento falimentar, indubitavelmente, é proporcionar o tratamento igualitário dos credores, efetivando o princípio da par conditio creditorum. Destarte, todo o

patrimônio do devedor será distribuído, seguindo um critério de preferência estabelecido pelo legislador, conforme a qualidade do crédito e o interesse social que ele demanda, preservando-se, em cada caso, a igualdade entre créditos cujos direitos comunguem da mesma natureza.

A maioria dos autores vê na par conditio creditorium a razão de ser da

falência, sua verdadeira essência. Por todos, Gladston Mamede enfatiza bastante o interesse social que a envolve:

A principal questão restante foi a necessidade de ordenar a apuração do

patrimônio ativo do insolvente (o qauntum total de seus bens), a apuração

adequada de seu passivo (o valor global efetivo de suas dívidas) e, enfim, uma preocupação com a distribuição do montante arrecadado com as vendas dos bens, tendo em vista dois critérios distintos: (1º) o interesse público em que determinadas obrigações, por sua natureza, sejam satisfeitas preferencialmente, em desproveito de outros créditos que, por sua natureza, mostram menor relevância pela avaliação do legislador; e (2º) a preocupação em garantir que todos os credores, titulares de créditos de mesma natureza, sejam tratados em igualdades de condições, opção jurídica que se identifica com o princípio da par conditio creditorum, ou seja,

princípio do tratamento dos credores em igualdade de condições.47

Fábio Ulhoa Coelho, por sua vez, destaca de forma bastante esclarecedora a idéia de justiça inerente ao princípio em epígrafe, in verbis:

O valor básico de justiça, que se encontra nos alicerces do direito

(34)

falimentar, isto é, a instauração do concurso na hipótese de devedor sem meios suficientes para cumprir na totalidade suas obrigações, é referido pela expressão latina par conditio creditorum, tratamento paritário dos

credores. Os titulares de crédito perante o sujeito de direito que não possui condições de saldar, na integralidade, as dívidas devem receber da justiça tratamento parificado, em que se dê preferência aos mais necessitados (os trabalhadores), efetivem-se as garantias legais (do Fisco ou dos credores privados com privilégio) ou contratuais (dos credores com garantia real) e assegurem-se chances iguais de realização do crédito aos credores de uma mesma categoria (p.ex., no caso dos rateios aos quirografários, proporcionais aos créditos de cada um).48

Cumpre ressaltar a importância desse tratamento igualitário no aspecto econômico e social de uma comunidade. Com a garantia de uma eventual execução concursal, os agentes econômicos sentem-se mais seguros para conceder créditos, o que, por sua fez, fomentará a economia, proporcionando desenvolvimento à sociedade.

Paralelamente ao princípio da par conditio creditorum, a doutrina também

estabelece como objetivo do processo falimentar a concreta eliminação das empresas econômica e financeiramente arruinadas do cenário empresarial, em virtude de perturbações e perigos que podem causar no mercado, com eventuais reflexos em outros organismos. O instituto da falência é o meio através do qual o Estado realiza o saneamento do meio empresarial, afastando aqueles empresários ou sociedades empresárias que possam vir a prejudicar o sistema de produção e de trocas na sociedade e que possam vir a abalar as relações de crédito – elemento esse essencial à atividade comercial nos dias atuais. Inequívoco, por conseguinte, que o escopo último dessa “faxina” no mercado é salvaguardar os interesses econômicos.

O legislador, atento ao interesse social de evitar mal maior à economia com a temerária permanência do devedor insolvente no comando de sua atividade empresarial, inseriu, na Lei 11.101/05, o artigo 107, cuja regra determina que a falência promoverá o afastamento do devedor de suas atividades.

Nesse sentido, – não obstante, a nosso ver, identificar equivocadamente a figura do falido à de uma pessoa desonesta e de má índole – Jaeder considera a

(35)

supressão do empresário falido do mercado um interesse supremo da economia nacional:

“O devedor capaz, sério e sobretudo honesto, que sabe utilizar eficazmente suas aptidões profissionais e os meios de que dispões, sabe limitar a satisfação de suas próprias necessidades, tem constantemente presentes as obrigações assumidas e é atormentado pela preocupação de satisfazê-las pontualmente e totalmente, é o que merece maior confiança; o devedor que não possui tais qualidades é o mais pérfido e perigoso, ainda que provido de meios e a sociedade deve defender-se com as medidas mais adequadas, e eventualmente mais drásticas, que podem consistir em sanções civis e penais e ainda na adoção de métodos de publicidade capaz de pôr de sobreaviso aquele que estivesse a ponto de conceder-lhe um crédito imerecido.”49

Ademais, o legislador ordinário, reconhecendo o papel social a ser desempenhado pela empresa, consagrou, entre os propósitos falimentares, a conservação de sua função social. A função social da empresa é um princípio constitucional construído doutrinariamente, resultado de uma interpretação sistemática de regras fundamentais esculpidas na Constituição Federal. Para uma melhor compreensão, passemos então a analisá-lo.

O constituinte, ao consagrar o direito à propriedade privada, determinou que ela atendesse à sua função social50, o que significa dizer, em poucas palavras,

que os bens particulares devem ser inseridos no contexto de convivência social, para que, de tal forma, toda a coletividade possa, de alguma forma, dele também beneficiar-se. Não se trata, vale salientar, de limitação ao direito de propriedade, visto que não diz respeito ao seu exercício, mas de elemento incrustado na própria estrutura desse direito. José Afonso da Silva enaltece a natureza publicista que esse princípio emprega na estrutura do direito de propriedade e ressalta a sua aplicabilidade instantânea:

“A norma que contém o princípio da função social da propriedade incide imediatamente, é de aplicabilidade imediata, como o são todos os princípios constitucionais. A própria jurisprudência já o reconhece. Realmente, afirma-se a teafirma-se de que aquela norma tem plena eficácia, porque interfere com a

Referências

Documentos relacionados

(2008), o cuidado está intimamente ligado ao conforto e este não está apenas ligado ao ambiente externo, mas também ao interior das pessoas envolvidas, seus

Depois da abordagem teórica e empírica à problemática da utilização das Novas Tecnologias de Informação e Comunicação em contexto de sala de aula, pelos professores do

Com a investigação propusemo-nos conhecer o alcance real da tipologia dos conflitos, onde ocorrem com maior frequência, como é que os alunos resolvem esses conflitos, a

A abordagem mais usual de fadiga, que utiliza a tensão nominal e a classificação de detalhes geométricos para previsão da vida em fadiga, não abrange conexões mais complexas e

Purpose: This thesis aims to describe dietary salt intake and to examine potential factors that could help to reduce salt intake. Thus aims to contribute to

Seria impossível estudá-los um por um, e aliás semelhante estudo ameaçava confundir-se como o que é realizado pela Ciência Jurídica. O que há de específico no Direito

A avaliação dos diferentes métodos de preparação da superfície já impressa para a extrusão de uma nova camada na impressão tridimensional por deposição fundida

Para tanto foram utilizados 60 ratos (Wistar) machos divididos em quatro grupos de 15 animais cada. Todos os animais foram submetidos à extração do incisivo central superior direito,