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O trabalho como formação e deformação do homem nos manuscritos de 1844 de karl Marx

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(1)

UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ FACULDADE DE EDUCAÇÃO PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO

Antônio Carlos da Costa e Silva

O TRABALHO COMO FORMAÇÃO E

DEFORMAÇÃO DO HOMEM NOS MANUSCRITOS DE

1844 DE KARL MARX

(2)

ANTÔNIO CARLOS DA COSTA E SILVA

O TRABALHO COMO FORMAÇÃO E

DEFORMAÇÃO DO HOMEM NOS MANUSCRITOS DE

1844 DE KARL MARX

Dissertação apresentada ao Curso de Mestrado em Educação, do Programa de Pós-Graduação em Educação Brasileira, da Universidade Federal do Ceará, como requisito parcial à obtenção de título de Mestre.

Orientador: Prof. Dr. Eduardo Ferreira Chagas. Coorientador: Prof. Dr. José Rômulo Soares.

(3)

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação Universidade Federal do Ceará

Biblioteca de Ciências Humanas

S578t Silva, Antônio Carlos da Costa e.

O trabalho como formação e deformação do homem nos manuscritos de 1844 de Karl Marx / Antônio Carlos da Costa e Silva. – 2012.

102 f. , enc. ; 30 cm.

Dissertação (mestrado) – Universidade Federal do Ceará, Faculdade de Educação,Programa de Pós-Graduação em Educação Brasileira, Fortaleza, 2012.

Área de Concentração: Educação.

Orientação: Prof. Dr. Eduardo Ferreira Chagas. Coorientação: Prof. Dr. José Rômulo Soares.

1.Marx,Karl,1818-1883 – Crítica e interpretação. 2.Propriedade privada. 3.Trabalho. 4.Alienação (Filosofia). I. Título.

(4)

ANTONIO CARLOS DA COSTA E SILVA

O TRABALHO COMO FORMAÇÃO E DEFORMAÇÃO

DO HOMEM NOS MANUSCRITOS DE 1844 DE KARL MARX

Dissertação apresentada ao Curso de Mestrado em Educação, do Programa de Pós-Graduação em Educação Brasileira, da Universidade Federal do Ceará, como requisito parcial à obtenção de título de Mestre.

Aprovada em _____/_______/_______.

BANCA EXAMINADORA

_________________________________ Prof. Dr. Eduardo Ferreira Chagas (Orientador)

Universidade Federal do Ceará - UFC

_________________________________ Prof. Dr. Hildemar Luiz Rech (Examinador)

Universidade Federal do Ceará - UFC

_________________________________ Prof. Dr. José Rômulo Soares (Coorientador)

Universidade Estadual do Ceará - UECE

(5)

A minha mãe Otília Costa, a minha

esposa Francirene e ao meu filho João

Carlos que são para mim incentivos em

(6)

AGRADECIMENTOS

A Deus que sempre me ilumina e guia, dando-me força para trilhar essa caminhada.

Ao meu orientador Prof. Dr. Eduardo Ferreira Chagas por quem tenho um verdadeiro

apreço, pela contribuição de seus conhecimentos e experiência que com seu rigor

cientifico e zelo pelo saber dos educandos, com paciência e serenidade conduziu essa

orientação, não obstante seu grande número de orientandos e outras atividades

profissionais.

Ao Prof. Dr. José Rômulo Soares que tão gentilmente aceitou a coorientação desse

trabalho com preciosas sugestões, indicação e empréstimo de livros, fazendo as devidas

críticas teóricas sem imposições ideológicas.

Aos meus professores do mestrado em especial ao Prof. Dr. Hildemar e aos demais

membros-examinadores que participaram das bancas de qualificação e de defesa, pelo

cuidado com que leram meu trabalho e pelas críticas e sugestões que fizeram para

melhorá-lo. .

Ao amigo e incansável incentivador Pe. Emílio Castelo, que nunca mediu esforços para

me ajudar em todas as horas.

Aos meus amigos (as) de trabalho e aos companheiros (as) do eixo Filosofia, Política e

Educação pelo incentivo e força, por sempre acreditaram em mim e nos meus esforços.

A todos os professores, funcionários e a todos aqueles e aquelas que direta ou indiretamente colaboraram para a realização deste trabalho.

Às Prefeituras de Fortaleza e de Maracanaú, através de suas respectivas Secretarias de

Educação, que me concedeu liberação para cursar o Mestrado Acadêmico em Educação,

e possibilitou dedicação exclusiva sem a qual não teria sido possível realizar esse

estudo.

(7)

“O trabalho não é suscetível nem de acumulação, nem mesmo de poupança, diferentemente das verdadeiras mercadorias. O trabalho é a vida, e se a vida não se permutar todos os dias por alimento, sofre e, em seguida, perece.”

(8)

RESUMO

Esta pesquisa; objetivou investigar o duplo caráter do trabalho em Marx como formador e deformador do homem nos Manuscritos Econômico-Filosóficos, de 1844. Para

realização da referida pesquisa, qualitativa, bibliográfica e documental, utilizou-se a

análise imanente da obra supracitada, pelo método diátetico-critico-reflexivo. Este

estudo teve o intuito de averiguar a questão da propriedade privada como condição do

trabalho negado, na medida em que investigou a crítica de Marx tanto à Economia

Política quanto a Hegel e à sua dialética. Assim, procurou-se mostrar que a reflexão de

Marx nos Manuscritos de 44 comporta esse duplo caráter do trabalho como

negação/deformação do homem no trabalho estranhado (atividade de subsistência e de

satisfação imediata, como fator de desumanização do homem). Assim sendo, o trabalho

não representa uma atividade na qual o homem se educa e se forma material e

espiritualmente, mas um meio em que se estranha em sua natureza, daquilo que produz,

da sua atividade e de si mesmo. Por outro lado, vimos o conceito positivo de trabalho

como atividade afirmativa da vida e da existência da pessoa e seu caráter social. Para

Marx, o homem se realiza no trabalho na medida em que objetiva as suas forças

essenciais, como resultado previamente estabelecido pela consciência antecipadora da

sua vontade crítica, e recupera o seu caráter genérico/universal. Conclui-se que, para

Marx, o trabalho é na sua essência uma atividade criadora (formadora) do homem, ao

mesmo tempo em que, na sociedade capitalista, baseada na propriedade privada dos

meios de produção, o trabalho se transformou em atividade de negação do homem, ou

seja, negação da formação humana.

(9)

ABSTRACT

The research that gives a particular shape to this dissertation had as its goal to

investigate Marx’s double perspective of work in his Economic Philosophic

Manuscripts of 1844, viz, labor as former and deformer of man. In order to carry on this qualitative, biographic and documentary research, the task was based on an immanent analysis of the aforementioned document by the use of the dialectic-critical-reflexive method. The study was aimed at evaluating the issue of private propriety as a condition to negated labor in so far as it investigates Marx’s critical appraisal not only of Political Economy but also of Hegel’s dialectics. In this way the research tries to

show that Marx’s reflection in the 1844 manuscripts allows for that double perspective

of labor as a negation/deformation of man within estranged labor (activity of

subsistence and immediate satisfaction as a factor of man’s

dehumanization). Therefore, labor does not represent an activity by means of which man educate and form himself materially and spiritually, but as an instrument that alienates him from his production, his activity, even from himself. On the other hand, one sees the positive concept of labor as an affirmative activity that validates life and the individual within a social framework. Marx propounds that man asserts himself in his job as far as it objectifies his essential strength that is a previously established output engendered by an anticipating awakening of his critical will and in this fashion releases its generic/universal appeal. One concludes then that for Marx, labor is essentially a creative activity (forming) for man, while in the capitalist society which is based on private propriety of the means of production, labor is changed into a tool for negation of man and denial of human formation.

(10)

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO... 11

1 A PROPRIEDADE PRIVADA COMO CONDIÇÃO DO TRABALHO / NEGADO E DEFORMADOR DO HOMEM. ... 18

1.1 A Origem da Propriedade Privada e as Concepções de Trabalho antes de Marx. ... 22

1.2 Influência de Hegel e dos Economistas Clássicos sobre o Pensamento de Marx. ... 30

1.3 A Propriedade Privada no Contexto da Sociedade Burguesa. ... 33

2 TRABALHO ESTRANHADO EM MARX ... 37

2.1 Aspectos Negativos do Trabalho ... 37

2.2 – O Trabalho como Produção da Existência ... 40

2.3 Quando o Trabalho se Torna Negação: Trabalho Estranhado ... 44

2.4 A Diferença entre Alienação e Estranhamento ... 52

3.5 As Determinações do Trabalho Estranhado ... 55

2.5.1 O Produto do Trabalho ... 55

2.5.2 O Ato da Produção ... 56

2.5.3 O Ser Genérico ... 58

2.5.4 O Trabalhador e os demais Seres Humanos ... 60

3 O CONCEITO POSITIVO DO TRABALHO. ... 63

3.1 A Influência Positiva de Hegel - A Positividade Hegeliana do Trabalho como Formação da Consciência. ... 64

3.2 Crítica aos Limites do Conceito de Trabalho em Hegel... 69

3.3 - Crítica Marxiana à Economia Política. ... 75

3.4. Positividade em Marx (Método da Inversão) ... 79

3.4.1 A Relação do Trabalho com o Produto. ... 80

3.4.2 O Trabalho Constrói o Produto. ... 81

3.4.3 O Homem se Vê em Feixe de Relações. ... 82

3.4.4 Possibilita o Homem Ter Relações com o Outro. ... 83

3.5 - Positividade do Trabalho com a Educação. ... 85

CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 93

(11)

INTRODUÇÃO

Ao completar 168 anos, a obra Manuscritos Econômico-Filosóficos, 1 esta pérola

marxiana, continua atualíssima e revolucionária. O contexto atual de mais uma crise do

capitalismo pós-industrial e de globalização dos mercados põe na pauta do dia a discussão

sobre a alienação do trabalho e da sua superação rumo à emancipação humana. A ebulição

sócio política e econômica mundial no presente, sem poupar nem mesmo as “grandes potências”, como exemplo as últimas manifestações nos Estados Unidos do “ocupe Wall Street”, a crise na zona do Euro e a chamada “Primavera Árabe”, bem figura que “tudo o que

era sólido se desmancha no ar, tudo o que era sagrado é profanado, e as pessoas são

finalmente forçadas a encarar com serenidade sua posição social e suas relações

recíprocas”. (MARX, 1990, p. 69).

Portanto, neste âmbito de crise do capitalismo mundial, sob o signo do domínio

das estruturas desumanas e mortíferas do capital, se impõe o debate sobre a dupla

determinação do trabalho, e esta providência histórica não está esgotada. O capitalismo não é

o sistema da emancipação humana porque sua “racionalidade” econômica e social é perversa

e “irracional” e sua proposta moral e social de liberdade/felicidade é ilusória, individualista e

egoísta.

Por isto, atualmente, quando se advoga o fim do trabalho e da sua centralidade,

para entender a sociabilidade e a emancipação humana, em autores como Offe (1989), Gorz

(1982) ao contrário deles ficamos com a posição confirmativa do trabalho, pois o trabalho,

continua sendo a atividade que ainda mais ocupa a maior parte da humanidade. Quase sempre,

porém ele é entendido como atividade precária, mal remunerada, alienada/estranhada, em que

os trabalhadores produzem as riquezas, mas não decidem o que produzem nem para quem

produzem, a que preço e outros aspectos da produção.

______________________

(12)

Desconhecer essa realidade ou subestimá-la é situar-se fora do mundo real das

pessoas. Não por acaso as políticas que mais “distribuem renda”– confirmadas pelo processo

brasileiro – estão associadas com aumentos de salários, em particular, do salário mínimo, de

tal forma que as atividades de trabalho são centrais para a sobrevivência das pessoas.

Se as atividades humanas não podem ser reduzidas às do trabalho na realidade,

elas cruzam a vida de praticamente todos: negros, índios, mulheres, idosos, crianças

(infelizmente) trabalham. Há, contudo, um grande beneficiário, o dono do capital que, por sua

vez, vive do trabalho alheio.

Por isso, as atividades do mundo do trabalho e tudo o que as envolve têm que

voltar a ser preocupação central dos governos democráticos, dos movimentos populares, do

pensamento crítico e de todos os que lutam pela emancipação humana. Desta forma, as

relações do trabalho continuam a ocupar lugar central no capitalismo e devem ser

contempladas centralmente na formação de um mundo justo e solidário.

Confirmamos ser o trabalho a objetivação ineliminável e primária do ser social, o

que implica a mediação deste como um instrumento possível no ser social e em seu metabolismo com a natureza. Tal metabolismo implica, no ser social, o estabelecimento de

meios e fins, de escolhas, de uma ação teleológica, objetivações que potencializam as

capacidades humanas. Até mesmo as objetivações aparentemente distantes do trabalho são, na

verdade, originadas por ele, como, por exemplo, a arte, a religião, a ciência, o pensamento

abstrato. Quanto mais se desenvolvem as esferas humanas originadas pelo trabalho, tanto

mais objetivações se relacionam a ele. Com efeito, entendemos não existir ser singular fora da

sociedade.

Todo o pensamento de Marx – desde a juventude até a maturidade – gravita ao

redor da efetivação da totalidade do homem, ou seja, o homem como ser plenamente realizado

e recuperado na sua unidade (essência e existência) com base no desenvolvimento das suas

potencialidades e capacidades humanas. Assim sendo, o fio condutor de sua reflexão é

alienação/estranhamento desde as obras de juventude até as da maturidade.

Ao analisar o contexto vivido por Marx, percebemos que ele foi contemporâneo

da segunda revolução burguesa na França de Napoleão III (1848-1852) e da primeira

revolução proletária mundial, a Comuna de Paris (1871), que no ano passado (2011)

(13)

elaborar sua teoria de classes e compreender melhor a natureza do Estado burguês. Mészáros

(2006), em A Teoria da Alienação em Marx, mostra que a importância de Marx para o

pensamento filosófico ocorre com suporte na crítica à filosofia idealista, transcendentalista e

especulativista, fundando a “filosofia da práxis” (MARTÍNEZ, 2007), pois Marx

revolucionou o pensamento ocidental, ao fundar o materialismo histórico e ao elaborar a

teoria da mais-valia, ignorado pela economia política de teor clássico.

Faz-se mister e se justifica, portanto, esta pesquisa na proposta de explicitar e/ou

tematizar como o trabalho em Marx tem um duplo caráter como formação e deformação do

homem. Também foi nosso propósito analisar, nesta dissertação, a relação entre trabalho estranhado e propriedade privada em Marx. Sustentamos, de saída, que tal relação implica a

submissão do ser humano ao capital, pois, segundo ele, a propriedade privada burguesa é o

principal obstáculo material à emancipação humana. A propriedade privada, segundo Marx,

faz com que o homem não reconheça o trabalho como atividade que engendra a vida genérica

(social). O trabalho como atividade estranhada, isto é, trabalho sob os ditames da propriedade

privada, impede a pessoa de trabalhar livre e consciente, portanto, de se reconhecer como ser

social.

Em decorrência, este estudo resulta de uma investigação bibliográfica e foi

desenvolvido com base na análise imanente da obra de Karl Marx, especificamente, os

Manuscritos Econômico-Filosóficos de 1844.

Assim sendo, pudemos detectar na obra de Marx que o problema central consiste

na crítica tanto à Economia Política, como a Hegel e à sua dialética especulativa. Desta forma,

procuramos mostrar que o objeto de reflexão nos Manuscritos de 44 é a crítica ao capitalismo,

à sociedade industrial moderna; crítica esta que se efetiva pela categoria trabalho como

negação do homem.

Nos Manuscritos Econômico-Filosóficos, de 1844, a categoria “trabalho” se

apresenta, por um lado, como a dimensão que especifica o homem como ser genérico - é

atividade vital da consciência como atividade livre. Trabalho para Marx é objetivação integral

do próprio homem, relaciona-se à práxis. Por outro lado, o trabalho não realiza o homem, ao

(14)

Em Marx, trabalho é tomado como processo e não existe trabalho sem teleologia.

Por isso, a sociabilidade em Marx é questão central quando se entende produção e reprodução

da vida social.

Assim sendo, é que, nestes Manuscritos de Paris, aparece pela primeira vez a

crítica marxiana à Economia Política. Esta crítica não é de cunho ético-humanista, mas,

especificamente, da ordem do real. É metodológica, uma vez que a Economia Política não vai

além do universo da sociedade capitalista; pelo contrario, ela vê a realidade como expressão

de leis eternas, isto é, não histórica.

Como definidor de nosso objeto, procuramos investigar como o estudo do

conceito trabalho contribui para pensar esta categoria, não apenas no universo do capitalismo

(sociedade industrial moderna), nem como a atividade teorética, mas objetivação integral do

próprio homem; ou seja, buscamos elucidar “o duplo caráter do trabalho em Marx como formador e deformador do homem”.

Conforme já nos referimos, a fonte primária de nosso estudo se concentrou na

obra da juventude de Karl Marx, Manuscritos EconômicoFilosóficos, de 1844, e dela buscamos extrair as tessituras dos conceitos que escolhemos investigar: propriedade privada,

trabalho alienado, trabalho estranhado. Do conceito de trabalho estranhado, entendemos como aspectos negativos as atividades de subsistência e de satisfação imediata; e do conceito

trabalho alienação, foram vistas como positivas as atividades afirmativas da vida e da

existência do indivíduo e seu caráter social.

Como leitura de apoio, mas não de menor importância, estudamos A Teoria da

Alienação em Marx, de István Mészáros, que nesta obra retoma e desdobra os vários tipos de

alienação do sistema capitalista, ao demonstrar os aspectos econômicos, políticos,

ontológicos, morais e estéticos nas relações com o trabalho, na separação entre teoria e

prática, entre o homem e a natureza, e considerações sobre a sua superação. Assim, pudemos

investigar em que medida Marx e Mészáros se atualizam; e o segundo completa o primeiro.

Presumimos que a barreira da alienação, impeditiva do homem efetivar a

liberdade, é a barreira do trabalho estranhado na sociedade capitalista, constituída sob a

inapropriada forma de apropriação da força de trabalho. Com efeito, o cerne da alienação

(15)

de produção. Ademais, o trabalho alienado valoriza e expande o capital e a propriedade

privada para uma minoria.

Esta dissertação desdobrou-se em cinco partes – “A PROPRIEDADE PRIVADA COMO CONDIÇÃO DO TRABALHO NEGADO/DEFORMADOR DO

HOMEM”, “O TRABALHO ESTRANHADO EM MARX” E “O CONCEITO

POSITIVO DO TRABALHO” – incluindo Introdução e Considerações Finais.

No primeiro capítulo, procedemos à discussão sobre A propriedade privada como

condição do trabalho negado/deformador do homem. Inicialmente, expressamos uma visão panorâmica da história do trabalho, como este foi sendo concebido nos vários momentos do

desenvolvimento da história da humanidade, desde a Idade Antiga, passando pela Idade

Média, Moderna e Contemporânea, período no qual Marx viveu e formulou sua teoria. Desta

forma, o seu conceito de trabalho recebeu a influência de Hegel e dos economistas clássicos

de sua época; pois, Marx, desenvolveu sérias críticas ao sistema capitalista, aos hegelianos, a

Hegel e aos economistas nacionais. Na sequência, contextualizamos a propriedade privada no

âmbito da sociedade burguesa pelo quanto transforma o trabalhador em mercadoria e a ele (trabalhador) “só é permitido ter tanto para que queira viver, e só é permitido querer viver para ter”. (MARX, 2010, p. 142).

O segundo capítulo, intitulado O Trabalho Estranhado em Marx, se pauta em

vários subitens como “Aspectos negativos do trabalho”, “O trabalho como produção da existência”, “Quando o trabalho se torna negação”, “A diferença entre Alienação e Estranhamento” e “As determinações do trabalho estranhado”. De início, tratamos diretamente do conceito de trabalho na visão de Marx, para quem o trabalho é uma atividade

essencial do ser humano consciente, que o realiza em contato com a natureza. Mais do que

qualquer outra coisa, é o trabalho que torna o ser humano diferente dos outros animais. O

trabalho, portanto, é uma condição objetiva da existência humana. É graças ao trabalho que o

homem consegue alimentos, vestiários e moradia.

Na medida em que a humanidade cresceu, também desenvolveu seus meios de

produção. Do uso dos instrumentos de pedra, o homem primitivo passou ao uso dos arcos e

flechas, indo assim da caça à pecuária primitiva. Depois, mediante o uso de instrumentos de

metal, ele chegou à agricultura. Posteriormente, surgiram ofícios separados da agricultura. Em

(16)

de substituição dos instrumentos de produção artesanal pela máquina, da pequena oficina para

a grande indústria.

Com o desenvolvimento desse processo e com a influência do sistema capitalista,

o pequeno produtor tornou-se submisso ao proprietário dos meios de produção, ficando

alienado em relação ao trabalho e ao seu produto, em relação a si mesmo e à sua espécie. O

trabalho alienado passou a ser para o trabalhador, em vez de uma realização, uma negação de

si mesmo.

Marx reconhece o método de Hegel, que vê o trabalho como dimensão

constituidora de objetividade. Se por um lado, no entanto, o trabalho é a dimensão que

especifica o homem como ser genérico e é atividade vital da consciência como atividade livre,

de outra parte, o trabalho não realiza o homem, ao contrário, é sua negação.

Trabalho para Marx é objetivação integral do próprio homem. Segundo nosso

autor, trabalho é tomado como processo e não existe trabalho sem teleologia. Por isso, a

sociabilidade em Marx é questão central.

Marx refere-se ao trabalho alienado/estranhado como o processo em que nesse ato

humano por excelência, que é o trabalho, o homem se perde a si próprio, separando-se de si,

não reconhecendo a sua humanidade naquilo que faz. Portanto, em vez de libertar o homem

da natureza, por via da objetivação, o trabalho tornou o homem escravo; e deformação do

humano no homem.

Efetivamente, a sociedade burguesa exprime de forma aguda a transformação do

trabalho em meio de negação do homem, quando por essência devia ser a afirmação da sua

humanidade. Então, em vez de formar o homem, o trabalho estranhado está deformando e

negando sua existência como ser consciente e livre.

No terceiro capítulo, objetivamos esclarecer O conceito positivo do trabalho; nele

fizemos uma contraposição entre a crítica e os limites do conceito de trabalho em Hegel e nos

economistas político-clássicos. Analisamos a positividade hegeliana do trabalho como

(17)

Em suma, esse módulo objetiva esclarecer como Marx anuncia a possibilidade

prática de realizar a emancipação humana com origem na abolição do trabalho alienado como

motor de expansão da propriedade privada e da valorização do capital.

Portanto, o trabalho é a atividade humana fundamental, pois com ânimo na

atividade laboral é desenvolvida toda a complexa rede de desdobramentos que envolvem a

condição humana: desde a produção dos produtos necessários para a satisfação das

necessidades humanas concretas, o desenvolvimento e aperfeiçoamento da atividade, dos

instrumentos utilizados ao desenrolar das próprias aptidões humanas, dos atributos humanos,

inclusive dos sentidos humanos, da linguagem, da consciência, da sociabilidade, das

representações humanas. Ou seja, temos o trabalho como formação da consciência.

De tal modo, esta consciência em relação à consciência com o outro é

possibilitada pela abolição da propriedade privada, bem como a superação da totalidade do

intercâmbio social estranhado. Isto porque estas, por sua vez, são expressas como condição

material para elaboração e surgimento do homem omnilateral que se edifica no seio de novas

relações sociais. Portanto se conclui que o trabalho não estranhado é mediação da formação

do homem que Marx chama de o homem rico; o homem de uma totalidade que concretiza a manifestação humana de vida. O homem, no qual a sua efetivação própria (educação/

(18)

1.

A PROPRIEDADE PRIVADA COMO CONDIÇÃO DO TRABALHO / NEGADO E DEFORMADOR DO HOMEM

No terceiro caderno dos Manuscritos Econômico-Filosóficos, intitulado “Propriedade Privada e Trabalho”, Marx inicia essa tematização dizendo que “a essência subjetiva da propriedade privada, a propriedade privada enquanto atividade para si própria,

como sujeito, como pessoa, é a trabalho” (MARX, 2010, p. 99). Para Marx, a Economia

Política é a grande reveladora da essência subjetiva da riqueza, ao considerar o trabalho como

o princípio da formação da riqueza objetiva das coisas, como resultado da energia real e do

movimento da propriedade privada que acelera e intensifica o dinamismo e o

desenvolvimento da indústria, tornando-a uma potência no domínio da consciência.

Para Marx, a propriedade privada, no entender da Economia Política, surge de

uma relação estranhada como consequência do trabalho estranhado, isto é, o produto ou

consequência do trabalho estranhado que pertence a outro e não a si mesmo. Ela é uma relação estranhada com a natureza, ou seja, “a propriedade privada é, portanto, o produto, o resultado, a consequência do trabalho exteriorizado, da relação externa do trabalhador com

a natureza e consigo mesmo.” (IBIDEM, p. 87).

A propriedade privada, nesse caso, vem de um trabalho estranhado de uma relação

social externa, apropriada por um outro e não o produtor. Assim, consoante Marx, a

propriedade privada vem de um trabalho que pertence a um dominador ou senhor do trabalho, implicando que a propriedade privada resulte “por análise, dom conceito de trabalho exteriorizado, isto é, de homem exteriorizado, de trabalho estranhado, de vida estranhada, de

homem estranhado.” (IBIDEM, p. 87).

Marx diz que o trabalho exteriorizado provém de um resultado da propriedade

privada na qual esta é originada do domínio de outro ou comando de outro. A propriedade

privada não é a causa do trabalho estanhado e sim uma consequência. Assim, segundo Marx, ela pode ser comparada com os deuses, pois eles vêm da produção dos outros.

(19)

Tal ação recíproca vem de uma ação natural ou que foi herdada da fantasia

humana de forma fictícia. O mistério da propriedade privada, por um lado, para Marx é o

produto de um trabalho exteriorizado ou de alguém que não é o trabalhador, e, por outro lado,

vem de uma realização do trabalho exteriorizado, porque, segundo Marx, o ponto máximo do desenvolvimento da propriedade privada “é, por um lado, o produto do trabalho exteriorizado e, em segundo lugar, que é o meio através do qual o trabalho exterioriza a realização desta

exteriorização.” (MARX, 2010, p. 88).

Marx verifica que não é o trabalho em geral que a Economia diz que é a alma da

produção e sim o trabalho abstrato. Marx diz que a “economia nacional parte do trabalho

como [sendo] propriamente a alma da produção, e, apesar disso, nada concebe ao trabalho e

tudo a propriedade privada”. (IBIDEM, p. 88)

Com isso, Proudhon1 não percebe ou ignora o trabalho estranhado, pois, conforme

Marx, não é o trabalho em geral a alma da produção capitalista e sim o trabalho abstrato, ou

seja, ele analisa de modo geral que:

Proudhon, a partir desta contradição, conclui a favor do trabalho [e] contra a propriedade privada. Nós reconhecemos, porém, que esta aparente contradição do trabalho estranhado consigo mesmo, e que a economia nacional apenas enunciou as leis do trabalho estranhado. (MARX, 2010, p. 88).

Com efeito, Marx assevera que a Economia Política só anunciou as leis do

trabalho alienado por causa da contradição em atribuir tudo à propriedade privada. Marx vê

que salário e propriedade privada são iguais porque o salário é apenas uma recompensa para o

homem aceitar o trabalho estranhado, isto é, o salário e a propriedade privada procedem da consequência de um trabalho estranhado, por isso “reconhecemos que salário e propriedade privada são idênticos, pois o salário (onde o produto, o objeto do trabalho, paga o próprio

trabalho) é somente uma consequência necessária do estranhamento do trabalho”. (IBIDEM,

p. 88).

Há um caráter estranhado do trabalho diante do homem, pois o salário mostra que

o trabalhador não tem direito à totalidade do produto do trabalho e sim apenas a uma parcela.

______________________

1 Marx desaprova Proudhon por ele não abolir o estranhamento político econômico no interior do estranhamento

(20)

Diferentemente do escravo, que recebia comida para trabalhar, o trabalhador recebe salário

para se manter. Marx questiona que, mesmo com uma elevação, ou melhor, pagamento do

salário, o valor ou dignidade do homem não aumentará, pois é como, por exemplo, um

escravo que recebe algo a mais para continuar trabalhando ou até mesmo um óleo colocado

em uma roda para manter o movimento. Assim, podemos perceber que, mesmo quando há

aumento do salário, ainda se preserva o estranhamento do trabalho, ou seja, “uma violenta

elevação do salário... nada seria além de um melhor assalariamento do escravo e não teria

conquistado nem ao trabalhador e nem ao trabalho a sua dignidade e determinação

humana”. (MARX, 2010, p. 88).

Mesmo com a elevação dos salários, ainda se mantém o trabalho que é de outro,

isto é, o trabalho que é do não trabalhador ou senhor do trabalho. Marx também descarta a

possibilidade de uma igualdade de salários, como pensava Proudhon, com o aumento dos

salários, mesmo assim o dono da propriedade privada ainda é considerado um capitalista, pois

as relações entre os homens com o seu trabalho permanecem afetadas, isto é, continua sendo

um trabalho estranhado porque a igualdade de salário ainda faz com que o não trabalhador ou

o senhor do trabalho continue sendo o mesmo, pois,

Mesmo a igualdade de salários, como quer Proudhon, transforma somente a relação do trabalhador contemporâneo como o seu trabalho na relação de todos os homens com o trabalho. A sociedade é neste caso compreendida como um capitalista abstrato. (MARX, 2010, p. 88).

Com essa igualdade de salário, ainda continua sendo a mesma realidade porque,

como já frisamos, o salário é só uma parcela da totalidade do que o homem produz. Esse

salário é como, por exemplo, um bônus ou uma recompensa para que o trabalhador aceite o

trabalho estranhado. Com o trabalho estranhado, salário e propriedade privada estão

interligados. Se por acaso se tiver de eliminar algum, o outro também deve ser eliminado, ou

seja,

salário é uma consequência imediata do trabalho estranhado, e o trabalho estranhado é a causa imediata da propriedade privada. Consequentemente, com um dos lados tem também de cair o outro. Da relação do trabalho estranhado com a propriedade privada depreende-se, além do mais, que a emancipação da sociedade da propriedade privada etc, da servidão, se manifesta na forma política da emancipação dos trabalhadores (MARX, 2010, p. 88).

Isso acontece porque quando deixa de existir o trabalho estranhado, o senhor do

trabalho deixa de ser o dono do trabalho porque o trabalhador recebe a totalidade do salário e

(21)

propriedade privada, teremos a emancipação humana, pois a emancipação humana universal é

com o encerramento do trabalho estranhado que é a causa da propriedade privada, pois estão

envolvidas nelas todas as relações humanas que fazem originar as opressões em virtude das

relações de produção e de servidão ambas envolvidas, ou seja:

Da relação do trabalho estranhado com a propriedade privada depreende-se, além do mais, que a emancipação da sociedade da propriedade privada etc., da servidão, se manifesta na forma política da emancipação dos trabalhadores, não como se dissesse respeito somente a emancipação deles, mas por que na sua emancipação está encerrada a [emancipação] humana universal, mas esta [última] está aí encerrada por que a opressão humana inteira está envolvida na relação do trabalhador na produção, e todas as relações de servidão são apenas modificação e consequências dessa relação. (MARX, 2010, p. 88).

A emancipação humana é a emancipação do trabalhador, pois a atividade

produtiva do trabalhador não pode ser atividade produtiva universal estranhada, ou seja, a

emancipação do trabalhador, porque nenhum trabalhador irá, no futuro, trabalhar para um

outro. Marx encontra por análise o conceito de propriedade privada por meio do conceito de

trabalho estranhado e diz que, com a ajuda desses dois conceitos, há também de encontrar e

desenvolver todas as categorias econômicas consideradas determinadas. Portanto, Marx diz que, “assim como encontramos, por analise, a partir do conceito de trabalho estranhado, exteriorizado, o conceito de propriedade privada, assim podemos, com a ajuda desses dois

fatores, ser desenvolvidas todas as categorias econômicas...” (MARX, 2010, p. 89).

A Economia Política considera a propriedade privada como categoria fixa ou que

sempre existiu, isto é, fora da história. Há dois problemas que Marx procura solucionar. O

primeiro é determinar a essência universal da propriedade privada. O segundo é o fato de que

o homem chegou ao ponto de exteriorizar seu trabalho. No primeiro, Marx exprime que,

perguntar pela origem da propriedade privada (fato que veremos na próxima seção) é o

mesmo que procurar saber qual foi o primeiro ser na terra. Nesse sentido, ele assinala:

Já obtivemos muito para a solução do problema quando transmutamos a questão sobre a origem da propriedade privada na questão sobre a relação do trabalhador exteriorizado com a marcha do desenvolvimento da humanidade. Pois quando se fala em propriedade, acredita-se de está se tratando de uma coisa fora do homem. Quando se fala do trabalho, está se tratando, imediatamente, do próprio homem. Esta nova disposição já é inclusive a sua solução. (2010, p. 89).

Marx chega à conclusão de que o trabalho é algo do próprio homem, o trabalho

estranhado surge na história da humanidade e não que sempre existiu ou que está na história,

ou seja, quando se fala do trabalho, a sua solução já é a partir da história da humanidade.

(22)

ralação é o trabalho estranhado exteriorizado com a propriedade privada estranhada, que

resultou em uma civilização estranhada, ou seja, “o trabalho exteriorizado solucionou-se para

nós, [ou seja,] a apropriação aparece como estranhamento como a verdadeira civilização”.

(MARX, 2010, p. 89).

Podemos perceber, então, que o trabalho estranhado se tornou “natural” na

civilização do capital, pois estão incluídos o não trabalhador e produto ou resultado do

trabalho estranhado. Assim sendo, a propriedade privada é encontrada como expressão

material do trabalho estranhado; nisso a propriedade privada abarca a relação com o produto

do trabalho, com o trabalho, com o não trabalhador e a relação do não trabalhador com o

trabalhador e com o seu produto.

1.1 A Origem da Propriedade Privada e as Concepções de Trabalho antes de Marx.

Como nos referimos na seção anterior, no segundo Manuscrito, Marx trata da

relação entre trabalho estranhado e propriedade privada. Ele inicia a tematização, explicitando

a condição existencial do trabalhador no processo da produção a partir do ponto de vista da

Economia Política. A propriedade privada vinculada ao trabalho estranhado é, na verdade, um

inautêntico modo de ter e possuir, porque é um tipo de propriedade privada baseada na

espoliação/exploração do trabalho humano. Portanto, imaginamos que tal relação implica

submissão do ser humano ao capital. Assim sendo, optamos por mergulhar um pouco na

história do surgimento da propriedade privada e como esta foi vista em diversas épocas.

A origem e evolução da propriedade são pontos interessantes e importantes na

história da humanidade. O conceito de propriedade no decorrer do tempo foi alvo de inúmeras

transformações, adaptando-se, num contexto histórico, a cada época e a todo lugar. Tal

conceito nos informa a maneira como cada sociedade vive e como seus membros dispõem dos

meios para transformá-los em riqueza e satisfazer as suas necessidades. Ou seja, expressa o

modo de produção que adotam. De acordo com Engels, “a ordem social em que vivem os

homens de determinada época ou determinado país está condicionada por duas espécies de

produção: pelo grau de desenvolvimento do traba lho, de um lado, e da família, de outro”

(23)

A propriedade teve sua história criada através dos tempos. Então, vejamos, por

exemplo, como as ideias sobre propriedade mudaram no decorrer da história. Primeiramente,

noticia-se que a propriedade era coletiva, quando a população humana ainda era pequena e

estruturada numa forma de organização social primitiva em agrupamentos humanos

reduzidos, vivendo basicamente como coletores e caçadores nômades. Nada era de ninguém,

ou seja, não se possuía nada privadamente a não ser a própria vestimenta e as armas como

lança ou pau.

Aos poucos, a propriedade passa de coletiva para individual. Os agrupamentos

humanos crescem, tornam-se sedentários e descobrem a agricultura e o comércio. Esse processo de sedentarização e a descoberta da agricultura que chamamos de Revolução

Agrícola foram a base para a institucionalização da propriedade privada e o surgimento do Estado.

Como nos ensina Rousseau (1998, p. 84), “o homem deixou o Estado de Natureza

quando alguém cercou um pedaço de terra e disse que era seu e os outros acreditaram”. Então, por esta época, a ideia de propriedade passa a ter um caráter sagrado de direito divino,

como aparece nas primeiras civilizações da Antiguidade.

Assim sendo, são duas as principais correntes que debatem sobre os primórdios da

propriedade: a primeira corrente, defendida pelos teóricos, como Rousseau, Cesare Beccaria2

e Montesquieu, que acreditavam na propriedade como criação do Direito positivo contrário à

natureza humana; a segunda tem em Coulanges3 seu paladino, que via a propriedade privada

como instrumento motor e regulador da ordem e do desenvolvimento social.

Não é pacífica, porém, a discussão sobre o surgimento da propriedade. O fato é

que, desde o fim do século passado, se intensificou esta discussão. Sabemos, no entanto, que a

posição adotada em geral era de que a Propriedade Original como coletiva baseia-se

principalmente na ideia de que a propriedade privada se desenvolveu ao mesmo tempo em

______________________

2 Cesare Bonesana, (1753 1794), marquês de Beccaria, filósofo, jurista e economista italiano, exerceu

influência decisiva na reformulação da legislação vigente da época.

3 Numa Denis Fustel de Coulanges (1830 1889), historiador francês, autor de La Cité antique (1864), sobre a

(24)

que ocorreu a dominação de um grupo humano sobre outro, tendo como objetivo manter essa

dominação.

Na verdade, o que se pode dizer com certeza é que o homem, vivendo

inicialmente da caça, da pesca e da coleta, sequer cogitaria em se apropriar da terra, pois esta

nada representava para seus fins imediatos e escapava às suas necessidades.

Posteriormente, com o advento do pastoreio, em razão das pequenas populações

humanas e grande quantidade de recursos naturais (água, pastagens), é provável como se

observa em algumas civilizações antigas, como, por exemplo, Hebréia e Caldéia, que a terra

tenha permanecido coletiva, enquanto os semoventes (os rebanhos) tenham se tornados

individuais. Quando se iniciou, no entanto, o cultivo da terra para a agricultura, revelou-se a

necessidade da apropriação individual ou familiar da terra, pois, a partir daí, a terra passa a

fazer parte dos fins imediatos do homem, e havia que se estimular o interesse individual de

cada um. (VICENTINO, 2010).

Nos primórdios da sua existência e de seu relacionamento com a terra, a relação

do homem com ela era meramente extrativista. A subsistência do homem do período

Paleolítico era garantida pela coleta de frutos e raízes, caça e pesca. Em razão da escassez de

alimentos e da hostilidade do meio ambiente, os grupos humanos viviam como nômades,

sempre em busca de novas regiões e, quando os recursos da região findavam, eles a

abandonavam. Nessa sociedade primitiva, o coletivo prevalecia sobre o individual. Incapaz de

viver sozinho e com poucos recursos em um ambiente hostil, o homem primitivo vivia e

trabalhava em função dos agrupamentos humanos, nessa época, compostos por poucas

pessoas em espécies de clãs ou tribos, que estavam ligados por fortes relações, sentimento de

responsabilidade, obrigações ou por crenças e afinidades que os uniam ao grupo. A riqueza

era distribuída de forma equitativa dentro do agrupamento social primitivo.

A evolução da agricultura fez com que os grupos humanos antigos evoluíssem

além da agricultura de subsistência, e o homem começou a produzir mais do que necessário

para o consumo. A produção excedente passou a ter valor de troca, tendo surgido a partir daí o

comércio e o dinheiro, passando o homem a se apropriar da terra, o meio de produção,

(25)

Todas essas transformações verificadas nesse período contribuíram para o

desaparecimento da propriedade coletiva dos primórdios para o surgimento da propriedade

privada, e, aos poucos, como escrevemos, foram sendo intensificados o comércio e o

artesanato que até então tinham pouca importância por causa da estagnação social e

econômica do limitado desenvolvimento das atividades comerciais.

A esta estrutura sócio econômica, baseada no Estado despótico e no controle da

produção agrícola comunitária sustentada por grandes obras, deu-se o nome de Modo de

Produção Asiático; na Antiguidade ou Idade Antiga, as grandes civilizações (Egito,

Mesopotâmia, Grécia e Roma) tiveram o Modo de Produção Escravista ou Escravocrata; e,

na Idade Média, houve uma mudança fundamental no sistema de propriedade com a mudança

no sistema de produção, pois, em lugar do sistema de produção escravagista, que entrara em

crise com o advento do cristianismo e com as invasões bárbaras que obrigaram as populações

a se refugiarem no campo, promovendo a ruralização de Roma. Por esta época confere muita

força o sistema feudalista, que constituiu a base da sociedade medieval e sobreviveu até o

surgimento das ideias que levaram à Revolução Francesa (HUNT, 1989).

Há basicamente duas figuras no sistema de propriedade vigente na Idade Média: o

senhor feudal e os vassalos. Os pequenos proprietários de terra cediam a terra a um senhor e

lhe davam parte da produção da terra, enquanto o senhor lhes dava proteção. Observe-se,

ainda, que um vassalo maior poderia também ter seus vassalos. Se um senhor houvesse cedido

um grande feudo a um determinado vassalo, esse, por sua vez, poderia cedê-lo em feudos

menores para seus próprios vassalos, desde que, ao final, cumprisse as obrigações com o

senhor. Assim, verifica-se na Idade Média, na prática, uma superposição de propriedades

baseada na hierarquia dos feudos, que se afastava totalmente do conceito romano exclusivista

sobre a terra.

Dessa forma, assim como o vassalo, que não era proprietário, não poderia dispor

do bem, o senhor também não poderia fazê-lo livremente, muito embora pudesse ser dado em

benefício a outro homem livre, que se tornaria vassalo do vassalo do proprietário. Ambos,

senhor e vassalo, estavam presos à relação de vassalagem. O senhor não poderia retirar o

feudo do vassalo a não ser que este cometesse falta em suas obrigações. O vassalo, por sua

vez, achava-se ligado à terra e não poderia se afastar dela. Assim, tinha-se o feudo como um

(26)

Pelo uso da terra, os vassalos tinham obrigações para com o senhor: prestar

serviço militar, trabalhar determinados dias da semana em áreas cuja produção era exclusiva

do senhor, entregar parte da sua colheita ou uma determinada quantia em dinheiro e, em troca,

recebia do suserano o direito de permanecer e usar a terra e a proteção dos muros do castelo

do suserano. Desta forma, tendo o feudo como organismo básico da economia feudal, quanto

maior o feudo, maior o poder. Assim, a divisão da terra para a formação de novos feudos

gerava a fragmentação do poder do senhor feudal. Então, teoricamente, temos o rei como

suserano maior, senhor dos senhores feudais, diante dos quais todos deveriam se curvar. Na

prática, no entanto, cada senhor feudal era de fato a suprema autoridade em seu território

respectivo. (VICENTINO, 2010).

Desta forma, como vimos, a formação dos feudos se deu muito em função das

guerras que arruinaram a capacidade produtiva das pequenas fazendas, colocando os

camponeses em estado de desproteção e renúncia, primeiro, junto à nova nobreza e à Igreja,

em segundo lugar, junto ao seu patrão, o senhor feudal, transferindo-lhe as terras em troca de

arrendamento ou proteção de serviços até caírem na servidão. Em síntese,

As relações entre os poderosos latifundiários e os servos camponeses dependentes – relações que tinham sido para os romanos a forma da decadência irremediável do mundo antigo – foram, para a nova geração, o ponto de partida para um novo desenvolvimento. E, além disso, nem por isso deixaram de produzir um grande resultado: as nacionalidades modernas, a refundição e a reorganização da Europa ocidental para a história iminente. (ENGELS, 1991, p. 124).

No século XIII, começa-se a observar o declínio gradativo do feudalismo. Com o

fim das invasões na Europa, aconteceu uma verdadeira explosão demográfica, a que o sistema

de produção feudal não era capaz de atender. Até mesmo o isolamento da população em

feudos contribuiu para que as grandes pestes (Peste Negra, século XIV, Varíola, século XVI)

que assolaram o Velho Continente diminuíssem e as taxas de natalidade superassem as de

mortalidade. Havendo mais gente trabalhando no campo e o aprimoramento das técnicas

agrícolas, gerou-se um excedente de produção que precisou ser trocado; surgindo as feiras

medievais e com elas o fortalecimento do comércio e o florescimento das cidades, onde o

excedente populacional que os feudos não comportavam ia se aglomerar. Assim, rapidamente

o feudalismo perde a sua razão política e econômica.

O liberalismo e a Revolução Francesa vieram acabar com os últimos vestígios de

feudalismo. O pensamento Iluminista considerava que o princípio organizador da sociedade

(27)

individual, a livre posse dos bens e a igualdade perante a lei. As relações econômicas

deveriam ser regidas por uma liberdade natural que se estabeleceriam por si mesmas (HUNT,

1989).

A ideia da função social da propriedade, no entanto, só ganhou corpo no fim do

século XIX e início do século XX. Ainda lá na Idade Média, porém, haviam aparecido as

primeiras preocupações de pensadores relacionando a propriedade com necessidades e

interesses sociais, como é o caso de Santo Tomás de Aquino, na sua Summa Theologica4.

Santo Tomás de Aquino, como outros doutores da Igreja - Santo Anselmo de

Cantuária e Santo Ambrósio - se dedicaram a investigações sobre a propriedade. Muito

embora Santo Tomás de Aquino não defendesse uma propriedade coletivizada, ele condenava

o caráter individualista da propriedade e defendia a ideia de uma propriedade individual que

atendesse aos interesses coletivos.

Ao analisar o modo como a propriedade foi entendida na Antiguidade e na Idade

Média, podemos entender como o trabalho era visto unicamente pelo seu lado negativo, pois a

própria palavra trabalhar, que deriva do latim tripaliare, significa “torturar por meio de

tripalium” (instrumento formado por três paus, próprio para atar os condenados ou para

manter presos os animais difíceis de ferrar). Igualmente a palavra labor é sinônima de

trabalho, mas também lembra sofrimento, dor, fadiga.

Na pólis grega, o trabalho manual era desvalorizado por ser feito por escravos5.

Enquanto isso, o trabalho intelectual era supervalorizado por ser feito pelos cidadãos que

viviam no ócio digno, disponíveis para cultivar o espírito. Platão assevera que a finalidade das

pessoas livres é a contemplação das ideias, portanto, sendo a atividade teórica mais digna

pelo fato de representar a essência de ser racional.

_______________________

4 A obra Summa Theologica , escrita entre 1265-1274, é o trabalho mais conhecido de Tomás de Aquino

(c.1225-1274) e, apesar de inacabado, é um dos clássicos da História da Filosofia, e uma das obras mais influentes da literatura ocidental. Pretende ser como um manual para iniciantes em Teologia, um compêndio de todos os princípios teológicos da Igreja. Ele apresenta o raciocínio para quase todos os pontos da teologia cristã no Ocidente. É famosa, entre outras coisas, por seus cinco argumentos para a existência de Deus.

5“Como Platão considera esta classe inferior, indica, como símbolo corporal humano, as entranhas também tidas

por inferiores na cultura antiga. Estes homens não precisam de instrução superior, basta que aprendam apenas as

(28)

Também em Roma, o trabalho manual era desvalorizado. Cícero, o grande orador

e trovador latino, um dos grandes agentes da helenização da cultura romana, defende a

preferência pelo otium sobre o nec-otium, desprezo deste também ser algo pago (LOGOS,

1989, p. 246). Esta concepção clássica teve repercussão na Idade Média com a distinção entre

as atividades próprias dos homens livres e aquelas próprias dos escravos.

Desde os primórdios, a divisão do trabalho não foi algo tão natural como nos

parece nas sociedades tribais de acordo com a força e a capacidade. O fato é que, desde as

mais antigas civilizações, sempre existiram os que mandam e os que só obedecem e

executam.

Entre os romanos, o trabalho para sustentar a vida era identificado com a palavra

negócio, literalmente, negação do ócio. O ócio significava, para os antigos, a forma nobre e digna de ocupar o tempo livre com o lazer, a arte de governar e a reflexão. Enquanto isso, as

atividades relacionadas diretamente com a sobrevivência material ficavam a cargo dos

escravos, cujas funções eram consideradas desprezíveis.

Também é um fato que as sociedades descobrem mecanismos para manter a

divisão, não conforme os talentos, mas de acordo com a classe a que cada um pertence. É claro que um dos instrumentos de manutenção desse estado de coisas é a educação, privilégio

daqueles que são proprietários. Não é por acaso que a palavra grega scholé, de onde deriva

escola, significa inicialmente o lugar do ócio (ARANHA, 1993, p. 37). Aí as crianças das

classes abastadas se ocupam com jogos, ginásticas, música e retórica, enquanto as demais,

pertencentes aos segmentos pobres, seguem seu destino social, sem que se levem em conta as

tendências individuais.

Na Idade Moderna, cresceu o interesse pelo trabalho manual em virtude da

ascensão dos burgueses provenientes de setores de antigos servos, praticantes de atividades

manuais, que, comprando sua liberdade, se dedicavam ao comércio.

Uma das marcas da burguesia nascente foi a procura de novos mercados pelo

estímulo às navegações. A partir do século XV, com os grandes empreendimentos marítimos,

foram descobertos, um novo caminho para as Índias e as terras do Novo Mundo. Logo depois,

com o aperfeiçoamento da tinta e do papel, Gutenberg criou a imprensa. Todas essas

mudanças contribuíram para formar uma nova mentalidade no ser humano acerca do seu

(29)

O século XVII também foi marcado por descobertas e intervenções

importantíssimas: Pascal inventa a primeira máquina de calcular; Torricelli constrói o

barômetro; surge o tear mecânico; Galileu, por suas pesquisas, faz nascer a Astronomia e a

Física. A influência da máquina sobre a mentalidade do homem moderno é tanta que

Descartes, em sua obra Meditações, compara o universo a um relógio e Deus ao grande

relojoeiro.

Enquanto na Idade Média o saber considerado mais importante era o

contemplativo, no Renascimento e na Idade Moderna, o que se torna mais importante é o

saber prático, mediante a técnica e a experimentação.

Também não é por acaso que entre as fábulas de Jean de La Fontaine, que viveu

na França no século XVII, destaca-se a conhecida fábula: A Cigarra e a Formiga, típica

alegoria do elogio ao trabalho e crítica à vagabundagem da cigarra, que passara o verão cantando e “se esquecera” de fazer as provisões para o inverno.

Durante a passagem do feudalismo para o capitalismo, aconteceram grandes

transformações na vida social e econômica como os avanços da técnica e o crescimento dos

mercados. O acúmulo do capital possibilitou a compra de matérias-primas e de máquinas. Com isso, muitas famílias que viviam do trabalho doméstico nas antigas corporações

manufatureiras foram obrigadas a dispor de seus antigos instrumentos de trabalho e, para

sobreviver, venderam sua força de trabalho em troca de salário.

Com o aumento da população, começaram a surgir os primeiros barracões das

futuras fábricas, nos quais os trabalhadores eram submetidos à ordem da divisão do trabalho,

com horários preestabelecidos. Isso significou o surgimento de uma nova classe social: o

proletariado.

No século XVIII, na Inglaterra, a mecanização no setor da indústria têxtil foi

objeto de um grande impulso6 com o surgimento da máquina a vapor que fez a produção de

tecidos aumentar de forma extraordinária. Aconteceram também avanços em outros setores,

como o metalúrgico e também no campo, pelo processo da revolução agrícola.

_______________________

6“O futuro dos trabalhadores deixa de pertencer aos trabalhadores e a sua produção passa a ser vendida pelo

(30)

No século XIX, em meio ao progresso, destacou-se um grande problema social, o

agravamento da exploração do proletariado, levando muitos operários a viver em condições

subumanas7 8. Nas fábricas, os trabalhadores viviam em condições desfavoráveis à saúde, por

serem locais escuros e sem higiene. A moradia dos trabalhadores era em alojamentos

inadequados e apertados, nos quais não havia privacidade.

É nesse âmbito de exploração no mundo do trabalho que aparecem as figuras de

Hegel e Marx com propostas para a modificação das relações de produção9.

1.2Influência de Hegel e dos Economistas Clássicos sobre o Pensamento de Marx

Na seção anterior, demonstramos como se deu a relação da propriedade privada

com o trabalho ao longo da História; porém, na Modernidade esta relação assume outra

conotação, como veremos mais adiante. Marx, no entanto, como grande estudioso de Hegel e

dos economistas clássicos, faz uma crítica a ambos e, como todo pensamento é fruto do seu

tempo, o pensamento de Marx não poderia ser diferente.

Marx, como já assinalamos, desenvolveu os seus escritos em um contexto de

exploração dos trabalhadores (proletários) por parte dos patrões (burgueses). Seu

pensamento, é claro, é influenciado por escritos de contemporâneos e antecessores, entre os

quais destacamos Hegel e os neo-hegelianos.

_______________________

7A nova classe é submetida a extensas jornadas de trabalho, de dezesseis a dezoito horas, sem direito a férias,

sem garantia para velhice, doença ou invalidez”. (ARANHA, 1993, p. 39).

8 “Embora todos sejam mal pagos, crianças e mulheres são arregimentados como mão de obra mais barata

ainda”. (ARANHA, 1993, p. 39).

9 “Hegel e Marx apresentaram as duas últimas grandes doutrinas sobre o trabalho com muitos pontos de acordo,

(31)

Constatando a situação de desigualdade e exploração no mundo do trabalho, Marx

tem a pretensão de formular uma filosofia de ação10 11 em que, segundo ele: os filósofos

têm-se limitado a interpretar diferentemente o mundo, têm-sendo sua função transformá -lo. (MARX,

2009, p. 128).

De Hegel, Marx fez uma leitura crítica, tomando por base, sobretudo, a dialética

do senhor e do escravo12. Enquanto, para os hegelianos, a realidade era vista como a ideia que

fazemos dela, Marx demonstra que o real é o concreto e que a essência do homem é

exatamente aquilo que ele produz, pois ele não é um ser metafísico.

A filosofia hegeliana da história é a última consequência, levada à sua ‘expressão

mais pura’, de toda esta historiografia alemã, que gira em torno de interesses

políticos, mas em torno de pensamentos puros, os quais consequentemente devem

aparecer a São Bruno como uma série de ‘pensamentos’ que se devoram entre si e perecem, finalmente, na ‘autoconsciência’; e, de modo ainda mais consciente, ao

sagrado Max Stirner, que nada sabe da história real, o curso da história aparece

como simples conto de ‘cavaleiros’, bandidos e fantasmas, de cujas visões só consegue naturalmente se salvar pela ‘dessacralização’. (MARX, 2009, p. 58).

Estando em Berlim, em 1837, Marx descreve suas relações contraditórias com o

hegelianismo. Sendo contra o idealismo de Hegel, Marx não deixou de ser envolvido e

atraído por ele. O marxismo apropria-se de alguns aspectos do hegelianismo, principalmente

da dialética, para voltá-los contra o sistema.

Marx parte da análise de um dos grupos mais atuantes de Europa, até 1843 – a

esquerda hegeliana. Os intelectuais desse grupo eram fiéis à dialética do mestre, criticando a

religião, porém, para Marx: “Toda crítica filosófica alemã de Strouss a Stirner se reduz à

crítica de representações religiosas”.(MARX, 2009, p. 24). As representações metafísicas,

__________________________

10“Ao contrário das leituras tradicionais da obra de Marx, em que se afirma o abandono da filosofia em prol de

uma ciência econômica, percebemos que a filosofia esteve sempre presente no seu pensamento, ainda que não explícita. Porém, uma filosofia em novas bases, que ele busca esclarecer”. (SOBRAL, 2005, p. 96).

11

Nas Teses sobre Feuerbach, Marx afirma que o mundo não muda somente pela prática: requer uma crítica teórica (que inclui fins e táticas), pois só a teoria pura não consegue fazê-lo. A práxis é a atividade prática adequada a fins (algo deseja mudar e algo conserva), ou seja, tem um caráter teleológico.

12A dialética do senhor e do escravo consiste no seguinte: “O senhor é senhor porque é vitorioso e assim realiza

seu desejo de ser reconhecido como tal pelo escravo, sobre o qual tem poder de vida e morte. Mas a relação senhor - escravo é, como toda relação, dinâmica, e o escravo não é um elemento meramente passivo. É a consciência do escravo que reconhece o senhor como tal; este, por isso, necessita do outro para afirmar-se e se manter como senhor. O escravo, dependente em princípio de senhor, torna-se senhor da consciência de seu

(32)

políticas, jurídicas, morais, entre outras, foram incluídas na esfera das representações

religiosas ou teológicas e no homem religioso. Tendo como pressuposto o domínio da religião

em todas as relações de dominação, estas representações passaram a ser explicadas com

relação à religião transformada em culto. O ponto de partida para tudo era a fé nos dogmas.

Em sua obra Crítica da Filosofia do Direito de Hegel, Marx critica essa forma de

pensar, afirmando que as instituições jurídicas são o resultado das condições materiais de

vida, e não do desenvolvimento do espírito humano. Tanto em A Ideologia Alemã, quanto em

A Sagrada Família, Marx garante que os hegelianos são conservadores, pois não combatem o

mundo real, do qual suas frases provêm. O pensamento deles é ideológico e sem radicalidade,

pois mantém a teoria separada da práxis.

Os mais jovens entre eles descobriram a expressão exata para qualificar sua

atividade quando afirmam que lutam unicamente contra “fraseologias”. Esquecem, apenas que opõem a estas fraseologias nada mais do que fraseologias e que, ao combaterem as fraseologias deste mundo, não combatem de forma alguma o mundo real existente.(MARX, 2009, p.26).

Marx não parte de dogmas, mas de premissas reais. O homem, para ele, é sujeito

de uma realidade e sua libertação só acontecerá pela superação da alienação e da sua condição

social de produção e exploração.

É baseado na realidade e em escritos do seu tempo como as obras de Hegel

(1770-1831), Ludwig Feuerbach (1804-1872), Friedrich Engels (1820-1895), Bruno Bauer

(1809-1882), Pierre-Joseph Proudhon (1809-1865), David Ricardo (1772-1823), Saint-Simon

(1760-1825), Jean-Baptiste Say (1767-1832) entre outros, que Marx edifica a sua filosofia

como forma nova de pensar a sociedade, uma sociedade em que trabalho material e trabalho

intelectual sejam tratados de forma inseparáveis.

Dentre as obras de Marx visitadas neste estudo podemos citar: Crítica da

Filosofia Hegeliana do Direito Público (1843), Manuscritos Econômico-Filosóficos (1844)

(objeto deste trabalho), Teses sobre Feuerbach (1845), Miséria da Filosofia (reposta à

Filosofia da miséria de Proudhon) (1947) e O Capital (1867) (dividido em três volumes, dos

quais os dois últimos foram publicados posteriormente por Engels); assim como outras obras

que Marx escreveu em colaboração com Engels como: O Manifesto do Partido Comunista

(33)

1.3 A Propriedade Privada no Contexto da Sociedade Burguesa

Se até a Idade Média a riqueza se restringia à posse de terras, com predominância

na economia no chamado setor primário, como vimos nas seções anteriores, nos séculos XVI

e XVII as atividades mercantis e manufatureiras se desenvolvem a tal ponto que a riqueza

passou a significar também a posse do dinheiro e do capital, o que exigiu o desenvolvimento

da ciência e da técnica para a ampliação das indústrias, ou seja, do setor secundário.

Com a Revolução Francesa e o advento da sociedade liberal, a propriedade passa

a ser encarada como instrumento de afirmação da liberdade humana. Na condição de sujeito

de direitos, o homem é caracterizado por sua liberdade de contratar e dispor de seus bens

conforme melhor lhe aprouvesse. Não cabe qualquer intervenção de ninguém na esfera

privada particular, podendo a pessoa gerir suas riquezas como bem entender. Essa perspectiva

liberal será a base do capitalismo mundial (BONAVIDES, 2004).

A liberdade política, no entanto, adquirida na Revolução, que é contratual13, e a

igualdade formal pouco fizeram para a grande maioria da população, que, despossuída, não

tinha a mínima condição de contratar ou dispor de seus bens.

Vale destacar ainda que, nos séculos XVIII e XIX, os Estados europeus se

encontravam em profundas desigualdades sociais que se acirraram ainda mais com a

Revolução Industrial. Esta revolução, por sua vez, transformou as relações de trabalho e obrigou contingentes enormes de pessoas cada vez mais miseráveis a se adaptar a condições

desumanas de trabalho, por outro lado, propiciando a concentração de riquezas.

É esse panorama que propicia o surgimento das obras de Karl Marx e Friedrich

Engels, que criticaram o modelo de propriedade liberal burguesa. Marx propõe, entre outras

coisas, a supressão da propriedade sobre os bens de produção, qualificando com homo

_______________________

13 “A premissa capital do Estado Moderno é a conversão do Estado Absoluto em Estado Constitucional; o poder

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