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Relações profissionais no Império brasileiro: Francisco Adolfo de Varnhagen e seus amigos. Raquel Glezer 1

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Academic year: 2021

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Relações profissionais no Império brasileiro: Francisco Adolfo de Varnhagen e seus amigos.

Raquel Glezer1

Para o XVIII ENCONTRO REGIONAL DE HISTÓRIA – ANPUH SP - O

Historiador e seu Tempo, no Seminário Temático 17 – O Historiador e seu Tempo: Teoria e Historiografia, escolhi a leitura de uma fonte conhecida, fundamentada nas

discussões contemporâneas sobre a sociabilidade2 e nas propostas analíticas sobre a profissionalização de historiadores nos séculos XIX e XX3.

O projeto de pesquisa:

Em 2004 o CNPq lançou um edital denominado Memória do Saber4, em conjunto com a Fundação Miguel de Cervantes da Biblioteca Nacional, e um grupo de docentes apresentou o projeto Objeto de Estudo: Francisco Adolfo de Varnhagen (1816-1878), aprovado e não dotado.

Compõem a equipe os pesquisadores: Arno Wehling; Guilherme Pereira das Neves; Lucia Maria Bastos P. das Neves; Lucia Maria Paschoal Guimarães; Manoel Luiz Salgado Guimarães; Nelson Schapochnik, Temístocles Cezar e Raquel Glezer.

A impossibilidade de concretizar as reuniões pela não dotação fez com que cada um de nós desenvolvesse suas pesquisas separadamente, estando prevista a junção dos textos posteriormente. O texto abaixo apresentado é parte do item ‘Espaços, idéias e interlocutores’, especificamente ‘Interlocutores: pares e desafetos’.

A Fonte:

1

Profa. Titular de Teoria da História e Metodologia da História - DH/FFLCH/USP; e-mail:

raglezer@usp.br.

2

Ver GOMES, Angela de Castro (org.) . Escrita de si, escrita da História. Rio de Janeiro: Ed. FGV, 2004.

3

Ver entre outros BOER, Pym Den. History as a profession. The study if History in France, 1818-1914. Princeton/New Jersey; Princeton University Press, 1998; CERTAU, Michel de. A

escrita da História. Rio de Janeiro: Forense-Universitária; 1982; CHARLE, Cristophe. La république des universitaires, 1870- 1940. Paris: Seuil/CNL, 1994; SOFFER, Reba N. Discipline and powe: The University, History and the making of an English elite, 1870-1930.

Stanford/CA/EUA: Stanford University Press, 1996.

4

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Considerando a proposta do Seminário Temático selecionei a fonte, a obra Francisco

Adolfo de Varnhagen - Correspondência Ativa, coligida e anotada por Clado Ribeiro de

Lessa, edição do Instituto Nacional do Livro do Ministério da Educação e Cultura, em 1961, contendo 242 cartas. Conforme afirma em sua Introdução, usou material coletado em arquivos: no Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro; na Biblioteca Nacional; algumas impressas e outras inéditas, e declara que pode haver outras ainda inéditas, as quais não teve acesso. A sua organização da correspondência foi em ordem cronológica, tanto por dispersão de autores, para unificar assuntos e por considerar que as próprias cartas formam uma autobiografia, 5 sugestão ousada para os anos sessenta do século XX.

Na leitura prévia das cartas consegui arrolar alguns conjuntos: o das relações com historiadores; as das relações profissionais, nas quais incluí os relatórios de atividades profissionais, que perfazem o total de 44, e as de relações sociais, em número de 36 cartas. As destinadas ao Imperador Pedro II, o maior conjunto com cerca de 68 cartas, possuem características diversas e devem ser trabalhadas isoladamente, pois tanto há cartas de ofertas de publicações, pedidos de promoção e de titulação, como cartas com análise de conjuntura política e informações diplomáticas.

O espaço e o tempo não permitem a completa exploração de todos os conjuntos e privilegio aqui apenas dois: o dos interlocutores historiadores e o dos interlocutores profissionais.

Pelo tema da análise proposta, deixei de lado: a carta de cunho familiar (1); a de destinatário anônimo (1), e, a subordinado no serviço diplomático (1).

Os interlocutores:

Por curiosidade profissional, exploro primeiro as com os interlocutores historiadores, profissionais ou diletantes.

a) os interlocutores historiadores6 :

Foram seus interlocutores em questões historiográficas, elencados conforme a ordem cronológica da correspondência editada:

5

LESSA, Clado Ribeiro de. Introdução. In: Francisco Adolfo de Varnhagen - Correspondência ativa, coligida e anotada por... Rio de Janeiro: Instituto Nacional do Livro/Ministério da Educação e Cultura, 1961, pp. 7 -18.

6

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1. Joaquim Heliodoro da Cunha Rivara – Diretor da Biblioteca de Évora 2. Cônego Januário da Cunha Barbosa – Secretário do IHGB

3. Francisco de São Luis - Cardeal Saraiva, Patriarca de Lisboa 4. Manuel Ferreira Lagos – 2º. Secretário do IHGB

5. Ferdinand Denis – historiador francês

6. D. Pedro Sabau – Secretario da Real Academia de Madri

7. Cônego Joaquim Caetano Fernandes Pinheiro - Secretário do IHGB 8. Joaquim Possidônio Narciso da Silva – arquiteto português

9. Carlos Honório de Figueiredo –Secretário do IHGB

Dentre os acima citados, há apenas dois com uma carta - as para D. Pedro Sabau e Joaquim Possidônio Narciso da Silva. Ao primeiro, em 1854, faz a solicitação, aceita pela instituição, de depositar uma cópia do original de sua História geral..., pelo prazo de dez anos, temendo a perda do manuscrito em viagem marítima7. Ao segundo, em 1868, faz sugestões sobre a reconstrução dos Jerônimos em Lisboa8.

A correspondência mais numerosa é com Joaquim Heliodoro da Cunha Rivara - cerca de 50 cartas, entre 1839 e 1849.Nestas cartas, nos anos iniciais o tom é cerimonioso – pois Varnhagen era um iniciante no campo da pesquisa histórica; mas, nos anos finais são cartas de amizade, com notícias pessoais. De qualquer modo, sempre os assuntos centrais são fontes históricas – objeto de pesquisa dos interlocutores, com informações sobre manuscritos, arquivos locais, estado de documentação e o envio de publicações, com os agradecimentos pelas recebidas e pelas notícias de publicação.

Com Januário da Cunha Barbosa, o Secretário Perpétuo do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, o tom é sempre cerimonioso e serviçal, oferecendo publicações, fazendo pesquisas em suas viagens pelo Brasil para o IHGB, dando informações detalhadas do material encontrado e sugerindo possíveis temas de pesquisa.

Com Ferdinand Denis, historiador francês de renome, conhecedor dos temas brasileiros, o tom é cerimonioso, oferecendo obras editadas, passando informações sobre arquivos e documentos. Posteriormente, trata de assuntos familiares, mas mantém o tom respeitoso. O apoio dele foi muito importante em sua carreira profissional, com cartas

7

Op. Cit, carta 98, p. 203.

8

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de recomendação, e nas indicações de contato com outros autores. Foi uma longa relação, praticamente até o ano de sua morte.

Com o Cardeal Saraiva, o tom é de suplicante, referindo-se sempre ao que têm em comum: o amor à pesquisa em história e a ânsia de conhecer novas fontes. O Cardeal fez intervenções pessoais em favor de Varnhagen, para sua transferência para o Brasil e inclusão na carreira diplomática e militar.

Com os outros secretários do IHGB, a correspondência mantém um tom de informação mais distante e formal: manuscritos localizados; obras editadas; cópias remetidas. As cartas para Joaquim Manuel de Macedo, secretário do IHGB, que coloco no rol das cartas de amizade, de relações pessoais e não institucionais.

Tais cartas concentram-se entre os anos de 1839 a 1858, permitindo a suposição que as atividades diplomáticas fossem de menor monta, deixando mais tempo livre para pesquisas em arquivos, edições de documentos, relações com pares historiadores.

No conjunto da correspondência ativa publicada chama a atenção a total ausência das cartas polêmicas com outros autores historiadores, estrangeiros ou nacionais. Francisco Adolfo de Varnhagen foi um polemista ativo, mas os confrontos de idéias e de leitura de fontes só aparecem de forma enviesada nas cartas a Rivara e Ferdinand Denis.

b) os interlocutores profissionais9:

Foram seus interlocutores profissionais, em suas atividades diplomáticas, a serviço do Império do Brasil, em ordem cronológica:

1. Ministro do Império ou ao dos Negócios Estrangeiros – s.d. 2. Ministro da Marinha – s.d.

3. Francisco José de Souza Soares de Andréia - General do Exército Imperial 4. Conselheiro Rodrigo de Sousa da Silva Pontes

5. Antonio de Menezes Vasconcelos de Drumond – Ministro Plenipotenciário do Brasil em Portugal

6. Joaquim Maria Nascentes d´Azambuja – Oficial –maior da Secretaria de Estado dos Negócios Estrangeiros

7. Ministro do Império

8. Conselheiro José Maria Velho da Silva

9

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9. Paulino José Soares de Sousa - Visconde do Uruguai

10. Caetano Maria Lopes Gama – Visconde de Maranguape - Ministro dos Negócios Estrangeiros do Império

11. José Maria da Silva Paranhos – Visconde do Rio Branco

12. Conselheiro José Antonio Saraiva - Ministro dos Negócios Estrangeiros 13. Francisco Otaviano de Almeida Rosa – enviado especial ao Rio da Prata 14. José Tomas Nabuco de Araújo

15. Conselheiro João Lustosa da Cunha Paranaguá – Ministro dos Negócios Estrangeiros

16. Conselheiro João Alfredo Correia de Oliveira – Ministro do Império

17. Luis Pedreira do Couto Ferraz - Visconde de Bom Retiro – Presidente do instituto Fluminense de Agricultura

18. Conselheiro Francisco do Rêgo Barros Barreto – Ministro da Agricultura, Comércio e Obras Públicas

19. Odorico José da Costa – Delegado do Tesouro Brasileiro em Londres 20. João Mauricio Wanderley – Barão de Cotegipe

21. João Jose de Oliveira Junqueira – Ministro da Guerra

22. José Fernandes da Costa Pereira Júnior - Ministro da Agricultura, Comércio e Obras Públicas

23. Tomás José Coelho de Almeida – Ministro da Agricultura, Comércio e Obras Públicas

24. Conselheiro Antônio da Costa Pinto e Silva - Ministro do Império

As cartas de cunho profissional possuem as seguintes características: tom respeitoso, em que as informações consideradas necessárias para a imagem, defesa do território, melhor aproveitamento da produção agrícola são passadas aos superiores, além das atividades e funções executadas, sempre exaltando as suas atividades e o seu patriotismo. Nos anos iniciais de suas atividades diplomáticas, Varnhagen esteve a serviço em Lisboa e Madri – locais excepcionais para o desenvolvimento de suas pesquisas documentais.

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A quantidade de cartas para cada interlocutor é pequena. Tais cartas concentram-se nos anos de 1859 a 1877, denotando quer maior responsabilidade em seus cargos diplomáticos quer a maior presença do Brasil na América do Sul, com a busca de solução pacífica para os conflitos sobre fronteiras. Quando de seu retorno à Europa, na permanência em Viena, um dos centros políticos das atividades diplomáticas no último quartel do século XIX, parece ter procurado acompanhar os desenvolvimentos estratégicos que dos estados nacionais em formação estavam utilizando em sua organização, e buscado melhor relacionamento com mercados consumidores de produtos agrícolas nacionais.

Conclusão:

No conteúdo de cada um dos conjuntos selecionados são perceptíveis as formas diversas de relacionamento.

Com os interlocutores historiadores há sempre o tom respeitoso, mas no decorrer dos anos e das cartas, aparece uma cumplicidade: na troca de informações: documentos localizados, arquivos descritos, questões propostas, material permutado. Uma comunidade de pares estava em formação, ainda que de forma embrionária, misturando eruditos e diletantes.

Com os interlocutores profissionais, além do tom respeitoso, há a busca de comprovação que a tarefa solicitada foi executada da melhor maneira possível como uma demonstração de amor e patriotismo ao Império.

Referências bibliográficas:

BOER, Pym Den. History as a profession. The study if History in France, 1818-1914. Princeton/New Jersey; Princeton University Press, 1998.

CERTAU, Michel de. A escrita da História. Rio de Janeiro: Forense-Universitária; 1982.

CHARLE, Cristophe. La république des universitaires, 1870- 1940. Paris: Seuil/CNL, 1994.

GOMES, Angela de Castro (org.) . Escrita de si, escrita da História. Rio de Janeiro: Ed. FGV, 2004.

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LESSA, Clado Ribeiro de. Francisco Adolfo de Varnhagen - Correspondência ativa, coligida e anotada por ... Rio de Janeiro: Instituto Nacional do Livro/Ministério da Educação e Cultura, 1961.

SOFFER, Reba N. Discipline and power: The University, History and the making of an English elite, 1870-1930. Stanford/CA/EUA: Stanford University Press, 1996.

Referências

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