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Palavras-chave: Manoel Bomfim, intelectual, história da educação, América Latina

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UM ESTUDO DO PENSAMENTO CONTRACORRENTE DE MANOEL BOMFIM PARA A INTERPRETAÇÃO DE NAÇÃO A PARTIR DE A AMÉRICA LATINA: MALES DE ORIGEM (1905): A RELAÇÃO DO

PROGRESSO, EDUCAÇÃO E CULTURA

Marcela Cockell1 Universidade do Estado do Rio de Janeiro

(E-mail: marcelacockell@hotmail.com)

Manoel Bomfim (1868-1932) foi um intelectual brasileiro (escritor, médico, professor e político) engajado em sua autenticidade: era um intérprete e um observador do país, em especial, da transformação urbana, social, política e econômica que se desenvolveram a partir início do século XX. Suas críticas em torno dos atenuantes problemas sociais e educacionais existentes no Brasil também se voltaram para a América Latina, especialmente a partir de sua obra A América Latina: males de origem (1905). A obra, escrita na França, demonstra toda a preocupação do autor em relação à formação social brasileira de uma perspectiva diferenciada: do continente europeu enxergou o Brasil e a América Latina com outra silhueta, como se esta distância acentuasse o seu olhar em relação às suas proximidades latinas. Em seu ponto de vista, os latino-americanos, como os brasileiros, sofriam o que denominou “parasitismo social” em relação às nações ibéricas, estabelecendo uma relação de submissão entre classes dominadas e dominantes. Nesta obra, seu contradiscurso foi evidenciado ao ir de encontro à teoria do branqueamento e das etnias inferiores do povo brasileiro, afirmando que a questão do atraso não era um problema racial, mas social e que apenas a educação seria capaz de curar os atrasos sofridos pelo Brasil e as demais nações latinas. Consideramos esta obra como o ato inaugural do pensamento intelectual de Bomfim e permanecerá em seus escritos posteriores, até 1932 quando viria a falecer.

Este estudo, ainda em andamento, pretende compreender como a ação e o discurso e as redes de sociabilidades deste intelectual foi se estruturando em contextos históricos de intensos debates sobre a educação, a identidade nacional e o progresso, marcando o seu pensamento e suas tomadas de posição. Seguiremos as pistas dos desdobramentos do pensamento de Manoel Bomfim, seguindo a trilha derridiana da desconstrução, numa perspectiva não totalizadora acerca das suas reflexões sobre as questões educacionais brasileiras, mas oscilante, como um entre-lugar (Santiago 2000), marcada pela diferença e subversão em relação a sua contemporaneidade. Sendo assim, buscaremos nos escritos: A América Latina: males de origem (1905) os matizes que fermentam e conectam as ideias do autor e também o seu engajamento com as possibilidades que configuram um sujeito, um intelectual e um projeto para o Brasil no campo da história da educação que se mostra contracorrente.

Palavras-chave: Manoel Bomfim, intelectual, história da educação, América Latina

1 O trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível

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Do entre-lugar: Manoel Bomfim e suas ideias a contrapelo

Neste trabalho, que parte de uma pesquisa de doutoramento em andamento sobre seu ideário intelectual, pretendemos refletir sobre os eixos argumentativos relevantes em A América Latina: males de origem (1905), que pode ser considerada a obra que inaugura seus ideais contracorrentes, mas também sustenta as bases do pensamento do autor sobre as questões que debateu e discutiu durante sua vida, especialmente sua preocupação em articular um Estado-Nação que sustentasse os ideais de civilidade e progresso que as necessidades econômicas e políticas necessitavam naquele momento tendo a educação como a “cura” para os males do atraso. Dentre estes eixos argumentativos podemos destacar sua teoria de parasitismo e a sua teoria de independência que viabilizaria a democracia e o progresso brasileiro.

Manoel Bomfim circula no cenário da Primeira República (1889-1930) na Capital Federal, que também vivencia a Belle Époque de 1898-1914, segundo Needel (1993), e todo o ideário de modernidade e civilidade. As modificações urbanas no Rio de Janeiro marcadas apelas Reforma de Pereira Passos (1902-1906) foram apenas o ponto de partida para evidenciar mudanças sociais, políticas e econômicas inspiradas no modelo francês. Os espaços transformados pela urbanização da cidade demarcavam aqueles pertencentes às elites, aos menos favorecidos, às crianças e aos intelectuais, como Bomfim, um representante da intelectualidade brasileira, transita nestes espaços.

O livro A América Latina: males de origem (1905) foi escrito durante uma viagem do autor à França (1902-1903) para realizar estudos de Psicologia Experimental na Universidade de Sorbonne. Podemos dizer que esta experiência ofereceu ao autor uma nova perspectiva a respeito da realidade brasileira daquele momento, em que a modernização e o progresso inspirado no modelo francês, a Belle Époque tropical. Talvez de uma outra escala de olhar Bomfim olhou para o Brasil de uma outra forma, enxergando o seu pertencimento ao continente latino.

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A teoria do parasitismo consiste na lógica de denominação externa imposta pelo colonialismo europeu, combinada com a dominação interna imposta pelas elites, causando males aos povos latino-americanos. A metáfora da biologia colabora para atenuar a sua observação de uma nação como um organismo vivo que possui atividades que desenvolvem e atrofiam, e deste modo a educação seria a cura para os males do atraso, uma doença para uma nação. Era um ideário influenciado pelas ideias do darwinismo social que o próprio Bomfim destaca na “Advertência” ao leitor no início da obra fazendo referência ao livro de Walter Bagehot, Physic and politics (1872).

Em sua alegoria as classes sociais são infectadas numa degradação sistemática pelos colonizadores ibéricos, que estimula e alimenta o parasita através de uma mentalidade parasitária pela ignorância do povo. Para o autor, a ignorância, ou o não investimento em educação só fortaleceria este parasitismo. O que demostra que para além do atraso por conta da mestiçagem, o que construíamos era uma relação de dependência fomentado pelas elites na manutenção do patrimonialismo brasileiro, como uma eterna oligarquia e também dependência cultural, tendo como referência os países ibéricos, ou neo-ibéricos, como por exemplo, a inspiração nos moldes franceses para aquilo que considerávamos modernidade e civilidade.

Podemos ainda destacar a teoria da independência fermentada por Manoel Bomfim partia, especialmente, da educação como necessária para o progresso e, de fato, avançar como nação moderna. A educação, representada pela instrução popular, era o que permitiria de fato o país se estruturar como democrático:

Sem isto, sem a instrução da massa popular, sem o seu realçamento, não é só a riqueza que nos faltará – é a própria qualidade de gentes entre as gentes modernas. Pouco importa o que está inscrito nas Constituições, que as camadas políticas vão depositando nos armários oficiais. Como estamos, não somos nem nações, nem repúblicas, nem democracias. A democracia moderna é um produto do progresso; e nós somos, ainda, uma presa do passado, recalcitrante em tradições e preconceitos, que não soubemos vencer ainda. Querer um regime moderno, com as almas cristalizadas nos costumes de três séculos atrás, não é uma utopia – é uma monstruosidade. Proclamar democracia e liberdade, e manter e defender as condições sociais e políticas das eras de absolutismo, é mais que insensato – é funesto, mais funesto que o próprio absolutismo formal. Este é criminoso, mas é pelo menos lógico; o crime pode ser lógico sem deixar de ser crime; o regime de democracia sem povo é absurdo, sem deixar de ser igualmente pernicioso. (BOMFIM, 1905, 362)”

Podemos dizer, que sua produção, inclusive a obras posteriores como a trilogia sobre o Brasil: O Brasil na América (1929), O Brasil na história (1930) e O Brasil nação

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(1931), se destaca pela análise crítica da formação social brasileira, demonstrando a preocupação com a relação entre educação e civilidade, em convergência com os debates intelectuais que perpassam as décadas de 20 e 30 e culminaram na publicação do Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova (1932). Neste ponto, o seu discurso engajado em relação à educação está em diálogo com as proposições sociais e políticas expressas nesta época e sua busca por renovação e reorganização nacional da educação.

É possível perceber a dualidade da ideia do “contra” em seu discurso, se mostrando como um reforço para o debate, uma marca do autor que sinalizamos como contradiscurso. Este “contra” não é apenas contrário, mas um movimento contracorrente ou de deslocamento de um lugar comum. Sua preocupação era elaborar uma produção interpretativa, entendendo o processo social como contínuo e não apenas cronológico, ou seja, entender as origens e seus males como forma de redefinir a própria história, as tradições e nos estabelecermos como nação, tendo a educação como elemento indispensável neste processo.

Bomfim pretende defender uma representação da identidade nacional, ampliar as perspectivas do seu ideário de “revolução pelo progresso”, sobre o dever do Estado na instrução pública, a preocupação com a criança, o ajustamento físico e mental do indivíduo na escola, as questões eugenistas, a questão do trabalho, a concepção de nação e o alcance do progresso. Sua proposição tem aproximações com as propostas dos pioneiros da Educação Nova na intenção de construir um ideal reformador, que justificasse o fracasso do Estado até então. Para Bomfim, a instrução pública era fundamental para a democratização da sociedade, isto é, a educação era o expoente de uma nação moderna e soberana.

A geração que se intitulou “pioneiros” tinha a intenção de construir um ideal reformador, e por isso, procura novas propostas teórico e metodológicos para implementar a ideia de um novo começo, e justificasse o fracasso do Estado até então. Bomfim seria visto como um representante da geração passada, que necessitava ser superado. Pretendemos investigar se essa caracterização dada ao autor colaborou para um entendimento superficial de sua obra, marcada pela contraposição, mas interpretada como conservadora.

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Bomfim acreditava que a educação deveria servir à nação e que este seria o grande projeto para o Brasil. O autor sinaliza que só a educação, especialmente a pública, de responsabilidade do Estado, permitiria uma revolução. Educar também significaria preparar para o mercado de trabalho, desse modo a ideia da cidadania estava determinada pela inserção no mercado de trabalho, isto é, o trabalho como um ato civilizador e, por isso, uma forma de valor social. Bomfim concordava com os pioneiros ao pensar na educação como uma construção com resultados à longo prazo, sem imediatismo, mas como um investimento de função social, democrática e única pelo Estado:

Para os signatários a escola devia ser compreendida como célula mater, núcleo de difusão e irradiação de uma nova concepção de civilização, onde a ela era destinado um papel fundamental na reconstrução do país, mas para que isto se efetivasse cabia ao Estado o papel central de coordenador e gestor na execução de uma proposta unificada para a educação pública (CAMARA, 2003, p.39)

Esse conceito em relação ao papel transformador da educação é demonstrado em Cultura e educação do povo brasileiro (1932), sua última obra, publicada postumamente, no mesmo ano do Manifesto:

Sofremos, neste momento, uma inferioridade, é verdade, relativamente aos outros povos cultos. É a IGNORÂNCIA, é a falta de preparo e de educação para o progresso – eis a inferioridade efetiva; mas ela é curável, facilmente curável. O remédio está indicado: necessidade imprescindível de atender-se à instrução popular (BOMFIM, 1932, p. 41).

O contradiscurso de Bomfim pode ser considerado uma destas varáveis que nos permite analisar alguns micro-detalhes. No nosso trabalho consideramos o contradiscurso, não apenas em seu caráter contrário, mas o de se deslocar do fluxo e dessa forma desconstruir aquilo que parecia sedimentado. O contradiscurso de Bomfim trabalha como uma desconstrução do que já foi proposto, e por isso, em seu tempo se torna polêmico. As concepções de Foucault2 (1972) e Derrida3 (1971, 1973) para esta questão nos ajuda a pensar o quanto Bomfim, como autor, se coloca em um movimento de desconstrução, ou deslocamento em relação às interpretações cristalizadas e defendidas pela intelectualidade corrente. Desta forma, seguindo este raciocínio, podemos ainda

2 Foucault (1972) faz a leitura de Nietzsche, Freud e Marx deslocando (ou descontinuando) suas

interpretações para as relações do saber e do poder.

3 Derrida (1971,1973) propôs a desconstrução dos conceitos para além do significado (metafísica da

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pensar neste deslocamento do autor para um entre-lugar, conforme a proposição de Santiago (2000), como um conceito em que um autor questiona a dubiedade da intelectualidade que se coloca num repertório de “imitação” de conceitos canonizados enquanto deveria operar deslocamentos e evidenciar as diferenças, buscando transgredir e não apenas repetir, como um intelectual engajado4, de fato.

Sendo assim, podemos pensar na configuração do entre-lugar, na análise da produção e do próprio autor, como um termo de esforço interpretativo que define o espaço intelectual e a sua representação, expondo suas direções e demonstrando as suas opiniões. O discurso contracorrente, a preocupação com à instrução primária, as críticas ao Estado e seu a anseio pela educação como fundamental para o progresso são expostas em suas obras, cujo objetivo é fundamentar o pensamento e social brasileiro.

O discurso deste contradiscurso são as vozes ideológicas que constroem as ideias do autor para àqueles quem escreve (seus leitores) e é contemporâneo às ideias correntes. Bakhtin (1997) fundamenta a polifonia e a dialogia como conceitos que marcam a composição do discurso. Segundo Bakhtin (1997), texto em seu conjunto, é composto por ideias e múltiplas vozes que constituem a sua totalidade, e por isso, é polifônico5. O diálogo do autor para o seu leitor consiste no dialogismo e que tem várias concepções inseridas: filosofia de vida, fundamentações políticas e sociais e concepções de mundo. Bomfim articula em seus textos com as transformações sociais e políticas de seu tempo numa percepção individual e coletiva de seus pensamentos, que pelo seu caráter contrário, se tornou transgressora, como veremos, a partir de A América Latina: males de origem (1905). Por isso, pensamos num contradiscurso, na perspectiva do deslocamento, da desconstrução de um entre-lugar.

Podemos dizer que a obra A América Latina: males de origem (1905) foi um marco relevante para Bomfim, delimitando o seu engajamento intelectual e o seu contradiscurso. A obra foi o ponto de partida para que Bomfim entrasse nas discussões

4Entendemos como o intelectual engajado conforme conceito formulado por Sartre, como sendo aquele

que intervém criticamente na sociedade, dialoga intencionalmente com as ideias mais densas procurando dar direção a elas, e revelando a sua opinião crítica de forma autônoma e objetiva (NOVAES, 2006, p. 161).

5 Bakhtin criou o conceito especificamente para designar o projeto estético de Dostoievski (1997), onde a

voz dos personagens e a voz do autor falavam em uma mesma altura e simultaneamente. Contudo, hoje a polifonia e o dialogismo são estudados no âmbito do texto, como uma forma de pensar as vozes do discurso e a intertextualidade, levando em consideração o pertencimento individual e social.

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entre intelectuais e virasse algoz de Silvio Romero6. A preocupação com a formação do povo brasileiro constituiu o principal debate da geração de Sílvio Romero e Manoel Bomfim, que tinha como objetivo a construção de uma nova nação, civilizada, comprometida com o progresso, influenciados pelas ideias de modernidade que marcaram a Belle Époque (1898 - 1914). Contudo, sua percepção ia além da presença da aparente modernidade, mas na ausência de se pensar nos problemas sociais já existentes, e que eram visíveis:

Basta observar, sabendo observar, penetrando no nevoeiro das aparências, dominando o desencontro dos detalhes, para achar o fundo solo das causas reais. Observação difícil e geralmente incompleta. Uma sociedade é um fenômeno vasto demais; para dominá-lo, no conjunto das suas manifestações, é preciso que o espírito se sobreponha a si mesmo, e não se deixe nunca tentar nem absorver por uma série de efeitos (BOMFIM, 1905, p. 263).

Enquanto Sílvio Romero privilegiava o determinismo racial como elemento autônomo que se impõe, a partir de fatores climáticos ou geográficos, Bomfim ia de encontro às teorias das raças: do branqueamento e das etnias inferiores do povo brasileiro como justificativa para o atraso brasileiro. Para Bomfim, a questão das raças estava mais ligada às relações sociais entre as classes dominantes e dominadas, concebendo a sociedade dentro de um sistema, o “parasitismo social”7. Para o autor a “cura” para os “males” do Brasil seria a educação.

Sendo assim, podemos dizer que Bomfim tem uma característica própria de estar neste deslocamento entre o centro e a margem, de estar no limiar do “entre”: no entrelugar. É um movimento dicotômico: corrente/contracorrente, discurso/contradiscurso, esquecido/lembrado. Como vimos, o autor carrega, em sua essência, uma oposição “entre um e outro” sugerindo tirar ou mudar um lugar (ou de lugar) ou ser contrário a um determinado centro para reforçar outro. Não é simplesmente negar. Estar no entre-lugar causa um desconforto pela suspeita de seu descentramento,

6 Sílvio Vasconcelos da Silveira Ramos Romero era também um intelectual engajado: um homem de letras,

jornalista, crítico, historiador e membro da Academia Brasileira Letras e famoso por usas críticas ferozes. Escreveu em 1906, suas críticas em relação à obra de em Os Annaes uma série de artigos sob o título

Uma suposta teoria nova da história latino-americana, sendo compilado em um livro no mesmo ano: A América Latina: analyse do livro de igual título do Dr. Bomfim. Tornou-se um importante interlocutor

da rede de sociabilidade (ver COCKELL, 2011).

7 Consiste na lógica da dominação externa imposta pelo colonialismo europeu, combinada com a

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mas esta é a sua intenção: descentralizar para reconhecer a ideia de que o centro deve ser questionado.

Algumas Considerações

Neste trabalho buscamos apresentar alguns pontos que se mostraram relevantes na obra A América Latina: males de origem (1905), que consideramos uma produção balizadora às propostas de Manoel Bomfim e também de grande importância na interpretação do pensamento social brasileiro. A importância de seu contradiscurso como uma característica marcante do autor, não apenas como um estilo, mas como uma forma de se apresentar como um intelectual engajado, que observa e questiona transformando a ação escrita também como uma ação política, no caso de Bomfim, tendo como objetivo o debate em torno da educação brasileira, que a seu ver, seria a única maneira de vislumbramos algum progresso.

Desse modo, podemos acompanhar a preocupação em articular um Estado-Nação que sustentasse os ideais de civilidade e progresso necessários para aquele momento político e social, mas ainda, potencializar a alteridade de um discurso que buscava compreender e contribuir com aquele ethos de país moderno, especialmente tendo na educação um meio para essa realização. Este trabalho, que parte de uma pesquisa de doutoramento em andamento sobre o pensamento de Bomfim, que se apresenta a partir de um contradiscurso, e tem na educação a centralidade das suas discussões e também ações seja no âmbito das ideias, seja na prática. A partir da análise de suas obras é possível estabelecer o que denominamos eixos argumentativos (questões envolvendo a raça/mestiçagem e América Latina; progresso/civilidade/ modernidade; tradição e cultura), que nos auxiliam a potencializar as questões fundantes no ideário deste intelectual, intensamente marcado pelo caráter desviante: no caráter contracorrente, em sua trajetória e em suas escolhas no campo da educação.

De certa forma, pensar neste movimento de olhar aquilo que não está no centro, bem claro às nossas vistas, é um desafio ao nosso exercício de pensamento e de pesquisa. Não estar em evidência, não significa a sua ausência, é necessário se deslocar para as possibilidades partindo do já estabelecido para as minúcias indiciárias, como as pegadas

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deixadas no percurso da margem ao centro. É um exercício sugestivo de perspectiva: descentralizar e retomar.

O olhar e o entre-lugar, aqui, é a troca, numa atitude de entender a força do autor e também o poder de seu texto e sua representação, a contrapelo, especialmente às questões da educação. Podemos dizer que a trilha escolhida pelo autor é marcada pelo desvio, instituindo uma forma de descentralizar o olhar, deslocar o discurso e desconstruir elementos com a perspectiva de exercer uma heterogeneidade. Partindo da questão educacional, como a linha central do pensamento de Bomfim dentro da história da educação, deslocamos o seu olhar, o seu contradiscurso e a sua inversão ao demonstrar identificações com as propostas apresentadas pelo Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova de 1932.

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