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Gisele Cristina Rosa dos Santos

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Academic year: 2019

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(1)

A s p a la v r a s n ã o m o r r e m ja m a is :

a n á lis e e c o m e n tá r io d e te x to s n ã o lite r á r io s d e

F e d e r ic o G a r c ía L o r c a

G is e le C r istin a R o s a d o s S a n to s

U n iv e r s id a d e d e B r a s ília

I n s titu to d e A r te s

B r a s ília - D F

(2)

U n iv e r s id a d e d e B r a s ília

I n s titu to d e A r te s

A s p a la v r a s n ã o m o r r e m ja m a is :

a n á lis e e c o m e n tá r io d e te x to s n ã o lite r á r io s d e

F e d e r ic o G a r c ia L o r c a

G is e le C r istin a R o s a d o s S a n to s

Dissertação apresentada ao Curso de Pós-Graduação do Departam ento de Artes Visuais do Instituto de Artes da Universidade de Brasília como parte dos requisitos para a obtenção de grau de Mestre em Processos Com posicionais para Cena.

O r ien ta d o r : P r o f.° D r. M a r c u s M o ta .

B r a s ília - D F

(3)

D I S S E R T A Ç Ã O E P R O D U Ç Ã O I M A G É T I C A D E M E S T R A D O E M A R T E A P R E S E N T A D A A O S P R O F E S S O R E S :

Professor Dr. MARCUS SANTOS MOTA (UnB)

O r ie n t a d o r

Professora Dra. IZABELA COSTA BROCHADO (UnB)

M e m b r o e f e t iv o

Vista e permitida a impressão

Brasília, terça-feira 01 de agosto de 2006.

(4)

A D eu s p e la vida, f é e capacidade intelectual que m e m ostram todos os

(5)

AGRADECIMENTOS

Aos m eus pais, Efrain e Juliana, e irmãos pelo apoio incondicional.

Aos m eus avós, tios e prim os por torcerem por m im e desejarem a m inha

felicidade sempre.

Ao M arcus M ota que, pela credibilidade, orientação, sagacidade e incentivo, m e

ensinou persistir e investir no m eu aprim oram ento profissional.

A D am iana Rodrigues, Gilberto Taboada, Adriana Silva Souza, Emm anuel

Queiroz, M arcos Terra, M ônica Filizola, Juliana Pina de Castro, Aline Nunes, Antônio

Carlos, Patrícia Freddi e Celso pela generosidade da amizade verdadeira e sincera e pelo

acolhimento nos m om entos difíceis.

A K enia Dias pelas palavras de coragem nos m om entos importantes da m inha

jornada em que a sua experiência norteou a minha.

Aos amigos do E spa ço B io cêntrico pela receptividade, aceitação e carinho

(6)

SUMÁRIO

LEGENDAS

VII

RESUMO

VIII

ABSTRACT

IX

APRESENTAÇÃO

02

M e to d o lo g ia 1 0

CAPÍTULO I -

Cultura Popular Espanhola

13

1.1 - Identificação do tipo de cultura popular abordada por Lorca 15

1.2 - Contraponto tradição X m odernidade na releitura de Lorca 51

1.3 - U m a outra proposta estética 57

CAPÍTULO II -

Coerência da proposta estética

64

II. 1 - A im portância de M aria na P ineda na definição do estilo dram atúrgico

de Lorca 66

11.2 - Definição de um a proposta estética 85

11.3 - Análise e com entário sobre a coerência da proposta estética em M ariana

P in eda 9 0

CAPÍTULO III -

Teatro Universitário La Barraca

134

III. 1 - Form ação do Teatro Universitário L a B a rraca 136

111.2 - Escolha do repertório para o Teatro U niversitário L a B arraca 176

111.3 - A nálise e com entário sobre a Política Educacional de Lorca 183

CONCLUSÃO

188

(7)

LEGENDAS

1 - F e d e r ic o G a r c ia L o r c a - u m a b io g ra fia , de Ian Gibson

Bgr-/: Biografia - Livro Um;

Bgr-II: Biografia - Livro Dois.

2 - E p isto la r io C o m p le to , Andrew A. Anderson y Christopher M aurer (eds.)

EC-/: Epistolario Com pleto - Libro Um;

EC-II: Epistolario Com pleto - Libro Dois.

3 - O b r a s C o m p le ta s - P ro sa , M iguel García-Posada (org.)

GP-P C nf. P ro sa - C onferencias;

G ? -PAI: P ro sa - A locuciones;

GP-PV: P ro sa - Varia;

G P-PO P: P ro sa - O tras Prosas',

GP-PEyd: P ro sa - E n trevistas y decla raciones;

G V-PC rr: P ro sa - C orrespodencia 1910-1936;

G P-PApn: P ro sa - A pêndices.

4 - O b r a s C o m p le ta s, Arturo Del Hoyo (recopilación y notas)

H-PIm : P ro sa — Im presiones;

H -P C nf. P ro sa - C onferencias;

H-Ps: P oesia;

W-Ttr: Teatro;

H -O PIm P : O utras P á gin as - Im p resiones y P aisajes;

H -VIm : Varia - Im presiones;

YÍ-VCnf: Varia - C onferencias;

H -VEnt: Varia - E ntrevistas;

(8)

RESUMO

O propósito deste trabalho científico é a análise e o comentário de textos não

literários de Federico Garcia Lorca, referentes aos gêneros Cultura Popular Espanhola e

Teatro, que contém inform ações sobre o processo criativo do dramaturgo. Estas fontes

foram transcritas e compiladas pelos seguintes organizadores: Andrew A. Anderson e

Christopher M aurer; Arturo Del Hoyo; e, Miguel García-Posada. Assim sendo, a

metodologia deste trabalho incidiu na apropriação do procedim ento básico da Crítica

Genética, de Cecília Alm eida Salles, para a realização da pesquisa de fonte proposta. O

referido procedim ento sofreu um determinado nível de adaptação porque as fontes

analisadas não são docum entos autógrafos, ou seja, do próprio punho do seu autor que,

neste caso, passaram por processos distintos de publicação. Por conseguinte, este trabalho

visa identificar, por m eio de levantamento, análise e comentário dos índices do processo

criativo do dram aturgo, existentes nas fontes consultadas, a forma de fundamentação da

coerência da proposta estética nas obras de Lorca e no Teatro Universitário L a B arraca

(9)

ABSTRACT

The purpose o f this scientific paper is to analyze and com mentate on non-literary

texts by Federico García Lorca on the genres o f Spanish Folk Culture and Theater, which

provide inform ation on the playw right’s creative process. These sources have been

transcribed and com piled by the following organizers: Andrew A. Anderson and

Christopher M aurer; Arturo Del Hoyo and M iguel Garcia-Posada. Hence, the approach for

this paper had an influence on the appropriation o f the basic procedure o f Genetic Critique

by Cecilia Alm eida Salles for the research o f the sources considered. This procedure

required a certain degree o f adaptation because the sources considered are not autograph

documents, that is, were not written by the author himself. In this case, the sources

underwent different publishing processes. The purpose o f this paper, therefore, is to

perform a survey, analysis and com m entary o f the cues used by the playwright in his

creative processes and that are found in the sources considered in order to identify how

coherent L orca’s works and the University Theater troupe (also known as L a B arraca) are

(10)

El teatro que ha p e rd u ra d o siem pre es el teatro de los poetas. Siem pre ha estado el teatro

en m anos de los po eta s. Y ha sido m e jo r el teatro en tanto era m ás gra nd e el poeta. N o es

- claro — e l p o e ta lírico, sino e l p o e ta dram ático.

(11)

APRESENTAÇÃO

O presente trabalho, em parceria com o LABORATÓRIO DE DRAMATURGIA

do Departamento de Artes Cênicas, da Universidade de Brasília, visa realizar um a outra

etapa de trabalho sobre o dram aturgo Federico Garcia Lorca (1898-1936)1. As primeiras

etapas com preenderam as traduções de algum as peças teatrais e de algumas conferências

realizadas pelo dram aturgo . A partir da seleção do material para as prim eiras traduções,

foram identificados outros documentos que poderiam revelar um a idéia m ais am pla do

dramaturgo como pensador do fazer teatral, m úsico e compositor, poeta, comentarista das

obras de outros autores e crítico de suas próprias obras, ensaísta e conferencista, desenhista,

encenador, perform er e diretor teatral. Este outro m aterial evidenciou um a busca do

dramaturgo para concretizar sua própria arte na dinâm ica de integração das diferentes

formas de arte e nas diferentes formas de m anifestação da cultura popular espanhola.

Estes docum entos continham um a série de informações que poderiam auxiliar na

compreensão do processo criativo de Lorca, que configurou-se como foco de estudo para o

desenvolvimento do presente trabalho. Havia evidências de que Lorca apropriou-se de um a

gama de inform ações a respeito da diversidade de produções artísticas de seu tem po, e a

selecionou criticam ente para, em seguida, utilizá-la em sua produção artística de modo

geral. O que não prom oveu a exclusão das referências tradicionais. Ao contrário, o

1 O s trabalh os d o L a b oratório fo ra m in ic ia d o s e m 1 9 9 8 , so b a co o r d e n a ç ã o d o P rof.° D r.° M a rcu s M o ta, desde en tã o a a s sistê n c ia d e trad u ção v e m sen d o re aliz ad a p o r G is e le C . R . S a n to s. A ob ra teó rica d e L orca com põe a b ib lio g r a fia e s p e c íf ic a d e ste trabalh o e ta m b ém é parte d a b ib lio g r a fia para estu d o s d o referid o laboratório.

2 C o n fe r ê n c ia s (2 0 0 0 ); A c a s a d e B e r n a r d a A l b a (2 0 0 0 ) ; A s s im q u e p a s s a r e m c in c o a n o s (2 0 0 0 ); Y e r m a

(12)

dramaturgo tam bém buscou nos textos clássicos espanhóis e universais algumas

referências para os processos do pensar e do fazer teatral.

O contato de Lorca com os bastidores das produções artísticas e com a prática de

diversas formas de arte lhe proporcionou um largo conhecim ento a respeito dos processos

de criação, produção e realização tanto de obras de arte quanto de valores éticos e estéticos.

Isso caracterizou Lorca como um artista m ultifacetado em busca de sua própria estética,

uma vez que o dram aturgo identificou a base de concretização da sua proposta estética nas

suas obras e no Teatro Universitário L a B a rraca justam ente por m eio da m ultiplicidade das

referências. Todavia, a form a que o dramaturgo passou a ser conhecido posteriorm ente não

valorizou a sua personalidade artística de um m odo m ais amplo, m ais global e

multidisciplinar; tais características já correspondiam ao comportam ento e as exigências do

artista m oderno no início do século XX. Busca-se, então, no presente trabalho um a inter-

relação das outras facetas artísticas do dram aturgo e um a compreensão do seu processo

criativo . Daí a necessidade de analisar os textos não literários de Lorca m ais detidam ente

para identificar o grau de influência das outras atividades desenvolvidas pelo referido

dramaturgo nas suas produções artísticas de m odo geral.

A realização do trabalho de análise do pensam ento de Lorca em relação à

dramaturgia som ente foi possível graças à existência dos tipos de fontes consultadas. Estas

dizem respeito a um a série de entrevistas e declarações a jornais im pressos, emissoras de

rádio e revistas; cartas trocadas entre Lorca com familiares e com amigos; conferências e

ensaios; notas de direção de ensaios teatrais; notas de revisões de textos; e, ainda, discursos

realizados pelo dram aturgo ao longo de sua carreira artística e de sua vida pessoal. As

fontes às quais tive acesso foram transcritas e compiladas por organizadores distintos, o

(13)

que, conseqüentem ente, resultou na edição de duas obras diferentes, a saber: O bras

Completas (1995), de M iguel García-Posada; O bras C om pletas (1957), de Arturo Del

Hoyo; e E pistola rio C om pleto (1997), de Andrew A. Anderson y Christopher M aurer -

ambas edições escritas em língua espanhola.

Convém lem brar que, para o desenvolvimento do presente trabalho, fez-se

necessário o uso de um a term inologia que pudesse compreender todo o m aterial teórico

selecionado como fonte de pesquisa. Desta m aneira, as fontes foram denom inadas textos

não literários com base nas características peculiares e na grande diversidade de gêneros,

de temas e de inform ações contidas no referido material.

De posse do m esm o, a prim eira providência tom ada foi identificar, nas prim eiras

leituras, o panoram a geral do m aterial a ser estudado e analisado. Este panoram a

evidenciou - em relação aos outros artistas de sua época um a outra m aneira que Lorca

possuiu de lidar com: a realidade do m ercado editorial literário e dram atúrgico; o mercado

editorial de revistas; os m ovim entos artísticos e outros artistas; a cultura popular e erudita;

a realização de conferências; as dificuldades de aceitação e de ascensão dos artistas de

vanguarda; os em presários culturais da época e as diferenças de pontos de vista; os

bastidores do fazer artístico; a am pliação de suas experiências na m úsica, no desenho, na

direção de atores, na encenação, como líder e diretor de um grupo de teatro universitário;

as limitações im postas pela ditadura na época; dentre outros.

Os textos não literários de Lorca apresentaram um a diversidade de assuntos

abordados que possibilitam um a futura seqüência de estudos específicos e reveladores

sobre os procedim entos de Lorca como pensador de diferentes áreas do conhecimento

humano. A identificação desta diversidade prom oveu um a ampliação no entendim ento a

(14)

do dramaturgo em relação aos seus contemporâneos. Isto é, o dram aturgo projetou um a

carreira artística voltada para a m ultidisciplinaridade, enquanto outros diretores teatrais de

sua época especializavam -se apenas na direção de cena e não tinham dom ínio sobre as

demais etapas da m ontagem teatral; pois, segundo Roubine - como veremos m ais adiante

foi no início do século XX que a presença do encenador surgiu e firmou-se no panorama

teatral moderno como “gerador da unidade, da coesão interna e da dinâm ica da realização

cênica”4. Portanto, fez-se necessário m anter esse estudo direcionado especificam ente ao

trabalho desenvolvido por Lorca na área teatral devido variedade de desdobram entos e de

inter-relações com outras áreas, o que será detalhado posteriormente.

Identificado o panoram a m ultíplice e selecionada a área de conhecim ento para

estudo, o passo seguinte foi dividir o trabalho em três etapas. Para iniciar o estudo e

realizar a posterior análise do m aterial selecionado, a prim eira etapa foi destinada ao

processo de seleção dos textos não literários de Lorca com declarações relevantes do

dramaturgo sobre tudo o que dizia respeito ao gênero Teatro.

N a m edida em que o processo de seleção avançou, tom ou-se im prescindível

definir e classificar os textos não literários de Lorca conform e tem as e gêneros abordados

pelo dramaturgo. Porque a diversidade de tem as (comparação de estilos estéticos e

musicais; imaginário; figuras m itológicas e religiosas; atores; m úsicos; pintores; autores;

história; tradição; m odernidade; regionalism os) e gêneros (Teatro; Cultura Popular; Música;

Cidades; Pintura; Poesia; Literatura; Teatro Universitário; Público; Educação; Dança) era

diretamente proporcional ao grande volum e de textos não literários compilados.

Finalizado o processo de definição e de classificação, o gênero Teatro confirmou-

se como prioridade de escolha dos textos não literários com comentários de Lorca a

(15)

respeito desse gênero, o que viria a constituir o corpo do presente trabalho. A forma

multifacetada do discurso de Lorca foi o que m ais cham ou a atenção para realização

posterior do estudo sobre a relação do dramaturgo com o processo criativo e com o fazer

teatral. Isto é, nem sempre as inform ações sobre o gênero Teatro estavam lim itadas aos

textos não literários que abordavam este gênero específica e restritam ente.

Por exem plo, algumas evidências sobre a pesquisa de Lorca a respeito da

variação da m étrica tradicional do verso e da criação das imagens verbais foram

encontradas no texto não literário que possui a análise que o dramaturgo realizou sobre a

utilização da m etáfora e sobre o estilo poético do poeta e dramaturgo, do Século de Ouro

Espanhol, Dom Luis de Gôngora (1561-1627). A partir da compreensão que Gôngora em

seu processo criativo não priorizou as palavras para figurarem-se belas ao leitor (de acordo

com os padrões literários e estéticos da sua época), m as que as utilizou para propor um a

outra possível sonoridade para a perform ance oral da sua poesia, Lorca identificou a

diferença entre a m étrica tradicional do verso e a reestruturação consolidada por Gôngora

em suas obras poéticas5. Lorca, então, propôs a sua variação da m étrica tradicional do

verso conform e seus interesses específicos, utilizando essa outra possibilidade de

organização de um a obra poética como parâm etro para a sua releitura da tradição literária.

Em relação à m etáfora de Gôngora, Lorca percebeu que o poeta do Século de Ouro

Espanhol as criou não para serem belas, m as para sobrepor sensações6. Daí Lorca optou

por criar as suas imagens verbais para inserir, por m eio da narração, ações e sensações que

aconteciam ‘fora’ da cena em desenvolvim ento e que, conseqüentem ente, prom overiam

uma sensação de deslocam ento do tem po e do espaço pela m anipulação da expectativa da

audiência e pela construção do im aginário desta.

5 G ? -P C n f, p. 5 6 -7 .

(16)

N a seqüência de investigação, o gênero Cultura Popular Espanhola constituiu-se

como dado de fundam ental im portância para a formação e para a coerência da proposta

estética dram atúrgica e poética de Lorca. Ou seja, Cultura Popular Espanhola configurou-

se como um orientador para o estudo específico do gênero Teatro realizado pelo

dramaturgo. Por isso, apenas a aplicabilidade da proposta estética dram atúrgica lorqueana

será abordada para fins da presente pesquisa com algumas referências à poesia de Lorca,

como o R o m an cero G itano, por exemplo.

A segunda etapa proporcionou o intercruzamento das informações contidas nos

textos não literários de Lorca. Essa etapa enfatizou o início de um processo de verificação

a respeito do diferencial artístico que Lorca poderia trazer como forma de contribuição ao

movimento teatral e ao panoram a cultural na Espanha ou fora dela, o que resultou na

confirmação da inovação de um a proposta estética do dramaturgo para prim eira m etade do

século XX. N esta etapa foi possível evidenciar um estilo, em Lorca, de pesquisa e de

produção intelectual que outros dram aturgos desenvolveram posteriorm ente e de form a

semelhante, como pode-se verificar a técnica do distanciamento desenvolvido por Bertold

Brecht para as suas respectivas peças teatrais7.

A terceira etapa propiciou a divisão do m aterial em capítulos que, de acordo com

a configuração que os textos não literários selecionados apresentaram como um resultado

da etapa anterior, adquiriram o seguinte formato para estudo e análise:

C a p ítu lo I - C u ltu ra P o p u la r E sp a n h o la . Neste capítulo concentram-se as

razões das inquietações artísticas de Lorca. Pois, o m aterial selecionado a respeito deste

gênero evidenciou um a linha de pesquisa, realizada pelo dramaturgo, voltada para o estudo

da imagem (a partir da paisagem geográfica e arquitetônica), da tradição oral e da estrutura

(17)

melódica produzidas em Granada. Esta pesquisa teve, como ponto de partida, as

referências tradicionais dos romances populares, das canções de ninar e do cante jo n d o .

Conseqüentemente, pôde-se observar que, diante dos padrões previam ente estabelecidos

pela tradição, Lorca organizou os seus próprios padrões estéticos de acordo com o desejo

de releitura que o panoram a cultural do início século X X propunha. D esta forma, a criação

dos paradigmas lorqueanos tam bém foi possível pelo desenvolvim ento de atividades

paralelas, como de conferencista e ensaísta, que orientaram o dramaturgo para a

multidisciplinaridade. N este sentido, verificou-se como Lorca percebeu a relevância da

tradição oral espanhola como referência à releitura e às outras propostas. O que,

inevitavelmente, repercutiu na produção teatral e poética lorqueana realizada por m eio do

teatro comercial e do Teatro Universitário L a B arraca.

C a p ítu lo II - C oerência da p ro p o sta estética. Este capítulo destina-se à

abordagem do teatro comercial ao qual as peças de Lorca eram escritas, tendo a peça

Mariana P in eda (1925) como referência central. De acordo com as evidências encontradas

nos textos não literários de Lorca, a referida peça configurou-se como um m arco de estilo,

que gerou um a série de desdobram entos na estética teatral do dramaturgo, apesar de não ter

sido a prim eira peça escrita. Tal m arco diferencial firmou-se devido ao longo processo de

revisões subseqüentes, ao qual M ariana P ineda foi subm etida pelo próprio dramaturgo,

para que sua obra não fosse proibida pela censura da época. Em M aria na P ineda, foi

possível fazer um levantam ento de alguns procedimentos básicos utilizados pelo

dramaturgo no decorrer do seu processo criativo e na sua aplicabilidade ao desenho da

cena dram ática m oderna. M aria na P ineda dem onstrou tam bém que a postura política de

(18)

C a p ítu lo III - T eatro U niversitário L a B a rraca. Este capítulo aborda o teatro

universitário como um a estrutura institucional, criada por Lorca, voltada para a divulgação

do teatro clássico espanhol em contraponto ao teatro comercial. O teatro universitário é o

segundo m arco na carreira dram atúrgica de Lorca porque lhe perm itiu consolidar, frente ao

grupo de teatro de estudantes, as diversas atividades centralizadas e desenvolvidas,

paralelamente desde o início de sua carreira artística. No ‘laboratório’ L a B arraca o

dramaturgo usufruiu um a posição m ais autônom a, como diretor e encenador, no controle

sobre suas produções artísticas, ao contrário do teatro comercial no qual Lorca ficou m uito

tempo limitado à criação do texto dram atúrgico e à procura de um a companhia interessada

em montá-lo. N a direção do L a B arraca, o dramaturgo deu continuidade à aplicabilidade

de seus padrões estéticos nas m ontagens de textos do teatro clássico espanhol. O Teatro

Universitário L a B arraca am pliou as fronteiras políticas propostas pelo dramaturgo no

âmbito educacional.

Encerrada essa terceira e últim a etapa de estudo e análise das informações

contidas nas fontes, destinadas à concepção do presente trabalho, um a figura m ais global

de Lorca como criador, como artista completo, ficou m ais evidente e m ais fácil de ser

reconhecida. Pois, esta personalidade versátil foi fragm entada no decorrer dos anos e suas

atividades artísticas foram seccionadas e isoladas um as das outras perdendo, assim, um

vínculo natural cujo núcleo foi a Cultura Popular Espanhola. Um a evidência disto foi a

divulgação da personalidade do poeta dissociada do dramaturgo e em detrimento das

facetas de ensaísta, conferencista, diretor de cena e de elenco, produtor teatral, compositor,

crítico teatral e desenhista que Lorca tam bém desenvolveu ao longo de sua carreira. Tal

fragmentação, conseqüentem ente, lim itou as formas de percepção e recepção do leitor e do

(19)

proporcionaria um a percepção e recepção m ais ampla de ambos8. Como Samuel Beckett,

Lorca tam bém desenvolveu m últiplas atividades referentes ao fazer teatral, inclusive como

produtor geral das m ontagens e produtor executivo9. Um a recepção m ais global do

universo criativo lorqueano contribuiu para um a m elhor com preensão da produção

intelectual do dram aturgo, tanto dos textos literários quanto dos textos não literários, bem

como perm itiu reintegrar a sua versatilidade outrora dissociada.

Em contato com a m agnitude desse m aterial é perm itido dizer que a obra de Lorca

guarda, em si, um a faceta de contemporaneidade, porque disto depende a form a percepção-

recepção e do pensam ento, no m om ento histórico, de quem relaciona-se diretam ente com a

obra - tal como fez Lorca ao contrapor tradição (literária e popular) e m odernidade.

M e to d o lo g ia

Para realizar a pesquisa de fonte no presente trabalho optou-se por um a

apropriação do procedim ento básico da Crítica Genética - isto é, a compreensão do

processo criativo da obra de arte - para verificar a coerência da proposta estética de

Lorca10. A utilização desse procedim ento estabeleceu um a referência para o estudo e a

análise dos textos não literários do dram aturgo em confrontação direta dos indícios

deixados no m aterial não literário com as obras propriam ente ditas. A utilização desses

outros ‘textos m enores’, ou seja, textos m ais curtos e independentes, corroboraram para

reforçar, am pliar ou m odificar as características e a form a de percepção e recepção a

8 ISER, 19 99: p . 0 9 - 1 1 .

9 Stanley G o n tarsk i artigo: “ R e v is in g H im self: P erfo rm a n ce a s T e x t in S a m u el B eck ett's T heatre” , J o u r n a l o f M o d e m L ite r a tu r e , V o lu m e 2 2 , N u m b e r 1. F lorid a S ta te U n iv er sity .

(20)

respeito de um autor - o que tira o foco dos estudos sobre os textos canônicos para abrir

outras perspectivas de compreensão da produção autoral em processo de análise.

Certamente, tal procedim ento sofreu um determinado nível de adaptação porque o

material estudado não foi o docum ento autógrafo, ou seja, de próprio punho do seu autor

que, neste caso, passou por processos distintos de publicação11. Em bora o instrumento de

pesquisa supracitado tenha orientado a identificação das peculiaridades dos períodos de

concepção do repertório lorqueano, com foco em M arian a P ineda e no Teatro

Universitário L a B a rraca, forneceu tam bém o suporte teórico necessário à pesquisa de

fonte desenvolvida.

Desta forma, foi possível realizar o levantam ento de determinadas questões

relacionadas ao tem a abordado no presente trabalho. O tem a em questão é: a

fundamentação da coerência da proposta estética nas obras de Lorca e no Teatro

Universitário L a B a rraca. Com referência no tema, o problem a suscita o seguinte

questionamento: Em que está fundam entada a coerência da proposta estética nas obras de

Lorca e no L a B arra ca e de que forma? O problem a concentra-se na verificação de um a

possível coerência da proposta estética e artística de Lorca devido às variações

apresentadas pelo dram aturgo a cada obra desenvolvida e concluída e nas produções do L a

Barraca. Por isso, no desenvolvim ento deste trabalho não serão abordadas as obras

inacabadas cujas autorias foram atribuídas ao dramaturgo.

A verificação da referida proposta lorqueana poderá promover, também, um a

outra forma de percepção e recepção de um a personalidade m ultifacetada e m ais completa

a respeito de Lorca, não em form a de resgate da figura outrora fragm entada, m as de m odo

possivelmente reestruturado. Pois, como “[...] a Crítica Genética não tem acesso a todo o

(21)

processo de criação - não tem os o ato criador nas m ãos - m as apenas alguns de seus

índices”, restam apenas as possibilidades de reestruturar a figura de artista completo que

foi Lorca ao invés de tentar trazê-la à tona na íntegra - um a vez que, para conseguir tal

12

feito, a presença do próprio artista em seu processo criativo seria necessária .

Conseqüentemente, pode-se levantar a seguinte hipótese, no propósito de

responder o problem a identificado: a coerência da proposta estética nas obras de Lorca e

no L a B arraca está fundam entada na pesquisa que o dramaturgo realizou a respeito de

determinadas m anifestações da cultura popular espanhola e na influência decisiva que essa

pesquisa exerceu sobre sua produção artística, bem como na figura m últipla do dramaturgo

e numa integração entre diferentes propostas estéticas pesquisadas. E tal coerência estética

apresentou-se na form a de variação das características da cultura popular espanhola e da

tradição literária a partir das referências próprias de ambas como resultado da releitura

realizada pelo dramaturgo. A referência na tradição literária e na cultura popular espanhola

constituiu-se como o centro orientador para as possíveis variações dessa cultura popular e

para as possíveis variações da m étrica tradicional da poesia, desenvolvidas por Lorca por

meio do seu processo criativo e aplicadas às obras teatrais e poéticas. As obras escritas por

Lorca, bem como o repertório escolhido para o L a B arraca, evidenciam um alto nível de

influência dessa cultura popular de m odo a superar as expectativas do senso comum

identificadas im ediata e superficialm ente nas figuras populares representadas nos

personagens criados pelo dram aturgo. Isto é, os elementos populares abordados por Lorca

em seus poem as e peças teatrais concretizaram a proposta estética criada pelo dramaturgo

para a pesquisa pontual realizada.

(22)

CAPÍTULO I -

Cultura Popular Espanhola

Este trabalho inicia-se pelo estudo do gênero Cultura Popular Espanhola, porque a

estética desta proporcionou o suporte fundamental para a organização e constituição da

coerência da proposta estética de Lorca. O trabalho desenvolvido por Lorca a respeito

dessa cultura popular condizia com o m ovim ento histórico e artístico do início do século

XX e, justam ente por isso, o dramaturgo direcionou o seu olhar crítico para esse gênero.

Isto é, o m odernism o vigente na época orientou a produção intelectual na literatura para o

processo de rom pim ento com a tradição literária13.

No caso de Lorca, esse processo não foi m otivado pela negação absoluta da

tradição como referência anterior, m as sim pela utilização desta referência como ponto de

partida para a criação de um a outra proposta de visão artística. Deste modo, o dram aturgo

percebeu e reconheceu a im portância da tradição literária e da cultura popular no dia-a-dia

dos granadinos, bem com o as formas de deslocamento dessa cultura, e apropriou-se disso a

favor da criação de suas próprias obras.

Foi nessa apropriação criativa que Lorca estruturou a sua proposta estética14. Seu

trabalho partiu das im pressões estim uladas pelo contato visual e, logo em seguida, das

impressões estim uladas pela sonoridade na natureza e das m anifestações populares

próprias de Granada. Isto é, a pesquisa de Lorca ainda não tinha um vínculo direto com a

metáfora no texto propriam ente literário, m as sim com a m etáfora nas coisas vivas e

concretas, que serviram de base para a criação das imagens verbais exploradas nas obras

lorqueanas - o que será abordado m ais adiante.

(23)

As investigações do dramaturgo partiram da concretude das imagens geográficas e

arquitetônicas que constituíam a Granada, do início do século XX, e a sua influência direta

sobre o com portam ento dos habitantes desta cidade. Lorca identificou, então, um

comportamento característico do povo granadino e sua relação com o espaço que,

conseqüentem ente, abriu todo um horizonte de relação com as m anifestações populares

como: as narrativas e os rom ances - com referência no R om ancero gitano\ e, as canções

(24)

1.1 - Id e n tific a ç ã o d o tip o d e c u ltu r a p o p u la r a b o r d a d a p o r L o r c a

A im a g e m

O que a localização geográfica e a paisagem arquitetônica de Granada tinham a

ver como parte da cultura popular pesquisada por Lorca? Tinham a influência do espaço

físico na form a de expressão lingüística com base na percepção e recepção do povo

granadino a respeito dessas im agens concretas, especificamente na expressão oral cotidiana,

conforme Lorca identificou. A interferência dessas formas m ateriais, tangíveis e imóveis

produziu um efeito peculiar no comportam ento do cidadão granadino e, como não podia

deixar de ser, no surgimento de tipos de m anifestações populares andaluzas;

conseqüentemente, a expressão oral tom ou-se um a delas. Lorca identificou um sentido

peculiar dos habitantes de Granada, no que diz respeito à expressão oral, ao conjugar os

verbos no dim inutivo15.

N esta cidade, especificam ente, o verbo pronunciado na form a dim inutiva estava

vinculado diretam ente com a lim itação geográfica e com o estilo arquitetônico apontados

por Lorca. As evidências sugerem que essa atitude era sim plesm ente praticada, sem que

houvesse um a elaboração proposital a partir de um processo consciente dos habitantes. Isto

é, Granada era um a cidade continental cercada por serras, diferentem ente de M álaga e

Sevilha - “ciudades en las encrucijadas dei agua, ciudades con sed de aventura que se

escapan al m ar” 16. Assim , a posição geográfica im pulsionava os habitantes de Málaga e de

(25)

Sevilha a um a abertura para o m undo, ao contrário de Granada onde os habitantes

adotaram um a postura m ais introspectiva.

Segundo Lorca, a utilização do verbo no diminutivo não era privilégio de Granada,

pois este costum e era característico da região da Andaluzia. Porém, ao comparar as cidades

de M álaga e Sevilha com Granada o dram aturgo percebeu outra diferença peculiar em

termos de pronuncia. Em M álaga e em Sevilha a pronuncia do verbo no diminutivo era

sempre acom panhado de ritm o e graça; já em Granada, esse diminutivo não tinha ritmo,

embora fosse cordial e entranhável num a intensidade que acessava o universo tão

característico encontrado apenas em Granada.

O dram aturgo notou que o uso do verbo no diminutivo tinha o sentido de

restringir, reduzir, abreviar, m as jam ais de um a form a pejorativa ou de exclusão, em

oposição aos term os que sugerem grandeza, imensidão. Esse processo de redução

promovia um deslocam ento, m elhor dizendo, um a sensação de deslocam ento das coisas,

das idéias e dos acontecim entos exteriores para o interior das casas e das pessoas. Essa

sensação tocava tudo o que dizia respeito ao tempo cronológico, ao espaço físico, aos

elementos e aos fenôm enos da natureza e à ação na busca de um a justa m edida entre ser e

realidade, um jogo de proporcionalidade com a matéria. Isso estabeleceu um lugar de

tensões entre o estático e o m óvel, que induziu a imaginação para firm ar as referências de

realidade e evitar a alienação, harm onizando as atitudes, os impulsos, as motivações

internas - o com portam ento de um m odo geral - com os traços arquitetônicos e

geográficos da cidade e com os m istérios que podiam suscitar.

A estética das coisas pequenas com punha a estética granadina, de acordo com a

(26)

era parte constitutiva da estética espanhola17. Essa estética granadina estava vinculada à

relação com o espaço e o tem po de um m odo que privilegiava a contemplação, a fantasia,

também estava vinculada a um a outra intensidade para expressar o amor.

O m ovim ento do tem po em Granada adquiriu, nas palavras de Lorca, outra

referência de ‘velocidade’, como um a ‘desaceleração’ que provocava a sensação de

18

alargamento das horas passadas sem pressa . Essa sensação pôde ser percebida pelo

dramaturgo quando este esteve em outras cidades espanholas, o que evidenciou um a outra

relação do espanhol com o tem po independentem ente da estação do an o 19. Em outras

cidades por onde passou, Lorca identificou esse outro m ovim ento do tem po por m eio da

sonoridade, das pausas e dos silêncios que preenchiam os espaços como referência auditiva.

Isto é, por m eio da quietude que enchia as ruas, pela quebra do silêncio pelos ruídos e sons

da natureza ou gritos de crianças, pelo m ovim ento lento dos animais, no vento suave e

constante, na paisagem silenciosa, no m ovim ento lento dos habitantes das cidades, no

temor que a religiosidade lhes impunha, na neve que tom ava conta da paisagem, do calor

que fazia o ar parar.

H avia outra m aneira de perceber a luminosidade do dia que atingia seu ponto

máximo nas luzes dos crepúsculos constantem ente inéditos e ‘interm ináveis’. O am anhecer

e o entardecer adquiriam m atizes indescritíveis aos olhos do campesino, porém de beleza

inigualável aos olhos do poeta. Como o próprio Lorca descreveu um amanhecer granadino

em um a de suas viagens20:

17 G P -P C n f, p . 8 0 -1 . 18 I d e m , p. 8 2 -3 .

19 H -O P I m P , p . 1 4 4 5 -5 0 1 .

(27)

“ L o s m o n te s leja n o s su rg en c o n o n d u la cio n es su a v e s d e réptil. L a s tra n sp a rên cia s in fin ita m en te crista lin a s lo m u estra n to d o e n su m ate esp len d o r. [...] la ciu d a d v a d e sp o jà n d o se d e su s v é lo s p e re zo sa m e n te, d eja n d o v e r su s cú p u la s y su s torres a n tig u a s ilu m in a d a s p o r u n a lu z su a v em e n te dorada. / L a s c a sa s a so m a n su s caras d e o jo s v a c ío s entre e l verd or, y la s h ierb as [...] d an zan g r a c io s o s a l so n d e la b risa solar. / L a s som b ra s s e v a n lev a n ta n d o y esfu m a n d o lâ n g u id a s [...]. / [...] / E l s o l a p a rece c a si sin b r illo ... y e n e s e m o m en to la s so m b ra s se lev a n ta n y s e v a n ..., la c iu d a d s e tin e d e púrpura p á lid a [...]. / [...] / E l so l d e A n d a lu cía c o m ie n z a a can tar c a n c ió n d e fu e g o q u e to d a s la s c o sa s o y e n c o n tem or. / [...].” .

Isso gerava um efeito im ediato no comportam ento dos habitantes, pois toda beleza

natural de Granada era contem plada das janelas das casas, um m ovim ento sempre de

dentro para fora que voltava para dentro, que tinha a iniciativa de apreciar, que estabelecia

o contato visual, m as não tinha a atitude de ir até essa natureza, de aproxim ar-se dela.

Assim, por m eio desse m ovim ento de contemplação, o granadino tinha essa característica

de trazer o m undo para dentro de sua casa, do seu quarto; ou seja, o m undo exterior era

trazido para o reservado, para o introspectivo. Um exemplo desse tipo de atitude é o jogo

de deslocamento do espaço público para dentro do espaço privado na peça M aria na P ineda

- que será abordado no próxim o capítulo.

Esse m ovim ento de ‘trazer para dentro’, ‘de tom ar parte’, ‘de inclusão’ firm ava o

comportamento m elancólico que, por sua vez, acessava o tim bre de voz melancólica,

porém líricos. Essa m elancolia possuía os cam inhos que levavam aos jardins da alm a

verdadeiramente granadina, quer dizer, que levavam à compreensão do intrínseco e do que

necessitava o olhar perspicaz para transpor a superficialidade das observações e dos

julgamentos precipitados. O granadino era um povo voltado para a admiração das coisas

interiores, um povo que contem plava o lirismo extraído das próprias entranhas em

comunhão com a paisagem exterior, sem ser amargurado ou fora da sua realidade e de suas

possibilidades.

(28)

Esse sentim ento de m elancolia foi trabalhado por Lorca em várias de suas peças

como contraponto vital para a existência do jogo de tensões e para a variação do ritm o da

peça - como será descrito na seção: A r e leitu r a d o trágico, deste capítulo. Porém, outros

sentimentos tam bém foram trabalhados pelo dram aturgo, sentimentos que fazem parte de

todo um repertório em ocional da hum anidade, m as que adquiriram outros significados,

outras intensidades e níveis de profundidade encontrados som ente na Espanha, principal e

especificamente em Granada.

A m elancolia e angústia, por exem plo, são dois sentimentos que preencheram as

ruas da referida cidade e, ainda, desdobraram -se na influência estrangeira. O aspecto

emocional tinha tal representatividade e relevância na cultura popular espanhola que

remetia as im pressões à m elancolia, à angústia e à tristeza, tanto quanto o silêncio e o som.

Lorca percebeu um a relação de interdependência de ambos, como pode-se observar no

fragmento a seguir21:

“ C a lle s e n q u e h a y c o n v e n to s d e clau su ra p erp etua, b la n c o s, in g ê n u o s, d o n d e h a y p a lo m a s y n id o s d e g o lon d rin a s. C a lle s d e seren ata y d e p r o c e sió n c o n la s c a n d o ro sa s v írg e n e s m o n jile s ... C a lle s q u e sie n ten la s m e lo d ia s p latea d a s d ei D arro y la s ro m a n za s d e h o ja s q u e ca n ta n lo s b o sq u e s leja n o s d e la A lh a m b r a ...[...]. / [...]. C u an d o s e está m á s ab ru m ad o p o r e l p a se o a n g u stio so d e la v e g a , siem p re p la tea d a , llen a d e m e la n c ó lic o s to m a so le s d e c o lo r ..., y la c iu d a d d u rm ien d o a p lan ad a entre n eb lin a s, e n la s q u e d e sc u e lla e l a co r d e dorado d e la ca ted ra l [...]. [...] / H a y u n a tra g éd ia d e con tra stes. P o r la c a lle solita ria se o y e e l ó rg a n o d u lc e m e n te to c a d o e n u n c o n v e n to ... [ . . . ] . / T o d o n o s h a ce v er u n a m b ien te d e a n g u stia in fin ita , u n a m a ld ic ió n orien ta l q u e c a y ó so b re esta s c a lle s / U n aire ca rg ad o d e r a sg u eo s d e guitarras y d e g rito s c a lm o s o s d e la g itan ería. / [...]. / T o d o lo q u e tie n e d e tranq u ilo y m a jestu o so la v e g a y la ciu d a d lo tie n e de a n g u stia y d e tra g éd ia e ste barrio m o r isc o . / [...].” .

(29)

E, ainda, o dramaturgo percebeu a relação espaço / cor / som, conforme descreveu

no fragmento a seguir, ao observar o passar das horas ‘alongadas’ de cidades que o próprio

Lorca cham ou de rom ânticas, no caso: Alham bra y Generalife. Nesta ocasião, Lorca

analisou um m ovim ento sensível do tempo em harm onia com a relação espaço / cor / som;

assim sendo, concretizou-se m ais um a vez no dram aturgo o m ovim ento de trazer o mundo

exterior para o universo introspectivo. Como pode-se observar a seguir 22:

“ [...]. S o n lo s p a tio s so n a d o res y u m b r o s o s ... / E n m e d io d el gran a co rd e m a c iz o d e l c a se r ío lo s c o n v e n to s p o n e n su a m b ien te d e tristeza. / [ . . . ] . L o q u e fa scin a e s e l so n id o . P o d ria d e cir se q u e su en a n to d a s la s c o s a s ... Q u e su en a la lu z , q ue su en a e l c o lo r , q u e su en a n la s form a s. / E n lo s p arajes d e in te n so so n id o , c o m o s o n la s sierras, lo s b o sq u e s, la s llanu ras, la g a m a m u sic a l d e l p a isa je tie n e c a si siem p re e l m ism o a co r d e , q u e d o m in a a la s d em á s m o d u la c io n e s. [...]. / [...]. C ad a h ora d e l d ia tie n e u n so n id o d istin to. S o n sin fo n ia s d e so n id o s d u lc e s lo q ue s e o y e n ... Y a l co n tra rio q u e lo s d e m á s p a isa jes so n o ro s q u e h e e sc u c h a d o , e ste p a isa je d e la ciu d a d ro m â n tica m o d u la sin cesar. / T ie n e to n o s m e n o r e s y m a y o res. T ie n e m e lo d ia s a p a sio n a d a s y a co rd e s so le m n e s d e fria s o le m n id a d ... E l so n id o ca m b ia c o n e l co lor: p o r e s o , ca b e d ecir q u e é ste canta. / [...]. / A lg u n a s v e c e s c la m a n e n to n o g ra v e la s ca m p a n a s son o ra s d e la cated ral, q u e llen a n lo s e s p a c io s c o n su s o n d a s m u s ic a le s ... [...]. / [...]. H a y s ilê n c io s m a g n ífic o s e n q u e ca n ta e l p a is a je ... [...] / L a n o c h e tie n e u n a b rilla n te z m á g ic a d e so n id o s [...]. S i n o h a y lu n a ..., e s u n a m e lo d ia fan tá stica y ú n ica lo q u e ca n ta e l r io ... [...]. / R e sb a la u n a p en a d o lo r o sa e irrem ed iab le so b re e l ca ser ío [...] y so b re lo s so b e rb io s d e c liv e s r o jo s y v e r d e s d e la A lh a m b ra y G e n e r a life ..., y v a ca m b ia n d o sin c e sa r e l c o lo r , y c o n e l c o lo r ca m b ia e l s o n id o ..

Estas palavras do dramaturgo evidenciaram um a exploração dos sentidos para a

percepção e recepção da paisagem e do som como estím ulos (visuais e auditivos) aos

sentimentos vivenciados pelos granadinos de m odo intenso e profundo, típico da região de

Andaluzia.

(30)

O r o m a n c e p o p u la r

N a seção anterior, conform e a percepção de Lorca, foi possível verificar a

presença do sentim ento de m elancolia no comportam ento do povo granadino estimulado

pela localização geográfica da cidade de Granada. N esta seção será abordado outro

sentimento que tam bém faz parte do universo psicológico e emocional dos granadinos: a

pena - porém absolutam ente desvinculada da m elancolia e da nostalgia, como observado

pelo dramaturgo . N este caso, de acordo com o pensamento de Lorca, a pena era um

sentimento que aproxim ava o hom em do que era sublime ao invés de m antê-lo fixado às

coisas da terra. Segundo essa outra percepção de Lorca, o sentimento de pena configurou-

se como um jogo de tensões entre um a inteligência, que o dram aturgo cham ou de

‘inteligência am orosa’, e um m istério, que estava acima da capacidade cognitiva dessa

inteligência. Isto é, um jogo de poder entre revelado versus não-revelado, um jogo de

mistério que necessitava im pedir que os segredos fossem descobertos.

Lorca trabalhou esse sentim ento na composição da im agem do seu R om ancero

gitano, bem como as figuras dos ciganos, dos m ouros, dos andaluzes, as paisagens e de

todos os dem ais elementos poéticos específicos de G ranada24. N a referida obra o

dramaturgo utilizou os elementos da cultura popular espanhola para elaborar suas

referências “antipintoresco, antifolclórico, antiflam enco” já organizando um a justa tensão

entre tradição e m odernidade, que certam ente utilizaria no decorrer de sua produção

artística25.

23 G P-P C n f, p . 1 7 9 . N o c a so e s p e c íf ic o d o sen tim e n to d e p en a , o dram aturgo e sc r e v e u c o m letra m a iú scu la ; m as, para a c o n tin u id a d e d e s s e estu d o será m a n tid a a p a lav ra c o m a letra in ic ia l m in ú sc u la c o m o o s d em a is sen tim en tos ca r a c te r ístico s d a r ecep çã o .

24 G P-P E y d , p. 3 7 9 .

(31)

Tratando-se de um a composição de imagens, Lorca buscou um tipo de associação

dos sentimentos próprios dos granadinos, com um a outra form a de olhar esses sentimentos

- o que, conseqüentem ente, abriu um outro espaço para a apresentação de outras imagens a

iniciar das conhecidas pelo senso comum espanhol. Isso originou a prim eira característica

específica do estilo poético lorqueano e independente de qualquer tipo de influência que já

tivesse sofrido anteriorm ente, segundo palavras do próprio dramaturgo26.

As im agens criadas por Lorca no R om ancero correspondem à influência do

movimento surrealista, da pintura, e é de fácil identificação. O dramaturgo desenhou com

suas palavras as im agens e m atizes o que desejou com unicar ao leitor e, para isso, propôs

um desdobram ento de possibilidades passíveis de verificação em seu R om a ncero21. Como

pode-se observar no seguinte fragm ento do R om ance sonâm bulo, a experiência sensível de

Lorca com paisagem e com a pintura perm itiram ao dramaturgo criar outras imagens que

ainda não tinham sido suscitadas no universo imagético do granadino, nem por m eio das

palavras e ritm os nem de pinturas28:

“V e r d e q u e te q u iero v erd e. V e r d e v ien to . V e r d es ram as. E l b a rco so b re la m ar y e l c a b a llo e n la m on tan a. C o n la som b ra e n la cintu ra e lla su en a e n su baranda, v e r d e ca rn e, p e lo v erd e, c o n o jo s d e fria plata. V e r d e q u e te q u iero v erd e. B a jo la lu n a g itan a, la s c o sa s la e stá n m iran d o y e lla n o p u e d e m irarias.

V e r d e q u e te q u iero v erd e.

26 G P - P C n f p. 178. 27 H-P s , p. 3 5 1 -9 5 .

(32)

G ran d es estrella s d e esca rch a , v ie n e n c o n e l p e z d e som b ra q u e abre e l c a m in o d e i alba. L a h ig u er a frota su v ie n to c o n la lija d e su s ram as, y e l m o n te , g a to gard u n o, e r iz a su s p ita s agrias.

^Pero q u ién v en d rá? p o r d ó n d e ...? E lla sig u e e n su baranda,

v e r d e carn e, p e lo v erd e, so n a n d o e n la m ar am arga.

Lorca observou duas m aneiras de perform ar um rom ance popular. Este era um a

narração, porém quando pronunciado de form a lírica o rom ance convertia-se em canção .

Neste m ovim ento, entre a narrativa e a lírica, o dramaturgo encontrou um outro espaço que

lhe permitiu perceber o rom ance de um a outra perspectiva formal. Entre essas formas

possíveis previam ente estabelecidas pelos costumes populares de dar continuidade à

divulgação do rom ance popular, Lorca criou um a outra possibilidade de trabalhar as

imagens e a própria estrutura rítm ica do rom ance por m eio do seu R om ancero gitano.

A proposta de Lorca consistia em unir as possibilidades de perform ance acima

descritas sem que houvesse qualquer perda na qualidade lírica ou narrativa do romance.

Portanto, o R om an cero foi organizado para evidenciar essa outra estratégia de criação

poética que abarcou um a outra construção rítm ica e um a outra perspectiva a respeito de

uma m anifestação popular. O que realm ente foi possível perceber, por m eio de alguns dos

poemas do R om an cero onde Lorca aplicou essa outra técnica, foi um a outra sensação que

aproximava o leitor ou o ouvinte de um a sensação de estranhamento a respeito de algo já

muito conhecido, de continuidade e descontinuidade, de não se saber ao certo o que era

essa outra estrutura que parecia um a “anécdota” ou um “agudo ambiente dram ático”, ou o

romance tal com o era em contraponto com a proposta de variação apresentada. Esse

(33)

estranhamento pode ser considerado tam bém o princípio de um a técnica de distanciamento

(para que o leitor fosse desvinculado do padrão tradicional com representação literal e

pudesse perceber um a m udança), e o princípio de um a ressignificação da m étrica

tradicional da poesia.

As imagens criadas por m eio do R om ancero são imagens que tam bém propunham

uma relação de proporcionalidade entre imaginação e realidade, de personificação dos

elementos da natureza, de outras formas de percepção e recepção dos m itos gregos e dos

mitos ciganos. Assim , o olhar lorqueano que criou outros m itos30. Como verifica-se no

Romance de la Luna, L u n a31:

“ L a lu n a v in o a la fragua c o n su p o lis ó n d e n ard os. E l n in o la m ira m ira. E l n in o la e stá m iran d o. E n e l aire c o n m o v id o m u e v e la lu n a su s b ra zo s y e n se n a , lú b rica y pura, su s se n o s d e duro estaiio. H u y e lun a , lim a, luna. S i v in iera n lo s g ita n o s, harían c o n tu c o r a zó n c o lla r e s y a n illo s b la n co s.

Isto é, Lorca iniciou seu processo de ressignificação da tradição literária nela

mesma, nas referências de percepção e de interpretação da imagem, na variação da m étrica

tradicional do verso, na continuidade formal de um tipo de m anifestação popular e na

descontinuidade possível, nas outras perspectivas que a própria cultura popular espanhola

poderia prom over, na inter-relação das artes que já apresentavam suas prim eiras evidências

no vínculo poesia-canto, nas possibilidades form ais do rom ance popular. Essa inter-relação

será verificada na peça M ariana P ineda, como m arco do teatro comercial produzido pelo

30 G V -P C rr , p . 8 0 9 , 8 8 4 .

(34)

dramaturgo, bem como nas m ontagens dos textos do teatro clássico espanhol realizadas

pelo grupo de Teatro Universitário L a B a rraca, que constitui-se como o segundo m arco na

carreira artística de Lorca. No caso da peça M aria na P ineda, a inter-relação poderá ser

Verificada no rom ance popular sobre corrida de touros que é pronunciado pela personagem

Amparo, pois trata-se de outro rom ance criado pelo dram aturgo especificamente para a

referida peça32. Tam bém poderá ser verificada no rom ance popular sobre a heroína

-5-1

Mariana Pineda, que o dram aturgo dispôs para iniciar e finalizar a referida peça teatral . Já

no caso do L a B arraca, essa inter-relação poderá ser verificada como parte complem entar

da coerência da proposta estética lorqueana aplicada às m ontagens das obras clássicas.

A técnica de ruptura de Lorca com a tradição literária e com a cultura popular

espanhola resum iu-se na apropriação destas para a criação de um a outra proposta, de um a

maneira que a ruptura não acontecesse por m eio de um a negação cerceadora e absoluta ou

pelo esvaziamento de um costum e em determinado espaço, m as que apresentasse proposta

estética coerente para a ressignificação de am bas34. O dramaturgo usou a estrutura formal

do romance para inserir a sua releitura sobre algumas características dessa cultura popular

e da tradição literária no repertório im agético do rom ance a ser performado. A partir disso,

Lorca deu ênfase ao sentim ento de pena, na solução de um problem a na presença da morte,

na forma lírica em relação de tensão com a narrativa para explorar a sensação de

estranhamento e reconhecim ento por m eio da produção de voz, m elodia e ritmo do

romance. Isso form alizou-se como um a estratégia de Lorca para valorizar a cultura popular

espanhola em seu lugar de origem e nos lugares para onde fosse ‘deslocada’, bem como

para a apreciação do espectador por um a outra proposta de m anifestação artística que

explorasse algum as possibilidades de variação dessa cultura popular absolutamente

32 H-T ír, p. 7 0 2 -4 ; G P- P C r r , p . 9 3 8 -9 . 33 Id em , p. 6 9 1 -2 , 8 0 1 .

(35)

Em relação ao cante jo n d o , o m om ento em que Lorca direcionou seu olhar para

esse tipo de m anifestação popular foi um m om ento no qual essa canção sofria um a

depreciação crescente na sociedade espanhola alcançando níveis pejorativos35. Pois, não

havia um cuidado em proteger esse tipo de m anifestação popular que, conseqüentemente,

já estava abandonada à m arginalidade no início do século XX.

O que era conhecido como cante jo n d o naquela época era um grupo de canções

andaluzas do tipo sigu irya g ita n a36. Essa consideração de Lorca foi im portante para

diferenciar o cante jo n d o do cante fla m e n c o - que não compartilhou a m esm a estrutura

musical e tom ou form a no século XV III37. Segundo Lorca, o cante jo n d o teve sua origem

no sistema m usical prim itivo da índia. Era, pois, um a ondulação m elódica, um sistema

organizado de m odo a valorizar outras notas m usicais que foram configuradas além da

escala das sete notas conhecidas no ocidente. Essas outras notas ampliavam a escala em

termos de um a variedade de semitons existentes entre cada um a das sete notas instituídas.

Houve elementos essenciais comuns que aproximaram as formas de expressão do cante

jondo e da m úsica indiana prim itiva das expressões m usicais bizantinas, como a ausência

de um padrão m étrico determ inado e específico na m elodia, o que tam bém foi verificado

por Lorca no caso da sigu iry a, por exem plo38. Ao contrário do cante jla m e n c o que, por ser

mais moderno, preenchia aos requisitos da escala m usical convencional e, por isso, tinha

um limitado repertório de possibilidades de variação, conforme explicação do dramaturgo.

N a pesquisa de Lorca sobre o cante jo n d o foi possível perceber, por meio das

diferenças que o dram aturgo descreveu entre o cante jo n d o e o cante jla m e n c o, que o ritmo

e a m elodia deste foi constituído nas norm as rígidas da m úsica ocidental. Enquanto o cante

35 G P-P C n f, p . 3 3 .

(36)

jondo seguiu os padrões m ais flexíveis da m úsica indiana prim itiva - introduzida tam bém

na Espanha pelos ciganos com alguma passagem ou origem no o rien te 39. Esse

deslocamento oriente-ocidente sugeriu que a localização geográfica tam bém exerceu um a

influência direta, nos costumes e nas tradições dos povos pertencentes às terras

estrangeiras, devido a possíveis semelhanças territoriais, m uito m ais que verossimilhanças

entre povos diferentes.

Lorca descreveu os poem as do cante jo n d o como poem as perform ados com

nuances aplicadas às prosas cantadas; deste modo, estas nuances interferiam diretam ente

na disposição da m étrica dos versos, distribuídos em tercetos e quartetos, e prom oviam ,

então, um a sensação de quebra do ritmo e da m étrica tradicionais do verso; m as que, em

contrapartida, sustentavam um a relação direta de proporção entre a m étrica e a

performance40. Essa observação de Lorca influiu diretam ente na organização da estrutura

melódica e rítm ica das suas peças teatrais, que foram criadas para levar ao público as

referências de contraste entre o convencional e o outro que era produzido a partir deste

convencional, como a reestrutura do verso tradicional para a peça M arian a P ineda e nas

montagens dos clássicos espanhóis pelo Teatro Universitário L a B arraca. Com base nesse

jogo de opostos complem entares, Lorca criou um a técnica para expandir ou abreviar a

sensação de passagem do tempo diretam ente ligada à sustentação do jogo dram ático de

tensões.

Os poem as do cante jo n d o incluíam o sentim ento hum ano em sua diversidade de

variações, de gradações e de possibilidades. Como pode-se verificar no seguinte

fragmento41:

“ (a m o r )

39 G P-P C n f, p. 3 7 -8 ; H - V C n f, p . 1 5 1 4 . 40 I d e m , p . 3 8 ,4 3 ; I d e m , p. 1 5 2 0 .

(37)

D ic e s q u e n o m e p u e s ver. L a cara te am a rillea c o n la fu erza d ei querer.” .

A abordagem de um problem a im possível, ou a solução deste por m eio da m orte, pareceu

sobressair enquanto tem a predom inante a partir da compreensão das palavras de Lorca42:

“ S o n tan g ra n d es m is p en a s q u e y a n o p u e o m á s y y o m e e s to y m u rien d o

p o r tu ca u sita , sin c a lo r d e n a d ie, lo q u ito p e r d í o

E n e l h o sp ita l.” .

E com essa abordagem, tem as como a dor, a pena e situações cotidianas que diziam

respeito apenas às pessoas oprim idas da sociedade compunham o repertório do cante jo n d o .

A burguesia jam ais foi representada por Lorca como parte da cam ada popular; porém , o

dramaturgo deu a essa classe social o sentim ento característico da form a de percepção e

recepção popular - ou seja, do sentim ento trágico da vida, que será abordado na seção: A

releitura d o tr á g ic o . Lorca trabalhou com os sentim entos provenientes das cam adas mais

populares da sociedade espanhola, por m eio das quais a m anifestação dos sentimentos

característicos dos granadinos era perpetuada e gerava um m aterial pré-expressivo para a

performance da cultura popular espanhola43.

Os quatro elem entos da natureza tam bém fizeram parte do repertório do cante

jondo. Como pode-se verificar no ‘m ito de um vento inventado’44:

“ S u b ia a la m u ralla y m e d ijo e l vien to :

£para q u é so n ta n to s su sp iro s s i y a n o h a y re m ed io ?

E l aire llo ró

a l v e r la s p en a s tan g ra n d es

42 G P-P C n f, p. 4 9 . “ S ã o tã o g ran d es a s m in h a s a fliç õ e s / q u e j á n ã o p o s s o m a is / e eu esto u m orrendo / p or tua cau sa, se m o c a lo r d e n in g u é m , / lo u c o p e r d i d o / n o h o sp ita l.”

43 I d e m , p. 4 5 -5 0 ; H - V C n f p. 1 5 2 0 .

(38)

d e m i c o r a z ó n .

Y o n o le te m o a rem ar, q u e y o rem ar rem aria; y o s ó lo le te m o al v ie n to q u e sa le d e tu b a h ía.” .

Esses tem as tam bém serão aproveitados por Lorca, de acordo com o

desenvolvimento de sua produção artística, como tem as característicos do comportamento

e do pensamento do povo andaluz. Apesar de que, tem a como o da m orte, m ais que

recorrente, foi como um a obsessão para o dram aturgo. Além disso, um fator que vinculou a

produção de voz ao sentim ento foi a pouca utilização do m eio tom, no caso específico do

cante jo n d o . Lorca apontou que, por m eio do ato de performance, tal ausência funcionou

como um reforço aos sentim entos de m elancolia, pena, angústia, tristeza, pranto,

característicos nas obras de Lorca e no imaginário popular espanhol. Em P oem a de la

siguiriya gitan a, observou-se de im ediato os primeiros indícios da releitura e da

reestruturação da m étrica tradicional do verso, como no caso do poem a P aisa je45:

“E l ca m p o d e o liv o s

s e abre y s e cierra c o m o u n a b a n ico . S o b r e e l o liv a r h a y u n c ie lo h u n d id o y u n a llu v ia o scu ra d e lu c e ro s frio s.

T ie m b la ju n c o y p en u m b ra a la o r illa d e i rio.

S e riza e l aire gris. L o s o liv o s , está n c arg a d o s d e grito s. U n a b an d ad a d e p á ja ro s c a u tiv o s, q u e m u e v e n su s la rg u ísim a s c o la s e n lo so m b r io .” .

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