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Kalahari de Luís Serguilha sem Antes e Sem Afora

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Academic year: 2021

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Resumo: o texto de Kalahari se oferece ao leitor no instante conturbado das forma-ções perceptíveis, que adentram o dilúvio, e se este fecha o livro e olha, para cima, vê estre-las num céu às avessas, no qual o mundo se desfaz em ruínas, poeira e estilhaços nascentes de línguas mortas, onde o abandono convive lado a lado com a instauração do sentido.

Palavras-chave: Kalahari. Lugar alado. Aventura impenetrável. À distância, a raiz contígua

A

s poucas entradas se propõem como minúsculos túmulos apartados. Cada uma delas se inclui nos rastros do Kalahari, até que outra entrada a dete-nha; como se cada uma fosse um limite instransponível. Seria melhor con-siderá-las como acenos do caminho.

Deise Quintiliano**, Marcus Alexandre Motta***

SERGUILHA SEM ANTES

E SEM AFORA*

* Recebido em: 16.09.2014. Aprovado em: 39.09.2014.

** Doutora em Letras Neolatinas (Língua Francesa e Literaturas de Língua Francesa) pela UFRJ / EHESS (Ecole des Hautes Etudes en Sciences Sociales de Paris). Pós-doutorado em Letras pela UFRGS (2010) e pela Université Paris 8 (2013). Membro do GES (Grupo de Estudos Sartrianos) de Paris. Professora de Letras Francesas, no IL da UERJ. Autora dos livros: Sartre: philia e autobiografia; Engenho e arte: pós-modernidade e relatividade em Sartre; Sartre em dois atos: as moscas e o diabo e o bom deus.

** * Professor do Programa de Pós Graduação em Letras da Universidade do Estado do Rio de Janeiro).

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Assim, essas entradas só de modo acidental coincidem com as ocasiões de espaços em branco que se vão despejados______ entre as lacunas________ que se fazem entre um_____ e outro. Esses espaços informam sobre as áreas de descan-so___________________, para desejar aclarar a mente, ou enuvia-lá, nos passos, que po-dem ser de introdução ou de abandono em Kalahari.

Por um lado

Não há experimento poético em Kalahari.

O experimento artístico tem o anseio pelo indeterminado da ação. Kalahari é hiper determinado.

Não há sensacionismo em Kalahari.

O sensacionismo é tributo pago à crença pagã nas sensações. Kalahari se dá no imediato anterior àquelas formações sensíveis†. Kalahari se encontra bem antes ≥ bem depois.

A indicação de qualidade em Kalahari é a qualidade dos textos que anima. Mas esses aparecem como inadequados, inda bem. Ao chegar a Kalahari não se consegue estar acerca de, nem arranjar intimidades. Ali apenas é sugerida a direção num vazio esvaziado por brutas frases.

(frases?)

Kalahari se encontra antes e depois de qualquer coisa.

Kalahari é a terra quando o céu ¬ mesmo não é a tampa do vaso. Ali só há línguas mortas, como qualquer língua que se fale agora.

Do outro lado

A loba no Kalahari não é uma imagem. Ela é figura da arte (esgota o vazio; ideia plástica). Como tal, entorna seu uivo e vai anuindo e simulando o que lhe vem de fora. Mas o uivo já está lá fora. A loba, em seu dispositivo, não tem dentro do dentro. A loba é o dentro do fora. Ela não é vítima dos critérios. Não aceita definição. Antes arguta pará-frases. Ela não existe em Kalahari. Ela é. Ela está ausente como elemento da condição essencial de oscilar sem dúvidas; ou seja: ela é a dí-vida. Kalahari é a o lugar-sem-lugar no qual o saber da arte, a loba, toma o outro sem o problema da certeza do outro.

Um outro ainda lado

A voz das vozes do poeta em Kalahari dita: “escuto, uivando. Não respondo, portanto. Na terra na qual finco os pés, há, e como há línguas mortas que se fazem de terriços e com eles faço aquela no qual vivo. (nnnnn...) A minha voz parece querer ser destino, ou dilúvio, que não mais vem, ou estrelas que se dão quando alguém fecha o

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livro e olha para cima e, tonto, vê estrelas num céu de cabeça para baixo. Constelações, ruínas, poeira, arranjos, tudo provém da mesma figura. Sei, apenas sei que qualquer língua é morta».

De lado no lado

Se do caso Kalahari sai o que supera as indecisões, sua gravidade primordial é o gesto de sepultar o sentido. Cada andamento ali inuma o sentido. Mas como o túmulo está aberto, a alegoria antiga clama e reclama diante da língua viva aventura imprete-rível que a ameaça, em cada momento, naquilo que ela já é †.

Do lado de lado

Kalahari é a fantasia dura ¼ do uivo antigo, mais-muito futuro, no qual ressoam palavras com apetite físico que se tolera auditivamente no estômago. No uivo, as palavras são inflexíveis, cadáveres, quando ficam, cuja nenhuma guia é o abandono e, ali, palpam. O lado de lado

Não há

em Kalahari algo que se possa eleger como possibilidades de alguma coisa mental, cordatamente ditas. Ao avesso: ali as possibilidades se elegem a si mes-mas como subtração da vista, se pondo como visões. Seus assuntos são a prova ocular de como as cenas se constituem elas mesmas como algo sem mais e assim ficam. De lado o lado ao lado

Não se pode entender Kalahari.

Kalahari não é também algo que se sinta. Kalahari é um mistério sem privacidades.

Kalahari é a grandiloquência para os indiferentes. Tudo está a serviço disso. Kalahari deseja tudo menos a luz e as trevas.

Kalahari não é um poema.

Kalahari é o terreno baldio que se forma dos restos da cultura.

Derrames de platô, portanto.

Sem lados os lados

No extremo radical, nada vem com rapidez.

Chega-se à evidência concreta, como a contra história que estala.

Estalam as madeiras que apoiam o que de fato já ruiu. Tudo está preparado para ser e jamais é.

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O ato de Kalahari é a dor uivante que sai do desflorar o presumível. A lateralidade de um dos lados

Observe que em Kalahari não há monólogo e nem prontamente diálogo. Há a parte ritual da fala que se faz de acréscimo crustal.

Ela petrifica, após. Dura assim. A lateralidade do outro lado

As palavras são “aluimentos” de toda a significação em Kalahari. É de Kalahari isso.

Ali se fosse, teria sido, se tivesse sido, não mais é,

logo, só é porque foi sem nunca ter sido,

pois é um fosse indeterminado da dí-vida e da servidão ao que é por ter sido mui-to antes do antes, ou

muito depois do depois.

Nome: penhas remotas. Fora

A unidade material em Kalahari é tanto mais enganosa quanto mais as suas for-mas e seus momentos parecem descrever um grau elevado de tópica. A escrita, ali, é um fenômeno geológico descumprindo o que se espera dela, manifestando a ambi-guidade fundamental da arte no esforço de erupção para além das coisas, dando-se a perceber quando rompe diques.

O fora do fora

As frases (frases?) em Kalahari

assemelham-se aos antearcos que margeiam o deserto histórico. O dentro do fora

Ali, em Kalahari, as avalanches são um tipo de linguagem. Mandamento de-monstrativo dos blocos.

Isso não define nenhum critério da identidade.

Kalahari é o desmoronamento anunciado pelos mais temíveis acordos entre os doutos.

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Lá fora, o fora

Conhecer ali é notar que o pensamento poético não é definição. Pouco há em Ka-lahari que se adapte à noção disseminada de que pensar é significar. Como se expressa esse conhecimento? Por um lado, aspectos antrópicos agem como linguagem; em outros, a área degradada se faz atuante, somente; ainda em outros, há a avulsão das frases coagi-das pelo sobressalto. Porém, em nenhum desses casos, o que se expressa é mero informe. O fora de lá fora

Se a existência de Kalahari, e o nosso conhecimento de sua existência, se con-verte num problema de arte, é suficiente dizer que aceitá-lo não significa nada mais que admitir as regras de como aceitá-lo ou rechaçá-lo? Isso não diria que aceitá-lo, ou rechaçá-lo, é uma maneira de eleição que se caracteriza por assumir, ou rejeitar, os mesmos critérios? Mas se Kalahari fosse um tipo de arte que se expressa e se mantém como algo que desaba na medida em que atua? Algo que se arrisca quando as suas pa-lavras declaram o que são: alúvios, desmoronamentos, erupções geológicas. Assim, o que há de rejeitar, ou aceitar, é tudo, tirando o que de fato só pertence à arte. Como tal, nela, aceitar ou rejeitar pouco de importância há.

O fora sem dentro

Como opróbrio, o conhecimento amarga a vida. Os frutos Já são o solo em Kalahari.

Além do fora

Coisas em Kalahari ensinam que, quando a voz fala, fala como vive a eloquência do final e o que vive é a linguagem que ali morre, numa desagradável alternância entre a noção de que a voz fala e a noção de que a fala é o arranhar rochas. Presa e abandono são da mesma natureza em Kalahari.

Além do além e seus foras

Não se olha para trás em Kalahari. Ali, a satisfação é indecente. Ali, o passado não há.

É arrastado em cada passo insistentemente.

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Perda

1) quando a sensação se torna significativa em Kalahari, é importante convertê-la numa passagem geológica;

2) quando se intui os fatos intelectivamente em Kalahari, é vigoroso reconhecê-los areentos;

3) quando o que acontece é a própria meta em Kalahari, é fundamental aceitá-lo nos passos e, isso, nada tem haver com ele.

Saída torta Olho e uso.

Medem-se as distâncias.

Os muros das expressões ajustam o olhar em cada centímetro que abona em Ka-lahari.

Fica-se de pé.

Volteia-se sem saber.

A mente é abrasada por vozes na voz que se houve quando acontece cada caso. Quer dizer: goles de arem cada tropeço ou escorregão.

As linhas em Kalahari enfraquecem quem nelas passa. A saída que há no não há

Sobe-se, ou se desce os degraus das frases que estão por todos os lados em Ka-lahari.

Antes de empurrar mais um passo, a cabeça declina num gesto de afinamento e peso. Há de se abençoar com os pés quando por ali passa alguém.

Kalahari só tem rotas.

A saída que nem se pode dizer como tal Trago notícias daqui.

Daqui, em Kalahari. Brisa nenhuma há. Estou ainda em Kalahari. Entretanto, penso. Isso quer dizer: retiro-me dali, ficando por lá. Qualquer um sabe o que quero dizer com isso.

Estando sozinho, cumpri o estado que prescreve certa situação pré-industrial: pus-me a pensar. Interessante: avisto a pequenina erva que cresce ao lado da grande pedra em Kalahari.

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Bem, tudo se inicia sem coisa alguma a narrar, pois estou pensando, e sem falar por algum tempo, pesando a amante desenhada, naquelas palavras que acontecem e se esquecem de se deter num limite qualquer.

Nesse caso, nenhuma acepção norteia a consciência.

A primeira coisa que me veio à mente foi tatear-me. Precisei do meu corpo; isso é, senti a grande parcela de matéria que me pareceu peculiar. Não soube como repre-sentá-la sem ostentar certa distância.

Sei que afixo aquela parcela de matéria nesses meus tropeços, ou tumbas, dentro dos justos limites de nada saber sobre Kalahari, e o pressinto na tarefa vaga que me traz até aqui, coçando a cabeça, apertando as pontas das orelhas.

Em pé, pronuncio: aqui estou. Tive a nítida presença de algo que parecia estar comprimindo a matéria do meu corpo.

Fraco das mãos estou. Tenho a reminiscências de leituras feitas. Comparo-as a tudo que se encontra acima ou abaixo delas. Olhei para os blocos de Kalahari. Ali se vê a mesma coisa, quanto mais se deseje tentar lhufas, de maneira a fugir do imperativo: o abandono e a sede.

De todos os lados chega o hálito de ar que me faz esconder os pés na boca da calça. Eis o moroso deleite de monge que passa agora. Não me atenho nesse sinal.

Evito pensar em objetos que poderiam estar a cercar-me, e contemplo absorto as alturas e os desníveis em Kalahari.

Prevejo alguma coisa chegando, partindo, se abandonando por ali, como se os blocos, os desmanches, as crostas fizessem um grande esforço para não sair do lugar.

Caso ficasse de súbito entretido, naquilo que estou, obteria a certeza que Ka-lahari, e o uivo que ouço, vem como blocos nos quais me encontro, ou me perco, ou, quem sabe abandono-me por inteiro.

Kalahari migra para as terras vesperais, conforme a trama de sua necessidade me faz um tipo de vingador de anêmica força messiânica, motivado por opiofagia lin-guística e morto de sede.

Sei, como sei que tal prescrição será visto como exercício de aspiração.

O que elas, aquelas palavras de Kalahari, deixam de dizer, as linhas do meu cor-po transcor-posto figuram sem traçados. Figuram a presença da órbita ampla do deserto que se esconde nas nuvens luminosas das aparentes frases, condenando-me a estar ouvindo o que deveria esquecer quando escuto os seus sons.

Maravilho-me que isso me ocorra, zangado por impedir as birras que me cabem. Porém, não passo de um ponto insignificante nos rastros das rotas de Kalahari.

E se a minha vista aí se detém, a imaginação evita-me, preferindo ver formatos naquelas crostas, aluviões, desmoronamentos.

Não pare, algo fala; mais rapidamente se cansará a imaginação de conceber formas. Toda essa superfície é apenas o rastro de traços da trajetória, cujo rumo se esten-de e inclina-se.

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quase no meu lugar, aquele vingador opiofágico de rara força messiânica, transmu-tando o arrojo das duras pedras que terminam nelas, andando sobre tropeços, impe-dindo discernimentos, ou de se propor como algo.

Forma da forma. Matéria da terra que se faz de corpo inscrito no meu lugar. Con-tudo, já aprendi: em Kalahari é proibido ser explícito. Ser explícito, quanta intimida-de há nisso e não quero aqui dizer apenas o quanto intimida-de violência há nela.

Aprendi? Então, o que eu faço por cá em Kalahari ainda? Há em Kalahari volu-mes, proporções, andamentos, ritmos e o que mais não sei.

Chega se achega aqui nesse esquecimento. Nada vi ainda e, prontamente, reco-nheço a evidência. Pergunto-me: “então, Kalahari rejeita-me?” Miga vejo ainda. Há o que no momento se fala e aquilo que o momento fala; a linguagem sempre fala, sem nós e repleta de si, como a anti natureza maior que nos cabe em nossa natureza de de-sertos. Sem pressa, há aparições, em auditivas tensões, uma contra outra que se fez de armadura com os dedos de fora.

No entre tempo de minha pouca competência de decidir, as palavras rumaram. Rumam com os olhos de areia pesados. Temo a tristeza que há em Kalahari. Temo, quem sabe? De ser mais uma voz que pensou por ali e morreu de silêncio. Agora o sol anda a dourar a terra árida, o que não lhe pesa.

Conte-me a má sabedoria de um Deus qualquer. Duvido, sei lá! Uma fala sem nada a contar é a morte muito mansa.

Óleos santos quem sois vós! Ungem minha face e dela nada direi que não seja eu. Eu, ai de mim mais uma vez como engano. Pressurosa constatação, sem se alçar ou aguar-me.

Mais proximamente hei de recorrer no tribunal de minhas faltas outro pacto; se conseguir sair daqui. Já me penetra algo entre consolos e cheiros. E aqueles uivos fica-ram milímetros da minha pele, como aqueles olhos daquele alguém.

Assim, me pus no solo de Kalahari. O pó que se agarra aos meus braços nasce dona. Vindo à casa, a janela vermelha está fechada. Jaz no parto de se abrir talvez. Res-pondo a ela quando chegar a abrir.

Não é pedir muito! Dali vem o barulho. Há de haver o haver havido, olvido, como direi, na misericórdia da ferida auto-imposta. Mas aqui não há ninguém ou todos, ain-da não sei.

Alhures homem! Recite alguma coisa em cautelas e sutis flores. Kalahari é sem aviso. Posta está a minha pena e algumas pedras pesaram no branco da minha memó-ria. Desespero-me e abandono-me com a cabeça recostada no mais duro pedregulho que não tem sentido algum, e assim vive Kalahari.

Eu ali, disse: as poucas entradas propostas como minúsculos túmulos aparta-dos, ficaram. Cada uma delas se incluiu nos rastros do Kalahari, até que outra entrada a detivesse; como se cada uma fosse um limite instransponível.

Seria melhor considerá-las como acenos do caminho, e eu abono o último.

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KALAHARI LUÍS SERGUILHA WITHOUT BEFORE AND WITHOUT APART In the distance, the contiguous root

Abstract: the text Kalahari offers the reader in the troubled time of the noticeable for-mations that enter the flood, and this closes the book and looks up, sees stars in heaven dazedly, in which the world falls apart in ruins, dust and shrapnel springs of dead lan-guages where the abandonment lives side by side co the establishment of meaning. Keywords: Kalahari. Winged place. Impenetrable adventure.

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