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Novas observaçâes sobre o foco de oncocercose da área do rio Toototobi, Estado do Amazonas, Brasil

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Bol 01 Sanif Panam 64(6), 1978

NOVAS OBSERVA@ES

SOBRE 0 FOCO DE ONCOCERCOSE

DA AREA DO RI0 TOOTOTOBI, ESTADO DO AMAZONAS,

BRASIL

Mário A. P. Moraes,’ Lélio B. Calheiros,2 Marcos A. S. Porto, Raimundo N. A. Neves’ e Anthony J. Shelley3

Após o descobrimento do primeiro foco de oncocercose no ex- tremo norte do Brasil, em 1973, e a confirma@0 do foco um

ano depois, novos estudos realizados na Amazônia brasileira em

1976 vieram modificar impressões anteriores.

Introdugáo

Nódulos oncocercóticos encontrados em missionárias americanas que viviam no ex- tremo norte do Brasil entre índios do grupo Yanomama, levaram à descoberta, em julho de 1973, do primeiro foco de oncocercose do país, em urna área ao longo do rio Tooto- tobi, pequeno afluente do rio Demini (Esta- do do Amazonas), próximo à fronteira com a Venezuela (3). Dentre 94 índios exami- nados, pertenecentes a três aldeias ou malo- cus diferentes, 60 (63,80/0) apresentavam microfilárias de Onchocerca volvuOus nd pele. Os achados não variaram muito de urna aldeia para outra. No total, o índice de infestacão ou microfiladermia foi prati- camente o mesmo para ambos os sexos, um pouco maior no feminino (64,2%) do que no masculino (63,4%) .

Cerca de um ano depois, Rassi et al. (8)) repetindo o inquérito em 61 índios do rio Toototobi, encontraram um índice de 60,6oJo. Houve ligeira predominância nos homens, o

lInstituto Evandro Chagas (FSESP), Caixa Postal 621, 66.000 Belém, Par&, Brasil.

* Ministério da Saúde, SUCAM, Brasília.

a Universidadc de Brasília, Instituto de Ciências Biológi- cm, Brasília.

que não é estatisticamente significante. Na mesma ocasião, o teste de Mazzotti, feito em 57 pessoas, mostrou-se positivo em 43, 0 que dá um índice de 75,4q/o. Acima dos 14 anos, entretanto, a positividade foi de lOO%, em ambos os sexos.

Nesses dois inquéritos para a pesquisa de microfilárias, utilizou-se urna única biópsia, tomada da região escapular de cada indiví- duo testado. Influiu na escolha do local, sem dúvida, o fato de os nódulos oncocercóticos, nos países do continente americano onde a doen& é endêmica, com exce@io da Vene- zuela, serem encontrados mais freqüente- mente no couro cabeludo dos pacientes. E as microfilárias, em conseqüência, são mais abundantes na parte superior do corp- ombros e região interescapular-do que nas nádegas e pernas.

Em marGo de 1976, urna equipe do Mi- nistério da Saúde fez novo estudo entre os indígenas do rio Toototobi, visando não só detectar o máximo possível de casos positivos -para efeito de tratamento-como tam- bém medir a intensidade da infesta@0 c relacionála com a gravidade das lesões cutâ- neas e oculares por-ventura existentes. Dessa investigac surgiram aspectos interessantes, ainda não revelados, os quais até certo ponto

(2)

Moraes .

ONCOCERCOSE

Face de indio Yanomama do rio Toototobi, com o rola de tabaco caracteristico atrás do Iábio inferior.

vieram modificar

impressões anteriores sobre

0 foco.

Material

e mhtodos

Os indígenas do rio Toototobi

pertencem

à subfamília Yanomam,

do grupo ou família

linguística Yanomama.’

A regiáo onde habi-

tam fica a urna altitude máxima de 200 m

acima do nivel do mar e dista de Boa Vista,

capital

do Território

Federal de Roraima,

cerca de 350 km em linha reta. Outras infor-

macões sobre os mesmos podem ser encon-

tradas na literatura

publicada (4, 5).

No presente inquérito foram incluidas no-

vamente as três aldeias situadas em torno

4 Segundo Migliazza (7), esa família compreende quatro línguas: Yanomam, Ninam, Sanuma e Iainoma. A Yano-

mam, a mais importante, divide-se em três o quatro diale- tos e está no centro de toda a famíiia Yanomama. Conta no Brasil com cerca de 2.000 falantes.

511

do posto da Missáo Novas Tribos do Brasil,

existente no local, as quais receberam 0 nome

de seus chefes: Roberto,

Plínio e Fialho.

Cerca de 150 individuos constituem a popu-

lacáo total dessas aldeias, dos quais 83 pu-

deram ser examinados. Também foram exa-

minados 14 indígenas de um pequeno grupo

(cuja chefe se chama Tomé), vinda do alto

Catrimâni,

provavelmente

de urna tribo de

Parahuri, da mesma subfamília

(Yanomam) .

Este grupo estava apenas há algumas sema-

nas no rio Toototobi.

Para atingir os objetivos do inquérito,

o

procedimento

usado consistiu no seguinte :

1) retirada

de duas biópsias de pele, urna

da regiáo escapular direita e outra da nádega

direita;

2)

obten@0 de amostra (10 ml)

de sangue venoso; 3) exame dermatológico

para lesões atribuíveis

a 0. uoZvulus, em

especial pesquisa de nódulos por palpacáo;

e 4) exame oftalmológico.

As biópsias, praticadas

com lâmina

de

barbear, ficavam

durante

30 minutos

em

urna gota de água destilada, antes do exame

direto para a pesquisa de microfilárias.

Urna

vez feito esse exame, retirava-se cuidadosa-

mente o fragmento de pele, e as prepara$Ses

assim obtidas eram deixadas secar ao ar.

Após fixacáo e colora+0

pelo hemalume de

Mayer, procedia-se a novo exame, para re-

contagem

e principalmente

identifica60

correta das microfilárias

nas laminas.

Os

retalhos de pele, por sua vez, foram preser-

vados e, mais tarde, no laboratório,

pesados

em balanca analítica

(o peso das biópsias

variou de 3 a 5 mg), o que permitiu

cal-

cular-se o número de microfilárias

por mili-

grama de pele.

Do sangue venoso, urna gota espessa em

lâmina, corada pelo Giemsa, serviu para a

pesquisa de microfilárias,

e o restante da

amostra para obten+0

de soro destinado a

várias reacões sorológicas.

0 estudo oftalmológico

compreendeu

a

determina@0

da acuidade visual, por meio

(3)

512 BOLETIN DE LA OFICINA SANITARIA PANAMERICANA -

lunio 1978

da córnea e câmara anterior do olho, com urna lâmpada de fenda. Sempre que possí- vel, procedia-se também ao exame oftalmos- tópico, evitando-se, porém, o emprego de midriáticos, por não se saber como os indí- genas reagiriam à dilatacão da pupila.

Resultados

Dos 94 indivíduos examinados no primeiro inquérito, 70 residiam ainda nas aldeias e puderam ser reexaminados. Dentre eles, 44 (62,80/0) haviam sido positivos para 0. vol- vulus na única biópsia então realizada. Na segunda investiga$ío, o número de positivos ao exame direto, com duas biópsias, subir para 58 (82,8%). Assinale-se que quatro índios, positivos em 1973, mostraram-se ago- ra negativos. Dois deles haviam sido sub- metidos a tratamento pela Suramina (Mo- ranyl) em Manaus, cerca de um ano e meio antes, outro sofrera nodulectomia em 1973, e o último, que devia ter urna densidade muito baixa, veio a se mostrar positivo em urna biópsia posterior. Um novo exame das Eminas, depois de coradas pelo hemalume, fez o total de positivos crescer para 63, desse modo elevando o índice de infesta@0 para 90%.

Além dos 70 índios reexaminados, outros 27 foram vistos pela primeira vez em 1976. Do total, compreendendo 52 homens e 45

mulheres, 39 (21 homens e 18 mulheres) pertenciam à aldeia do chefe Roberto, 33

(19 homens e 14 mulheres) à do chefe Plínio, ll (4 homens e 7 mulheres) à do chele Fialho e 14 (8 homens e 6 mulheres) ao gru- po liderado por Tomé.

0 exame direto das biópsias mostrou que 84 índios (42 homens e 42 mulheres) ou seja, 86% dos 97 testados, apresentavam mi- crofilárias de 0. volvulus na pele. Conside- rando-se as aldeias em separado, o índice de infesta60 foi de 89% na do chefe Ro- berto, 97% na do chefe Plínio e 100% nas dos chefes Fialho e Tomé.

Após o exame das Eminas coradas, o nú- mero de indivíduos positivos passou para 89 (45 homens e 44 mulheres) . 0 índice de microfiladermia foi, assim, de 91,7%, um pouco maior no sexo feminino (97,7%) do que no masculino (86,5%) .

A idade entre os positivos variou de 15 a 62 anos; deliberadamente, não foram incluí- dos no inquérito os menores de 15 anos, por motivos apantados em trabalho anterior (3). A distribui@io por grupo etário e sexo é mos- trada no Quadro 1.

Mais de 95% dos individuos já estão infes- tados antes dos 20 anos. 0 decréscimo veri- ficado nas faixas seguintes deveu-se, certa- mente, à presenta dos ãois índios que haviam sido tratados pela Suramina e do outro que sofrera desnodulizacão. Houve também o índio, na faixa de 20-29 anos, em quem a

PUADRO l-Pesquisa de microfildrias de Onchocerca VOIVLJIUS em indios do rio Toototobi, Brasil, por grupo etário e sexo (1976).

Homens Mulheres Total

Idade Exam. Posit. % Exam. Posit. % Exam. Posit. %

15-19 11 10 90,9 ll 11 100,o 22 21 95,4

20-29 17 14 82,3 17 16 94,l 34 30 88,2

30-39 10 8 80,O 9 9 100,o 19 17 89,4

40-49 9 8 88,8 5 5 100,o 14 13 92,8

50 e + 5 5 100,o 3 3 100,o 8 8 100,o

(4)

Morues .

ONCOCERCOSE

513

QUADRO 2-Distribui$o das microfilárias de Onchocerca volvulus na pele dos hdios do rio foototobi,

Brasil, por sexo (1976).

Predominancia

Sexo

Ombro

Nádega

No. igual

Negativos

-

Exam.

No.

%

No.

%

No.

%

No.

%

Masculino

52

17

32,6

28

53,8

0

Feminino

45

0,O

7

12

26,6

13,4

30

66,6

2

4,4

1

22

29

29,8

58

59,7

2

2,0

8

repeticáo da biópsia revelou as microfilarias.

Levando-se

em conta esses quatro casos, o

índice de infesta@0 entre os homens seria de

94,2%, e no total, de 95,8%.

Houve nítida predominância

das microfi-

lárias na parte inferior

do carpo. Em 58

casos (28 homens e 30 mulheres)

em que as

microfilárias

foram mais numerosas na bióp-

sia das nédegas, apenas 29 ( 17 homens e

12 mulheres)

mostraram

o contrário

(Qua-

dro 2). Se apenas urna biópsia-da

regiáo

escapular-tivesse

sido feita, como no pri-

meiro inquérito,

nada menos de 20 casos

teriam passado despercebidos. Isso reduziria

o número de positivos para 69 e a taxa de

infesta@0 para 71,1% bastante próximo do

-

percentual

obtido em 1973.

Por outro lado, a diferenca no tamanho

dos fragmentos

de pele náo parece ter in-

fluenciado

de modo significativo

os valores

achados. Após a determina@0

do número de

microfilárias

por miligrama

de pele, as pro-

por@es do Quadro 2 náo se modificaram.

0

número médio de microfilárias

por miligra-

(5)

514

BOLETIN DE LA OFICINA SANITARIA PANAMERICANA

- Junio 1978

Pele espessa e enrugada nas n6degas. Esta lesão, muito pruriginosa, Q freqüente nos indígenas do rio Toototobi.

ma de pele, nos positivos, foi de 5,8 nas

biópsias do ombro e 14,2 nas biópsias da

nádega.

Náo se encontraram

microfilárias

de Man-

sonda ozzardi nas preparac&

de sang-ue.

Em 33 (37%) d os indígenas positivos pa-

ra microfilárias

e em 4 dos 8 negativos, foi

encontrado um total de 59 nódulos subcutâ-

neos (32 na cabeca, 3 no dorso, 21 na regiáo

sacrococcigeana,

1 sobre a crista ilíaca, 1 no

punho e 1 no pé) . Náo houve relago entre

a presenta desses nódulos e a distribuisáo

e

quantidade

de microfilárias

na pele: índios

com grande número

de microfilárias

náo

apresentavam nódulos; outros, exibindo essas

les%, tinham urna densidade relativamente

baixa de microfilárias.

A maioria dos indi-

viduos com nódulos (60%) estava nas faixas

etárias acima de 30 anos.

Entre as manifesta@es cutâneas atribuíveis

às microfilárias

de 0, voZvulus, as mais fre-

qüentes compreendiam

perda da elasticidade

e enrugamento

da pele-a

qual se mostra

como que envelhecida-no

dorso, nádegas

e coxas. Em casos extremos, o local adquire

um aspecto de “pele de sáurio”. Essas lesões,

sempre muito pruriginosas,

eram bem evi-

dentes em 38 (39,1%)

dos 97 indígenas exa-

minados. Ao contrário dos nódulos, guardam

elas relago

com a distribuicáo

das microfi-

lárias no tegumento:

em 32 dos 38 indios,

localizavam-se nas nádegas e coxas. Há tam-

bém urna relacão com a idade e a car,ga

de microfilárias : aparecem em geral nos in-

divíduos de mais de 30 anos e com um núme-

ro relativamente

grande de microfilárias

por

miligrama

de pele. Foi menos freqüente

a

observa60

de outras lesões, como espessa-

mento cutâneo--acompanhado

de urna tona-

lidade

superficial

vermelha

e luzidia

( 13

casos) -e discromias (em 4 indios) . Em três

casos foram observadas pequenas saliências,

como papilomas,

nas nádegas, sobre pele

enrugada.

0 exame oftalmológico

de 92 índios (86

positivos e 6 negativos) mostrou que 58 den-

tre os positivos e 4 dentre os negativos náo

apresentaram

lesão alguna. Foi encontrada

(6)

Momes -

ONCOCERCOSE 515

lino e um do feminino. Neste último, entre- tanto, a oncocercose pôde ser excluída como causa, pois, além de não ser a lesão (atrofia do olho direito) de tipo oncocercótico, o número de microfilárias na derme, inferior a urna por mg de pele, era muito baixo. Nos demais, as lesões poderiam ser atribuídas a 0. VOZVUZUS. Um deles, bastante idoso (cerca de 60 anos), com ceratite esclerosante no olho direito e uveíte anterior, além de cata- rata senil no olho esquerdo, tinha urna den- sidade apenas um pouco acima da média (6 e 21 microfilárias por mg de pele nas biópsias, respectivamente, do ombro e da nádega). 0 outro, cego dos dois olhos, ape- sar de jovem (33 anos) estava intensamente infestado, tendo sido encontradas 40 e 100 microfilárias por mg de pele, respectivamen- te, nas duas biópsias. Este caso apresentava ceratite esclerosante e sinéquias posteriores em ambos os olhos.

Com acentuada diminuic;ão da acuidade visual havia ainda urna índia, de 52 anos de idade, portadora de três nódulos na cabeca e numerosas opacidades em ambas as cór- neas. Apesar da lacalizacáo dos nódulos, o número de microfilárias era maior na parte inferior ( 18 mf/mg) do que na parte supe- rior do carpo (9 mf/mg) .

Em 26 indígenas, dos quais dois negativos para microfilárias; existiam opacidades na córnea, com aproximadamente 1 mm de diâ- metro, sem reducáo da acuidade visual. As nubéculas de um dos negativos poderiam ser atribuídas a traumatismos; no outro, entre- tanto, urna índia de 22 anos, eram elas se- melhantes às observadas nos casos positivos. Assinale-se que essa índia, com doi nódulos na cabeSa, fora também negativa em 1973. Náo houve relac$o entre a presenta de opa- cidades corneanas e nódulos do couro cabe- ludo nos casos positivos. A associacáo foi observada em 10 casos e em 14 não se mani- festou. Por outro lado, 10 índios com nódu- los na cabeca náo apresentavam lesáo da córnea. Também náo se verificou rela@o

entre ceratite e predominância de microfi- Iárias na parte superior do carpo. Ao con- trário, predominavam elas na parte inferior, em quase todos os casos com lesões oculares.

Comentários

A diferenca, bastante expresiva, entre os resultados da primeira e desta segunda in- vestigacáo no rio Toototobi teve por base principalmente o uso, em 1976, de duas biópsias-urna do ombro e outra da nádega -para cada pessoa testada. Ficou evidente que, na orfcocercose do grupo Yanomama, ao contrário do que se pensava, as micro- filárias predominarn na parte inferior do carpo, o que mfluiu ncs resultados. Essa característica, aliás, ao lado de outras, como a freqiiência relativamente baixa de nódulos e a fraca densidade de infesta@0 (em 27% dos 89 positivos o número de microfilárias era de um ou menos por miligrama de pele), torna a forma Yanomama bem mais pró- xima da forma venezuelana da doenca do que da encontrada no México e na Guatemala.

(7)

516 BOLETIN DE LA OFICINA SANITARIA PANAMERICANA

- Junio 1978

cecáo de um positivo com três microfilárias por miligrama de pele, todos os demais tin- ham menos de urna por miligrama.

A baixa prevalência nos Maquiritares do Brasii, se náo favorece a hipótese, também náo a invalida. A maior parte do grupo, cuja populacáo é avaliada em 2.000 indiví- duos, tem suas aldeias na Venezuela. Urna pesquisa mais extensa entre eles ajudaria bas- tante a esclarecer a questão, dada a conheci- da mobilidade dos Yanomarnas, que os leva a atravessar constantemente a fronteira entre os dois países. 0 relato que se segue demons- tra como a oncocercose pode ter alcancado o Brasil:

Em outubro de 1976, chegou à missão do rio Toototobi um grupo de 32 indígenas Yanomamas -19 adultos e 13 criancas- de mudanca para o alto rio Demini e provenientes do su1 da Vene- zuela, onde viviam perto da aldeia Yajiobateri. A oncocercose neles era muito semalhante à do Toototobi: o índice de infesta$o foi de 85% em 20 pessoas testadas, e as microfilárias predo- minavam na parte inferior do carpo em 60% dos positivos. 0 mais velho do grupo, com 60 anos e 75 mf/mg de pele na biópsia do ombro, estava cego de ambos os olhos. Apenas 35% dos positivos apresentavam nódulos, e o número mé- dio de microfilárias por mg de pele foi de 9,5 nas biópsias do ombro e 12 nas biópsias da ná- dega. Antes de proseguir viagem, o grupo per- maneceu nas aldeias por algumas semanas. As- sim, é bastante possível que no passado, tenham trazido a oncocercose para o rio Toototobi,

Urna outra hipótese. segundo a qual a oncocercose teria sido transmitida aos Yano- mamas por missionários estrangeiros, náo é aceit&vel, dado o curto espaGo de tempo de- corrido entre a instala@0 das primeiras missões no Brasil (em meados da década de 50) e a época em que 0 primeiro caso autóc- tone descoberto na regiáo provavelmente adquiriu a doenca. Esse caso, referido por Bearzoti et al. (2), em 1967, foi por nós visto recentemente, na cidade de Boa Vista, Território de Roraima. A paciente, hoje com

cano, que nos informou ter ela nascido. em Georgetown (República da Guiana) , em se- tembro de 1961, e levada, com apenas alguns meses, para a missão Parima, na serra do mesmo nome, onde permaneceu com o resto da família por quase um ano. Cerca de três anos depois, em Campinas, Sáo Paulo, foram dela retirados dois nódulos oncocercóticos que nesse ínterium lhe haviam aparecido no couro cabeludo. Como a única outra missáo em que estivera, antes disso, fora a do rio Mucajaí, na qual até hoje é desconecida a oncocercose entre os nativos (do subgrupo Ninam) , podemos afirmar que sua infesta+0 ocorreu seguramente em 1962. É difícil acre- ditar em urna dissemina@o táo larga da oncocercose-por toda a regiáo do Parima--

no curto período de seis anos, tempo que vai desde a chegada dos missionários ao pri- meiro posto, no norte do Amazonas, até a ,

epoca em que a pacrente se infestou. Da Eamília, foi ela a única a adquirir a doenca. Por outro lado, a existência de 0. volvulus em torno da missáo Parima teve comprova- cã;o em 1975, quando Rassi et al. (9)) exa- minando 104 indígenas Yanomamas do local, encontraram microfilárias na pele de quase 30% deles. É provável que esse percentual seja bem mais elevado, pois no inquérito foi utilizada somente a biópsia do ombro.

(8)

Moraes -

ONCOCERCOSE 517

A baixa densidade de microfilárias igual- mente explica a relativa ausência de sinto- mas graves, quer cutâneos quer oculares, nos indígenas infestados. Náo foi possível visua- lizar, com a lâmpada de fenda, cualqucr microfilária na córnea ou na câmara ante- rior de seus olhos. Embora tal fato possa ser atribuído à pouca experiência dos autores, é bem provável que a conserva@o este- ja correta, pois dados da Anderson e Fuglsang (1) , obtidos na República dos Ca- marões, mostraram que só eram encontradas microfilárias na córnea quando seu número atingia em média a 25 e 71 por miligrama, respectivamente, da pele do ombro e da nádega; e na Cámara anterior quando sua concentra& era de 28 e 100, respectiva- mente. Poucas vezes foram esses valores atin- g%dos no rio Toototobi.

Resumo

Após quase três anos, um novo inquérito para oncocercose foi levado a cabo nas al- deias Yanomama da área do rio Toototobi, Estado do Amazonas. No primeiro, feito em julho de 1973, os autores, utilizando urna única biópsia de pele para cada indivíduo- d a parte superior do carpo-haviam en- contrado urna prevalência de 63,870. Nesta segunda investigacão, o índice aumentou pa- ra 91,7%, apesar de Q numero de indígenas examinados ter sido apenas ligeiramente maior do que na anterior. Mais de dois

tercos dos examinados, aliás, haviam tam- bém participado da primeira investiga@o.

Atribuiu-se a expressiva diferenca entre os resultados ao uso no segundo inquérito de duas biópsias para cada indivíduo-urna do ombro e outra da nádega. Como as mi- crofilárias, na oncocercose do grupo Yano- mama, predominarn na parte inferior do carpo, fato até entáo desconhecido, muitos casos só puderam ser revelados pela biópsia da nádega.

Várias características do foco, agora per- feitamente estabelecidas, como a fraca inten- sidade de infesta+o, número) relativamente baixo de pessoas com nódulos e ausência de sintomas graves-quer cutâneos quer ocula- res-parecem demonstrar que a doenca foi introduzida entre os indígenas do Toototobi náo há muito tempo. Além disso, sua grande semelhanca com a forma de oncocercose en- contrada na Venezuela- reforGa a hipótese de ter ela vindo dos focos já conhecidos naquele país, por intermédio talvez dos Maquiritares, um grupo indígena com o qual os Yanoma- mas têm bastante contacto, principalmente em território venezuelano. 0

Agradecimentos

Nossos agradecimentos aos missionários Bruce e Dorothy Hartman, da missáo Novas Tribos do Brasil no rio Toototobi, pela colaboracáo pres- tada junto aos índios, e à Dra. Margarida M. R. Almeida, do Instituto Evandro Chagas, pelo exa- me das lâminas coradas.

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Nuevas observaciones sobre el foco de oncocercosis en ta zona del río Toototobi, Estado de Amazonas, Brasil (Resumen)

Después de casi tres años se llevó a cabo un nuevo estudio sobre la prevalencia de la oncocer- cosis en las aldeas Yanomama, en la zona del río Toototobi, Estado de Amazonas. En la primera investigación, realizada en julio de 1973, los au- tores utilizaron una sola biopsia de piel por persona-de la parte superior del cuerpo-y encontraron un predominio de 63.8%. En este segundo estudio el índice aumentó a 91.7%, a pesar de que el número de indígenas examinados fue escasamente superior al de la primera vez y más de dos tercios de los mismos habían partici- pado también en el primer estudio.

La sorprendente diferencia entre ambos resul- tados se atribuye a que en la segunda investiga- ción se tomaron dos biopsias por cada individuo, una del hombro y otra de la nalga. Dado que en la oncocercosis del grupo Yanomama las mi-

crofiliarias predominan en la parte inferior del cuerpo-hecho hasta entonces desconocido-mu- chos casos pudieron ser descubiertos solo por la biopsia de la nalga.

Varias características del foco, ahora bien es- tablecidas, como la débil intensidad de infesta- ción y el número relativamente bajo de personas con nódulos y ausencia de síntomas graves-tan- to cutáneos como oculares-parecen demostrar que la enfermedad se introdujo no hace mucho tiempo entre los indios de Toototobi. Además, su gran semejanza con la forma de oncocercosis des- cubierta en Venezuela refuerza la hipótesis de que proviene de focos ya identificados en ese país, quizá por intermedio de los Maquiritares, una tribu indígena con la cual los Yanomamas tienen bastante contacto, principalmente en terri- torio venezolano.

Recent observations on the onchocerciasis focus in the Toototobi River area, Amazonas State, Brazil (Summar/)

(10)

Moraes -

ONCOCERCOSE 519

cent, even though the number of Indians exa- mined was only slightly higher than in the pre- vious sulvey. Moreover, more than two thirds of the persons examined had also taken part in the first survey.

The striking difference between the two results was attributed to the use in the second survey of two biopsies per individual subject-one from the shoulder and the other from the buttock. Since in the onchocerciasis of the Yanomama group the microfilariae are found predominantly in the lower part of the body-a fact unknown until this study-many cases were detected only as a result of the buttock biopsy.

Severa1 characteristics of the focus that have now been well established, such as the low in- tensity of infestation, the relatively low number of persons with nodules, and the lack of serious symptoms-whether cutaneous or ocular-sug- gest that it has not been a long time since the disease was first introduced among the Indians of the Toototobi. Moreover, its great similarity to the form of onchocerciasis found in Venezuela reinforces the assumption that it stems from foci already identified in that country, perhaps through Makiritare, an Indian tribe with which the Ya- nomama have considerable contact, for the most part on Venezuelan territory.

Nouvelles observations sur le foyer d’onchocercose de la région du fleuve Toototobi, dans I’Lat de I’Amazone, au Brésil (Résumé)

Après prés de trois ans, il a été procédé à une nouvelle enqu&te sur la prévalence de l’onchocer- cose dans les villages Yanomama de la région du fleuve Toototobi, dans I’Etat des Amazones. Lors de la première enquête, effectuée en juillet 1973, les auteurs avaient trouvé, en utilisant une seule biopsie de la peau pour chaque individu-pré- levée sur la partie supérieure de leur corps-une prévalence de 63,8% de la maladie. Lors de cette nouvelle enquête, ce taux est passé à 91,770 pour un nombre d’Indiens examinés à peine supérieur à celui de l’enquête précédente. En outre, plus des deux tiers des personnes examinées lors de cette nouvelle enquête l’avaient déjà été lors de la première.

La grande différence entre les résultats de ces deux enquêtes est imputable à I’emploi, cette fois-ci, de deux biopsies par individu-la pre- mière prélevée sur l’épaule et l’autre sur la fesse. Etant donné que I’onchocercose des populations

Yanomama se caractérise par le fait que les mi- crofilaires prédominent dans la partie inférieu- re de l’organisme-fait inconnu auparavant-de nombreux cas n’ont pu être décelés que par la biopsie de la fesse.

Referências

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