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Relatório estágio profissional

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Academic year: 2021

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UNIVERSIDADE NOVA DE LISBOA

NOVA MEDICAL SCHOOL | FACULDADE DE CIÊNCIAS MÉDICAS

RELATÓRIO FINAL DE ESTÁGIO

E apontamentos de um final feliz

6º Ano | Estágio Profissionalizante | Ano letivo 2018-2019

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1. INTRODUÇÃO E OBJETIVOS……….………..………... 1

2. DESCRIÇÃO DAS ATIVIDADES DESENVOLVIDAS - ESTÁGIOS PARCELARES 2.1. Medicina Interna……….………... 2

2.2. Cirurgia Geral……….……... 2

2.3. Pediatria……….……….………..… 3

2.4. Ginecologia e Obstetrícia ……….……….………..….………….. 3

2.5. Saúde Mental ……….………..……….….…. 4

2.6. Medicina Geral e Familiar………5

3. ELEMENTOS VALORATIVOS………..5

4. REFLEXÃO CRÍTICA……….……….6

5. ANEXOS………..8

Abreviaturas

CEMEF – Curto Estágio Médico em Férias CHLC – Centro Hospitalar Lisboa Central

CPCJ – Comissão de Proteção de Crianças e Jovens DM2 – Diabetes Mellitus tipo 2

DRC – Doença Renal Crónica

ECD’s – Exames Complementares de Diagnóstico HTA – Hipertensão Arterial

IC – Insuficiência Cardíaca

IFE – Interno de Formação Específica IFG – Interno de Formação Geral ITU – Infeção do Trato Urinário USF – Unidade de Saúde Familiar

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1. INTRODUÇÃO E OBJETIVOS

Durante os primeiros cinco anos deste percurso académico do Mestrado Integrado em Medicina, foram-nos oferecidos os alicerces, ensinados os mecanismos fisiopatológicos das doenças, a representação clínica dessas entidades, as condutas mais indicadas para as diagnosticar e, por fim, tratar. Frequentamos os serviços clínicos da maioria das especialidades, salvo raras exceções. Assim, munidos de um conhecimento primário em todas as áreas, ingressamos no 6º ano – onde tais competências são, por um lado, postas em prática e, por outro, fortalecidas, nos pilares estruturais da Medicina: a Medicina Interna, a Cirurgia Geral, a Pediatria, Ginecologia e Obstetrícia, Saúde Mental e Medicina Geral e Familiar.

De facto, em janeiro do próximo ano, teremos doentes ao nosso cargo nas enfermarias; frequentaremos regularmente os serviços de urgência – seremos responsáveis pelo estado de saúde das pessoas que havemos de tratar. Sugere-se, portanto, que voemos um pouco mais do que o fizemos em anos anteriores. Nesse sentido, auxilio-me no Core Graduates Learning Outcomes Project para responder aos objetivos propostos para este período letivo. Pretende-se que, por um lado, conheçamos as patologias mais comuns de cada um dos pilares da Medicina que acima numerei, hierarquizando as situações clínicas urgentes e reconhecendo critérios de gravidade; que tenhamos um ou dois doentes atribuídos nos serviços hospitalares, aos quais colhamos anamnese, realizemos exame objetivo e discutamos os achados com quem nos orienta, podendo sugerir a requisição de ECD’s ou implementação/alteração de terapêutica; que pratiquemos, em contexto hospitalar, ou ambulatório, procedimentos basilares no exercício médico. Tão ou mais importante que isso, que aperfeiçoemos a relação médico-doente (ou, neste caso, estudante de medicina-doente), para que, no futuro, perante casos mais complexos, tenhamos a agilidade de os destrinçar e apaziguar.

Descrevo, nas próximas páginas, as atividades que desenvolvi em cada um dos estágios parcelares por que passei; acrescento projetos nos quais me envolvi, não necessariamente associados ao contexto académico, terminando com uma opinião sincera e refletida sobre este percurso de seis anos.

Para os que terminam esta jornada em julho, chegámos ao limite da falésia. Permito-me repescar a metáfora que usei acima e parafraseio com Frida Kahlo:

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2. DESCRIÇÃO DAS ATIVIDADES DESENVOLVIDAS

2.1. Medicina Interna (10/09/2018 a 02/11/2018)

Mais do que somatório das valências da Cardiologia, da Nefrologia, da Neurologia, da Endocrinologia e de outras especialidades médicas, o internista é o médico do doente: compreende todos esses problemas e sua interdependência e define prioridades na gestão dos mesmos, de forma a proporcionar os melhores e mais eficientes cuidados de saúde para cada indivíduo. Assim, pretende-se, no final desta atividade, que estejamos preparados para responder às necessidades dos doentes com que a especialidade contacta, sendo capazes de diagnosticar e tratar as patologias típicas, com ponderação prognóstica, no que diz respeito não só à doença crónica, mas também em contexto agudo e emergente. O estágio decorreu no Hospital de Santo António dos Capuchos, pertencente ao CHLC, num período de 8 semanas, sob tutoria do Dr. Augusto Ribeirinho e regência do Prof. Doutor Fernando Nolasco. Em termos de atividade clínica na Enfermaria, acompanhei a evolução em internamento de 14 doentes (média de idade: 79 anos) e os diagnósticos mais frequentes enquadraram-se no foro infecioso (nomeadamente pneumonia e ITU), em doentes com patologia crónica de base (como IC, DRC, HTA, DM2). Observei diariamente os doentes a mim atribuídos, interpretei e solicitei ECD’s, bem como alterações a nível terapêutico, discutindo com a equipa médica acerca dos contextos clínicos que me suscitavam mais incertezas. Semanalmente, apresentei em visita médica, a situação clínica dos doentes a meu cargo. Frequentei, também, o serviço de urgência, tendo observado 20 doentes, motivos mais frequentes de dor pré-cordial, dispneia, vómitos e náuseas. Assisti, todas as semanas, às sessões clínicas efetuadas por IFGs e IFEs, tendo elaborado um trabalho subordinado ao tema ‘Pneumonias’, que apresentei aos docentes do serviço e aos colegas que comigo frequentaram o estágio.

2.2. Cirurgia Geral (12/11/2018 a 10/01/2019)

A Cirurgia Geral reveste-se de especial importância no 6º ano curricular por permitir aperfeiçoar competências clínicas, nomeadamente no que concerne ao conhecimento das principais síndromas cirúrgicas, à destrinça entre patologias que requeiram intervenção urgente e aquelas que possam ser abordadas eletivamente, à metodologia do exame objetivo e dos ECD’s e à comunicação com os doentes, que neste contexto, se encontram particularmente debilitados e vulneráveis. O estágio decorreu no Hospital das Forças Armadas sob tutoria da Dra. Catarina Pinho e regência do Prof. Doutor Rui Maio. Dedica-se uma semana a aulas teórico-práticas; e as restantes sete semanas ao estágio prático no âmbito da especialidade. Integrando a equipa da Dra. Catarina Pinho, pude, no Bloco Operatório, assistir a 21 cirurgias, tendo participado no ato cirúrgico como 3ª ajudante em duas cirurgias – lobectomia esquerda da tiróide e hernioplastia incisional – cortando os fios de sutura ou usando o aspirador. Observei 18 doentes no Serviço de Internamento - realizei diários clínicos, notas de entrada e de alta. Em âmbito de Consulta Externa, assisti

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3 a 16 consultas sob supervisão dos docentes, maioritariamente primeiras consultas, de seguimento, de pré- e pós-operatório – que incluía, em grande parte das vezes, em avaliação e seguimento das feridas operatórias, com renovação de pensos, remoção de pontos/fios de sutura ou agrafos. Na vertente da Cirurgia de Ambulatório, pude participar, por duas vezes, como segundo cirurgião, na excisão de lipomas dorsais e abdominais. Participei no curso TEAM, no 10º curso de antibioterapia, promovido pelo Hospital da Luz e no XVII encontro da saúde militar (vide Anexos). No Mini-Congresso de Cirurgia do Hospital Beatriz Ângelo apresentei um trabalho que incidiu sobre fístulas perianais.

2.3. Pediatria (21/01/2019 a 15/02/2019)

A Pediatria é uma especialidade médica singular e humana, particularmente pelo facto de a população-alvo englobar as crianças e os adolescentes, uma faixa etária com características peculiares. Daí que se sugira que, por um lado, conheçamos as principais patologias que afetam esta população, reconhecendo critérios de gravidade que permitam bifurcar o tipo de tratamento, em ambulatório ou em contexto de internamento; e, por outro, que adquiramos capacidades comunicacionais para esclarecimento dos quadros clínicos, não só com os doentes, mas também com a família. O estágio decorreu no Hospital Dona Estefânia, pertencente ao CHLC, sob tutoria da Dr.ª Paula Kjölleström e regência do Prof. Doutor Luís Varandas. Considerando o facto de a Dra. Paula Kjölleström ser Hematologista Pediátrica, a população com que tive mais contacto foram os doentes hematológicos. No Internamento, colhi dados anamnésticos, realizei exame físico aos doentes atribuídos, redigi diários clínicos e realizei uma nota de entrada e uma de alta. Elaborei, ainda, uma história clínica formal de um adolescente com Diabetes Mellitus tipo I. Durante este período de tempo, acompanhei a evolução em internamento de 9 doentes (média de idade: 9 anos) cujos principais motivos englobaram episódios agudos de crises vaso-oclusivas ou pneumonias em contexto de drepanocitose. No Serviço de Urgência, observei 35 doentes com motivos mais frequentes de ida ao SU de tosse, febre, vómitos/diarreia e dor abdominal. Em contexto de Consulta Externa assisti a consultas de Hematologia Geral, Hemoglobinopatias e Imunoalergologia. Apresentei um trabalho sobre “Asplenia e hiposplenia: prevenção e tratamento de infeções” no último dia de estágio.

2.4. Ginecologia e Obstetrícia (18/02/2019 a 15/03/2019)

Considerando as especificidades inerentes à prática profissional nesta área tão sensível e delicada da Medicina, somos encaminhados a desenvolver habilidades no diagnóstico de tratamento dos problemas de saúde mais comuns da mulher não-grávida, da grávida e da puérpera, pesando na nossa abordagem a individualidade de cada mulher. O estágio decorreu no Hospital Beatriz Ângelo, sob tutoria da Dra. Rita Lermann, com regência da Prof. Doutora Teresinha Simões. No que concerne à Ginecologia, assisti, em

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4 contexto de Consulta Externa, consultas de Ginecologia Geral, de Senologia e Pavimento Pélvico, tendo observado, no seu conjunto, 27 doentes. Assisti, também, a procedimentos diagnósticos e terapêuticos como colposcopia, histeroscopia e ecografia endovaginal. No que diz respeito à Obstetrícia, observei, em Consulta Externa, 24 doentes, cujos motivos versaram essencialmente sobre gravidezes bi-ou trigemelares e obesidade – colaborei na medição da pressão arterial, peso e altura uterina e monitorização do batimento cardíaco fetal. Assisti, paralelamente, neste âmbito, à realização de ecografias obstétricas do segundo e terceiro trimestres. No serviço de internamento, observei unicamente patologia obstétrica, sendo a mais frequente a presença de colo curto. No Serviço de Urgência, observei 51 doentes, cujos motivos principais de vinda ao serviço foram algias pélvicas, ardor vaginal e diminuição dos movimentos fetais. Assisti também a 5 partos. No Bloco Operatório, pude presenciar vários procedimentos cirúrgicos, incidindo sobretudo na tumorectomia e pesquisa de gânglio sentinela de carcinomas da mama. No último dia de estágio apresentei um trabalho intitulado ‘Vaginal hysterectomy with or wihtout bilateral salpingo-oophorectomy may be na alternative treatment for endometrial cancer patients with medical co-morbidities precluding standard surgical procedures: a systematic review’.

2.5. Saúde Mental (18/03/2019 a 11/04/2019)

A entrevista clínica e a colheita anamnésica são uma ferramenta essencial na prática médica, afigurando-se transversais a todas as especialidades. No entanto, na Psiquiatria, assumem um papel imprescindível – pela escassez e impraticabilidade de ECD’s. Somos, por isso, imbuídos a internalizar conceitos relativos à relação interpessoal com os doentes, à esfera biopsicossocial dos mesmos, considerando além das perturbações psiquiátricas, os aspetos psicológicos das doenças somáticas. Foi com este prelúdio que iniciei o estágio no Serviço de Internamento de Psiquiatria e Saúde Mental de Adultos do Hospital Prof. Doutor Fernando Fonseca, sob a tutoria do Dr. Bruno Trancas e da Dra. Patrícia Gonçalves e regência do Prof. Doutor Miguel Talina. As atividades realizadas no serviço de internamento constituíram a quase totalidade da vertente prática deste estágio parcelar. Acompanhei os tutores e restante equipa médica nas atividades assistenciais da Unidade de Internamento. Tive a oportunidade, neste contexto, de entrevistar, em conjunto com o meu colega de estágio, 3 doentes. Uma destas entrevistas resultou na elaboração de uma história clínica formal, que recaiu sobre esquizofrenia. A psicopatologia observada mais frequente foram as perturbações do humor e a esquizofrenia. No serviço de urgência, presenciei entrevistas clínicas e anamnese de quadros psicopatológicos bastante frequentes como intoxicação medicamentosa voluntária e comportamentos auto-lesivos. Por último, assisti a 5 sessões de eletroconvulsivoterapia, onde os doentes apresentavam, na sua maioria, perturbação bipolar.

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2.6. Medicina Geral e Familiar (22/04/2019 a 17/05/2019)

A Medicina centrada na pessoa é a pedra basilar da prática da Medicina Geral e Familiar – por versar sobre os indivíduos nas suas famílias, nas suas culturas. Para além do cuidado diagnóstico e terapêutico, acresce-lhe o enquadramento destes elementos na atmosfera pessoal de cada doente. Promove-se, por isso, neste período, que adotemos uma abordagem centrada no doente, reconhecendo, no entanto, os problemas de saúde mais frequentes na comunidade, tratando-os ou articulando-os com outros profissionais. Estagiei na USF São João Evangelista dos Lóios (Marvila) sob orientação da Dr.ª Ana Maria Cavaleiro. Assisti a consultas no campo da ação da saúde de adultos, diabetes, saúde infanto-juvenil, saúde materna, planeamento familiar e, também, consultas abertas, tendo conduzido algumas delas, ainda que com apoio da equipa médica – na colheita anamnéstica, realização do exame objetivo, suspeição diagnóstica e sugestão terapêutica. Treinei, por contacto múltiplo (“água mole em pedra dura…”) o raciocínio clínico, a agilidade médica e a comunicação com os doentes, especialmente nos casos mais intrincados. Apresentei em contexto de Journal Club, o trabalho intitulado “Abordagem terapêutica da lombalgia nos cuidados de saúde primários”. Elaborei um documento intitulado Diário de Exercício Orientado, destinado a avaliação final.

3. ELEMENTOS VALORATIVOS

Integrar projetos como aqueles que descrevo de seguida surgiu da necessidade de desenvolver, em tais contextos, componentes emocionais e intelectuais que reconhecia como ainda inexploradas. Nos primeiros dois anos de curso, participei no Grupo de Teatro Miguel Torga, da faculdade. Vivendo a cerca de 300 km de distância da minha cidade-natal, num ambiente tão diferente, criar alicerces sociais próximos – com quem mais facilmente me identificava, por ter feito durante 7 anos teatro escolar – ajudou-me no processo de adaptação à nova realidade, Lisboa. Neste jogo de imitação, onde as emoções são colocadas em cima do palco, sem vergonhas, atores, como nós, têm oportunidade de as explorar e reconhecer. Para estudantes de medicina, esta crescente consciencialização permite-nos, não só estabelecer os nossos próprios limites, mas também identificar as emoções dos outros, dos doentes, que comummente se encontram camufladas verbalmente por discursos despreocupados. Aquando do ingresso do 3º ano e, portanto, da rotina hospitalar, o aumento de responsabilidades e a ainda gestão imatura de tempo obrigaram-me a prescindir desta atividade. O estudo da medicina pode, no entanto, tornar-se muito facilmente absorvente, deixando-nos pouca abertura para refletir, para questionar. Uma vez mais, pela necessidade de o fazer, decidi integrar, neste último ano, a comissão organizadora do TEDx Lisboa. Realizamos, a par da preparação do evento principal, várias tertúlias, a última das quais intitulada de ‘Somos livres?’, onde debatemos a falácia da liberdade de expressão nas sociedades atuais, o lugar do humor neste novo panorama ideológico, entre outras questões. Concluímos que não há respostas certas ou erradas, e que a dúvida é muito mais

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6 enriquecedora que a certeza absoluta. Durante o percurso académico, realizei paralelamente estágios curriculares, especialmente no período de férias, donde destaco CEMEF em Medicina Geral e Familiar (2014) e Radiologia (2016).

4. REFLEXÃO CRÍTICA

Este pequeno relatório representa mais do que um sumário factual e apressado deste último ano letivo. Representa, também, uma jornada que começou há quase 20 anos, quando, por circunstância de um Carnaval, me mascarei com uma bata e um estetoscópio de plástico e disse: “quando for grande, quero ser médico!”.

Mentiria, se dissesse que me lembro das motivações exatas para esse sonho. Não é, no entanto, um desejo incomum dos mais novos. Por curiosidade, pesquisei, há uns tempos, sobre o porquê de tantas crianças quererem ser médicas quando forem grandes. Descobri que ajudar os outros é-nos tão primitivo quanto beber, comer ou dormir. Chimpanzés partilham a comida com os membros da comunidade,

sem esperar reciprocidade. Golfinhos ajudam os seus pares doentes, nadando por baixo deles durante horas e empurrando-os, ocasionalmente, à superfície para que eles possam respirar. Talvez Darwin, quando desenvolveu a teoria da sobrevivência do mais apto, se esqueceu que as comunidades que trabalham em conjunto, partilham, e dividem tarefas, entreajudando-se, fazem com que as fragilidades individuais se esmoreçam. Sobrevivem e perpetuam-se. Moldam-nos a perspetiva para uma teoria da sobrevivência do mais gentil (survival of the nicest, em inglês). Socorrendo-me deste conceito e enquadrando numa sociedade altruísta global, eis que surge o papel do médico – não só pelo conhecimento científico a que se encarrega, mas pelo contacto, na sua vida diária, com a vulnerabilidade humana. E é com este mote que me permito descrever as minhas experiências, no decurso dos estágios parcelares que frequentei, começando com aquele que mais me marcou – Medicina Geral e Familiar. Este decorreu numa USF pertencente a uma área de Lisboa onde o pano de fundo socioeconómico assume uma importância diferencial. Contactei invariavelmente com utentes ex-presidiários, utentes cujos filhos haviam sido retirados recentemente pela CPCJ, utentes com recursos financeiros insuficientes para poderem comprar medicamentos na farmácia.

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7 Utentes cujas angústias e medos se camuflavam em comportamentos confrontativos e violentos. Deparei-me com as resistências implicadas na tentativa de educação para a saúde em contextos tão desiguais, reforçando, assim, a importância de um elemento conhecedor destas comunidades e das suas vulnerabilidades. Cabem, neste conceito, inúmeras particularidades que fui explorando, também, em ambiente hospitalar: a mulher, a criança, o doente mental, o doente cirúrgico e o idoso com co-morbilidades. Os cartões de visita, portanto, das restantes especialidades por que passei neste último ano de curso. Descrever experiências tão recompensadoras é um desafio de síntese. Cinjo-me, por isso, a exemplos práticos: como a doente mastectomizada que vê a sua feminilidade e imagem desfiguradas, mergulhando, muitas vezes, espirais auto-depreciativas ; a criança doente, que não consegue verbalizar as suas dores, acompanhada por pais protetores, intolerantes à frustração da complexidade da marcha diagnóstica; o doente esquizofrénico, que é torturado diariamente pelas crueldade das vozes que ouve; a doente de 40 anos, saudável até então e que, após diagnóstico de adenocarcinoma gástrico inoperável, se vê obrigada a reajustar as expectativas de vida, perante a nova e bárbara realidade; e, por fim, a doente de 80 anos, com um tumor do cólon metastizado nos pulmões, fígado e ossos, que sente o seu estado de saúde deteriorar-se gradualmente, entrevendo a morte na próxima paragem. Durante este ano letivo, considero ter-me permeabilizado a essas experiências, às opiniões e conselhos dos docentes e outros profissionais com os quais contactei, ao desapontamento no insucesso das primeiras flebotomias, das insuficientes anamneses iniciais, dos exames objetivos incompletos – à alegria do sucesso dos mesmos, após dedicação e empenho. Desenvolvi, concretamente, mais competências aquando dos estágios parcelares de Medicina Interna e Medicina Geral e Familiar, pelo maior contacto em anos prévios e por estas assumirem um caráter mais generalista, equipando-me de uma compreensão mais espectral das patologias. Reconheço, assim, que os objetivos globais do Estágio Profissionalizante e aqueles enunciados por cada uma das várias Unidades Curriculares foram atingidos. Consciente de estar a recorrer a lugares-comuns, envaideço-me ao dizer que aprendi medicina nas bibliotecas, sublinhando apontamentos, mas aprendi a ser médico no hospital, com os doentes. O futuro veste-se de uma silhueta dúbia e incerta e a medicina, tal como a conhecemos, insiste em metamorfosear-se e erodir numa prática mais pragmática e economicista. Resta-nos adivinhar se os princípios de entreajuda, respeito e humanidade se manterão. Evoco, por isso, o que escrevi no início desta reflexão – a sobrevivência das nossas famílias e comunidades e, quiçá, da nossa profissão, assenta num princípio tão básico quanto humano – sejamos gentis.

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