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ECLI:PT:TRE:2006:

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ECLI:PT:TRE:2006:2353.06.2.62

http://jurisprudencia.csm.org.pt/ecli/ECLI:PT:TRE:2006:2353.06.2.62

Relator Nº do Documento

Bernardo Domingos

Apenso Data do Acordão

14/12/2006

Data de decisão sumária Votação

unanimidade

Tribunal de recurso Processo de recurso

Data Recurso

Referência de processo de recurso Nivel de acesso

Público

Meio Processual Decisão

Agravo negado provimento

Indicações eventuais Área Temática

Referencias Internacionais Jurisprudência Nacional Legislação Comunitária Legislação Estrangeira Descritores

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Sumário:

I – Tendo transitado em julgado o acórdão do STJ que declarou a nulidade dum dado contrato promessa de compra e venda dum dado prédio e bem assim o subsequente contrato de compra e venda do dito prédio (celebrado consigo próprio, em representação do anterior proprietário do prédio) em causa nestes autos, com o cancelamento dos respectivos registos, tal declaração implica a anulação dos negócios jurídicos subsequentes celebrados pelos RR., e relativos ao dito prédio.

II – Assim tendo os AA. intentado a acção invocando a qualidade de proprietários por transmissão feita por parte de transmitente declarado “non domine” é obvio que após a prolação tal declaração deixaram de ter legitimidade substancial para prosseguir com a acção uma vez que o negocio em que assentava deixou de valer na ordem jurídica.

III – E não obsta à invalidade o facto de o acto de aquisição se encontrar registado a favor dos AA. Com efeito o registo da acção (que julgou a causa prejudicial) é anterior ao registo da aquisição por parte dos 1ºs AA., sendo indiferente para o caso a posterior caducidade do registo da acção,

entretanto renovado, tal como sucedeu com o registo provisório de aquisição, também caducado e renovado mais tarde, pois estava cumprida a sua principal função – dar publicidade a uma situação litigiosa sobre a titularidade do imóvel. Por outro a acção foi intentada nos tês anos imediatos e os 1ºs AA., não podem ser considerados adquirentes de boa fé.

IV - O conceito de boa fé ínsito no n.º 3 do art.º 291 do CC., é um conceito ético «pois a lei não se basta com o mero facto psicológico do desconhecimento da desconformidade» substancial ou registal. Ao invés exige-se que esse desconhecimento não possa ser imputável ao terceiro subadquirente, a título de culpa. Ora os 1ºs AA., terceiros subadquirentes, não só não

desconheciam a existência da acção de anulação, como conheciam essa existência. E sendo o 1º A., advogado tinha todas as condições para saber e conhecer em pormenor as causa do litígio sobre o prédio, bastava-lhe a consulta dos autos respectivos. Se o não fez a culpa do

desconhecimento é-lhe imputável em exclusivo e o risco de ver anulada a aquisição corre, natural e conscientemente, por sua conta, dado que não pode invocar em seu proveito o desconhecimento da lei (art.º 6º do CC)…!

Decisão Integral:

Acordam os Juízes da Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora:

Proc.º N.º 2353/06-2 Agravo Recorrente: José Manuel………... Recorrida: Maria ………. *

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José Manuel ………….. e mulher, Rosa……… e Eduardo………….. e mulher, Maria Manuela………….., vieram intentar a presente acção declarativa de condenação, sob a forma de processo ordinário, pedindo

que a ré seja condenada:

- A proceder de imediato às adequadas obras de conservação, restauro ou substituição das

canalizações de água, de esgotos e das instalações sanitárias de sua causa, de modo a pôr fim às infiltrações, repasses e escorrências existentes nas abóbadas, tectos e paredes do rés do chão do prédio e a prevenir, em termos normais, outras futuras ocorrências análogas;

- A deixar os autores procederem às obras adequadas de reparação e isolamento no terraço e seus canteiros da sua casa, de modo a pôr fim aos repasses, infiltrações e escorrências existentes e a prevenir, em termos normais, outras futuras;

- A pagar aos autores José Manuel e Rosa Maria uma indemnização não inferior a 3.500.000$00 pelos danos materiais e morais por estes sofridos e de que ela é responsável por via legal e contratual;

- A pagar aos mesmos autores uma indemnização pelos prejuízos futuros, materiais e morais, que estes venham a sofrer, cujo montante será apurado em execução de sentença;

Os primeiros autores fundamentam a sua legitimidade para a acção no facto de serem

arrendatários do rés do chão do prédio em questão, os autores no facto de serem proprietários de todo o prédio.

A R. foi citada, contestou e deduziu reconvenção. Os AA. replicaram.

Findos os articulados foi proferido despacho a suspender a instância para se aguardar a decisão de acção de anulação da venda feita aos primeiros AA., e considerada prejudicial para a causa, na medida em que da sua procedência determinaria a ilegitimidade de todos os AA. para prosseguirem a presente lide. O Sr. Juiz fundamentou a decisão nos seguintes termos:

«1. José Lúcio Nobreza Negreiros, intentou, junto do 12° Juízo Cível do Tribunal da Comarca de Lisboa, uma acção com processo ordinário contra José Eduardo de Oliveira Dias e mulher, 2°s autores na presente acção, a que foi atribuída o n. ° 4.611/95 e distribuída à 1a secção do referido 120 Juízo Cível, a qual se encontra registada na Conservatória do Registo Predial de Serpa pela inscrição F-2 do prédio descrito sob o n.º 01588/Salvador;

2. Na acção a correr termos no 12° Juízo Cível de Lisboa José Lúcio Nobreza Negreiros, formulou o seguinte pedido:

a) Declara-se irrito, nulo e de nenhum efeito o dito contrato promessa de compra e venda celebrado entre o José Lúcio Nobreza Negreiros e José de Oliveira Dias em 6 de Julho de 1994 e que tem por objecto o prédio urbano sito na Rua do Rocio, n.ºs 31 e 33, inscrito na matriz predial da freguesia de Salvador sob o artigo 1300 e descrito na Conservatória do Registo Predial de I Serpa sob o n. ° 1.588, ou quando assim não se entenda,

b)Anular-se o mesmo contrato promessa;

c) Anular-se a procuração outorgada pelo referido José Lúcio Nobreza Negreiros a favor de José Eduardo Oliveira Dias e mulher Maria Manuela Leite Dias, em 6 de Julho de 1994 no 22° Cartório Notarial de Lisboa;

d) Ordenar-se o cancelamento de todos os registos efectuados com base nesses documentos; e) Serem igualmente declarados nulos ou, subsidiariamente, anulados quaisquer actos praticados com base ou a partir do contrato promessa e procuração anulandos, ordenando-se também o cancelamento de todos os registos efectua dos com base nos mesmos; Conclusão facto-jurídica:Dispõe o n.º 1 do artigo 2790 do Código do Processo Civil revisto, que o tribunal pode ordenar a suspensão (da instância) quando a decisão da causa estiver dependente do julgamento

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de outra já. proposta e quando ocorrer outro motivo justificado.

No ensinamento do Prof ALBERTO DOS REIS (Comentário, 111, pág. 206): uma causa é

prejudicial em relação a outra quando a decisão daquela prejudicar a decisão desta, isto é, quando a procedência da primeira tira razão de ser à existência da segunda (sublinhado nosso).

É o caso dos autos, dado que se a acção n.º 4.6111/95 vier a ser julgada procedente, todos os contratos celebrados pelos réus José Eduardo de Oliveira Dias e mulher serão declarados nulos ou anulados e, consequentemente, todos os registos entretanto efectua dos cancelados. Entre esses contratos inclui-se o contrato de arrendamento e o contrato promessa de compra e venda relativo ao prédio urbano situado na Rua do Rocio n.ºs 31 e 33 em Serpa, celebrado entre o primeiro autor marido e o segundo autor marido.

Ora, se o contrato de arrendamento e o contrato promessa de contra e venda celebrado entre o primeiro autor marido e o segundo autor marido vieram a ser declarados nulos, eles deixam de ter a qualidade de arrendatário e senhoria, pelo que passam a carecer de legitimidade para interpor a presente acção. Só quem tem a qualidade de senhorio e de arrendatário pode exigir a feitura de obras no locado.

Numa frase, a procedência da primeira acção tira a legitimidade dos autores para interporem a presente acção.

Nos termos do artigo 279°, n.° 2 do Cód. de Processo Civil), existindo pendência de causa

prejudicial, a suspensão só não dever ordenada se houver fundadas razões para crer que aquela foi intentada unicamente para se obter a suspensão ou se a causa dependente estiver tão

adiantada que os prejuízos da suspensão superem as vantagens.

No caso, sendo a causa prejudicial preexistente à causa dependente, afastada fica a hipótese de a mesma ter sido intentada unicamente para se obter a suspensão.

Quanto ao requisito dos prejuízos da suspensão face ao adiantamento da presente causa, o mesmo não se verifica, dado que ainda se está na fase do pré-saneador».

Deste despacho não houve recurso.

Decidida aquela causa, com decisão transitada em julgado, foi ordenada a junção das certidões da decisões, com nota de trânsito em julgado e de seguida foi proferido despacho onde se admitiu a reconvenção. Simultaneamente e face à procedência da acção que foi considerada “prejudicial”, foram os AA. considerados partes ilegítimas e consequentemente foi a R., absolvida da instância. Inconformados com o decidido, vieram os AA. interpor recurso de agravo, tendo rematado as suas alegações com as seguintes

Conclusões:

«1ª - A relação material controvertida – legitimidade do 1 ° recorrente José Manuel ……… – sobre a qual o Tribunal a quo proferiu a decisão de que ora se recorre, já foi objecto de decisão judicial

transitada em julgado consubstanciada no douto Acórdão da Relação de Évora;

2ª - Esta decisão, proferida no Agravo – Proc. N° 1100-05- 3ª Secção, que declarou válida, substancial e formalmente, a aquisição do prédio em questão pelo 1° recorrente e ipso factu lhe reconheceu legitimidade ad causam, tem força obrigatória na presente acção (art° 671°, n.º1 do C.P.C.);

3ª - A referida anulação de contrato de compra e venda do imóvel em causa não implica a nulidade de arrendamento urbano celebrado a favor do 1° recorrente, terceiro de boa fé;

4ª - O 1° recorrente, como arrendatário e promitente comprador do prédio, de boa fé, e que nele realizou avultadas benfeitorias necessárias e úteis com obras de limpeza, restauro e conservação,

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tem legitimidade para a causa como possuidor e retentor do imóvel;

5ª - O Tribunal a quo violou o n° 2 do art° 514° CPC por não ter levado em conta na douta

decisão recorrida as suas anteriores decisões que proibiram o 1° recorrente de celebrar a escritura pública de transmissão da propriedade do prédio a seu favor, e “ipso factu”,

6ª - Impediu-o indevidamente de converter em definitivo o registo provisório de aquisição a seu favor de 21 de Setembro de 1998.

7ª - O Tribunal a quo violou o princípio dispositivo definido no art° 264° CPC ao decretar a ilegitimidade do 1 ° recorrente com base em factos não alegados pelas partes decorrente da aplicação do art° 490° do CPC.

8ª - O Tribunal a quo não valorou devidamente, para a formação da douta decisão recorrida, o contrato promessa de compra e venda celebrado em 11 de Setembro de 1998, pelo qual o 1° recorrente ficou com as chaves do prédio, pagou a totalidade do preço ajustado e recebeu a procuração irrevogável outorgada pelos vendedores que permitiu, só por si, transferir para ele a propriedade do prédio.

9ª - Nesta data da conclusão do negócio – 11/9/1998 – o 1° recorrente não tinha qualquer conhecimento do vício do negócio anulável celebrado entre os 2°s recorrentes e José Lúcio

Negreiros, nem sequer da existência da acção de anulação que este intentara na 12ª Vara Cível de Lisboa – Proc. 4611/95.

10ª - O 1º recorrente só teve conhecimento da existência desta acção de anulação no decurso da acção de despejo, sendo certo que naquela só veio a ser anulado aquele negócio, por usura, por Sentença transitada em julgado em 24/09/2003.

11ª - O 1º recorrente não teve conhecimento do vício do negócio anulável – usura – antes da 12ª Vara Cível de Lisboa o ter declarado em decisão final, tanto mais que, antes desta, foram proferidas duas sentenças (anuladas pela Relação de Lisboa) a considerar improcedente o vício de usura alegado por José Lúcio Negreiros.

12ª - Não há nenhuma prova de que o 1° recorrente teve conhecimento antes de 24/9/2003 do vício do negócio anulável (usura) celebrado em 1994 entre os recorrentes e José Lúcio Negreiros. 13ª - Não há nenhuma prova, nem foi alegado em nenhuma acção, que o 1º recorrente tivesse tido conhecimento pessoal das relações de formação e das circunstâncias do negócio celebrado em 1994 entre os 2°s recorrentes e José Lúcio Negreiros, pelo que desconhece, sem culpa, qualquer vício do negócio.

14ª - O mero conhecimento posterior da existência da acção de anulação, sem nela ter qualquer intervenção, não pode subsumir-se no conceito de conhecimento do vício do negócio anulável constante do n° 3 do dito art° 291 ° CC. Por isso

15ª – O 1 ° recorrente deve de ser considerado terceiro de boa fé nos termos e para os efeitos do referido art° 291 ° CC.

16ª - Dispondo o 1° recorrente de registo a seu favor, e não existindo nenhum registo válido da acção de anulação da 12ª Vara, deve ser considerado o dono do prédio, face ao disposto no art° 7° do CRP e art° 1.268, n° 1 C.C.

17ª - Esta presunção registral só pode ser afastada por decisão judicial transitada em julgado que decrete o seu cancelamento expresso – art° 13° CRP. E

18ª - Não pode ser impugnado em juízo, sem que simultaneamente seja pedido o seu cancelamento – art° 8° CRP.

19ª - Em nenhuma acção judicial foi impugnado o registo a favor do 1° recorrente, nem pedido o seu cancelamento, pelo que a douta decisão recorrida não pode, sem mais, considerar ilidida a

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presunção derivada do registo.

20ª - Porque dispõe de titulo e ignorava, quando adquiriu a posse do prédio em 11/9/1998, o vício do negócio anulável e até a existência da acção de anulação da 12ª Vara, o 1° recorrente deve ser considerado possuidor de boa fé – art° 1260° CC.

21ª - Porque dispõe também de registo a seu favor, o 1° recorrente deve também presumir-se proprietário do prédio – art° 1.268° CC.

22ª - Porque é possuidor do prédio, de boa fé, dispõe de titulo e de registo e pode aceder à sua a posse dos antecessores, o 1° recorrente pode invocar a seu favor a usucapião (art.ºs 1.256°, 1.260° e 1.294° C.C.).

23ª - Para efeitos do n° 3 do art° 291° CC, o momento da aquisição. No caso sub judice, deve reportar-se a 11/9/1998, data da conclusão do negócio de aquisição do prédio pelo 1 ° recorrente, ou, na pior hipótese, a 21/9/1998, data do registo provisório a seu favor, que só não foi convertido em definitivo, porque o Tribunal a quo o impossibilitou de tal fazer ao proibi-lo de celebrar a

escritura de compra e venda, apesar do seu requerimento datado de 3/3/1999 no Proc.140-A/ 1999. 24ª - Para efeitos do n° 3 do art° 291 ° CC, conhecer o vício do negócio anulável não é,

simplesmente, como na douta decisão recorrida se entende, ter conhecimento da existência da acção de anulação, sem nela ter qualquer intervenção. Diferentemente,

25ª - Desconhecer, sem culpa. O vício do negócio anulável pressupõe que se não teve, nem havia obrigação de ter, conhecimento pessoal da sua celebração e das reais circunstâncias na formação do vontade das partes, como é o caso.

26ª - Porque nos articulados não existiu nenhuma impugnação às qualidades jurídicas invocadas pelos autores e foram expressamente considerados pela ré como donos, senhorios, arrendatários e promitentes compradores do prédio, tem de considerar-se que houve acordo das partes sobre os factos que no respectivo requerimento inicial se alegaram, pelo que a legitimidade dos AA., ora recorrentes, deve ser admitida – art° 490°, n.ºs 1 e 2, art° 271°, n° 2 do CPC.

27ª - A inexistência de registo da acção de anulação que correu pela 12ª Vara Cível de Lisboa –Proc. 4611/95 – implica que a douta decisão transitada em julgado nela proferida só é invocável entre as partes respectivas e não é oponível ao titular de registo predial definitivo – art°s 4°, 5°, 7° e 8° do C. Reg. Predial e art° 1.268° C.C.

28ª - Pelo exposto, a douta decisão recorrida viola ostensivamente o princípio do contraditório, contido no n.º 3 do art° 3° do C.P.C., e

29ª - A douta decisão recorrida viola também o princípio dispositivo, regulado n.ºs n.ºs I, 2 e 3 do art° 264° do C.P.C ..

30ª - O Tribunal a quo, na sua douta decisão recorrida, violou todas as normas e princípios legais referidas nas presentes Alegações, do modo como se expôs, pelo que a mesma deve ser revogada e substituída por outra que declare os recorrentes com legitimidade para a presente acção, porque é de Lei e de Justiça». *Não houve contra-alegações e antes de ordenar a subida dos autos a este Tribunal a Sr.ª Juíza proferiu despacho sustentando a decisão.*Na perspectiva da delimitação pelo recorrente [1] , os recursos têm como âmbito as questões suscitadas pelos recorrentes nas

conclusões das alegações (art.ºs 690º e 684º, n.º 3 do Cód. Proc. Civil) [2] salvo as questões de conhecimento oficioso (n.º 2 in fine do art.º 660º do Cód. Proc. Civil).

Das conclusões decorre que as questões a decidir consistem em saber:

1ª- se o Tribunal “a quo” poderia conhecer oficiosamente da decisão proferida na causa prejudicial e tomá-la em conta no processo;

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2ª - e se ao fazê-lo violou os princípios do dispositivo e do contraditório;

3ª - se a decisão, proferida no Agravo – Proc. N° 1100-05-3ª Secção, da Relação de Évora, onde se declarou válida, substancial e formalmente, a aquisição do prédio dos autos pelo 1° recorrente e como tal se lhe reconheceu legitimidade como cessionário, tem força obrigatória na presente

acção.*Colhidos os vistos legais cumpre apreciar e decidir.*Antes de mais e para um melhor

enquadramento das questões, convém ter presente o teor do despacho recorrido e que reza assim: «Sendo do meu conhecimento funcional, por força de decisão proferida no Proc. n.º 77-A/1998 deste tribunal, que o 1º A., por escritura pública, lavrada no dia 04/01/2002, no Cartório Notarial de Serpa, por si e como procurador dos 2ºs AA., declarou vender a si próprio e aceitar a venda do prédio descrito na Conservatória do Registo Predial de Serpa, com o n.º 01588, da freguesia de Salvador e inscrito na matriz sob o art.º 1300 e encontrando-se actualmente tal processo no Tribunal da Relação de Évora em recurso, oficie ao Cartório Notarial de Serpa, solicitando o envio da referida escritura, dando oportuno conhecimento às partes da junção da mesma aos autos. ***

Da Reconvenção:

Os AA., José Manuel Macedo de La Feria e mulher Rosa Maria Godinho Macedo de La Feria e José Eduardo de Oliveira Dias e mulher Maria Manuela Leite Dias, intentaram a presente acção declarativa de condenação contra Maria José Pereira Branco, pedindo a condenação desta a

proceder a obras de conservação, restauro ou substituição das canalizações de água, de esgotos e das instalações sanitárias da sua casa e a deixar os AA. procederem às obras adequadas de

reparação e isolamento no terraço e canteiros da sua casa, bem como a pagar aos 1ºs AA. uma indemnização não inferior a 3.500.000$00 pelos danos morais e materiais por si sofridos e uma indemnização por prejuízos futuros, materiais e morais, que venham a sofrer, a liquidar em execução de sentença.

Para tanto alegaram, e em suma, que os 2ºs AA. são proprietários de um prédio urbano, sito na Rua do Rossio, n.ºs 29, 30 e 33, na freguesia de Salvador, concelho de Serpa, o qual prometeram vender ao 1º A. conferindo-lhe, além do mais, procuração com poderes para vender o prédio e a quem também deram de arrendamento o rés-do-chão do mesmo prédio.

Mais alegaram os AA. que a R. ocupa o 1º andar do imóvel, com entrada autónoma pelo n.º 31, invocando ter-lhe sido transmitida, em acção de divórcio, a posição de inquilina no contrato de arrendamento de que juntam cópia e que não só tem perturbado, por actos e omissões, a

realização de obras no prédio pelos AA., como não efectuou no locado as obras que lhe competem por força legal e contratual, o que é causa de anomalias no prédio e de diversos prejuízos para os AA.

A R. contestou, invocando desde logo a pendência do Proc. n.º 4611/95, do 12º Juízo Cível de Lisboa, 1ª Secção, na qual se pede além do mais, a anulação do contrato de compra e venda, por efeito do qual os 2ºs AA. adquiriram a propriedade do prédio em causa e a pendência do Proc. n.º 140/1999 neste tribunal onde se discute o direito de preferência da R., enquanto arrendatária relativamente àquela venda, bem como impugnando o alegado pelos AA. e os prejuízos por si sofridos, já que nunca impediu os AA. de realizarem quaisquer obras e referindo que o prédio em questão é muito antigo e se encontra em mau estado de conservação, por falta de obras, cuja execução compete aos AA., nos termos da lei e do contrato de arrendamento.

A R., fundando-se nessa falta de realização de obras e nos danos que alegadamente sofreu, deduziu ainda reconvenção contra os AA., pedindo a condenação destes a efectuarem obras de reparação de cobertura do prédio e a substituírem as canalizações de água, esgotos e instalações

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sanitárias do 1º andar, sempre que as mesmas se deteriorarem com o decurso do tempo, bem como a pagarem solidariamente à R. uma indemnização não inferior a 1.800.000$00 para reparação dos danos materiais e morais sofridos e uma indemnização por todos os prejuízos futuros, materiais e morais, que venha a sofrer, a liquidar em execução de sentença.

Os AA. replicaram, arguindo, além do mais, a inadmissibilidade do pedido reconvencional por falta dos requisitos de conexão substantiva previstos no art.º 274º, n.º 2 do Código de Processo Civil. Na tréplica, a R. nada responde quanto a esta questão.*A reconvenção pressupõe a formulação de um pedido autónomo pelo réu contra o autor e transcende a simples improcedência da pretensão do autor e dos corolários dela decorrentes, constituindo, assim, uma contra-acção dentro do mesmo processo e passando a haver duas acções cruzadas, em que o autor figura simultaneamente como réu e vice-versa, cfr. Prof. Dr. Antunes Varela, Dr. J. Miguel Bezerra, Dr. Sampaio e Nora, Manual de Processo Civil, 2ª Edição Revista e Actualizada, Coimbra Editora,1985, págs. 322 e segs. A admissibilidade legal da reconvenção depende, em geral, da verificação de três requisitos de natureza substantiva e processual:

-conexão entre os pedidos formulados por autor e réu, cfr. art.º 274º, n.º 2 do Código de Processo Civil;

-competência absoluta do tribunal, cfr. 98º do Código de Processo Civil;

-identidade das formas de processo, cfr. art.º 274º, n.º 3 do Código de Processo Civil.

A conexão substantiva exigida pelo referido art.º 274º, n.º 2 verifica-se em três situações, a saber: 1.Quando o pedido do réu emerge do facto jurídico que serve de fundamento à acção ou à defesa (alínea a);

2.Quando o réu se propõe obter a compensação ou tornar efectivo o direito a benfeitorias ou despesas relativas à coisa cuja entrega lhe é pedida (alínea b);

3.Quando o pedido do réu tende a conseguir em seu benefício, o mesmo efeito jurídico que o autor se propõe obter (alínea c).

Ora, da análise dos pedidos formulados por AA. e R. e respectivas causas de pedir, conclui-se que o pedido reconvencional, e contrariamente ao pretendido pelos AA., tem cabimento ao abrigo da referida alínea a).

Com efeito, tanto a acção, como a reconvenção se fundam, além do mais, num contrato de arrendamento respeitante ao rés-do-chão do prédio em causa e a necessidade de realização de obras nesse prédio que permitam aos proprietários e arrendatários o seu uso e fruição.

Tais fundamentos, invocados pela R. na sua reconvenção, surgem não só como factos nos quais os AA. assentam as suas pretensões, como servem igualmente para sustentar a defesa da R. apresentada na contestação, razão pela qual se verifica o aludido requisito de conexão substantiva, ou seja, o pedido do réu emerge do facto jurídico que serve de fundamento tanto à acção, como à defesa, nos termos do citado art.º 274º, n.º 2, a) do Código de Processo Civil.

No que se refere aos acima elencados requisitos processuais de admissibilidade, temos que o tribunal é absolutamente competente para conhecer do pedido reconvencional formulado e que a diversidade de formas de processo relativas à acção e à reconvenção, respectivamente, comum ordinário e sumário, nos termos das disposições conjugadas dos art.ºs 462º do Código de Processo Civil e 24º n.º 1 da Lei n.º 3/99, de 13 de Janeiro (Lei de Organização e Funcionamento dos

Tribunais Judiciais) e tendo em atenção os valores atribuídos e não questionados pelas partes, porque proveniente do diverso valor dos pedidos não obsta à admissibilidade da reconvenção.*Pelo exposto, e por se mostrarem verificados os requisitos substantivos e processuais de

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Notifique.***Da Audiência Preliminar:

Nos termos do art.º 508º-A, n.º 1 do Código de Processo Civil, concluídas as diligências a que se refere o art.º 508º do mesmo Código, se a elas houver lugar, é convocada audiência preliminar destinada a algum ou alguns dos fins aí especificados.

O art.º 508º-B do Código de Processo Civil, na redacção anterior ao Decreto-Lei n.º 38/2003, de 8 de Março, aplicável in casu, por força do art.º 21º, n.º 1 do mesmo diploma, dispõe o seguinte: “1. O juiz pode dispensar a audiência preliminar:

a)Quando, destinando-se à fixação da base instrutória, a simplicidade da causa o justifique; b)Quando a sua realização tivesse como fim facultar a discussão das excepções dilatórias já debatidas nos articulados ou do mérito da causa, nos casos em que a sua apreciação revista manifesta simplicidade.

2. Não havendo lugar à realização de audiência preliminar, se a acção tiver sido contestada e houver de prosseguir, o juiz, no despacho saneador, seleccionará a matéria de facto, mesmo por remissão para os articulados, podendo as partes apresentar as respectivas reclamações no início da audiência final.”

Resulta destas disposições que a regra, no âmbito das acções que seguem a forma de processo ordinário, é a realização de audiência preliminar, a qual apenas pode ser dispensada nos casos previstos no transcrito art.º 508º-B.

Quanto ao disposto na alínea a) deste artigo, a lei refere como critério de dispensa da audiência preliminar a simplicidade da causa, o que a doutrina vem reportando à maior ou menor dificuldade na selecção da matéria de facto, “(…) pois que não havendo, em si mesmo, causas “difíceis” ou “simples”, qualquer causa se pode tornar simples se a controvérsia das partes quanto à matéria de facto for reduzida.” – Prof. Dr. Miguel Teixeira de Sousa, Estudos sobre o Novo Processo Civil, Lex, 1997, pág. 306. No mesmo sentido, v. Dr. António Santos Abrantes Geraldes, Temas da Reforma do Processo Civil, II Volume, Almedina, 3ª Edição Revista e Ampliada, pág. 99 e 100 e Dra. Paula Costa e Silva, Saneamento e Condensação, in Aspectos do Novo Processo Civil, Lex, 1997, pág. 259.

Relativamente à primeira parte da alínea b) do art.º 508º-B do Código de Processo Civil, e

considerando que tal dispositivo tem como um dos seus fundamentos essenciais a desnecessidade de fazer actuar o princípio do contraditório, a dispensa da audiência preliminar pode ter lugar nos casos em que a mesma se destinasse a discutir excepções dilatórias já suscitadas pelas partes e de simples decisão ou, mesmo que não tenham sido expressamente suscitadas pelas partes, desde que tal discussão seja manifestamente desnecessária, tal a sua evidência e acessibilidade para as partes (art.º 3º, n.º 3 do mesmo Código), cfr., neste sentido, obras e autores citados supra. No caso dos autos, revestindo-se a apreciação da excepção dilatória da ilegitimidade, de que se conhecerá de seguida, de simplicidade e, embora não tenha sido expressamente invocada pelas partes nos seus articulados, constituiu já fundamento para a suspensão da instância, nos termos constantes do despacho de fls. 251 e segs., a decisão sobre a mesma não constitui qualquer surpresa, nem se mostra necessário actuar o contraditório, pelo que a convocação da audiência preliminar não teria qualquer utilidade,

Pelo exposto, e nos termos do art.º 508º-B do Código de Processo Civil, dispenso a audiência preliminar.

Notifique.***DESPACHO SANEADOR*O tribunal é absolutamente competente. Não existem nulidades que invalidem todo o processado.

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Da ilegitimidade dos AA.:

A legitimidade, como pressuposto processual, constitui um dos requisitos necessários a que o tribunal se possa pronunciar sobre o mérito da causa, já que, na sua falta, a decisão que viesse a ser proferida não poderia vincular os verdadeiros sujeitos dos interesses em causa.

Assim, prescreve o art.º 26º do Código de Processo Civil:

“1. O autor é parte legítima quando tem interesse directo em demandar; o réu é parte legítima quando tem interesse directo em contradizer.

2. O interesse em demandar exprime-se pela utilidade derivada da procedência da acção; o interesse em contradizer, pelo prejuízo que dessa procedência advenha.

3. Na falta de indicação da lei em contrário, são considerados titulares do interesse relevante para o efeito da legitimidade os sujeitos da relação controvertida, tal como é configurada pelo autor.”

A nova redacção do artigo 26º, emergente da reforma do processo civil de 95/96, significou a

tomada de posição do legislador na querela doutrinária que historicamente opôs o Prof. Barbosa de Magalhães ao Prof. Alberto dos Reis, assim se perfilhando uma concepção subjectivista da

legitimidade, próxima da posição daquele ilustre Professor, expressa agora no n.º 3 deste artigo. Assim, ao apuramento da legitimidade interessa apenas a consideração do pedido e da causa de pedir, independentemente da prova dos factos que a integram, ou seja, a titularidade da relação material controvertida é aferida pela configuração que dela faz o autor.

Este critério, no entanto, só se refere à legitimidade singular e directa das partes, “(…) isto é, à fixação do «critério normal» de determinação da legitimidade das partes, assente na pertinência ou titularidade da relação material controvertida – e resultando da formulação proposta que, pelo contrário, a legitimação extraordinária traduzida na exigência do litisconsórcio ou na atribuição de legitimidade indirecta, não depende das meras afirmações do autor, expressas na petição, mas da efectiva configuração da situação em que assenta, afinal, a própria legitimação dos intervenientes no processo.”, cfr. Preâmbulo do Decreto-Lei n.º 329-A/95, de 12 de Dezembro e, como resulta da própria norma, na falta de indicação da lei em contrário.

Ora, no caso dos autos, e como resultava já do despacho de fls. 251 e segs. que suspendeu a instância, com fundamento na pendência do Proc. n.º 4611/95, do 12º Juízo Cível de Lisboa, 1ª Secção, a procedência desta última acção retirou legitimidade aos AA. quer enquanto demandantes na acção, quer enquanto demandados na reconvenção.

Vejamos porquê.

O prédio urbano em causa mostra-se descrito na Conservatória do Registo Predial de Serpa, com o n.º 01588, da freguesia de Salvador e inscrito na matriz sob o art.º 1300, cfr. certidão de fls. 333 e segs.

Por escritura pública, lavrada no dia 04/01/2002, no Cartório Notarial de Serpa, o 1º A. José Manuel ……….., por si e como procurador dos 2ºs AA., declarou vender a si próprio o referido prédio e aceitar a venda.

O 1º A. tem registada a seu favor a aquisição, provisória por natureza, do referido prédio, por contrato promessa de compra e venda, aos titulares inscritos, os 2ºs AA. (mediante a Ap. 13/990719, convertida em definitivo pela Ap. 01/020107 (inscrição G-4).

Por sua vez, o 2º A. José Eduardo de Oliveira Dias, por escritura pública celebrada em 18/11/94, e junta aos autos a fls. 163 e segs., por si e na qualidade de procurador de José Lúcio Nobreza de Negreiros, declarou comprar o mencionado prédio ao seu constituinte e aceitar a venda do mesmo, o qual se encontrava já registado a seu favor na Conservatória do Registo Predial de Serpa, pela inscrição G-2.

(11)

Por sentença proferida no Proc. n.º 4611/95 da 1ª Secção da 12ª Vara Cível de Lisboa, transitada em julgado no dia 24/09/2003, em que era A. José Lúcio Nobreza de Negreiros e RR. os aqui 2ºs AA. foi decidido, designadamente, anular o contrato-promessa de compra e venda celebrado entre A. e R. marido em 06/07/94 e que tem por objecto o referido prédio urbano; anular a procuração outorgada pelo A. a favor dos RR. em 06/07/94 no 22º Cartório Notarial de Lisboa; anular a

escritura de compra e venda celebrada em 18/11/94, lavrada de fls. 120 a 121 do Livro 65-H do 22º Cartório Notarial de Lisboa e na qual o R. interveio por si e em representação do A. utilizando a procuração anulada; e ordenar o cancelamento de todos os registos efectuados com base nos actos ora anulados, cfr. fls. 264 e segs.

Importa ainda considerar que a referida acção que correu termos com o n.º 4611/95, foi registada, mediante a inscrição F-1, Ap. 04/941221 e F-2, Ap 04/980924 e que a presente acção deu entrada no dia 11/05/2001, sendo todos AA. patrocinados pelo 1º A. José Manuel………….., na qualidade de mandatário forense.

Assim sendo, e por força da decisão proferida no Proc. n.º 4611/95, os AA. perderam a qualidade de proprietários do imóvel, tendo ainda os 1ºs perdido igualmente a qualidade de arrendatários do rés-do-chão.

Com efeito, os sucessivos contratos de compra e venda, relativamente ao prédio em causa nestes autos, foram celebrados, mediante a forma legalmente prevista, sendo um dos efeitos do contrato a transmissão da propriedade da coisa, cfr. art.º 875º, 875º e 879º, a) do Código Civil.

Nos termos do art.º 289º, n.º 1 do Código Civil, tanto a declaração de nulidade como a anulação do negócio têm efeito retroactivo, devendo ser restituído tudo o que tiver sido prestado, pelo que, e anulado o contrato mediante o qual José Lúcio Nobreza Negreiros transferiu a propriedade aos 2ºs AA., tudo se passa como se a propriedade do prédio em causa nunca tivesse sido transmitida a estes, sendo a venda subsequente ao 1º A. nula por falta de legitimidade do transmitente, como igualmente nulo é o contrato de arrendamento celebrado entre o 1º e o 2º A. junto aos autos a fls. 27 e segs., nulidades essas de conhecimento oficioso e a todo o tempo, cfr. art.ºs 286º e 892º, este último aplicável directamente quanto à compra e venda e por força do art.º 939º no que se refere ao arrendamento, todos do Código Civil.

A esta conclusão não obsta a circunstância de o referido imóvel se mostrar registado a favor do 1º A., uma vez que presunção consagrada no art.º 7º do Código do Registo Predial é ilídivel.

Tratando-se de um bem imóvel, resta apenas saber se, relativamente à compra e venda e tendo em atenção o disposto nos art.ºs 291º do Código Civil e 17º do Código do Registo Predial, a anulação do negócio por força da referida decisão judicial é ou não oponível ao 1º A., ou seja, se esta anulação determina, como acima se explicitou, a nulidade da venda subsequente.

Não sendo pacífica a forma de delimitação dos campos de aplicação do disposto nos art.ºs 291º do Código Civil e 17º do Código do Registo Predial, atenta a disparidade de requisitos para tutela dos terceiros de boa fé, sendo a primeira norma mais exigente por impor limitações de ordem temporal, entende-se que a aplicação de uma ou outra norma depende, respectivamente, da inexistência ou existência de registo inválido a favor do transmitente, cfr., sobre esta matéria e neste sentido, Prof. Luís A. Carvalho Fernandes, Lições de Direitos Reais, Quid Iuris, 3ª Edição, págs. 142 e segs. e Dra. Isabel Pereira Mendes, Código do Registo Predial, Anotado e Comentado, Almedina, 11ª Edição, págs. 127 e segs.

No caso sub judice, uma vez que a aquisição do prédio se encontrava registada a favor dos 2ºs AA. aquando da sua transmissão ao 1º A., a norma a ter em conta é o citado art.º 17º, n.º 2 do Código do Registo Predial que estabelece o seguinte: “A declaração de nulidade do registo não prejudica

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os direitos adquiridos a título oneroso por terceiro de boa fé, se o registo dos correspondentes factos for anterior ao registo da acção de nulidade.”

Tendo em atenção estes requisitos, bem como as circunstâncias de facto supra referidas e resultantes dos autos, dúvidas não restam que o prédio foi adquirido a título oneroso pelo 1º A. e que o mesmo foi registado em momento anterior ao da acção de nulidade, já que, no momento da conversão do registo da aquisição em definitivo, o registo da acção havia caducado, cfr. inscrições G-4 e F-2 da certidão de fls. 333 e segs.

Falece, no entanto, o requisito da boa fé do terceiro adquirente. Com efeito, “É considerado de boa fé o terceiro adquirente que no momento da aquisição desconhecia sem culpa, o vício do negócio nulo ou anulável.”, cfr. art.º 291º, n.º 3 do Código Civil.

Sucede que, 1º A., José………….., aquando da aquisição do prédio conhecia o vício do negócio anterior, e que conferiu legitimidade ao transmitente, tendo inclusivamente conhecimento da pendência do Proc. n.º 4611/95 da 1ª Secção da 12ª Vara Cível de Lisboa.

Tal circunstância retira-se, por um lado, do facto de a acção ter sido registada, desde logo, em momento anterior ao da promessa de aquisição, apesar de o registo ter entretanto caducado e, por outro lado, do facto de o 1º A. ter patrocinado todos os AA. na presente acção, sabendo, em

consequência, da pendência do referido Proc. n.º 4611/95 e da suspensão da acção até à decisão definitiva desse processo.

Não sendo considerado nos termos legais terceiro de boa fé, a posição do 1º A. não merece protecção jurídica, pelo que se considera ilidida a presunção emergente do art.º 7º do Código do Registo Predial e afastada a aquisição tabular do prédio, sendo nulo, para todos os efeitos legais, o contrato de compra e venda que celebrou com os 2ºs AA.

Ora, os AA. intentaram a presente acção invocando, os 2ºs AA., a sua qualidade de proprietários do prédio em causa e os 1ºs a sua qualidade de promitentes-compradores do mesmo prédio e

arrendatários do rés-do-chão, figurando a R. na acção enquanto arrendatária do 1º andar. Como já acima se deixou expresso, tanto a acção, como a reconvenção em apreço têm

fundamento, além do mais, num contrato de arrendamento respeitante ao rés-do-chão do prédio em causa e a necessidade de realização de obras nesse prédio que permitam aos proprietários e arrendatários o seu uso e fruição, sendo que, por força das disposições conjugadas dos art.ºs 11º e segs. do Regime do Arrendamento Urbano e dos art.º 1031º e segs. e 1038º do Código Civil e como já constava da decisão de fls. 251 e segs., apenas quem tiver a qualidade de senhorio e inquilino pode, ao abrigo de um contrato de arrendamento, exigir a realização de obras no locado. É certo que a qualidade de senhorio não se confunde com a de proprietário do imóvel. No entanto, no caso dos autos, os AA. não invocam qualquer outra circunstância que permita extrair a

conclusão de que possuem aquela qualidade.

Por outro lado, os pedidos de indemnização formulados, tanto por via da acção, como por via da reconvenção são igualmente fundados na violação das regras legais e contratuais que impõem, consoante os casos, ao senhorio e ao arrendatário, a obrigação de realização de obras e

manutenção do locado.

Assim sendo, anulado o negócio pelo qual os 2ºs AA. adquiriram o imóvel e sendo nulos tanto o contrato de compra e venda subsequente ao 1º A., como o contrato de arrendamento do rés-do-chão, falece legitimidade aos AA. tanto para demandarem na presente acção, como para serem demandados, por não serem titulares de qualquer posição jurídica relativamente ao imóvel que lhes permita sustentar os pedidos formulados contra ou pela R.

(13)

verificação de uma excepção dilatória nominada, insanável no caso em apreciação, com a

consequente absolvição dos réus da instância e dos autores da instância reconvencional, tudo nos termos das disposições conjugadas dos artºs 493º, n.º 2, 494º, n.º1, e), 495º e 288º, nº 1, d) do Código de Processo Civil.

Concluindo-se pela ilegitimidade dos AA., e não havendo lugar à aplicação do disposto no art.º 288º, n.º 3 do Código de Processo Civil, por falta de verificação dos respectivos pressupostos, fica prejudicado o conhecimento das demais questões suscitadas pelas partes e, designadamente, do mérito da causa.

Pelo exposto, julgo verificada a excepção dilatória da ilegitimidade dos AA. e, em consequência, absolvo a R. da instância na acção e os AA. da instância reconvencional.

Custas da acção pelos AA. e da reconvenção pela R., cfr. art.º 446º, n.ºs 1 e 2 do Código de

Processo Civil».*Perante esta decisão e atentos os fundamentos de facto e de direito, com os quais se concorda, poderia este Tribunal limitar-se a confirmar o despacho nos termos do disposto no art.º 713º n.º 5 do CPC. Porém para que não subsistam dúvidas quanto ao acerto da decisão

iremos tecer algumas breves considerações a propósito das questões concretas acima enunciadas. Quanto à primeira questão a resposta não pode deixar de ser positiva. Com efeitos o Tribunal “a quo” não só podia conhecer da questão da legitimidade, como tinha obrigação legal de o fazer!! Na verdade compete ao Juiz conhecer oficiosamente, além de outras questões, da verificação dos pressupostos processuais relativos às partes e que constituem excepções dilatórias (art. 494º, 495º e 510º n.º 1 al. a) do CPC). Foi isso que fez a Sr.ª Juíza.

Sustentam os recorrentes, socorrendo-se da argumentação constante do Ac. desta Relação, proferido no Agravo – Proc. N° 1100-05- 3ª Secção, que o Tribunal não podia servir-se da decisão proferida no Processo que correu termos na 12º Vara Cível e que decretou a anulação da venda efectuada aos 2ºs RR. e das subsequentes, porquanto se tratava de uma anulabilidade e não de uma nulidade...sendo que a anulabilidade não é do conhecimento oficioso…!

Erro o seu! Na verdade a situação em apreço nos presentes autos é completamente diferente da que foi suscitada naquele agravo. Aí questionava-se a legalidade do conhecimento oficioso de factos que não tinham sido alegados pelas partes e que contrariavam outros já considerados confessados (por ausência de contestação – ficta confessio). Aqui, nestes autos, a situação é a inversa. Não só não existem factos confessados que sejam contrários aos que foram oficiosamente considerados, mas, mais do que isso, os factos e a decisão judicial que foram considerados tinham sido invocados e alegados pela R. na sua contestação, pelo que em caso algum estaria vedado o seu conhecimento ao Tribunal.*Quanto à segunda questão, também não assiste qualquer razão aos agravantes. No tocante à alegada violação do princípio do dispositivo, acaba de se evidenciar que a mesma não ocorreu. Na verdade foi a R. que alegou na sua contestação, os factos relativos à existência da acção de anulação das vendas feitas aos AA. e dos seus fundamentos. Daqui decorre que o Tribunal não só pode, como deve, conhecer desses factos (art.º 660º 663º e 664º do CPC).

Quanto à violação do princípio do contraditório, só por fantasia se pode invocar!!! Com efeito tal princípio foi cumprido em todas as suas vertentes, desde os articulados de resposta até ao cumprimento escrupuloso do disposto no art.º 3º do CPC. Desde logo os AA., no despacho que suspendeu a instância, foram informados, não só da prejudicialidade da acção de anulação como também dos efeitos da sua procedência, nesta acção e em particular no tocante à sua

legitimidade. Mais tarde foram notificados da junção das certidões das diferentes decisões e

(14)

contraditório.*Quanto à terceira questão também ela improcede, pois não houve neste processo, nem poderia haver, violação do caso julgado formado no agravo n° 1100-05- 3ª Secção, deste Tribunal da Relação, pela singela razão de se tratar de uma decisão em processo diverso, relativa a uma questão processual e por conseguinte com eficácia apenas no âmbito do respectivo processo (art.º 672º do CPC –caso julgado formal), sendo por isso irrelevantes quaisquer considerações sobre a validade ou invalidade substancial dos negócios, já que isso estava fora do objecto do recurso – a decisão recorrida estava circunscrita à apreciação da legitimidade – e como tal nunca poderiam impor-se a outro Tribunal pois não passam de argumentos respeitantes à fundamentação da decisão propriamente dita onde se decidiu a questão da legitimidade.

Mas para que não subsista a menor dúvida de que a decisão do STJ, proferida no processo n.º 4611/95, da 1ª Secção da 2ª Vara Cível de Lisboa e transitada em julgado (que decretou a anulação do contrato-promessa de compra e venda, do prédio da Rua do Rocio n.º 31 a 33 em Serpa, celebrado pelo 2º R. com José Lúcio Nobreza de Negreiros e bem assim o subsequente contrato de compra e venda do dito prédio celebrado consigo próprio, em representação do anterior proprietário do prédio em causa nestes autos, com o cancelamento dos respectivos registos), implica a anulação dos negócios jurídicos subsequentes celebrados pelos RR., e relativos ao dito prédio, sempre se dirá não pode deixar de ser assim. Com efeito em relação aos 2ºs AA. (José Eduardo e mulher) nem sequer se coloca a questão pois foram parte naquela acção de anulação e consequentemente a decisão aí proferida faz caso julgado dentro e fora do processo e consequentemente estão vinculados ao seu cumprimento.

Quanto aos primeiros AA., terceiros em relação ao processo, só estariam protegidos das

consequências da anulação se ocorresse a situação prevista no art.º 17º n.º 2 do C.R. Predial ou no n.º 1 do art.º 291 do CC.

Ora como bem se demonstrou na sentença não se verifica nenhuma dessas situações. Por um lado o registo da acção é anterior ao registo da aquisição por parte dos 1ºs AA., sendo indiferente para o caso a posterior caducidade do registo da acção, entretanto renovado, tal como sucedeu com o registo provisório de aquisição, também caducado e renovado mais tarde, pois estava cumprida a sua principal função – dar publicidade a uma situação litigiosa sobre a titularidade do imóvel. Por outro a acção foi intentada nos tês anos imediatos e os 1ºs AA., não podem ser considerados adquirentes de boa fé, como aliás se ilustrou na sentença. A este propósito convém referir que o conceito de boa fé ínsito no n.º 3 do art.º 291 do CC., é um conceito ético «pois a lei não se basta com o mero facto psicológico do desconhecimento da desconformidade» [3] substancial ou registal. Ao invés exige-se que esse desconhecimento não possa ser imputável ao terceiro subadquirente, a título de culpa. Ora os 1ºs AA., terceiros subadquirentes, não só não desconheciam a existência da acção de anulação, como conheciam essa existência. E sendo o 1º A., advogado tinha todas as condições para saber e conhecer em pormenor as causa do litígio sobre o prédio, bastava-lhe a consulta dos autos respectivos. Se o não fez a culpa do desconhecimento é-lhe imputável em exclusivo e o risco de ver anulada a aquisição corre, natural e conscientemente, por sua conta, dado que não pode invocar em seu proveito o desconhecimento da lei (art.º 6º do CC)…!

Bem andou pois o Tribunal “a quo” ao decidir como decidiu pela ilegitimidade substancial dos AA..* Concluindo

Deste modo, pelo exposto e sem necessidade de mais considerações, acorda-se em negar provimento ao agravo e confirma-se o despacho recorrido.

(15)

Évora, em ………….

---( Bernardo Domingos – Relator)

---( Silva Rato – 1º Adjunto)

---(Assunção Raimundo– 2º Adjunto)

______________________________

[1] O âmbito do recurso é triplamente delimitado. Primeiro é delimitado pelo objecto da acção e pelos eventuais casos julgados formados na 1.ª instância recorrida. Segundo é delimitado

objectivamente pela parte dispositiva da sentença que for desfavorável ao recorrente (art.º 684º, n.º 2 2ª parte do Cód. Proc. Civil) ou pelo fundamento ou facto em que a parte vencedora decaiu (art.º 684º-A, n.ºs 1 e 2 do Cód. Proc. Civil). Terceiro o âmbito do recurso pode ser limitado pelo

recorrente. Vd. Sobre esta matéria Miguel Teixeira de Sousa, Estudos Sobre o Novo Processo Civil, Lex, Lisboa -1997, págs. 460-461. Sobre isto, cfr. ainda, v. g., Fernando Amâncio Ferreira, Manual dos Recursos, Liv. Almedina, Coimbra - 2000, págs. 103 e segs.

[2] Vd. J. A. Reis, Cód. Proc. Civil Anot., Vol. V, pág. 56.

[3] Cfr. neste sentido Oliveira Ascenção, in Direitos reais, 5ª ed. Pag. 377.

Referências

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