XXII Encontro de Iniciação à Pesquisa
Universidade de Fortaleza17 à 21 de Outubro de 2016
O
DIREITO
DE
INDENIZAÇÃO
NO
SERVIÇO
DA
UBER
EM
FORTALEZA/CE
Igor Benevides Amaro Fernandes1(IC)*,Thais Lopes de Aquino 2(IC), Roberta Teles Bezerra 3(PQ), Isabela Fares Matias 4(PQ).
1.Universidade de Fortaleza- Curso de Direito 2.Universidade de Fortaleza- Curso de Direito
3.Mestre pela UFC. Professora do Curso de Direito da Universidade de Fortaleza – UNIFOR 4.Especialista pela PUC-SP. Professora do Curso de Direito da
Universidade de Fortaleza - UNIFOR
igor_benevides@edu.unifor.br
Palavras-chave: Indenização. Transporte. Responsabilidade.
Resumo
A presente pesquisa localiza-se no campo do Direito Civil, e tem como objetivo analisar a possibilidade de indenização no serviço prestado pela Uber em Fortaleza/CE. O novo modelo de transporte vem se inserindo de forma significativa no cenário social e seus impactos jurídicos precisam ser conhecidos e analisados. Este trabalho aborda a grande polêmica gerada com a prestação de serviço da Uber em Fortaleza e sua relação com o contrato de transporte, em face de ainda não ser regulamentado, bem como o direito à indenização a partir do uso do aplicativo em smartphones, ao restar configurado algum dano ao passageiro. A pesquisa é essencialmente bibliográfica e documental, e tem como marco teórico e temporal o Código de Defesa do Consumidor, o Código Civil de 2002.
Introdução
Foi através do Código Civil de 2002 que a responsabilidade civil cresceu de forma significativa no Brasil. Além disso, ganhou expressiva força com o Código de Defesa do Consumidor, com a consagração da responsabilidade objetiva.
A responsabilidade civil faz parte do Direito Obrigacional, mas só vai surgir, quando o dano restar caracterizado. Hoje a responsabilidade civil tem uma amplitude muito maior, ou seja, há uma flexibilização de pressupostos. Existem as seguintes previsões na legislação: arts. 186, 187, 188 e 931, CC/02, os contratos, o Código de Defesa do Consumidor, cujo fundamento é a responsabilidade objetiva.
Cabe ressaltar que a obrigação merece ser cumprida de forma espontânea, porém, não é muito comum nos dias de hoje isso acontecer. Assim sendo, caso a obrigação não seja cumprida, a pessoa que é o seu credor tem o direito de exigir sob a forma de pagamento ou com indenização pelos problemas decorrentes do débito.
Isto posto, a responsabilidade civil no modelo atual traz um modelo de responsabilidade onde a medida da responsabilidade vai ser a medida do dano, conforme preceitua o art. 944, CC/02 (“a responsabilidade mede-se pela extensão do dano”). Diante disso, percebe-se que a responsabilidade civil tem o objetivo de reestabelecer o status quo anterior, ou seja, tem-se que equilibrar aquela relação que por aquele dano, tornou-se uma relação desequilibrada.
O presente estudo analisa os danos que o serviço da Uber pode causar e como isso pode ser resolvido na legislação civil e consumerista vigente, uma vez que se trata de um tipo de contrato atípico e totalmente informal, não obstante seja um serviço que como qualquer outro meio de transporte traz inúmeros riscos para seus usuários.
Metodologia
Para realização desse estudo foi realizada uma pesquisa essencialmente bibliográfica, com consulta de fontes diversas buscando ao máximo coletar notícias sobre tema tão recente.
Resultados e Discussão
O contrato de transporte é uma obrigação de resultado, pois a empresa transportadora é obrigada a levar a pessoa ou coisa do destino que contratou até o destino final e deve ser entregue sã e salva, com total incolumidade física e dos seus pertences também. Trata-se de uma relação contratual, é um contrato de adesão, ou seja, não há como discutir as cláusulas, não tem como mudar, pois, o contrato já vem com sua regras previamente estabelecidas.
Percebe-se que, muitas vezes, não se tem nenhum tipo de comprovante - o bilhete do transporte, mas exsistirá o vinculo contratual e consequentemente a responsabilidade. Um exemplo disso são os transportes realizados em zonas rurais, por exemplo, como o tradicional “pau de arara” ou até mesmo nas zonas urbanas, como o transporte coletivo urbano, incluindo ônibus e topics.
Merece destacar que o preço da passagem, via de regra, corresponde ao benefício recebido pelo passageiro, conforme dispõe o art. 730 do Código Civil de 2002: “Pelo contrato de transporte alguém se
obriga, mediante retribuição, a transportar, de um lugar para outro, pessoas ou coisas”.
Segundo Cavalieri (2012), pode-se afirmar que o bilhete ou passagem não é considerado indispensável para a celebração do contrato, tendo em vista que se trata de contrato não formal, podendo apenas servir como meio de prova da sua existência. Mesmo raciocínio se utiliza para o pagamento da passagem, o qual também não é visto como elemento necessário para a consumação do contrato.
No caso do serviço da Uber, sociedade empresária que desenvolveu uma plataforma tecnológica para conectar e articular motoristas e consumidores de transporte individual, o referido pagamento só é feito no final da viagem, quando o utilizador do serviço classifica a prestação de serviço do motorista por meio do aplicativo no smartphone e, a partir daí, recebe um recibo no correio eletrônico associado à respectiva conta. Assim sendo, pode-se afirmar que se trata de fase da execução do contrato e não da celebração.
Diante de tal situação, no que se refere à atividade da Uber na cidade de Fortaleza, merece destacar que não se trata de transporte puramente gratuito, pois, conforme Cavalieri (2012), tal transporte é o feito no exclusivo interesse do transportado, por mera cortesia do transportador, ou seja, quando alguém, por exemplo, dá carona a um amigo e o transportador não vai responder com base nos arts. 730 apud 756 do Código Civil de 2002, os quais são referentes ao contrato de transporte, mas sim, com base nos arts. 186 e 927 do mesmo Código, ou seja, com base na responsabilidade subjetiva.
Vale ainda ressaltar que a Uber também não se enquadra como transporte aparentemente gratuito, o qual é entendido pelo retromencionado autor, como sendo aquele que o transportador tem algum interesse pecuniário no transporte, mesmo que indireto, como ocorre, por exemplo, no transporte que o patrão oferece aos empregados para levá-los ao trabalho, do corretor que leva o cliente para ver o imóvel que está à venda. Trata-se, portanto, de um transporte interessado, ou seja, o transportador vai auferir vantagens indiretas e tem responsabilidade contratual.
É oportuno também enfatizar o que estabelece o art. 12 da Lei nº 12.587/2012, a qual institui as diretrizes da Política Nacional de Mobilidade Urbana e preceitua que serviços de utilidade pública de transporte individual de passageiros deverão ser organizados, disciplinados e fiscalizados pelo poder público municipal, assim como a Lei nº 12.468/2011, a qual regulamenta a profissão de taxista e assim a define, no seu art. 2o, como
sendo a atividade destinada aos que utilizam veículo automotor, próprio ou de terceiros, para o transporte público individual remunerado de passageiros, cuja capacidade será de, no máximo, 7 (sete) passageiros. Analisa-se, portanto, que a Uber não se trata de serviço de táxi, por este ser considerado um transporte individual de passageiros na sua modalidade dita pública e que, por ter essa natureza, goza de acesso privilegiado e exclusivo a algumas das designadas infraestruturas de mobilidade urbana, como os lugares ou espaços de estacionamento públicos, pontos de embarque de passageiros, segundo parecer de Canotilho (2015, p. 17, online). Assim sendo, a Uber se caracteriza como modelo privado de transporte individual, ou seja, atividade econômica privada.
Logo, o serviço da Uber se trata de um transporte pago, ou seja, de acordo com o que preceitua Gomes (2009), a onerosidade do contrato de transporte é de sua essência, já que o serviço de transporte se configura como atividade econômica de fim lucrativo. Diante disso, não é possível conceder sua prestação gratuita. Porém, mesmo que isso ocorra, ainda assim, configura-se o contrato, mas a responsabilidade do transportador obedece à regra diversa, entendendo-se que, em caso de dano, a presunção de culpa é apenas juris tantum.
Em São Paulo, o serviço prestado pela Uber, ainda não foi definitivamente regulamentado mesmo com a existência do Projeto de Lei Ordinária nº 349/2014 e o Decreto nº 56.981 de 10 de maio de 2016, já divulgados em diário oficial. Segundo a Secretaria Executiva de Comunicação da Prefeitura de São Paulo (2016, Site Oficial da Prefeitura do Estado de São Paulo Capital), o objetivo central do decreto anteriormente citado é a regulamentação de três novas atividades de compartilhamento de veículos e o uso intensivo nas vias urbanas, em outras palavras, o transporte individual remunerado de passageiros de utilidade pública, tais como as empresas especializadas nestes serviços: Easy, Cabify, Uber, 99, bem como a carona solidária e o de compartilhamento de automóveis sem condutor, tendo como exemplos, a Bla Bla Car e a Zaz Car respectivamente.
Para as empresas de transporte individual remunerado de passageiros, o qual é a categoria da Uber, o decreto determina que as prestadoras deste serviço deverão ser credenciadas como Operadoras de Tecnologia de Transporte Credenciadas (OTTCs), tendo que utilizar créditos, em quilômetros, para operarem, bem como dentre outras normas a serem seguidas.
Ademais, destaca-se ainda que se encontram diversos entraves que precisam ser resolvidos para proporcionar a zona de equilíbrio entre as categorias de taxis e as empresas como a Uber.
Diante de tal cenário, aufere-se que o serviço da Uber em Fortaleza ainda não se encontra regulamentado. Porém, existe um Projeto de Lei Ordinária nº 112/2016, de autoria do vereador Antonio Ronivaldo da Silva Maia (PT), o qual dispõe sobre a operação, administração ou uso de software aplicativo destinado à oferta, contratação ou intermediação de serviço de transporte por meio da remuneração de passageiros no âmbito do município de Fortaleza e sua localização atual é na Comissão de Constituição, Justiça e Legislação Participativa da referida Câmara Municipal, aguardando parecer do relator desde data do dia 09 de maio de 2016.
Vale salientar, de acordo com Varela (2016, Jornal O Povo Online), que o vereador Ronivaldo Maia (PT), proponente do projeto, argumenta que o texto não propõe a proibição total do serviço, mas sim a criação de critérios mínimos de qualificação para os motoristas do aplicativo, ou seja, precisa se submeter a um
desenho institucional, exigindo, portanto, critérios mínimos para serem cumpridos pelo motorista que irá transportar passageiros. Ainda ressalta que os veículos e motoristas sejam cadastrados e recebam autorizações pela Prefeitura de Fortaleza, havendo conexão das informações da operadora ou administradora do software com os órgãos de fiscalização.
Em consonância com o raciocínio desenvolvido anteriormente, no serviço prestado pela Uber em Fortaleza, enfatiza-se que está também prevista a obrigação de segurança e incolumidade no transporte, conforme art. 734 do Código Civil de 2002, o qual preceitua que o transportador responde pelos danos causados às
pessoas transportadas e suas bagagens, salvo motivo de força maior, sendo nula qualquer cláusula excludente da responsabilidade. Logo, conforme parecer Canotilho (2015, p.29, online): “O “sistema Uber” consiste numa actividade privada de prestação de serviços, com utilidade pública baseada na interconexão tecnológica de utilizadores, através da utilização de meios típicos da informática (Internet). O contrato que os utilizadores celebram com o “sistema Uber” é igualmente um contrato de direito privado (civil).”
Portanto, o passageiro, ao solicitar o serviço da Uber, o contrato é firmado pelo aplicativo da empresa e o pagamento é realizado por meio de cartão de crédito, sendo a cobrança realizada no nome da Uber. Assim sendo, denota-se que, além do motorista, o passageiro também pode exigir que a Uber repare os prejuízos sofridos por meio de indenização. Diante disso, percebe-se que o passageiro pode responsabilizar o transportador, no caso, a Uber, de forma objetiva, com fundamento no risco, inerente à atividade empresarial, por se tratar de uma relação de consumo, nos termos do art. 14 do Código de Defesa do Consumidor, bem como poderá responsabilizar o motorista de forma subjetiva, com fundamento na culpa, prevista no art. 14, §4º do Código de Defesa do Consumidor.
Conclusão
Diante do que já foi exposto, denota-se que o sistema da Uber é configurado como atividade econômica privada de transporte individual de passageiros, sendo desenvolvida por meio de aplicativo no smartphone. Trata-se, portanto, segundo parecer de Canotilho (2015, p. 25, online),de um contrato civil (privado) de transporte celebrado entre o consumidor e o transportador, donde se pode concluir que está sujeito à todas as regras atinentes previstas no Código Civil e Código de Defesa do Consumidor.
Vale destacar que diz respeito a uma relação inovadora por existir um intermediário tecnologicamente interativo que facilita a celebração daquele contrato e a respectiva execução, com o fito de auxiliar, ao mesmo tempo, os dois sujeitos anteriormente mencionados.
Logo é possível afirmar que caberá indenização quando houver comprovação de prejuízo ao consumidor ou utilizador do serviço, o qual poderá responsabilizar objetivamente a sociedade empresária responsável pelo
Uber em face do risco e, de forma subjetiva, o motorista, com fundamento na culpa.
Por fim, o estudo, ainda em fase inicial, apresenta resultados parciais que já são suficientes para trazer à cena jurídica a reflexão, bem como contribuir para ampliar a pesquisa na área em que se insere.
Referências
CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Parecer Uber. Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, 26 out. 2015. Disponível em:< http://s.conjur.com.br/dl/parecer-canotilho-uber.pdf>. Acesso em: 17 ago. 2016. CARVALHO, Maria Cecília Maringoni de. Construindo o saber – Metodologia científica: Fundamentos e técnicas. 11.ed. Campinas, SP: Papirus, 2001.
COMUNICAÇÃO, Secretaria Executiva de. Decreto municipal regulamenta transporte individual de
passageiros. Site Oficial da Prefeitura do Estado de São Paulo Capital. 10 de maio de 2016. Disponível em:
<http://www.capital.sp.gov.br/portal/noticia/10873#ad-image-0>. Acesso em: 18 de ago. 2016. GOMES, Orlando. Contratos. 26. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2009.
GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade Civil. 9. ed. São Paulo: Saraiva, 2005.
VARELA, Átila. Projeto trata de regulamentação do aplicativo Uber em Fortaleza. Jornal O Povo Online. Fortaleza, 30 de abril de 2016. Disponível em: <http://www.opovo.com.br/app/opovo/economia/2016/04/30/noticias jornaleconomia,3609299/projeto-trata-de-regulamentacao-do-aplicativo-uber-em-fortaleza.shtml>.Acesso em: 14 ago. 2016.
Agradecimentos
Os agradecimentos pela realização desse trabalho são dirigidos à Universidade de Fortaleza pelo incentivo ao exercício da pesquisa e às Professoras Roberta Teles Bezerra e Isabela Fares pela disponibilidade, orientação e acompanhamento na produção da referida atividade acadêmica.