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PROCEDIMENTOS PARA PESQUISA COM JOGOS TRADICIONAIS INDÍGENAS

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Academic year: 2021

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PROCEDIMENTOS PARA PESQUISA COM JOGOS TRADICIONAIS INDÍGENAS

Marina Vinha/UCDB marinavinha@terra.com.br Mestrado em Educação/Linha 3 – diversidade cultural e educação indígena

Grupo de Estudo - Práticas Corporais e Cultura/Curso de Educação Física/UCDB/CNPq Grupo de Pesquisa - Educação e Interculturalidade/Linha 3/UCDB/CNPq Apoio Financeiro UCDB/MS Resumo

Este texto trata dos jogos tradicionais e tem como objetivo argumentar sobre a compreensão do jogo em etnias indígenas indicando modos de registrá-los na pesquisa com grupos étnicos. A motivação por esse objeto de estudo vem do reconhecimento de que pouco se faz para atender o Art. 217 da Constituição brasileira de 1988, a qual afirma ser dever do Estado proteger, resgatar, registrar e divulgar as manifestações culturais de caráter esportivo que se vinculam às nossas raízes etno-históricas. Os resultados esperados por um estudo dessa natureza visam fortalecer esse preceito constitucional e refletir sobre os procedimentos de contextualização dos mesmos diante da cultura, das diferenças e das representações sociais de cada grupo étnico.

Introdução

“Certamente encontraremos professores que utilizam as palavras jogo, brinquedo e brincadeira como sinônimos”, afirmam Bertoldo e Ruschel (2008). Quase tudo é brincadeira. Algumas brincadeiras são jogos. O que são brincadeiras, brinquedos e jogos? Como registrar o jogo sob valores de determinada cultura?

Na busca de respostas para as perguntas, foi elaborado o presente texto para fundamentar o Seminário Introdutório/CONCOCE (2008) “procedimentos para pesquisa com jogos tradicionais indígenas”. O objetivo é o de argumentar sobre a compreensão de jogo tradicional indígena, indicando modos de registrá-los na pesquisa com grupos étnicos.

A motivação por esse objeto de estudo vem do reconhecimento de que pouco se faz para atender o Art. 217 da Constituição brasileira de 1988, a qual afirma ser dever do Estado proteger, resgatar, registrar e divulgar as manifestações culturais de caráter esportivo que se vinculem as nossas raízes etno-históricas.

Os resultados esperados por um estudo dessa natureza vêm fortalecer esse preceito constitucional, que mereceu uma publicação pelo Instituto Nacional de Desenvolvimento do Desporto (INDESP), em 1996, com o título “esporte com identidade nacional” (BRASIL, 1996). Os temas desenvolvidos trataram do “esporte de criação nacional”, conforme Art. 217, mas já observando que na simplicidade da expressão há o entendimento de uma relação de jogos elaborados no espaço geográfico chamado Brasil. No entanto, mesmo sendo sugerido um ‘banco de dados’ para registrar todos os jogos e esportes nascidos no país, fica a inquietude de como fazer com aquelas atividades criadas em culturas estrangeiras e aqui introjetadas através das relações de contato.

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Frente a um problema epistemológico, conceitual, foi necessário fazer um detalhamento da referida expressão constitucional separando o termo “esporte” do termo “criação nacional”. Em que pese tais considerações, este estudo não prioriza a busca da origem dos jogos por entender que os mesmos são “sem fronteiras”, conforme Renson e Smulders (1981).

“Esporte” pode ser entendido segundo dados introdutórios da publicação INDESP, como jogo, brincadeira, dança, ritual dentre outros. Mas ao ser adjetivado com “criação nacional” pode ser remetido à ‘criação cultural’ ou à ‘identidade cultural’ (BRASIL, 1996).

Nesse amplo contexto da cultura e da identidade, cuja natureza é de ambigüidades por tratar das diferenças, é que problematizamos o tema em estudo. A metodologia adotada para a escrita do artigo e para elaboração do ‘seminário introdutório’ foi: referência bibliográfica sobre os temas e a experiência com esse tipo de estudo adquirida com a empiria, realizada entre os indígenas Kadiwéu e os Guarani e Kaiowá, ambos vivendo no Estado de Mato Grosso do Sul, sendo o primeiro grupo da região do pantanal e o segundo da região da Grande Dourados (VINHA, 2004).

Os resultados esperados são primeiramente que acadêmicos e profissionais de Educação Física apreendam a problemática de caráter constitucional e, ao adotarem as propostas metodológicas as ampliem sempre visando compreender os jogos tradicionais não somente em suas estruturas organizacionais, mas em seus contextos sócio-culturais, considerando-os acervo do patrimônio imaterial de grupos étnicos (GALLOIS, 2006).

Brincadeira, Brinquedo e Jogo

Brincar seria fazer algo, entreter-se, divertir-se com um objeto, com a imaginação ou uma atividade qualquer, menear, tamborilar, mexer em algo distraidamente ou compulsoriamente, dentre outras compreensões trazidas por Houaiss (2007). Brinquedo seria o suporte do brincar, algo que serve para brincar. Brincadeira e brincar vêm do antepositivo brinc, derivado de brinco, do latim vinculüm significando liame, laço, atadura. Outros termos derivam desse antepositivo como: embrincar, brinquete, brinquinharia, dentre outras expressões poucos comuns.

Jogo, segundo o mesmo dicionário, pode ser uma designação genérica de certas atividades cuja natureza é recreativa, remetendo também à compreensão de brincadeira. Em outro sentido, pode ser atividade que submete quem a faz a regras que estabelece quem vence ou quem perde comparando o desempenho em competição física, mental ou por sorte, com participantes que disputam por premiações ou por prazer, dentre outras compreensões. O jogo é um tema bastante estudado em várias áreas do conhecimento, no entanto, neste estudo o recorte metodológico é direcionado para o contexto sócio-cultural por entendermos os jogos impregnados de valores culturais e de criações do mundo material e imaterial das sociedades.

Jogo Popular

Criados pelos diferentes povos, difundidos através do contato e re-significados com as transformações das civilizações e das sociedades, os jogos fazem parte da riqueza da ludodiversidade, termo adotado de Renson e Smulders (1981) significando o patrimônio cultural da humanidade na particularidade do lúdico. Em analogia com a biodiversidade e os processos de extinção das formas de vida da flora e fauna; a ludodiversidade trata das manifestações lúdicas em diferentes sociedades, também sob risco de extinção.

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A compreensão de jogo popular é de que podem marcar uma sociedade ou um grupo, sendo transmitido de geração a geração, pela família, por amigos, repassado nas ruas, nos clubes, nas moradias, podendo ser originado em diferentes povos e praticado em diferentes sociedades ou grupos sem vínculos com as especificidades de cada sociedade (ROCHA FERREIRA et al, 2005).

Jogos Tradicionais Indígenas

Um dos mais expressivos estudos sobre jogos tradicionais indígenas na América do Norte foi o de Culin (1975, p. 32, apud ROCHA FERRREIRA, 2005, p. 2), publicado em 1907 e republicado em 1975. Nos seus estudos, o autor conclui que “por trás das cerimônias e jogos existiram mitos dos quais ambos derivaram seus impulsos”. Referências a jogos são comuns na origem dos mitos em vários povos. Eles usualmente consistem na descrição de uma série de contextos nos quais a entidade representada por uma força sobre-humana ganha do oponente, um ser humano, pelo exercício de uma astúcia superior, habilidade ou magia. Muitos desses jogos são apresentados cerimonialmente para agradar aos deuses com o objetivo de obter fertilidade, trazer chuva, para gerar vida longa, expelir demônios ou curar doenças.

Tendo como subsídios outras pesquisas realizadas no Laboratório de Antropologia Bio-cultural, vinculado ao Depto de Estudos da Atividade Física Adaptada, da Faculdade de Educação Física (DEAFA-FEF), na UNICAMP e também publicações sobre o tema, Rocha Ferreira et al (2005) propôs a seguinte definição sobre jogos tradicionais indígenas:

Atividades corporais, com características lúdicas, por onde permeiam os mitos, os valores culturais e que, portanto, congregam em si o mundo material e imaterial, de cada etnia. Os jogos requerem um aprendizado específico de habilidades motoras, estratégias e/ou sorte. Geralmente, são jogados cerimonialmente, em rituais, para agradar a um ser sobrenatural e/ou para obter fertilidade, chuva, alimentos, saúde, condicionamento físico, sucesso na guerra, entre outros. Visam, também, a preparação do jovem para a vida adulta, a socialização, a cooperação e/ou a formação de guerreiros. Os jogos ocorrem em períodos e locais determinados, as regras são dinamicamente estabelecidas, não há geralmente limite de idade para os jogadores, não existem necessariamente ganhadores/perdedores e nem requerem premiação, exceto prestígio; a participação em si está carregada de significados e promove experiências que são incorporadas pelo grupo e pelo indivíduo.

O processo de transformação das sociedades indígenas ao longo do tempo, advindo do contato interétnico, do processo de colonização européia a partir do século XVI, do processo de urbanização que adentram muitas das aldeias, das religiões que penetram na organização de muitas etnias, dentre outros fatores que influenciaram o modo de vida e simultaneamente os jogos tradicionais, alguns jogos se mantiveram, outros entraram em desuso e outros ainda, foram esvaziados do sentido sócio-cultural.

Durante muitos anos, pouco se ouviu falar dos jogos tradicionais indígenas no país, a não ser na população próxima às aldeias e mesmo pouco se estudou sobre os mesmos. No quadro a seguir são apontados os elementos estruturantes da forma de jogar tanto popular quanto tradicional. As diferenças vêm com a compreensão de patrimônio cultural imaterial de cada etnia, a ser desenvolvido no decorrer do Simpósio Introdutório.

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Quadro 1. Propriedades estruturais dos jogos populares e tradicionais, segundo Dunning (1997 apud ROCHA FERREIRA, 2002)

JOGOS TRADICIONAIS Difusão e organização informal implícita na cultura local. Normas simples e orais, legitimadas pela tradição.

Padrões dos jogos maleáveis, tendência para mudar a longo e médio prazo e do ponto de vista dos participantes são quase imperceptíveis as quebras (cortes). Variações regionais de normas, de tamanho e formas das bolas, etc.

Limites não fixos de território, de duração ou do número de participantes. Influência forte de diferenças naturais e sociais no padrão do jogo.

Papel baixo de diferenciação na divisão dos papéis dos jogadores durante o jogo. Distinção mais solta entre jogar e papéis esperados.

Diferenciação estrutural menos delimitada, sem especialização dos movimentos padronizados.

Controle social informal pelos jogadores mesmo dentro do contexto do jogo. Nível alto de tolerância física socialmente, emoções espontâneas.

Geração numa forma espontânea e aberta de prazer de excitamento nos jogos. Ênfase na força física como oposta à habilidade.

Pressão forte da comunidade para participar, identidade subordinada à identidade de grupos, teste de identidade em geral.

Contexto local significativo e igualdade relativa de habilidades dos jogadores entre os lados, não têm chances de reputação nacional ou de pagamento financeiro.

Referências

BERTOLDO, J. V. e RUSCHEL, M. A. de M. Jogo, brinquedo e brincadeira - uma revisão conceitual. Laboratório de brinquedos e jogos. Obtido em:

http://www.labrinjo.ufc.br/artigos%20e%20textos/artigo_006.pdf. acesso em 20/agosto/2008. BRASIL. Esporte com Identidade Cultural: Coletânea. In: Instituto Nacional de

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CULIN, S. Games of the North American Indians. New York: Dover Publications, 1975. DUNNING, E. Football in the civilizing process. In: ANAIS do V Encontro de História do Esporte, Lazer e Educação Física. As ciências sociais e a história do esporte, lazer e educação física. Maceió/Alagoas,1997.

GALLOIS, D. T. Patrimônio Cultural Imaterial. e Povos Indígenas. IEPÉ. 2006

RENSON, R. & SMULDERS, H. Research methods and development of he Flemish Folk Games File. International Review of Sport Sociology, 16 (1),1981.

ROCHA FERREIRA, M.B et al. Jogos Tradicionais Indígenas. In: Raízes. Atlas do Esporte no Brasil. Org. Lamartine Pereira da Costa, Rio de Janeiro: Editora Shape, 2005, p.35-36. ROCHA FERREIRA, M.B. Cultura corporal: jogos tradicionais e esporte em terras indígenas. VIII Congresso Brasileiro de História da Educação Física, Esporte, Lazer e Dança. (CDRom). Ponta Grossa/PR: Monferrer Produções, 2002.

VINHA, M. Corpo-Sujeito Kadiwéu: jogo e esporte. 2004. 261fs. Tese

(Doutorado/Educação Física) – Faculdade de Educação Física, Universidade Estadual de Campinas, Campinas.

Referências

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