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Felipe Miranda e Rodolfo Amstalden

Felipe Miranda e Rodolfo Amstalden

São Paulo, 2016

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Capa e Ilustrações - Marcelo Torres Projeto Gráfico - Renata Torres

Diagramação - Guilherme Montanari

Revisão: Daniela Piccoli, Frederico Rosas e Renato Torelli

marcelodgt@gmail.com 

© 2016 Empiricus Consultoria e Negócios Ltda. Todos os direitos reservados

Rua Joaquim Floriano, 913 4º andar – 04534-013 Itaim Bibi – São Paulo/SP

www.empiricus.com.br 

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

Miranda, Felipe

Contra o financismo : o método mais prático e eficiente para investir em ações / Felipe Miranda e Rodolfo Amstalden. -- 1. ed. -- São Paulo : Empiricus, 2016.

  Bibliografia.

ISBN 978-85-92581-01-5

1. Ações (Finanças) 2. Bolsa de valores

3. Finanças pessoais 4. Investimentos 5. Mercado de ações 6. Mercado de capitais I. Amstalden, Rodolfo. II. Título.

16-06800 CDD-332.6

Índices para catálogo sistemático:

1. Mercado financeiro e de capitais : Economia 332.6

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Prefácio ... 09

Introdução ... 19

I. Quer investir em valor?... 33

II. As armadilhas de valor ...59

III. Crítica da razão pura... 79

IV. Buffett vale mais ...95

 V. Um pouco de muito risco ... 107

 VI. Opcionalidades ... 121

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.9.

P

reFáCio

Por Caio Mesquita CEO da Empiricus Caro leitor,

 Você tem em mãos um título contrário ao “Financismo”.

Provavelmente nunca ouviu tal expressão, mas pode deduzir seu signifi-cado com o empurrãozinho semântico aqui prefaciado por mim, a pedido do Felipe e do Rodolfo.

 A Empiricus cunha o Financismo como um conjunto de hábitos poten-cialmente nocivos ao bolso do investidor. Não é coincidência que o termo soe estranho, pois ele pretende provocar a estranheza.

Os financistas promovem uma complexidade – desnecessária, é claro – da linguagem, sempre falando difícil o que poderia ter sido dito de maneira fá-cil. Trata-se de um artifício retórico para tentar distanciar as pessoas normais (advogados, engenheiros, médicos etc.) das pessoas financistas, atribuindo a essas últimas um monopólio do conhecimento lucrativo.

Como advogado, engenheiro ou médico, você lida diariamente com te-mas tão complexos quanto uma conciliação de norte-mas e jurisprudências an-tagônicas, o dimensionamento estrutural de uma ponte de concreto armado ou o perfil epidemiológico de pacientes com meningioma cerebral.

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.10.

Por que você não conseguiria entender sobre o funcionamento de um título público que protege contra a inflação ou sobre o fluxo de caixa de uma empresa que distribui dividendos regularmente?

Se você dirige uma dúvida objetiva a um financista – por exemplo, vale a pena comprar dólares agora? – e recebe uma resposta confusa, ininteligível, esteja certo de que a culpa mora do lado financista do balcão.

Eu, Felipe, Rodolfo ou qualquer analista da Empiricus jamais saberemos responder se o dólar vai subir ou vai cair. Mas nos sentimos confortáveis em analisar se vale a pena comprar dólares ou reais agora, com a máxima clareza possível.

Fingem-se iguais, mas são óticas bem diferentes.

Prever o futuro (vai subir ou vai cair) nada tem a ver com a nobre tarefa de pesar vários tipos de futuro (vale a pena?). Prever o futuro é uma ambição impossível. Pesar vários futuros é um exercício útil.

O Financismo ambiciona prever o futuro, mas só consegue prever o pas-sado – aquele mesmo paspas-sado que não vale nada, pois já aconteceu.

Quando, em meados de 2014, nosso estrategista Felipe Miranda temia uma potencial recessão de -3% para 2015, o consenso de mercado unia-se em torno de +1% de crescimento. A realidade se provou ainda mais dura que o temor do Felipe, e atropelou completamente o consenso de mercado, marcando retração de -4%. O episódio referendou nossa tese metafórica de O Fim do Brasil e, mais importante, referendou dicas de investimento que geraram milhões de reais em valor para nossos leitores.

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.11.

Como conseguimos atingir esse alto grau de verossimilhança num mo-mento em que o futuro desafiava radicalmente o passado? Lendo aquilo que o Financismo não lia, estudando aquilo que o Financismo não estudava, falando aquilo que os advogados, engenheiros e médicos poderiam compre-ender facilmente.

Miramos o ideal de John Maynard Keynes – o principal economista do século XX –, que preconizava: “Quando nós, economistas, conseguirmos construir nosso raciocínio como pessoas humildes e competentes, no mes-mo nível dos dentistas, estaremes-mos numa situação esplêndida”.

Como se referenciar pelo ethos profissional do dentista? Trabalhando num ritmo oposto ao do consenso pasteurizado de mercado, que não cabe em plani-lhas de excel. Viajamos pelo país, visitamos fábricas, conversamos com concor-rentes, sentimos o cheiro do mérito ou do embuste nos discursos corporativos.

Para analisar a realidade, precisamos experimentá-la de inúmeras manei-ras, em um exercício multissensorial que o financista mediano já abandonou faz tempo. Precisamos mergulhar naquilo que não nos pertence. A planilha de excel, portanto, não basta, pois só preenchemos as células com aquilo que já sabemos, ou calculamos saber.

Ouço dizerem: “é impossível bater o mercado”! Gênios como Warren Buffett ou George Soros seriam meras excrescências estatísticas. Mas como o financista sabe dessa impossibilidade, se ele sequer tentou bater o mercado?

O mercado – para o Financismo – é o último dos adversários. Frequentemen -te, o financista nem chega a alcançá-lo, parando em outros obstáculos imediatos.

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Para na já citada metodologia rasa das planilhas, para nos interesses co-merciais do banco no qual trabalha ou nas ordens frenéticas da corretagem que remunera seu trabalho. Desimpedido, poderia seguir em frente. Travado, desiste e adere ao conforto de uma remuneração por soma zero, em que o cliente perde enquanto ele ganha.

Lembro-me de um gestor profissional conversando com o Felipe sobre os desafios de montar e acompanhar a Carteira Empiricus. “Felipe, como é brigar noite e dia contra o CDI? Muito estressante?”

Pergunta aparentemente absurda, pois seria exatamente essa a briga desig-nada, por vocação, ao próprio gestor – o qual retrucou: “Eu não brigo contra o CDI. Brigo contra a administradora do meu fundo, contra os cotistas, contra o 2/20, contra a ANBIMA e contra a CVM. Quando chego no CDI, lá no fim da fila, já estou exausto”.

 Ao se perceber uma vítima do Financismo, o profissional da Faria Lima tem duas escolhas: conformar-se ou trabalhar como um louco para comprar sua alforria o quanto antes. Via de regra, não são escolhas mutuamente ex-cludentes, e o preço da alforria sobe a cada dia, ajustado pelo CDI.

Posso afirmar pois fui eu mesmo, certa vez, a vítima dessa mesma dita-dura financista. Trabalhei em bancos internacionais – aqui, na Europa, em Nova York –, onde conheci a arrogância e a incompetência que tanto nos distanciam dos nobres dentistas.

Em 2009, mastigando disso tudo, tivemos uma cárie e fundamos a Empiricus.

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.13.

O que significa “Empiricus”? – de certo, não é uma alcunha comum. Nossa marca é inspirada em Sextus Empiricus, filósofo grego conhecido como o pai do Ceticismo.

Cético – como bem definiu Oscar Wilde – é o homem que conhece o preço de tudo, e não conhece o valor de nada.

Bem antes de Oscar Wilde ou de David Hume, Sextus já pregava a suspen -são das crenças absolutas e alertava para as ameaças do raciocínio por indução, que se presta a tirar conclusões gerais a partir de observações particulares.

Seu pensar era bem mais simples.

Deparando-se com razões ou sentimentos de ordem X, Sextus limitava-se a afirmar, numa postura humilde em relação à realidade: “parece-me, neste momento, que isso significa X”. Portanto, sem que tal afirmação despertasse a ânsia de uma definição completa e imutável do mundo exterior.

Sextus não teria problema algum em provocar sua audiência com um discurso destrutivo de O Fim do Brasil para então – tempos depois – repro- vocá-la por meio de uma tese construtiva de Contragolpe.

“Eu sei que o mel que eu provo tem um gosto doce” – ele dizia. “Mas sei também que esse adocicado talvez não me explique nada sobre as verdadeiras propriedades do mel”.

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.14.

Quais são as verdadeiras propriedades de um título público? A política fiscal por trás do déficit primário? O Estado de mal-estar social?

Quais são as verdadeiras propriedades de uma ação? A empresa por trás da ação? Os investidores que insistem, dia a dia, em comprá-la e vendê-la?

Quais são as verdadeiras propriedades de um fundo imobiliário? Metros quadrados, nível de vacância, liquidez restrita?

Quais são as verdadeiras propriedades do câmbio? Termos de troca das com-modities, intervenção via swaps do Banco Central, quantitative easing do Fed?

Todas as respostas, parciais, são negativas e afirmativas em diferentes proporções.

Diante de tantos salgados, amargos e azedos do mel financeiro, devemos servir um banquete completo para os deuses do mercado, resistindo à tenta-ção de pular direto para a sobremesa e pedir a conta.

Se tais e tais coisas acontecerem (ninguém sabe se acontecerão), quanto poderemos ganhar? E quanto poderemos perder? Esse é o único raciocínio legítimo para um analista que não queira se meter a prever o futuro.

O Financismo, entretanto, impede que as humildes sugestões de Sextus Empiricus sejam levadas a cabo dentro das instituições financeiras. Analistas de bancos e corretoras precisam saber exatamente o que acontecerá e não podem se dar ao luxo de perder, nem mesmo por mera hipótese.

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.15.

Sem meio termo, ou eles partem de premissas utopicamente racionais ou de premissas descaradamente comerciais.

Não é à toa que o Financismo produz estudos e recomendações que inte-ressam apenas aos financistas, e a ninguém mais.

No utopicamente racional, vale a briga infantil entre as melhores pro-jeções de inflação, câmbio, Ebitda e lucro – sem qualquer apelo prático.  Aquilo que Deirdre McCloskey ilustrou como “boys playing games in their

sandbox”. Garotos entretidos pela construção de castelos de areia, valoran -do-os como castelos de verdade.

No descaradamente comercial, ganha o analista que mais gerar dinheiro para os deals do banco: empréstimos-ponte, aberturas de capital, advisory para fusões & aquisições. Quem ganha é o banco e, depois, o analista. Não ganha o dentista.

Com a Empiricus – e com este livro, em particular – brigamos pela defi -nição de um novo tipo de financista. Aquele que é dentista cinco dias por semana e também sabe cuidar de seus investimentos. Aquele que entende quando ouve de finanças e se faz entender quando fala de finanças.

Miramos um novo tipo de financista. Como chegaremos lá? Contando histórias.

Contadores de histórias que são, Felipe e Rodolfo dedicam boa parte do livro a narrativas pessoais e coletivas que tocam em diversos campos do saber (e do não saber). Aproximam, assim, a experiência de aprender sobre investimentos à experiência cotidiana.

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Temos que dançar dançando, e investir investindo. Não existe fórmula

Temos que dançar dançando, e investir investindo. Não existe fórmula

mágica, robôs, algoritmos ou guias definitivos para o seu bolso. Pare de

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procurar por essas soluções externas e comece a experimentar você mesmo.

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 As próximas páginas não vão prepará-lo para se tornar um investidor de

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sucesso, do quilate de

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-riam prometer isso, pois Buffett ou Soros amparam-se, principalmente, em

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conhecimento tácito.

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 Veja eja só só o o que que Buffett Buffett disse disse aos aos sócios sócios da da Ambev Ambev quando quando questionadoquestionado

sobre tomada de decisão de investimento: “Em todas as ações e empresas

sobre tomada de decisão de investimento: “Em todas as ações e empresas

que investi, tomei a decisão em menos de dois minutos. Gosto de olhar no

que investi, tomei a decisão em menos de dois minutos. Gosto de olhar no

olho de quem toca o negócio e ver se ele é fan

olho de quem toca o negócio e ver se ele é fanático, se se preocupa com seusático, se se preocupa com seus

clientes e se sente mal quando algum (cliente) é mal atendido’’.

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s-so que nos interessa: cumprir necessidades e satisfazer vontades financeiras,

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suas e de sua família, ao longo de todo o seu ciclo de vida.

suas e de sua família, ao longo de todo o seu ciclo de vida.

Indo contra o Financismo, Felipe e Rodolfo falam de um método

Indo contra o Financismo, Felipe e Rodolfo falam de um método

práti-co e eficiente para investir em ações. O que esperar ao final da leitura? Sem

co e eficiente para investir em ações. O que esperar ao final da leitura? Sem

spoilers, você vai aprender sobre Kafka, Tales de Mileto, Gilmar Fubá e o

spoilers, você vai aprender sobre Kafka, Tales de Mileto, Gilmar Fubá e o

tutu de feijã

tutu de feijão da Solange. Vo da Solange. Vai entender tambai entender também como pensam Nasém como pensam Nassim Tsim Taleb,aleb,

Harry Markowitz, Benjamin Graham e

Harry Markowitz, Benjamin Graham e Daniel Kahneman.Daniel Kahneman.

É como querer financiar o que há de bom.

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ntrodução

“Querido Pai,

Tu me perguntaste recentemente por que afirmo ter medo de ti. Eu não soube, como de costume, o que te responder, em parte justa-  mente pelo medo que tenho de ti, em parte porque existem tantos detalhes na justificativa desse medo, que eu não poderia reuni-los no ato de falar de modo mais ou menos coerente. E se procuro re-  sponder-te aqui por escrito, não deixará de ser de modo incompleto,  porque também no ato de escrever o medo e suas consequências me atrapalham diante de ti e porque a grandeza do tema ultrapassa de

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 Apesar de começar assim, este livro pouco tem de kafkiano. Ele não traz nenhuma ideia repressiva ou surreal. Tampouco simboliza um acerto de contas com a figura paterna. Há outros motivos envolvidos desde o início.

Essas linhas primeiras, extraídas da Carta ao Pai de Kafka, são uma ho-menagem amorosa aos nossos pais, mestres e a todos aqueles que, de alguma forma, exerceram ascendência intelectual sobre os autores. Obrigado, nós amamos vocês.

Para além dessa gratidão pessoal, o trecho foi escolhido visando rebater o fato estilizado – antigo e autoritário – de que só o especialista em Admi -nistração ou Ciências Econômicas pode fazer bons investimentos. Aceitar esse clichê é compactuar com uma limitação intelectual cujos danos à saúde (financeira) são irreversíveis.

 Ao longo dos próximos capítulos, você perceberá que os autores têm uma ideia fixa na cabeça: seguindo lições simples, o leigo pode se sair inclusive melhor do que o profissional financeiro. Usando sua própria inteligência, o advogado, engenheiro ou médico está habilitado a bater as recomendações do gerente de banco, inclusive por larga margem.

Como bem nos ensinou o investidor Guimarães Rosa, o que esta vida quer da gente é coragem. Enfrentaremos corajosamente o estereótipo do financista sabe-tudo, amparados na certeza de que uma mudança tan-gível na forma de tratar seus investimentos poderá alçá-lo a uma nova compreensão do que é rentabilidade.

Estamos propondo algo essencial: livrar-se da necessidade de estar 100% certo nas teses de investimento. Em vez dessa massagem ao ego,

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privilegiamos o foco total em ganhar dinheiro – seja nos campos filosó -fico, teórico ou prático.

Não somos mais crianças a ponto de saber tudo. Abandonamos lá atrás a obsessão por se estar sempre corretos, vencendo a discussão. Agora temos um objetivo adulto: fazer nossos leitores mais ricos.

 Se você é daqueles que se preocupam com os melhores racionais e os mais sofisticados métodos de investimento, então precisará entrar na fila do diploma de PhD. Antes que perca tempo e dinheiro com cursos platônicos, precisamos lhe dizer que não vai adiantar.

Praticamente todos os modelos financeiros são simplificações grosseiras da realidade. E a realidade das ações é também a realidade das empresas – que, por sua vez, carregam uma complexidade muito grande para caber em planilhas de Excel. Fenômenos sociais não podem ser reduzidos a cartilhas econômicas. Ao tentar fazê-lo, não estamos apenas simplificando a realida-de, mas distorcendo o mundo, naquilo que a linguagem técnica batizou de “não-ergodicidade”. Distorções de interpretação nos investimentos têm um corolário imediato: prejuízo.

 Já se você tem uma outra motivação – em vez de estar certo, quer sim-plesmente ganhar dinheiro – então pode abrir mão de ser um PhD. Você reconhece a impossibilidade de entender a realidade e tentar adivinhar o futuro. O ininteligível não significa o “não inteligente”. Em vez de procurar entender o mundo e fazê-lo caber em poucas linhas de uma planilha, passe a aproveitar o quanto não conhece. Em vez de brigar contra sua ignorância, beneficie-se dela. Do limão à caipirinha. Como viver num mundo que não entendemos? Essa é a tarefa, afinal.

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Gostaríamos de saber das coisas, mas não é assim que funciona. Lembra o Caetano em Cajuína ? “Existirmos, a que será que se destina?” Não sabe-mos, nem vamos saber. Ora, então por que tentamos entender cada nota de rodapé da realidade financeira, em vez de focarmos em beneficiar-nos da nossa ignorância e da incerteza que nos cerca?

Trazendo para a linguagem canônica de finanças, estamos propondo um instrumental mais moderno frente ao típico investimento em valor (value investing). Uma filosofia que permita ganhos formidáveis (e intuitivos) ao investidor leigo no longo prazo.

Que fique clara a mensagem: qualquer um pode se tornar milionário in- vestindo em ações. Não requer conhecimento elaborado em Finanças. Exige apenas assumir que você vai errar várias vezes. Estar equivocado faz parte do processo. Basta que perca pouco quando erra e ganhe muito ao acertar. Fazendo isso, um único acerto empurrará o agregado de sua carteira para o positivo. O resumo é esse.

Se você reparar na Carta ao Pai , Kafka assume que a grandeza do tema ultrapassa seu entendimento. Se o sujeito é incapaz de entender a relação com o próprio Pai, com quem esteve, até aquele momento, por 36 anos, como poderá compreender uma empresa ou uma ação? Não estamos aqui para entender. Estamos aqui para triunfar.

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 J

ogo de inFluênCias

 A organização (ou a falta dela) deste livro é curiosa. Reúne relatos pes-soais, casos reais, um pouco de filosofia e, mais importante, o objetivo de mostrar a capacidade de o leigo superar o profissional – falamos aqui espe -cificamente do caso financeiro, mas estamos um tanto convencidos à esta altura de que serviria para quase todas as disciplinas das Ciências Sociais.

Se você tem alma engenheira, não se preocupe, pois este é também um trabalho de algumas tecnicidades. Sob o ponto de vista técnico, estamos nos inspirando no conceito de “antifragilidade” tal como definido por Nassim Taleb. Trata-se, obviamente, de interpretação própria dos autores, de modo que nossas culpas serão sempre nossas, e de mais ninguém.

 Essa veia técnica absorve o conceito de Taleb e o relaciona diretamente ao investimento em ações e em demais ativos financeiros. Grosso modo, es-tamos afirmando que estratégias desenhadas sob uma abordagem antifrágil são – ao menos do ponto de vista filosófico – superiores àquelas do tradicio -nal investimento em valor ou a qualquer outro método manjado.

Mas o leitor distante do mundo de Finanças não precisa se preocupar com isso neste momento. Tudo será explicado em cenas dos próximos capítulos.

 Antes que sejamos bombardeados por milhares de e-mails das viúvas de  Warren Buffett e Benjamin Graham, cumpre esclarecer: não há absolutamen-te nada contra o value investing original. Ao contrário, achamos que essa abordagem funciona também. E já se provou historicamente adequada para carteiras de ações voltadas ao longo prazo.

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Somos, sim, e continuaremos sendo admiradores desses monstros sa -grados. Estamos defendendo apenas uma superioridade epistemológica na antifragilidade frente aos ensinamentos da Escola de Valor. Não precisa-mos ter medo dos nossos pais e mestres. Se quiserem, ainda assim, mandar e-mails em defesa de Buffett (como se ele precisasse), responderemos com prazer.

u

ma raiz FilosóFiCa

“É curioso como não sei dizer quem sou.

Quer dizer, sei-o bem, mas não posso dizer.

Sobretudo tenho medo de dizer

 porque no momento em que tento falar não só não exprimo o que sinto 

como o que sinto se transforma lentamente no que eu digo”.

(Clarice Lispector) 

Um bebê precisa ser capaz de catalogar os nutrientes do leite materno an-tes da amamentação? Ciclistas do Tour de France estudam noções cinéticas essenciais à Engenharia Mecânica?

 Veja bem, não é por que você não entende uma coisa que ela não existe. Há o conhecimento passível de narrativa/formalização e há o mais opaco. Com todo o perdão da palavra, eu, imitando a Clarice Lispector, sou um mis-tério para mim.

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Na Escola, misturávamos história antiga e mitologia grega, temperando

Na Escola, misturávamos história antiga e mitologia grega, temperando

a salada com dúvidas – algumas filosóficas – sobre o que era filosofia. Não

a salada com dúvidas – algumas filosóficas – sobre o que era filosofia. Não

sabia se o tal Aristóteles era Deus, semideus, herói ou humano.

sabia se o tal Aristóteles era Deus, semideus, herói ou humano.

Recente-mente fiquei feliz em saber que o sujeito pertencia à ultima categoria. Ele

mente fiquei feliz em saber que o sujeito pertencia à ultima categoria. Ele

também cometia seus erros. Se fosse herói, teria – como os outros – morrido

também cometia seus erros. Se fosse herói, teria – como os outros – morrido

de overdose.

de overdose.

Então deixe-me contar uma história rápida, causo real.

Então deixe-me contar uma história rápida, causo real.

Tales de Mileto, matemático e filósofo pré-socrático, embora dotado de

Tales de Mileto, matemático e filósofo pré-socrático, embora dotado de

competências mercantis razoáveis, vivia uma vida sem luxo. Por isso,

competências mercantis razoáveis, vivia uma vida sem luxo. Por isso,

enfren-tava com frequência críticas inspiradas no dito popular da época: “aqueles

tava com frequência críticas inspiradas no dito popular da época: “aqueles

que podem, fazem; os outros filosofam”. De tanto ouvir, Tales se cansou da

que podem, fazem; os outros filosofam”. De tanto ouvir, Tales se cansou da

turma do amendoim.

turma do amendoim.

Numa tentativa de demonstrar que sua opção pela filosofia derivava de

Numa tentativa de demonstrar que sua opção pela filosofia derivava de

interesse genuíno (e não da falta de alternativas), alugou todas as prensas de

interesse genuíno (e não da falta de alternativas), alugou todas as prensas de

olivas de Mileto e adjacências num momento supostamente adverso para

olivas de Mileto e adjacências num momento supostamente adverso para

a colheita. Para tanto, fez um pagamento antecipado muito barato (já que

a colheita. Para tanto, fez um pagamento antecipado muito barato (já que

tudo indicava colheita ruim), garantindo o aluguel futuro das prensas. As

tudo indicava colheita ruim), garantindo o aluguel futuro das prensas. As

condições climáticas mostraram-se profícuas e renderam uma colheita

condições climáticas mostraram-se profícuas e renderam uma colheita

alta-mente produtiva, fomentando a demanda por prensas e trazendo grandes

mente produtiva, fomentando a demanda por prensas e trazendo grandes

lucros para Tales.

lucros para Tales.

 Aristóteles interpretou essa

 Aristóteles interpretou essa história como história como uma demonstração uma demonstração da capaci-da

capaci-dade de Tales de antecipar condições climáticas favoráveis à colheita, graças

dade de Tales de antecipar condições climáticas favoráveis à colheita, graças

a seus conhecimentos de astrologia. Nessa leitura aristotélica, a razão do

a seus conhecimentos de astrologia. Nessa leitura aristotélica, a razão do

fi-lósofo teria sido a força por trás de seu enriquecimento. Não concordamos.

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Na verdade, a coisa

Na verdade, a coisa funciona justamente na direção contrária: os funciona justamente na direção contrária: os lucroslucros

 vieram

 vieram do do aproveitamento aproveitamento da da ignorâncignorância, ia, e e não não do do conheciconhecimento. mento. TTalesales

estava na posição de se beneficiar fortemente de um resultado positivo,

estava na posição de se beneficiar fortemente de um resultado positivo,

tendo, em contrapartida, sua perda limitada pelo pagamento antecipado e

tendo, em contrapartida, sua perda limitada pelo pagamento antecipado e

barato. Paga-se um preço pequeno para expor-se a uma chance de grandes

barato. Paga-se um preço pequeno para expor-se a uma chance de grandes

lucros. Perde-se pouco em caso de resultado negativo e ganha-se muito em

lucros. Perde-se pouco em caso de resultado negativo e ganha-se muito em

caso de acerto. Essa é

caso de acerto. Essa é a ideia central da antifragilidade.a ideia central da antifragilidade.

Há uma separação importante entre os talesianos e os aristotélicos. Os

Há uma separação importante entre os talesianos e os aristotélicos. Os

primeiros se preocupam com os efeitos práticos da exposição, com os

primeiros se preocupam com os efeitos práticos da exposição, com os

payoffs e as consequências práticas de cada ação, enquanto os últimos

payoffs e as consequências práticas de cada ação, enquanto os últimos

focam o conhecimento

focam o conhecimento per se per se, a preocupação vaidosa com estar certo ou er-, a preocupação vaidosa com estar certo ou

er-rado. Dada a

rado. Dada a impossibilidade de se prever o futuro e adivinhar qual impossibilidade de se prever o futuro e adivinhar qual cenáriocenário

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importante para investimentos bem feitos.

importante para investimentos bem feitos.

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horahora dede deFinirdeFinir

“Eu errei mais de nove mil arremessos em minha carreira. Perdi

“Eu errei mais de nove mil arremessos em minha carreira. Perdi quase 300 jogos. Por 26 vezes, me confiaram a bola do jogo e eu

quase 300 jogos. Por 26 vezes, me confiaram a bola do jogo e eu

errei. Eu falhei, e falhei e falhei de novo em minha vida. E é por

errei. Eu falhei, e falhei e falhei de novo em minha vida. E é por isso que eu prosperei”.

isso que eu prosperei”.

Quem disse isso foi um jogador de basquete, numa famosa propaganda

Quem disse isso foi um jogador de basquete, numa famosa propaganda

da Nike. Sim, Michael

da Nike. Sim, Michael Jordan entendeu o ponto. O esporte, o empreendedoJordan entendeu o ponto. O esporte, o empreendedo-

-rismo e o investimento são todos processos de tentativa e erro.

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O erro faz parte das situações que envolvem incerteza. Não dá

O erro faz parte das situações que envolvem incerteza. Não dá para tentarpara tentar

domesticar o desconhecido, tratando a realidade com a mesma

domesticar o desconhecido, tratando a realidade com a mesma

complexi-dade de videogame ou jogos de cassino, em que os cenários potenciais e as

dade de videogame ou jogos de cassino, em que os cenários potenciais e as

probabilidades de ocorrência são conhecidas a priori.

probabilidades de ocorrência são conhecidas a priori.

Interessante como empresários entendem facilmente a questão, mas

Interessante como empresários entendem facilmente a questão, mas

acadêmicos & afins passam batido. Vejam como pensa o pessoal da 3G –

acadêmicos & afins passam batido. Vejam como pensa o pessoal da 3G –

Lemann, Telles e Sicupira: “Claro que é da natureza humana querer que a

Lemann, Telles e Sicupira: “Claro que é da natureza humana querer que a

incerteza vá embora. Mas esse desejo pode levá-lo a

incerteza vá embora. Mas esse desejo pode levá-lo a agir rápido, às vezes rá-agir rápido, às vezes

rá-pido demais. De onde eu venho,

pido demais. De onde eu venho, você percebe rapidamente que a incertezavocê percebe rapidamente que a incerteza

jamais desaparecerá, não importa quais ações ou decisões tomemos”.

jamais desaparecerá, não importa quais ações ou decisões tomemos”.

Preâmbulo

Preâmbulos feitos, por s feitos, por que o nome que o nome estranho de antifragilidade? Sem preestranho de antifragilidade? Sem pre-

-cisar recorr

cisar recorrer ao dicionário – er ao dicionário – ok, você pode conferir se ok, você pode conferir se quiser, sem problemaquiser, sem problema

–, o que é frágil? Basicamente, algo que se quebra facilmente mediante um

–, o que é frágil? Basicamente, algo que se quebra facilmente mediante um

choque. E qual o contrário de frágil? Com frequência, apontam-se supostos

choque. E qual o contrário de frágil? Com frequência, apontam-se supostos

antônimos como forte, vigoroso, robusto.

antônimos como forte, vigoroso, robusto.

Ora, o contrário de negativo não é neutro, mas sim positivo. De

Ora, o contrário de negativo não é neutro, mas sim positivo. De

ma-neira análoga, o antônimo de frágil não pode ser simplesmente algo que

neira análoga, o antônimo de frágil não pode ser simplesmente algo que

resiste bravamente a um choque. O oposto de frágil deve se beneficiar de

resiste bravamente a um choque. O oposto de frágil deve se beneficiar de

um choque. Na ausência de outro termo pré-existente, ficamos com

um choque. Na ausência de outro termo pré-existente, ficamos com

anti-frágil: aquilo que se beneficia do impacto, da turbulência, da incerteza, da

frágil: aquilo que se beneficia do impacto, da turbulência, da incerteza, da

 volatili

 volatilidade, da dade, da ignorâncignorância, do ia, do desconhedesconhecido.cido.

Esmiuçando a coisa, definições um pouco mais formais para o propósito

Esmiuçando a coisa, definições um pouco mais formais para o propósito

deste livro seguem abaixo:

deste livro seguem abaixo:

- Frágil: toda coisa ou situação em que as perdas aumentam mais do que

(29)

.28.

proporcionalmente conforme a intensidade do choque negativo; os ganhos, por sua vez, aparecem em intensidade inferior àquela do choque positivo.

- Robusto: toda situação ou coisa com resposta linear à intensidade do choque.

- Antifrágil: toda coisa ou situação em que os ganhos aumentam mais do que proporcionalmente conforme a intensidade do choque positivo; as perdas, por sua vez, ficam maiores em intensidade inferior àquela do choque negativo.

Uma xícara é frágil ao impacto. Vários choques muito pequenos não vão fazê-la quebrar. Um único golpe um pouco mais forte e ela está desfeita. O corpo humano é frágil à altura. Dez quedas de 50 centímetros causam pouca (ou nenhuma) lesão. Uma única queda de cinco metros pode ser fatal. Tacar 1.000 pedras de 100 gramas num sujeito pode ser desprezível. Basta uma pedra de 100 kg para empurrar o cidadão para o andar de cima. Em cada uma dessas situações, o resultado negativo (prejuízo ou perda) aumenta em  velocidade superior àquela da intensidade do choque.

Em contrapartida, a compra de um seguro para sua casa pode ser anti-frágil. Quanto mais extremo for um evento – exemplo: incêndio em toda a residência –, mais terá valido a pena fazer o seguro. Pequenos choques não mexem muito com você, mas algo impactante o deixará satisfeito por ter feito o seguro (importante frisar que falamos da contratação do seguro e não da perda da casa em si). Os ganhos de felicidade em ter concordado com o corretor serão maiores conforme a intensidade do choque – se é que é possível alguma felicidade decorrente de conversas com corretores de seguro.

(30)

.29.

Quando se está diante de algo frágil, um evento adverso vai lhe trazer grandes perdas. E quanto mais adverso, ainda maiores as perdas. Já um even-to positivo traz poucos ganhos, que crescem em ritmo leneven-to à medida que o resultado favorável se intensifica.

Em contrapartida, na antifragilidade, um evento adverso lhe traz poucas perdas. E se o evento vai se tornando ainda mais adverso, o tamanho das perdas vai aumentando lentamente, ou nem sequer aumenta. Enquanto isso, um evento positivo traz grandes ganhos, que sobem rapidamente com a intensidade do cenário favorável.

Resume-se a coisa assim: o frágil não gosta de volatilidade e eventos ex-tremos. Além disso, em situações de fragilidade, você perde muito se estiver errado e ganha pouco se estiver certo. Analogamente, o antifrágil adora vola-tilidade e eventos extremos. Sob antifragilidade, você perde pouco se estiver errado e ganha muito quando acerta.

Quando você faz o seguro da casa, você não acha que sua casa vai ne-cessariamente pegar fogo. Mas, se estiver errado, perderá apenas o valor do prêmio. Certamente, um prejuízo pequeno frente à possibilidade de arcar com todo o patrimônio imobiliário.

 v 

 amos Por Partes

O livro é estruturado no seguinte sentido: da apresentação dos pilares or-todoxos do investimento em valor para a defesa da superioridade filosófica da antifragilidade.

(31)

.

.3030..

O primeiro capítulo introduz o value investing tradicional. Colocamos

O primeiro capítulo introduz o value investing tradicional. Colocamos

aí os principais conceitos do Investiment

aí os principais conceitos do Investimento em Vo em Valor a partir dos ensinamen-alor a partir dos

ensinamen-tos clássicos de Benjamin Graham e Warren Buffett. Tratamos também da

tos clássicos de Benjamin Graham e Warren Buffett. Tratamos também da

evolução da Escola de Valor, passando da maior importância ao passado,

evolução da Escola de Valor, passando da maior importância ao passado,

conforme as determinações iniciais de Graham, para posterior possibilidade

conforme as determinações iniciais de Graham, para posterior possibilidade

de incorporarem-se fluxos futuros na determinação do valor de uma

de incorporarem-se fluxos futuros na determinação do valor de uma

empre-sa, tratando da influência de Philip Fisher sobre Warren Buffett. A seção é

sa, tratando da influência de Philip Fisher sobre Warren Buffett. A seção é

fechada com a exposição de um Modelo de Fluxo de Caixa Descontado, e

fechada com a exposição de um Modelo de Fluxo de Caixa Descontado, e

de como o método remete ao mito da Cama de Procustos.

de como o método remete ao mito da Cama de Procustos.

 A

 A segunda segunda parte parte aborda as aborda as armadilhas caarmadilhas canônicas, nônicas, que enque ensejam sejam uma uma dis-

dis-cussão mais ampla sobre o que é valor. Existiria mesmo uma aparente

cussão mais ampla sobre o que é valor. Existiria mesmo uma aparente

ver-dade aristotélica capaz de crav

dade aristotélica capaz de cravar com precisão qual o valor de uma empresa?ar com precisão qual o valor de uma empresa?

Recado antecipado: não há somente armadilhas de valor; o próprio valor é

Recado antecipado: não há somente armadilhas de valor; o próprio valor é

uma armadilha. A rigor, os riscos escondidos e os eventos imprevisíveis são

uma armadilha. A rigor, os riscos escondidos e os eventos imprevisíveis são

aqueles que acabam determinando a evolução de um ativo financeiro. Isso

aqueles que acabam determinando a evolução de um ativo financeiro. Isso

remete ao problema clássico da indução de David Hume e aos tais cisnes

remete ao problema clássico da indução de David Hume e aos tais cisnes

negros de Nassim Taleb.

negros de Nassim Taleb.

O terceiro capítulo faz um apanhado sobre a inadequação da hipótese

O terceiro capítulo faz um apanhado sobre a inadequação da hipótese

de que podemos conhecer os fluxos de caixa futuros e, portanto, o valor de

de que podemos conhecer os fluxos de caixa futuros e, portanto, o valor de

uma empresa. O investidor é um ser humano – e não um sujeito capaz de

uma empresa. O investidor é um ser humano – e não um sujeito capaz de

fazer cálculos e processar informações perfeitamente. O homem é

fazer cálculos e processar informações perfeitamente. O homem é uma coisauma coisa

e aquilo que a T

e aquilo que a Teoria Econômieoria Econômica chama de Homo Economicuca chama de Homo Economicus é outra, bems é outra, bem

diferente.

diferente.

 A

 A quarta quarta parte parte funciona funciona como como uma uma espécie espécie de de ressalva. ressalva. Expõe Expõe comocomo

Buffett é, na verdade, muito mais complexo do que os livros sobre ele

Buffett é, na verdade, muito mais complexo do que os livros sobre ele

supõem. Letras não são capazes de dar a devida precisão à abordagem

(32)

.

.3131..

buffettiana do ponto de vista prático. Muito do processo de investimento

buffettiana do ponto de vista prático. Muito do processo de investimento

se apoia em conhecimento tácito, há um grande reducionismo nas

se apoia em conhecimento tácito, há um grande reducionismo nas

narrati- vas e

 vas e boa parte dos boa parte dos casos de sucesso casos de sucesso de Wde Warren Buffett esteve, a rigor, maisarren Buffett esteve, a rigor, mais

associada ao growth investing (investimento em crescimento futuro, e não

associada ao growth investing (investimento em crescimento futuro, e não

em valor).

em valor).

E se Buffett responde pelo tradicionalismo em ações, Markowitz faz o

E se Buffett responde pelo tradicionalismo em ações, Markowitz faz o

mesmo para a montagem de portfólio. O capítulo subsequente versa

mesmo para a montagem de portfólio. O capítulo subsequente versa

exa-tamente sobre o platonismo de uma tal fronteira eficiente, que inclusive

tamente sobre o platonismo de uma tal fronteira eficiente, que inclusive

ganhou prêmio Nobel de Economia. As premissas são completamente

ganhou prêmio Nobel de Economia. As premissas são completamente

im-pertinentes e o objetivo aqui é mostrar como um portfólio composto por

pertinentes e o objetivo aqui é mostrar como um portfólio composto por

90/95% de um ativo

90/95% de um ativo sem nenhum risco, combinado a uma sem nenhum risco, combinado a uma pequena parcelapequena parcela

(10/5%) de algo muito arriscado – com a óbvia contrapartida de bom re

(10/5%) de algo muito arriscado – com a óbvia contrapartida de bom re -

-torno potencial –, é superior a uma carteira feita por vários ativos de risco

torno potencial –, é superior a uma carteira feita por vários ativos de risco

médio. De novo, o problema dos riscos escondidos.

médio. De novo, o problema dos riscos escondidos.

O sexto bloco representa o ponto máximo da argumentação. Definimos

O sexto bloco representa o ponto máximo da argumentação. Definimos

em detalhes a abordagem filosófica e teórica da antifragilidade, para então

em detalhes a abordagem filosófica e teórica da antifragilidade, para então

mostrarmos como a coisa funciona na prática. Daremos exemplos reais de

mostrarmos como a coisa funciona na prática. Daremos exemplos reais de

investimentos embasados na antifragilidade, porque isso aqui não é cultura

investimentos embasados na antifragilidade, porque isso aqui não é cultura

de enciclopédia.

de enciclopédia.

Por fim, o capítulo sétimo faz a conclusão dos argumentos anteriores, e

Por fim, o capítulo sétimo faz a conclusão dos argumentos anteriores, e

sebo nas canelas. Só há uma forma de se aprender a cozinhar: cozinhando.

sebo nas canelas. Só há uma forma de se aprender a cozinhar: cozinhando.

 Já diria

 Já diria Jorge Jorge Ben: tem Ben: tem que dançar que dançar dançando. Grdançando. Grosso modo, osso modo, é assim é assim tambémtambém

com investimentos. Faça você mesmo.

(33)
(34)

.33.

i. Q 

uer investir em  valor

?

Este não é um livro sobre value investing. Ao menos nestas páginas, não estamos bitolados em investimento em valor, escola de valor ou qualquer outro nome a gosto do freguês que envolva “valor”. Há centenas de livros na área. Alguns são bem legais, desconfia-se de muitos.

Por ora, queremos apenas apresentar o value investing da forma como bem (ou mal) entendemos. É histórica a incapacidade de estabelecer uma  visão definitiva sobre investimento em valor. Portanto, isso aqui é só como

nós vemos a coisa em nosso dia a dia de analistas. Na verdade, o investimen-to em valor é simples de entender – de implementar, nem taninvestimen-to.

(35)

.34.

Num esforço didático, acho que dá pra resumir a filosofia em dois pilares centrais:

(i) Uma ação é a menor representação do capital próprio de uma empresa.

(ii) Podemos estimar com alguma precisão o valor de uma companhia. A essa cifra dá-se o nome de valor intrínseco – por ser indissociável, inapartável e íntimo à firma.

Ora, se uma ação é – em última instância – uma empresa, e eu posso calcular o valor dessa empresa, então tenho uma sequência lógica: o preço da ação deve convergir para o valor intrínseco.

Basta o sujeito calcular o valor intrínseco e olhar para o preço da ação, de modo a capturar distorções entre ambos. Se o preço da ação for inferior ao valor intrínseco, você compra. Caso contrário, você vende. Pau, pedra e fim do caminho.

Bebendo da fonte ipsis litteris, Warren Buffett caracteriza seu método

como a forma de se comprar algo que vale um dólar (valor) por cinquenta cents (preço). E citando outra frase clássica do oráculo de Omaha: se um negócio vai bem, no fim das contas a ação acaba refletindo isso, numa refe-rência explícita à convergência.

 Aparentemente, tudo se resume em saber o diabo do valor intrínseco, dado que o preço da ação é informação pública. Aqui já vale a pena atentar para certas nuances da metodologia…

 A afirmação de que a ação é a menor fração do capital próprio da em-presa decorre de uma constatação contábil e jurídica – ignorando razões

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.35.

práticas de que quem forma o preço da ação é o mercado e, por conseguinte, investidores. Todas as vicissitudes da interação social dos agentes de mercado são simplesmente ignoradas.

 Já a ideia de que existe um valor intrínseco passível de estimativa não provém da dedução lógica. Ao contrário, é premissa do modelo, proveniente da suposta observação empírica de Benjamin Graham (precursor do value investing) lá por meados do século XX – sim, bem antes da internet e da atual pluralidade de informações. Assume-se que é assim e ponto final.

O próprio Graham chegou a ser questionado sobre a justificativa por trás da convergência entre preço das ações e seu valor intrínseco, ao que respon-deu da seguinte forma: “Não sei explicar o porquê. Simplesmente é assim. Tenho observado esse comportamento por vários anos”. Explicação clara e indubitável: a convergência é uma hipótese assumida ad hoc . Basta sentar no

sofá de uma sala (eterna?) de espera e aguardar chamarem sua senha para o paraíso de precificação.

De volta ao purgatório, tudo se resume ao cálculo do valor intrínseco – essa espécie de verdade aristotélica de quanto vale precisamente uma empre-sa, a reger o cosmo financeiro. Como definir esse tinhoso?

Originalmente, conforme os ensinamentos de Ben Graham, o valor in-trínseco seria definido a partir dos bens e direitos já detidos pela companhia. Diferente do Raul Seixas, Graham não era astrólogo, nem conhecia a histó -ria do início ao fim. Apoiava-se no presente e no passado para determinar o valor de uma firma. Toda a informação era extraída de demonstrações de resultados e balanços já divulgados.

(37)

.36.

No meio do século XX, adivinhar o futuro significava introduzir elemen-tos da ficção na análise de ativos financeiros. Certa vez, Graham chegou a dizer: “a combinação de fórmulas precisas e suposições imprecisas pode ser usada para estabelecer ou justificar qualquer valor desejado, por mais alto que seja”. Versão mais elegante para a seguinte afirmação rápida e rasteira: “as planilhas de projeção aceitam qualquer coisa”.

Uma das formas preferidas de Graham para estimar o valor intrínseco apoiava-se essencialmente no patrimônio líquido da empresa. Racional bas-tante simples: ora, se uma ação é cotada a preço inferior ao dos ativos menos suas obrigações financeiras, então seu valor real está acima daquilo, confi-gurando-se num ponto de entrada. Anomalias ainda mais gritantes seriam descontos no valor da ação frente à soma do ativo circulante, ou até mesmo na comparação com o montante detido no caixa.

 Além de observações a respeito do patrimônio líquido ou de seus ativos mais líquidos, distorções em relação ao NAV (net asset value; valor do ativo líquido) ou a seu valor de liquidação merecem atenção. Grosso modo, o primeiro representa o valor de todos os ativos da companhia, apreçados corretamente a partir de cotações de mercado, subtraídos de suas obrigações financeiras. Já o valor de liquidação oferece a ideia do quanto a companhia poderia levantar caso fosse vendida integral e imediatamente. Warren Buffett gosta de lembrar que sempre haverá a opção de liquidar um negócio e ir embora caso as coisas não caminhem bem – por isso, observa com relativa frequência descontos frente ao valor de liquidação.

Para encerrar a exposição inicial, cito a descrição do próprio Graham para sua maneira original de investir em ações. Sou uma espécie de Eça de Queiroz e acho uma lamentável sabujice essa história de falar bem uma

(38)

.37.

outra língua. Ainda assim, mesmo dispondo de péssimo inglês, arrisco uma tradução livre da definição:

“Meu primeiro instrumental, mais limitado, contempla compra de

ações a preços inferiores ao valor de seu ativo circulante, sem dar nenhum peso à planta e a outros ativos fixos, e subtraindo todas as obrigações financeiras da firma. Nós usamos extensivamente essa téc-  nica na gestão de fundos de investimento e, por um período difícil de 30 anos, devemos ter ganhado aproximadamente 20% ao ano. Por

um momento, entretanto, depois da metade dos anos 50, esse tipo de

oportunidade ficou bastante raro por conta do persistente otimismo  generalizado. Depois, as oportunidades voltaram em maior frequên- 

cia com a queda de 1973/74. Em janeiro de 1976, nós contamos 300 situações como essa no stock guide da S&P, cerca de 10% do total”.

Há também um outro método de Graham, similar ao primeiro em sua filosofia:

“Comprar grupos de ações a preços inferiores a seu valor intrínseco,

indicado a partir de um ou mais critérios simples. O critério que eu prefiro é a relação de sete vezes os lucros reportados nos últimos

12 meses. Você pode usar outros – como o retorno corrente de divi -  dendos acima de sete por cento ao ano ou valor de livro superior ao  preço da ação em 120%, etc. Nós estamos terminando um estudo de  performance dessas abordagens ao longo da última metade de século

(1925-1975). Elas geram consistentemente retorno de 15% ou mais

 por ano, equivalente a duas vezes o desempenho do índice Dow  Jones em igual intervalo. Tenho muita confiança no seguinte tripé

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.38.

desse método: lógica sólida, simplicidade da aplicação e um exce-  lente histórico. No final, é uma técnica que permite ao verdadeiro investidor explorar o excesso de otimismo ou de apreensão inerentes

à especulação alheia”.

P

esCador do Futuro

Sou do tempo das locadoras de fitas VHS. Religiosamente aos sábados, meu pai ia à Pop Arte, na Av. Heitor Penteado, bairro do Sumarezinho, São Paulo. Hoje virou papelaria, daquelas meio bregas – toldo corderosa e pla -quinha emoldurada na entrada com madeira de lei: “Temos Wi-Fi”.

Eu tinha dois heróis e sempre insistia que meu velho voltasse da Heitor carregando ao menos um deles embaixo do braço. Enquanto empurrava os óculos com o indicador direito contra o meio das sobrancelhas para mitigar a miopia, ele acelerava o passo pela calçada, prensando a sacola bege nas costelas com a parte interna do braço. Dentro, havia de conter Rocky: O Lutador e/ou De Volta para o Futuro. Sem isso, meu final de semana estava acabado. Decorei até mesmo as frases do Paulie e nunca me esquecerei da engraçada previsão de Dr. Emmett Brown de que Ronald Reagan seria pre-sidente dos EUA.

Rocky Balboa era um semideus, símbolo da superioridade da intuição, da sabedoria de rua e do improviso sobre o tecnicismo. Como um bom he-rói, poderia ter também morrido de overdose (de esteroides), mas está aí até hoje. Marty McFly, por sua vez, representava o novíssimo, o skate voador e o colete vermelho fofinho, igualzinho ao do meu sócio Caio Mesquita.

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.39.

Desde então, sou um apaixonado pelo futuro, mas confesso: já desisti de entendê-lo. Virei uma espécie (menos santa) de Madre Teresa. “O ontem já foi. O amanhã ainda não chegou. Nós só temos o hoje. Vamos começar”. Philip Fisher pensava diferente. O professor da Stanford Graduate School of Business e fundador da gestora de recursos Fisher & Co. é tido como o precursor do growth investing, em linhas gerais a capacidade de o crescimento futuro agregar valor.

 A ideia central de Fisher é de que determinados negócios oferecem boa dose de certeza sobre sua capacidade de expansão – assim, na avaliação de uma companhia, negligenciar o componente de crescimento poderia levar à precipitada conclusão de que uma ação está cara quando, na verdade, se mostra barata se contemplar o rendimento futuro.

Em manuais superficiais de finanças, o growth investing é apresen-tado como diametralmente oposto à abordagem value. Eu, que posso ser leve como uma brisa ou forte como uma ventania, não gosto de co-locar as coisas dentro de gavetas sem fundo falso. Discordo, portanto, de qualquer antagonismo – Fisher é complementar a Graham. A asser tiva é corroborada por autoavaliação de Warren Buffett, o maior ex -poente do value investing, resumindo a si mesmo como 85% Graham, 15% Fisher.

Filosoficamente, Fisher não trouxe grandes novidades à ideia de valor intrínseco e convergência de preços. Apenas reconheceu uma firma como uma entidade viva, com bens e direitos variando mediante a passagem do tempo. Por conseguinte, o valor intrínseco pode ir crescendo com a em-presa. Saímos de uma abordagem mecanicista, que trata o valor da firma

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.40.

como um parâmetro, para uma perspectiva menos newtoniana, em que o  valor intrínseco se torna uma variável.

Obcecado por vantagens competitivas de longo prazo, Fisher apresentou em sua obra mais emblemática – Common Stocks and Uncommon Profits  – uma espécie de guia qualitativo para a identificação de empresas bem geridas e com oportunidades de sólido crescimento à frente, batizado de Fifteen Points to Look for in a Common Stock .

 A apresentação dessas quinze coisas para procurar em uma ação resume o essencial sobre growth investing. Não é à toa que perdemos tempo com isso. O reconhecimento de um futuro gerador de valor é a centelha para uma série de problemas epistemológicos na análise de ações (chegaremos lá). Por ora, seguimos o guia de Fisher:

1 A companhia dispõe de produtos/serviços com potencial de mer -cado suficiente para crescer suas vendas com vigor por vários anos? Uma empresa que mira um período consistente de crescimento ex-pressivo precisa estar diante de mercados grandes e em expansão. 2- Existe obstinação dos administradores da empresa por novos pro-dutos/processos capazes de dar um novo salto às vendas quando os serviços anteriores já esgotaram suas possibilidades? Todos os mer-cados encontram a maturidade e, para manter crescimento acima da média por um período de décadas, uma empresa necessita desen- volver novos produtos para expandir o mercado atual ou encontrar

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.41.

3- Quão efetiva é a área de pesquisa e desenvolvimento da companhia frente a seu tamanho? Para desenvolver um novo produto, o esforço em P&D precisa ser eficiente.

4- O tamanho da equipe de vendas é superior à média de mercado? Poucos produtos e serviços são tão atrativos a ponto de maximiza-rem seu potencial sem o devido aparelhamento da área comercial e de marketing.

5- A margem líquida compensa? Uma empresa pode crescer uma enor-midade, mas a expansão deverá ser acompanhada de lucros capazes de remunerar seus investidores.

6- O que tem sido feito em favor da margem de lucro? Não importa a margem líquida do passado, mas sim a do futuro. A inflação exer-cerá pressão sobre as margens e a concorrência vai tentar empurrar os preços de mercado para baixo, de modo que precisamos monitorar a atividade em prol da redução de custos.

7- A companhia oferece um bom clima para trabalho em grupos? Uma empresa é feita de pessoas e pessoas mais felizes produzem mais. É capcioso medir isso, mas você pode procurar por boas políticas de remuneração e analisar a forma como o top management trata os demais empregados.

8- A empresa se pauta em incentivos meritocráticos? Procure por mérito nas promoções e salários que reconheçam diferenciais de pro-dutividade. Evite ambientes de nepotismo ou politicagem.

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.42.

9- Existe uma cultura enraizada – com a devida profundidade no management – capaz de transcender uma única gestão? Estamos atrás de crescimento por décadas, sendo nevrálgica uma amostra grande de talento do management por gerações. Alerta adicional sobre manage-ment relutante em delegar funções.

10- A análise de custos e a contabilidade são suficientemente boas? (alguém aí pensou nas incorporadoras brasileiras?). Não dá pra cres-cer de forma sustentada sem saber exatamente como se comportam os custos de cada etapa das operações.

11 Há algum atalho, uma dica ou qualquer coisa que possa fazer o in - vestidor perceber as vantagens competitivas daquela empresa frente aos competidores? É importante ao investidor entender de onde vêm os fatores de sucesso daquela firma e como ela lida com a concorrência. 12- Qual é o horizonte temporal das perspectivas de lucros? Curto ou longo? Fisher sempre manteve horizontes dilatados em seus inves-timentos. Exigia isso das empresas também. A obsessão por atender estimativas de lucros trimestrais por vezes representa a perda de gran-des oportunidagran-des de longo prazo.

13- O crescimento futuro exigirá levantar dinheiro via emissão de ações e, portanto, diluirá os acionistas antigos? A empresa precisa con-seguir se financiar com fluxo de caixa próprio ou a partir da tomada de dívida, sem pedir dinheiro novo aos acionistas.

14- A Diretoria conversa com a comunidade financeira de forma am-pla e transparente na bonança, mas não quer papo quando das vacas

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.43.

magras? Todo negócio vai ter seus percalços. Escolha firmas dispostas a mostrar todo o aspecto do negócio, suas partes boas e ruins – você precisa conhecer o inimigo e, portanto, é importante conversar tam-bém sobre os pontos fracos.

15- Por fim, a integridade dos administradores é inquestionável? Para Fisher, o investidor jamais deveria colocar seu dinheiro na ação de uma empresa cujos donos não se relacionam com o mercado de for-ma 100% confiável.

 Pronto: você já tem 15% do cérebro de Warren Buffett. É bom, mas pre -feriria 15% do patrimônio, né?

B

iCho de sete CaBeças

Não dá pé, não tem pé nem cabeça, não tem ninguém que mereça, é o bicho de sete cabeças.

Reconhecida a capacidade de o futuro agregar valor, chegamos ao palav-rão maior, o modelo de Fluxo de Caixa Descontado (Discounted Cash Flow, ou simplesmente DCF). O nome é longo, mas esse bicho não me assusta, nem vai assustá-lo.

Quanto você pagaria por um bilhete da seguinte loteria: ela te premia com R$ 100 no cenário A e com R$ 0 no cenário B. As chances de acontecer cada um dos eventos é a mesma, 50%.

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.44.

 A (R$ 100, 50%) (50%*100) + (50%*0) = R$ 50

B (R$ 0, 50%)

Se você não é um sujeito avesso a riscos, está disposto a pagar R$ 50 para participar desse jogo. É o valor esperado da loteria, nada mais natural. O  valor de um jogo – análogo ao valor de uma empresa – se dá justamente pelas

suas entradas líquidas de caixa ponderadas pelo futuro.

Pois bem, o valor de uma firma vem de seus fluxos de caixa projetados. Evidentemente, uma mesma cifra não representa a mesma coisa hoje e ama-nhã. Há um custo do dinheiro intimamente associado ao tempo, e esse custo é dado pela taxa de juros. Logo, precisamos descontar os fluxos de caixa futuros da empresa por uma determinada taxa de juro.

O modelo de Fluxo de Caixa Descontado foi originalmente formalizado na tese de doutorado de John Burr Williams, posteriormente sacramentada no livro clássico The Theory of Investment Value .

 A ideia é intuitiva e está alinhada aos princípios filosóficos do value in- vesting. John explica que o valor de uma empresa é definido pela soma dos fluxos de caixa esperados de hoje até o infinito, trazidos ao tempo presente pela taxa de juros apropriada. E se a ação é o pedaço de uma empresa, o valor da ação decorre facilmente do cálculo anterior.

Depois de ler as próximas linhas, talvez você pense que tenho algo pes-soal contra o DCF. Eu juro: ele nunca me tratou mal, nem quis sair com minha mulher ou me negou uma carona. Minha relação com o Fluxo de

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.45.

Caixa Descontado parte de uma história curiosa, mas as críticas são essen-cialmente técnicas, ok?

Começo pela experiência pessoal. Apesar da calvície, não sou tão velho assim. Mas em Finanças me considero um dinossauro.

Por influência do meu pai, que acabara de deixar o Banco Safra depois de 20 anos e fora trabalhar em casa como trader/analista de ações, comecei cedo na renda variável. Pé trocado! Comprei minha primeira ação aos 14 anos. Era o auge da Nasdaq e eu, metido a descolado, fui logo enchendo o carrinho (à época bem pequeno, por razões óbvias) das famosas Globonabo. Gostaria de esquecer da PLIM4. Em contrapartida, se pudesse, tatuaria as queridas CMET4, que me renderiam alguns quinhões.

Fique tranquilo, não há trauma nenhum nisso. O resto da adolescência foi todo normal – com exceção de uma dedicação imbecil aos estudos. Natu-ral também acabou sendo a escolha pela Faculdade de Ciências Econômicas; nem sei se foi muito bem “escolha”…

Estava no primeiro ano da FEAUSP quando pintou uma vaga de está -gio. Eu tirava notas legais, com exceção da disciplina do professor Flávio Saez, que eu odiava – a disciplina, não o professor. Então decidi que queria mesmo trabalhar, fui fazer entrevista no Deutsche Bank. O salário era bo-nito para a época e o cartão servia para inflar o ego adolescente e idiota ao traduzir em negrito: Banco Alemão.

Fui à entrevista sem grandes pretensões. Eles queriam alguém do quarto ano e era improvável aceitarem um menor de idade com inglês macarrôni-co. Ao final, resolveram me contratar. Ainda não sei a razão, só sei que foi

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assim. Dizem que está cada vez mais impossível arrumar estagiário, naquela época já era difícil. E lá fui eu pra área de sales de mercados emergentes, com foco em operações estruturadas de derivativos. Alguém conhece lugar pior para começar? Já não bastava perder a virgindade com a Globonabo?

Bom, de cara, percebi de onde vinha o apelido “cowboys do mercado” para os traders do Deutsche. A experiência foi traumática e durou meses. “Pai, o ambiente de investment banking não é pra mim. Trabalho 13 horas por dia, corro feito louco, não me dão nada que valha pensar, me cobram coisas sem qualquer sentido e ainda me tratam como um verme. Por favor, deixa eu pedir as contas? Quero seguir carreira acadêmica”.

Sério, mudei de ideia em seis meses. Mergulharia integralmente nos es -tudos, prestaria Anpec (prova de seleção para o mestrado em Economia) e seria professor universitário. Felizmente, Drummond estava ao meu lado: havia uma pedra no meio do caminho, que obrigou a virar o volante noutra direção. “Felipe, tem uma vaga na LCA. É a sua cara. Eles estão montando uma área especial na consultoria, voltada pra análise de ações. Querem gente nova, dedicada e com flexibilidade de horário. Posso mandar seu currículo?”

Eu não podia negar a chance de trabalhar ao lado do estádio do Pacaem-bu. Já combinei a tal flexibilidade de horário com as noites de quarta-feira – eu teria a chance de parar o carro sem pagar o flanelinha e usufruir semanal -mente da calabresa na barraca durante a caminhada de volta. Isso sim é vida.

Então lá fui eu para uma nova rodada de perguntas com o RH. Dona Jú -lia, muito gentil, conversou comigo por uns 45 minutos e disse ter gostado de mim – pois é, tem gosto para tudo, bicho. Só pediu algo simples como lição de casa: “Você pode fazer esta análise de Ultrapar pra gente?”

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Era uma planilha com modelo de Fluxo de Caixa Descontado para Ul-trapar e suas 276 mil unidades operacionais. O Excel continha mil linhas, separadas em oito abas diferentes. Arrisquei-me numa inicial masturbação com os números. Mas logo percebi que aquilo era tão absurdo que poderia preencher as células com qualquer coisa que me viesse à cabeça. Uma clara transcrição quantitativa do que é a subjetividade.

Se eu estivesse otimista com a empresa, colocaria números alinhados a bom prognóstico de crescimento e expansão de margens. Estava feito um DCF capaz de entregar uma ação bem atrativa, descontada frente a seu valor intrínseco. Já se eu não gostasse da companhia, embutiria ritmo fraco das receitas e margens estagnadas, deixando a ação cara. Sábios mesmo foram Pérsio Arida e Deirdre McCloskey – não necessariamente nessa mesma or-dem –, que perceberam a importância da retórica na Economia…

Talvez ainda pior: uma única linha em meio àquelas mil seria suficiente para mudar tudo. Uma célula (i)mexível tornaria o caro barato e vice-versa, com variações radicais sobre o valor intrínseco. Resultado: não fui adiante com a lição de casa, desisti da vaga de imediato. Adeus ao Paca, adeus à calabresa.

Por ironia, aquilo despertou minha atual vocação. Se há algum uso pra mim nesta vida, é como analista de ações. E não vou para compactuar com um método que pressupõe preenchimento exato de mil linhas. Desde então, firmei esse compromisso ético e moral. Como resume Taleb: se você vê uma fraude e não a aponta, então você também é uma fraude.

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r

ei nu

,

rei Posto

Quero deixar o rei nu. Vamos construir juntos um modelo de DCF para  você ver com os próprios olhos as doses de absurdo envolvidas. O financis-mo engravatado tenta, platonicamente, fazer com que a realidade complexa caiba numa planilhinha de Excel.

 A melhor forma de aprender sobre um método (e suas fragilidades) é pela via da aplicação prática. Então, vamos lá enfrentar o gigante Piaimã, o monstro Venceslau Pietro Pietra.

 As nuances técnicas são chatas, e podem soar ainda mais monótonas para o leitor não técnico. Mas não se preocupe: delas não depende o cerne da discussão, visto que podem ser puladas sem nenhuma perda relevante de conteúdo. O aparato técnico configura apenas um reforço adicional ao argumento. Quando pintar uma fórmula que o cansa, vá direto ao pará-grafo seguinte.

Retomemos o conceito de DCF rapidinho para deixar as coisas mais fá-ceis – entre a repetição e a confusão, prefiro a primeira. O modelo de Fluxo de Caixa Descontado tem a pretensão de definir o valor de uma empresa a partir da soma dos fluxos de caixa projetados, de hoje até o infinito, trazidos a valor presente por uma taxa de desconto adequada.

Por imposição lógica, tudo começa, portanto, com a determinação dos fluxos de caixa. Precisamos chegar nesses danados.

Funciona basicamente assim: partimos da receita bruta, extraímos os im-postos diretos e fazemos a primeira pausa na receita líquida.

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Receita Bruta – Impostos Diretos = Receita Líquida

Daí tomamos fôlego para subtrair o Custo dos Produtos Vendidos, alcan-çando o lucro bruto.

Receita Líquida – CPV = Lucro Bruto

Retiramos despesas de Vendas, Gerais e Administrativas, chegando ao lucro operacional.

Lucro Bruto – Despesas VGA = Lucro Operacional

Somamos então a depreciação, mas retiramos os gastos com investimen-to (Capex) e a variação do capital de giro (K Giro).

Lucro Operacional + Depreciação – Capex – K Giro = FCx

Pronto! Temos o fluxo de caixa da empresa num dado período.

Faremos nosso modelo aqui para uma empresa de varejo. Poderia ser qualquer uma. Cada qual tem uma especificidade, mas a essência é a mesma. Na primeira linha, a receita bruta é, por definição, a multiplicação de duas variáveis: a quantidade vendida e seu respectivo preço. Coisa fácil. Bas-ta prever quanto a empresa vai vender e a cifra cobrada por cada unidade.

Para uma companhia de varejo, em particular, a estimativa de faturamen-to é normalmente separada entre lojas existentes e lojas novas. Assume-se certo crescimento para as lojas já maduras (conceito usual de “same store

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sales”) e uma curva de maturação para as debutantes, sob premissa de evolu-ção gradual das vendas conforme a experiência histórica.

Também precisamos pensar nos componentes de inflação, em como a empresa vai conseguir remarcar preços, e dessa forma matamos o pri-meiro passo.

Chegar na receita líquida é trivial, em que se pesem isenções tributárias ou aproveitamento de créditos fiscais. Os impostos diretos oferecem alíquo-tas (infelizmente) conhecidas, de modo que basta tirá-los da receita bruta para chegarmos ao faturamento líquido. Tranquilão.

Rumamos agora ao lucro bruto, dedutível de dois jeitos: ou você estima cada linha de custo dos produtos vendidos ou simplesmente projeta um percentual de margem bruta. Seja como for, passamos aqui necessariamente pelo conhecimento do custo de todas as matérias-primas e dos indicadores de eficiência da empresa no trato dos insumos.

De posse do lucro bruto, queremos chegar no lucro operacional, certo? De novo, duas formas possíveis: supor diretamente uma margem operacional ou passar, linha a linha, pelas despesas de vendas, gerais e administrativas (no jargão em inglês, SG&A). Neste caso, precisamos conhecer a estratégia de marketing, política de remuneração, eventuais comissões, demissões e outras nuances. Não à toa, o tal SG&A é conhecido como a bolsa de mulher da demonstração de resultados, onde cabe tudo e onde ninguém acha nada.

 Agora faltam só três coisas até o fluxo de caixa do primeiro ano: gastos com investimento (no jargão inglês, capex), depreciação e variação do capital de giro.

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