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O Projeto de lei Gabriela Leite e a formação de um contrato de trabalho

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JÉSSICA RAMOS ALVES DA SILVA

O PROJETO DE LEI GABRIELA LEITE E A FORMAÇÃO DE UM CONTRATO DE TRABALHO

Niterói 2016

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JÉSSICA RAMOS ALVES DA SILVA

O PROJETO DE LEI GABRIELA LEITE E A FORMAÇÃO DE UM CONTRATO DE TRABALHO

Trabalho de conclusão de curso apresentado à Faculdade de Direito da Universidade Federal Fluminense, como requisito parcial para a obtenção do grau de Bacharel em Direito.

Orientador:

Prof. Dr. Indio do Brasil Cardoso

Niterói 2016

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Universidade Federal Fluminense Superintendência de Documentação

Biblioteca da Faculdade de Direito

S586 Silva, Jéssica Ramos Alves da

O Projeto de Lei Gabriela Leite e a formação de um contrato de trabalho

/ Jéssica Ramos Alves da Silva. – Niterói, 2016.

42 f.

TCC (Curso de Graduação em Direito ) – Universidade Federal Fluminense, 2016.

1. Direito do trabalho. 2. Prostituição. 3. Contrato de trabalho. 4. Legalidade. 5. Ilegalidade. I. Universidade Federal Fluminense. Faculdade de Direito, Instituição responsável II. Título.

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JÉSSICA RAMOS ALVES DA SILVA

O PROJETO DE LEI GABRIELA LEITE E A FORMAÇÃO DE UM CONTRATO DE TRABALHO

Trabalho de conclusão de curso apresentado à Faculdade de Direito da Universidade Federal Fluminense, como requisito parcial para a obtenção do grau de Bacharel em Direito.

Aprovada em de de .

BANCA EXAMINADORA

_____________________________________________ Prof. Dr. Indio do Brasil Cardoso (Orientador) - UFF

_____________________________________________

_____________________________________________

Niterói 2016

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AGRADECIMENTOS

Aos meus pais, por todo amor incondicional e toda confiança depositada nesses 5 (cinco) anos de faculdade, me impulsionando a ser melhor a cada dia. Vocês sempre serão meus exemplos e inspiração. Jamais conseguirei retribuir tudo que fizeram e fazem por mim.

Ao meu irmão, por ser meu melhor amigo e companheiro de todas as horas. Aos meus amigos, tanto os que a UFF trouxe, quanto os que já me acompanham há mais tempo, obrigada pelo apoio e incentivo. Poder ter vocês ao meu lado nessa caminhada faz qualquer obstáculo ser facilmente superado.

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De tudo que é nego torto Do mangue e do cais do porto Ela já foi namorada O seu corpo é dos errantes Dos cegos, dos retirantes É de quem não tem mais nada

Dá-se assim desde menina Na garagem, na cantina Atrás do tanque, no mato É a rainha dos detentos Das loucas, dos lazarentos Dos moleques do internato (…) Joga pedra na Geni! Joga bosta na Geni! Ela é feita pra apanhar! Ela é boa de cuspir! Ela dá pra qualquer um! Maldita Geni!1 Chico Buarque

1 “Geni e o Zepelim” é uma canção brasileira, composta e cantada por Chico Buarque. Esta canção

fez parte do musical Ópera do Malandro, do mesmo autor, lançado em 1978, do álbum, de 1979, e do filme, de 1986, todos com o mesmo nome.

A letra, ainda tão de acordo com a realidade atual, descreve o episódio ocorrido com Geni, uma travesti (segundo representado na “Ópera do Malandro”), que era hostilizada na cidade. Diante de uma ameaça de ataque de um Zepelim, o comandante se encanta com os dotes de Geni, que acaba sendo provisoriamente tratada de um modo diferenciado pelos seus detratores. Passada a ameaça, ela retorna ao seu dia-a-dia normal, no qual as pessoas a ofendiam e excluíam, revelando o caráter pseudo-moralista e hipócrita da sociedade.

A canção teve tal relevância que o refrão “Joga pedra na Geni” se transformou numa espécie de bordão, indicando como Geni pessoas ou até mesmo conceitos que, em determinadas circunstâncias políticas, se tornam alvo de execração pública, ainda que de forma transitória ou volátil. (Disponível em: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Geni_e_o_Zepelim>)

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RESUMO

O presente trabalho corresponde a um estudo descritivo e explicativo, que tem como objeto a reflexão a respeito do Projeto de Lei Gabriela Leite, sobretudo no que tange a possível formação de um contrato de trabalho entre a prostituta e o dono casa de prostituição, caso ocorra a descriminalização de tais casas. No decorrer da exposição, será feito uma análise do PL proposto pelo deputado Jean Wyllys, com uma posterior ponderação quanto à formação de um contrato, que é a questão que move o presente estudo. Tudo isso sob a ótica dos princípios constitucionais e do que já está previsto na CLT e no Código Civil acerca do assunto. Ainda, há a breve menção aos projetos de legalização da prostituição já ocorridos em outros países, bem como seus resultados, apenas com o intuito de auxiliar a formação de uma opinião crítica acerca do assunto. Porém, o que se objetiva neste trabalho, é desmembrar e analisar ponto a ponto o contrato de trabalho que se formaria com a aprovação do PL em estudo.

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ABSTRACT

This work represents a descriptive and explanatory study, which has as its object the reflection on the Gabriela Leite Bill, especially regarding the possible formation of an employment contract between the prostitute and the owner of the prostitution’s house, if occurs the decriminalization of such houses. During the exhibition, will be made an analysis of the Bill proposed by Jean Wyllys, with a further deliberation of the formation of a contract, which is the question that drives the present study. All this from the perspective of constitutional principles and what is already provided about the subject in the CLT and in the Civil Code. Still, there is a brief mention about the legalization of prostitution that have already occurred in other countries, as well as their results, with the intention of assisting the formation of a critical opinion. However, the objective of this work is dismantle and analyze point-to-point the employment contract would be formed with the passes of the Gabriela Leite Bill.

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

ART. Artigo

CC Código Civil

CLT Consolidação das Leis Trabalhistas

CTPS Carteira de Trabalho e Previdência Social

CP Código Penal

DST Doenças Sexualmente Transmissíveis FGTS Fundo de Garantia do Tempo de Serviço RICD Regimento Interno da Câmara dos Deputados ONG Organização não Governamental

ONU Organização das Nações Unidas

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO... 9

2 PROJETO DE LEI GABRIELA LEITE... 13

2.1 Quem foi Gabriela Leite... 13

2.2 O mundo frente a prostituição... 14

2.3 O Projeto de Lei ... 16 3 O CONTRATO DE TRABALHO... 21 3.1 Formação do contrato... 21 3.2 O contrato na prostituição... 26 3.3 Princípios constitucionais... 30 4 ANÁLISE COMPARATIVA... 37 5 CONCLUSÃO... 41 REFERÊNCIAS... 44

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1. INTRODUÇÃO.

A prostituição é conhecida popularmente como a profissão mais antiga do mundo, apesar de não ser possível determinar com exatidão quando ocorreu o seu surgimento, acompanhando a história da humanidade ao longo dos anos.

Na Antiguidade, a prostituição era uma prática comum que ia de acordo com a moral da época, sendo considerado um ritual de iniciação das meninas que chegavam à puberdade, fazendo com que as prostitutas gozassem de prestígio social.

Porém, com o passar dos séculos e, principalmente, com a influência da religião Cristã2, a prostituição passou a ser vista como algo imoral, sendo as

profissionais do sexo marginalizadas e excluídas, consideradas um tabu social, sem amparo jurídico ou direitos sociais.

Desenvolve-se, então, um "preconceito profissional" baseado, na maioria das vezes, em conceitos morais - que mudam de acordo com o tempo e com a sociedade.

Paralelo ao processo de marginalização das trabalhadoras do sexo ocorria a batalha entre povos e governos por direitos sociais e garantias individuais. Ouvir a população torna-se cada vez mais necessário para a formação do ordenamento jurídico de um Estado democrático - no Brasil, a Constituição Federal prevê os direitos fundamentais dos cidadãos, inclusive direitos trabalhistas em seu art. 7º.

No entanto, a classe das profissionais do sexo não possui até hoje tais

2 Durante a Reforma Religiosa do século XVI, houve uma epidemia de doenças sexualmente

transmissíveis, e somente dessa vez vimos a Igreja se envolvendo na resolução: enfrentou o problema construindo uma espécie de dogmatismo, a fim de acabar com o que considerava promiscuidade. Com isso, a prostituição foi relegada à clandestinidade, o que configurava também uma forma de preconceito.

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garantias básicas, atuando à margem da lei apesar de todas as conquistas ocorridas ao longo dos anos no âmbito dos direitos sociais.

O tema da legalização da prostituição surgiu da urgência de pensar seriamente em um dos graves problemas de exclusão social.

Atualmente, o ordenamento jurídico brasileiro prevê a ilicitude das casas de prostituição no artigo 229 do Código Penal, sendo considerada, então, legal a prestação de serviços sexuais de forma autônoma, sem a subordinação a um estabelecimento.

Porém, em uma análise da realidade das profissionais, vê-se que é cada vez menor a prática autônoma ao ponto de não necessitar de um entorno ou/e de relações - visto que são essenciais para a profissão -, fazendo com que a maioria delas optem pelo serviço ilegal prestado nos prostíbulos.

Ocorre que, pelo fato das casas serem consideradas crime, ou seja, pelo fato das profissionais do sexo prestarem no caso um serviço cujo objeto é ilícito, não há reconhecimento de vínculo empregatício entre elas e as casas de prostituição, não havendo, então, o reconhecimento dos direitos trabalhistas inerentes a um contrato de trabalho.

Nesse ponto, na busca pelas garantias da classe das trabalhadoras do sexo, já houve duas propostas no Legislativo como iniciativas para regularizar a profissão, ambas sem sucesso. Uma delas foi o PL 42.444/2004 do ex-deputado federal Eduardo Valverde, o qual saiu de tramitação a pedido do autor, e a outra foi o PL 98/2003 do ex-deputado federal Fernando Gabeira, a qual foi arquivada.

Atualmente, há uma terceira proposta em trâmite, realizada em 2012 na Câmara dos Deputados pelo deputado federal Jean Wyllys, como mais uma tentativa de atender as necessidades das profissionais do sexo. O projeto de lei 4.211/12, também conhecido como projeto Gabriela Leite, tem o objetivo de regularizar as casas de prostituição, com a definição de novos tipos penais.

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A proposta gerou discussões não só na mídia nacional e nas redes sociais, mas também na Casa Legislativa, separando os parlamentares mais conservadores dos mais liberais. Esses defendem que o projeto é uma forma de cumprir o direito fundamental do “livre exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão”, previsto no art. 5º, XIII, da nossa Carta Magna.

Inicialmente, pretendia-se a aprovação do projeto até 2014, devido a grande demanda que haveria com a Copa do Mundo, porém o projeto ainda não foi aprovado e enfrenta forte oposição da bancada moralista/conservadora - que acaba por criminalizar a prostituição como um todo por considerá-la imoral.

Salienta-se que a profissionalização da prostituição já ocorreu em países como Holanda, Nova Zelândia, Alemanha e Bélgica, que entendem que a profissão deve ser descriminalizada para acabar com problemas como o tráfico de mulheres e a exploração sexual, além de controlar a transmissão de doenças venéreas.

Importante ressaltar que, embora a legislação brasileira estabeleça a ilegalidade dos estabelecimentos que prestam serviços sexuais, é de notório conhecimento a existência de casas de prostituição por todo o país, funcionando no vácuo da legalidade. Trata-se de um crime "para inglês ver", visto que não possui funcionalidade prática.

Logo, em contrapartida com o que dispõe a lei, há decisões que estabelecem a atipicidade das casas de prostituição pelo fato de sua manutenção ser tolerada pela sociedade e autoridades, com base nos princípios da razoabilidade e adequação social.

Com a atipicidade dos prostíbulos reconhecida por muitos, é inevitável que se pense em direitos trabalhistas, já que, então, não haveria um impedimento para o reconhecimento do vínculo empregatício e a formação de um contrato de trabalho.

Nesse sentido, em maio de 2013, o Tribunal Regional do Trabalho em Campinas proferiu decisão na qual foi estabelecia uma indenização ao filho de uma

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prostituta no valor de R$ 100 mil devido um acidente de trabalho que gerou a morte da mãe. A profissional havia ficado tetraplégica após sofrer uma queda enquanto trabalhava em uma boate, falecendo pouco tempo depois, aos 25 anos.

A jornada de trabalho e a remuneração foram usadas como provas do vínculo empregatício, comprovando que, de fato, já é reconhecida uma relação de emprego entre a trabalhadora do sexo e o prostíbulo, ainda que a lei preveja a ilegalidade deste.

Com isso, no presente trabalho, pretende-se analisar o projeto de lei Gabriela Leite com foco nos aspectos trabalhistas, ponderando sobre a possibilidade da formação de um contrato de trabalho entre as profissionais do sexo e as casas de prostituição, e, ainda, uma análise comparativa com os países em que já ocorreu a profissionalização.

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2. PROJETO DE LEI GABRIELA LEITE.

2.1 - Quem foi Gabriela Leite:

Inicialmente, cumpre esclarecer a origem do nome do projeto apresentado por Wyllys.

Gabriela Leite foi uma paulistana de classe média e filha de uma dona de casa conservadora, iniciou o curso de Sociologia na Universidade de São Paulo (USP), mas o largou no final da década de 1960 para tornar-se prostituta.

Conhecida por ser uma defensora dos direitos humanos das profissionais do sexo, iniciou sua militância em 1979 ao combater a perseguição por parte da polícia de São Paulo às trabalhadoras do sexo e travestis. Defendia a regulamentação da profissão, a organização da classe e era contra a ideia de vitimização da categoria - que é vista por muitos como uma falta de opção.

Participou, em 1987, da organização do Primeiro Encontro Nacional de Prostitutas. Em 1992 criou a ONG "Davida", com o propósito de atrair atenção da mídia e do mundo político para a prostituição.

A ONG tem como missão promover a cidadania das profissionais através de políticas públicas, mobilização, controle social e combate ao preconceito, reduzindo a vulnerabilidade da categoria e conquistando condições melhores de trabalho.3 Ainda, a "Davida" criou a grife "Daspu", em 2005, com objetivo de ajudar

3 Em entrevista concedida ao Programa Roda Viva e publicada pela Fundação de Amparo à Pesquisa

do Estado de São Paulo (FAPESP) em 02 de junho de 2009, dia internacional da prostituta, Gabriela Leite disse: "A prostituição no Brasil não é crime. Crime é manter casa de prostituição. E como tudo que é proibido cria máfias, existe uma máfia muito grande no meio dos chamados exploradores da prostituição, que não pagam direito nenhum para as prostitutas. Então, a gente (sic) está lutando para tirar do Código Penal esses senhores e senhoras, para que eles assumam os seus deveres com as prostitutas. E nada impedindo também que a prostituta consiga, como autônoma, pagar todos os seus impostos e também receber os seus direitos."

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financeiramente os projetos das trabalhadoras da ONG.

Participou da conquista do reconhecimento da ocupação “profissional do sexo” pelo Ministério do Trabalho e Emprego, por meio da Portaria 397, de 09 de outubro de 2002, quando foi incluída na Classificação Brasileira de Ocupação (CBO).

Segundo a Portaria, estes profissionais são pessoas que buscam programas sexuais, atendem e acompanham clientes, além de participar em ações educativas no campo da sexualidade. Aqueles que exercem a prostituição de subsistência (livre, ainda que motivada por motivos econômicos) ou de luxo se enquadrariam nessa classificação.

Em 2009, lançou o livro intitulado “Filha, mãe, avó e puta: a história da mulher que decidiu ser prostituta”, deixando claro o objetivo principal de suas lutas: a liberdade. Lê-se na primeira página:

"Adoro homens, gosto de estar com eles, e não conheço homem feio. Outra coisa que adoro é falar o que penso, sem papas na língua. Quem ler este livro vai perceber isso. Existe uma terceira coisa que eu prezo muito, talvez a que mais prezo, aliás, que é a liberdade, liberdade de pensar diferente, de se vestir diferente, de se comportar diferente" (2009, p. 1).

Em 2010, Gabriela foi candidata à deputada federal.

Faleceu em 2013, aos 62 anos, vítima de um câncer, tendo sido o nome do projeto de lei de Wyllys uma homenagem à ela que é até hoje conhecida como símbolo da luta pelos direitos humanos das prostitutas.

2.2. O mundo frente à prostituição:

Em 1921, a Liga das Nações designou um comitê para tratar o problema do tráfico de mulheres e crianças, e, em 1946, a ONU adotou uma convenção a fim de erradicar a prostituição.

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A solução para o problema parecia ter sido encontrada com a multiplicação de medidas preventivas de higiene e o controle da propagação de doenças sexualmente transmissíveis e outras enfermidades. Porém, o aparecimento da AIDS na década de 1980 iniciou uma verdadeira epidemia, fazendo com que o poder público tivesse que intervir.

Atualmente, ocorre um processo de expansão. A prostituição já chegou aos meios de comunicação, com o sexo pelo telefone, via sites, imagens e webcams ao vivo, ou seja, a prática chegou ao mundo virtual.

No Brasil, a prostituição está diretamente ligada a um processo histórico de desigualdades sociais e injustiças. O perfil dos profissionais do sexo é, na maioria das vezes, de pobres, negros ou que fazem parte de alguma etnia (índios, por exemplo), e que estão nesse mercado para melhorar as suas condições de vida e da própria família.

Fatores como a desestruturação familiar, vícios, violência doméstica, física ou sexual e o apelo ao consumo justificam a entrada de jovens no mercado da prostituição, com base em falsas promessas, suborno, sedução, ou vendidos pelos próprios pais. Porém, há também as que exercem a profissão por escolha própria.

Pesquisa do Ministério da Saúde verificou que cerca de 40% das prostitutas brasileiras estão na profissão há no máximo quatro anos, como uma forma de sobrevivência, principalmente na juventude.

Em relatório feito pela fundação francesa Scelles em 2012, o número de pessoas que se prostituíam girava em torno dos 42 milhões no mundo, sendo 90% ligadas a cafetões.4

Existem formas diversas de política, que se posicionam de formas diferentes frente ao fenômeno da prostituição.

4 http://www.fondationscelles.org/en/

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A abolicionista entende que a prostituição sempre será uma forma de exploração sexual e violência, reduzindo a mulher ao status de objeto. não há distinção entre prostituição voluntária e prostituição forçada, sendo que qualquer movimentação no sentido de legalizar a prostituição é uma concessão às constantes violações dos direitos humanos das mulheres. Assim, os abolicionistas propõem erradicar totalmente essa prestação de serviços, devendo haver repressão por parte do Estado, pois entendem que, dessa maneira, estaria combatendo o tráfico de pessoas.

Já a regulacionista estabelece normas trabalhistas, educativas e sanitárias para profissionais do sexo, pois entendem que a profissão em si não é o problema, mas sim as condições de trabalho. Defendem os direitos humanos e a justiça social, visto que, ao regularizar e garantir direitos sociais e trabalhistas às profissionais do sexo diminuir-se-ia a exploração, coerção e o tráfico de pessoas. Logo, a prostituição seria uma escolha laboral legítima para os regulacionistas.

2.3 - O projeto de lei.

Em 12 de julho de 2012, foi apresentado à Câmara dos Deputados o Projeto de Lei n.4.211/2012, de autoria do Deputado Federal Jean Wyllys, do Partido Socialista/RJ, com o propósito de regulamentar a atividade dos profissionais do sexo no Brasil.

O Projeto, em regime de tramitação ordinária, teve sua última ação legislativa em 06 de fevereiro de 2015, quando foi desarquivado nos termos do artigo 105 do RICD, pela Mesa Diretora da Câmara dos Deputados.5

5 Projeto de Lei Ordinária n. 4211/2012. Projetos de Leis e outras proposições. Câmara dos

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Na justificativa de seu projeto, o deputado federal diz:

"o escopo da presente propositura não é estimular o crescimento de profissionais do sexo. Muito pelo contrário, aqui se pretende a redução dos riscos danosos de tal atividade. A proposta caminha no sentido da efetivação da dignidade humana para acabar com uma hipocrisia que priva pessoas de direitos elementares, a exemplo das questões previdenciárias e do acesso à Justiça para garantir o recebimento do pagamento"

Como principais objetivos do projeto de lei 4.211/2012 estão: a desmarginalização da profissão, o combate à exploração sexual através da fiscalização do Estado em prostíbulos, a redução de riscos da atividade, a promoção de melhores condições de trabalho e higiene por meio de políticas públicas e a descriminalização das casas de prostituição.

O art. 1º do referido projeto determina quem pode exercer a atividade. A prostituição deve ser exercida de maneira voluntária e remunerada diretamente, e obrigatoriamente por pessoas absolutamente capazes (maiores de idade com plenas capacidades mentais).

O art. 2º veda a exploração sexual, o que não é o mesmo que prostituição. A exploração ocorreria pela apropriação total ou maior que 50% do rendimento da atividade sexual por terceiro, pelo não pagamento do serviço sexual prestado voluntariamente ou por forçar alguém a se prostituir mediante grave ameaça ou violência, independentemente de maioridade ou capacidade civil.

Atenta-se para o fato de que a crianças prestando serviços sexuais não é prostituição, mas sim exploração sexual. Consta expressamente no Estatuto da Criança e do Adolescente que há a necessidade de proteger o pleno desenvolvimento físico, psíquico e moral do jovem, atendendo, sobretudo, à Convenção 182 da Organização Internacional do Trabalho, que classifica o ato de prostituir-se como uma das piores formas de manifestação do trabalho infantil.

<http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/ fichadetramit acao?idProposicao=551899>. Acesso em 28 janeiro. 2016.

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A exploração sexual, quando a vítima é menor de dezoito anos, é tipificada como crime hediondo tanto pelo Código Penal, nos artigos 214 e 218, quanto pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, dos artigos 240 ao 241-E.

O art. 3º autoriza a prestação do serviço sexual de forma autônoma, em cooperativas e, ainda, nas casas de prostituição (desde que não ocorra algum tipo de exploração/abuso).

No art. 4º, há a definição de novos tipos penais:

“Art. 4º - O Capítulo V da Parte Especial do Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940, Código Penal, passa a vigorar com as seguintes alterações:

“Favorecimento da prostituição ou da exploração sexual.

Art. 228. Induzir ou atrair alguém à exploração sexual, ou impedir ou dificultar que alguém abandone a exploração sexual ou a prostituição:

...” “Casa de exploração sexual

Art. 229. Manter, por conta própria ou de terceiro, estabeleciment o em que ocorra exploração sexual, haja, ou não, intuito de lucro ou mediação direta do proprietário ou gerente:

...” "Rufianismo

Art. 230. Tirar proveito de exploração sexual, participando diretamente de seus lucros ou fazendo-se sustentar, no todo ou em parte, por quem a exerça:

...” Art. 231. Promover a entrada, no território nacional, de alguém que nele venha a ser submetido à exploração sexual, ou a saída de alguém que vá exercê-la no estrangeiro

...” Art. 231-A. Promover ou facilitar o deslocamento de alguém dentro do território nacional para ser submetido à exploração sexual:

...”

É importante ressaltar a mudança prevista no título do art. 229 do CP, pois, apesar da supracitada diferença entre prostituição e exploração sexual, no título do atual artigo 229 do Código consta 'casa de prostituição', ainda que em seu conteúdo esteja prevista a vedação da exploração sexual, o que demonstra que ainda ocorre a associação entre as duas práticas.

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A mudança do título do referido art. do Código Penal para 'casa de exploração sexual' é um dos objetivos do projeto de lei de Wyllys, pois visa desassociar as duas atividades.

Por exemplo, o uso de crianças e adolescente em serviços sexuais é abuso sexual, que é ilegal e deve ser combatido. Nas casas de prostituição, que são aceitas e toleradas pela sociedade, conforme já mencionado, só trabalham profissionais absolutamente capazes, logo, não seriam ilegais.

Com a definição do novo tipo penal determinado pelo art. 4º, ocorrerá a descriminalização dos prostíbulos, que poderão funcionar regularmente junto com as outras formas de prestação de serviços sexuais, ocorrendo, então, o combate à exploração - já que o Estado irá fiscalizar a casa de prostituição, assim como fiscaliza qualquer outro estabelecimento profissional, o que garantirá que somente pessoas capazes estarão exercendo a atividade de profissional do sexo.

Além disso, com a licitude da atividade das casas, as profissionais teriam direito à um contrato de trabalho, assim como aos direitos trabalhistas oriundos deste, o que será discutido posteriormente.

Há, ainda, o art. 5º do projeto Gabriela Leite, que estabelece a aposentadoria especial de 25 anos nos termos do art. 57 da Lei 8.213/91.

A referida aposentadoria é concedida aqueles que exercem o trabalho em condições adversas à saúde, com riscos superiores aos normalmente aceitos, em decorrência da exposição a agentes nocivos químicos, físicos ou biológicos, após 25 anos de exercício da profissão. No caso das trabalhadoras do sexo, o risco à saúde está na constante exposição a doenças sexualmente transmissíveis.

Salienta-se que a concessão da aposentadoria extraordinária depende de comprovação perante o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) da exposição aos agentes nocivos - exposição essa que deve ser de modo permanente, não ocasional nem intermitente -, através de laudos técnicos a serem elaborados por médicos do trabalho ou engenheiros de segurança do trabalho.

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Por fim, ocorrendo a descriminalização das casas de prostituição - e tirando o foco da área penal - haverá consequências significativas para o direito do trabalho e para o direito previdenciário em razão do vínculo de trabalho que iria se criar entre os profissionais e as casas, como será visto a seguir.

As mudanças apresentadas na propositura do projeto têm como objetivo tirar os profissionais do sexo do submundo, trazendo-os para o campo da licitude e garantindo-lhes a dignidade inerente a todos os seres humanos.

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3.1 - Formação do contrato:

Conforme já discutido, com a aprovação do PL Gabriela Leite, e a descriminalização das casas de prostituição, será possível a formação de um contrato de trabalho entre a profissional e o cafetão.

O contrato é um 'acordo entre duas ou mais pessoas que transferem entre

si algum direito ou se sujeitam a alguma obrigação'.6 E contrato de trabalho é uma

espécie do gênero contrato, que compreende toda prestação de serviço de uma pessoa natural em beneficio de outrem.

O doutrinador Maurício Godinho Delgado define contrato de trabalho como 'negócio jurídico expresso ou tácito mediante o qual uma pessoa natural

obriga-se perante pessoa natural, jurídica ou ente despersonificado a uma prestação

pessoal, não eventual, subordinada e onerosa de serviços'.7

O contrato de trabalho possui como características: ser um acordo de Direito Privado, sinalagmático, consensual, intuito personae, de trato sucessivo, de atividade, oneroso, comutativo, dotado de alteridade e pode vir acompanhado de outros contratos anexos (contrato complexo).

É um contrato de direito privado devido a natureza privada não só dos indivíduos pactuantes, mas também dos interesses envolvidos. É sinalagmático porque as partes assumem obrigações contratuais contrapostas, havendo reciprocidade entre as obrigações contratuais, que levam a um equilíbrio dessas prestações.

É consensual por não depender de regras formais e solenes, podendo ser pactuado até mesmo tacitamente, pois se aperfeiçoa com a mera manifestação de

6 FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo Dicionário da Língua P ortuguesa, p. 377 7 DELGADO, Maurício Godinho. Curso de direito do trabalho, p. 477

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vontades. Já contrato celebrado intuito personae/pessoal é uma característica relativa ao empregado, que deve realizar o contrato pessoalmente, visto que é contratado devido a características pessoais que ele possui.

Contrato de trato sucessivo é aquele no qual suas prestações se sucedem no tempo ao longo do prazo contratual, ou seja, sua execução continuada não se esgota no tempo. O contrato de atividade é aquele que tem como centro a obrigação de fazer, que se cumpre continuamente no tempo.

É oneroso porque há a obrigação de remunerar, há troca de sacrifícios e vantagens contratuais, com cada parte contribuindo com uma obrigação economicamente mensurável. Já no contrato comutativo há uma comutatividade quando ambas as prestações vêm de ambas as partes, sendo as prestações conhecidas desde o início da contratação.

O contrato dotado de alteridade é aquele no qual o risco inerente à prestação de serviços e a seu resultado são estranhos à figura do empregado, pois recaem sobre a figura do empregador. E, por fim, contrato complexo ocorre quando há associação entre contratos, pois o contrato principal vem acompanhado de contratos anexos ou acessórios.

Importante salientar a diferença entre contrato de trabalho e contrato de emprego. Godinho pontua:

“A primeira expressão tem caráter genérico: refere-se a todas as relações jurídicas caracterizadas por terem sua prestação essencial centrada em uma obrigação de fazer consubstanciada em labor humano. Refere-se, pois, a toda modalidade de contratação de trabalho humano modernamente admissível. A expressão relação de trabalho englobaria, desse modo, a relação de emprego, a relação de trabalho autônomo, a relação de trabalho eventual, de trabalho avulso e outras modalidades de pactuação de prestação de labor (como trabalho de estágio, etc.). Traduz , portanto, o gênero a que se acomodam todas as formas de pactuação de prestação de trabalho existentes no mundo jurídico atual. [...]

A relação de emprego, do ponto de vista técnico-jurídico, é apenas uma das modalidades especificas de relação de trabalho juridicamente configuradas. Corresponde a um tipo legal próprio e específico, inconfundível com as demais modalidades de relação de

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trabalho ora vigorantes".8

A relação de emprego, espécie do gênero contrato de trabalho, está formada quando presentes os requisitos previstos nos arts. 2º e 3º da CLT, que são: I. pessoa física, pois pessoa jurídica prestadora de serviços não pode ser considerada empregada; II. trabalho prestado de forma contínua; III. trabalho subordinado, pois o empregado deve cumprir ordens de seu empregador; IV. e trabalho prestado de forma não voluntária, ou seja, deve haver uma contraprestação.

Dispõem os artigos 2º e 3º da CLT:

"Art. 2º - Considera-se empregador a empresa, individual ou coletiva, que, assumindo os riscos da atividade econômica, admite, assalaria e dirige a prestação pessoal de serviço."

"Art. 3º - Considera-se empregado toda pessoa física que prestar serviços de natureza não eventual a empregador, sob dependência deste e mediante salário."

Logo, pode-se afirmar que a relação empregatícia só "nasce" quando há a reunião desses elementos, que são: subordinação jurídica; pessoalidade; pessoa física; não eventualidade e onerosidade.

Após o nascimento da relação empregatícia, o operador jurídico deve conferir validade a esta relação, verificando se estão presentes os requisitos de validade essenciais. Tais requisitos estão previstos no art. 104 do Código Civil e são exigidos em todos os demais contratos celebráveis no ordenamento jurídico pátrio, visto que a sua ausência pode gerar a nulidade do contrato.

Os elementos essenciais do contrato são: agente capaz; objeto lícito, possível, determinado ou determinável; forma prescrita ou não vedada por lei. Acrescenta-se, ainda, a manifestação da vontade ou consentimento.

Segundo Mauricio Godinho Delgado:

8 GODINHO, P. 285, 2007

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"Essenciais são aqueles elementos constitutivos do contrato sem os quais não se confere validade, no mundo jurídico, ao pacto firmado. Consideram-se como virtuais requisitos à configuração efetiva da relação jurídica de corte contratual. Concernem às pessoas contratantes (sujeitos) – à sua capacidade e legitimação. Concernem, também ao objeto do pacto estabelecido – à sua idoneidade ou não. Pertinem, finalmente, ao consenso que levou ao ajuste – pesquisa-se pela higidez ou não da manifestação da vontade das Partes. A esses três elementos, aduza-se a forma de exteriorização do contrato asssentido."9

Um agente capaz é aquele que pode exercer pessoalmente seus direitos e responder por suas obrigações. Há agentes que são considerados incapazes pela lei, sendo proibidos de exercer pessoalmente todos ou alguns atos jurídicos em decorrência de não possuir os requisitos indispensáveis para tal, devendo ser representados ou assistidos.

No contrato de trabalho os agentes são o empregador e o empregado. O empregador é a pessoa natural, jurídica ou o ente despersonificado capaz de assumir direitos e obrigações trabalhistas (art. 2º da CLT). E o empregado será considerado plena ou absolutamente capaz quando atingir 18 anos; O menor entre 16 e 18 anos precisa da assistência de um representante legal, pois é considerado relativamente capaz; E o jovem com idade entre 14 e 16 anos só poderá trabalhar na condição de aprendiz.

O contrato também deve apresentar um objeto lícito, de modo que não traga desabono às partes contratantes e/ou à sociedade. A idoneidade do objeto deverá ser avaliada durante a formação do contrato, e se observada antes que o contrato produza os seus efeitos, do mesmo fica com sua validade comprometida. Ressalta-se que trabalho ilícito é diferente de trabalho irregular/proibido.

O segundo consiste no desrespeito a uma norma proibitiva do Estado, e pode ter seus efeitos trabalhistas reconhecidos se corrigido o vício do contrato; É o caso do trabalho executado por menores em período noturno. Já o trabalho ilícito

9 DELGADO, Maurício Godinho. Curso de direito do trabalho Estudos em memória de Célio Goyatá,

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consiste em um tipo legal penal ou concorre diretamente para ele e, em regra, torna o contrato inválido.

No entanto, a doutrina tem citado algumas situações em que o contrato de emprego pode ter efeitos reconhecidos, ainda que seu objeto seja ilícito. São elas: o trabalhador desconhecer a ilicitude de sua atividade ou quando a atividade prestada pelo empregado e a atividade-fim ilícita não coincidirem.

Por exemplo, aquele que exerce a função de segurança de uma casa noturna, onde, na verdade, funciona um prostíbulo. Logo, a regra geral de imperativa necessidade de licitude do objeto comporta algumas exceções no Direito do Trabalho.

Ainda, os contratos devem ter a forma que a lei exige ou, no caso de não haver previsão, forma que não seja vedada pela legislação. Os que têm forma livre, aperfeiçoam-se pela mera troca dos consentimentos, devendo-se apenas observar cláusulas mínimas e detalhes específicos para o caso concreto, e os contratos solenes dependem de forma imposta em lei.

No direito do trabalho, não há regras rígidas quanto à forma dos contratos, sendo válidos os acordos verbais e destituídos de formalidades - no entanto, há exceções que exigem forma específica, como o contrato de trabalho do atleta profissional de futebol, artista profissional e trabalho terceirizado. Mas, em regra, o contrato de emprego não possui forma prescrita.

Acrescenta-se, por último, o consentimento de ambas as partes. Se restar provado que a manifestação de vontade estava viciada - por dolo, erro, ou coação - o contrato poderá ser anulado, cabendo a parte lesada provar tal situação.

Como os contratos trabalhistas possuem, em geral, um caráter de adesão, a manifestação de vontade do empregador não contribui muito, fazendo com que as normas trabalhistas possuam regras imperativas voltadas a equilibrar as partes.

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Além dos requisitos de validade essenciais, há os naturais e os acidentais. Elementos naturais do contrato não são indispensáveis à sua formação, porém, estão presentes recorrentemente. E elementos acidentais do contrato - condição e termo - aparecem apenas esporadicamente no contrato.

Portanto, conclui-se que a relação de emprego só se torna completa, podendo gerar plenos efeitos, quando estão reunidos os elementos para seu "nascimento" (quando passa a existir) e para sua validade.

3.2 - O contrato na prostituição:

O PL Gabriela Leite pretende, com a descriminalização dos prostíbulos, possibilitar a formação de um contrato entre a prostituta e a casa, conforme já mencionado. Esse contrato seria um contrato de trabalho, ou, para ser mais específico, um contrato de emprego.

Trazendo os apontamentos anteriores quanto a formação de um contrato para o âmbito do trabalho exercido pelos profissionais do sexo, vamos passar a análise dos elementos de existência e de validade do contrato que se formaria no cenário de aprovação do PL.

Para que possa existir o contrato de emprego da profissional do sexo, ele deverá possuir os requisitos presentes nos arts. 2º e 3º da CLT, conforme visto anteriormente.

A subordinação jurídica ficaria evidente na relação prostituta-cafetão com a existência do chamado poder diretivo do empregador, por assumir os riscos do negócio. Trata-se da supervisão do trabalho. Esse poder serve para que o patrão dirija, oriente, fiscalize e puna o seu empregado - claro, dentro dos limites permitidos.

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que o prestador de serviços não poderá ser substituído por outro. No caso em análise, a prostituta contratada deverá prestar seu serviço pessoalmente, apenas podendo ser substituída quando houver consentimento do tomador de serviços - o que não afastaria necessariamente a pessoalidade com relação ao trabalhador original. Atenta-se, no entanto, que a substituição tende a configurar uma nova situação jurídica.

O terceiro requisito diz respeito ao fato do empregado dever ser sempre uma pessoa natural, não podendo haver contrato de trabalho quando figura como contratado uma pessoa jurídica. O fato da prostituta - empregada - ser pessoa física garante a existência do contrato de emprego quanto a esse requisito também.

A não eventualidade é o empregado colocar a sua força de trabalho à disposição do empregador de modo habitual, fazendo com que o patrão possa ofertar aquele trabalho de maneira permanente e regular.

Tal requisito está relacionado ao fato do contrato de trabalho ser de trato sucessivo. Com isso, a prostituta estaria vinculada à casa de prostituição que a contratasse, prestando serviços com habitualidade.

E, como último requisito, a onerosidade, que diz respeito à reciprocidade de obrigações - o empregado oferece o serviço e o empregador a remuneração por ele. Essa exigência está ligada ao art. 1º do PL em estudo, quando, ao definir quem poderia exercer a prostituição, exige-se que seja de forma remunerada. Como visto, o PL está em total acordo com as exigências atuais para a formação de um contrato de emprego.

Com isso, estariam preenchidos todos os requisitos e o contrato passaria a existir. Mas, poderia ser válido?

Passamos agora à análise dos requisitos de validade.

Os agentes capazes estariam presentes no contrato na medida em que a casa de prostituição-empregador possuir o poder diretivo e assumir direitos e

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obrigações. Já a prostituta-empregada deverá possuir mais de 18 anos e plena capacidade mental, o que nos remete também ao art. 1º do PL Gabriela Leite, visto que também exige capacidade absoluta para exercer a prostituição.

Quanto à forma, já foi dito que o direito do trabalho - com raras exceções - não exige uma forma para o contrato, bastando que respeite detalhes específicos em cada caso. Logo, até mesmo um contrato verbal entre a profissional e a casa seria válido.

A manifestação de vontade das partes, livre de qualquer vício, remete, mais uma vez, ao art. 1º do PL, que determina que a prostituta deve exercer a profissão voluntariamente.

O que nos leva a um último requisito de validade: o objeto lícito. E é nesse tema que a aprovação do projeto geraria a maio mudança.

Atualmente, fica clara a impossibilidade de se reconhecer o vínculo empregatício existente entre as profissionais e a casa, pois, conforme já mencionado, uma vez ilícita a prática devido a criminalização dos prostíbulos, resta descaracterizada a formação do contrato tal como legalmente exigido, pela ilicitude do objeto.

Porém, com a aprovação do PL e a descriminalização das casas de prostituição, o objeto seria lícito, e o contrato poderia ser válido, visto que a atividade prestada não consistiria em um tipo penal.

E com o vínculo empregatício, os profissionais do sexo passariam a ter todos os direitos trabalhistas inerentes ao contrato de trabalho, tais como anotação na CTPS, salário mínimo, férias, décimo terceiro, FGTS e demais prerrogativas elencadas no artigo 7º da Constituição Federal, bem como seus direitos previdenciários.

Importante salientar que a concessão dos referidos direitos trabalhistas dependeria de leis que regulamentassem a profissão.

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Em conjunto com tais encargos, o empresário dono da casa de prostituição também estaria responsável pelo cumprimento das obrigações previdenciárias decorrentes do reconhecimento da relação de trabalho, mormente no que se refere ao pagamento das contribuições para a Seguridade Social.

Pois, uma vez descriminalizadas as casas de prostituição, estas estariam obrigadas a se constituírem sob os moldes da lei civil, e, na condição de pessoas jurídicas empregadoras, deveriam recolher, juntamente com todos os demais impostos, as contribuições sociais acima mencionadas. De igual forma, estariam os profissionais do sexo também incumbidos de recolher suas contribuições.

Assim, estaria formado um contrato de emprego válido.

Com isso, fica evidente o propósito do Projeto do deputado Wyllys, que é justamente levar o Estado para dentro das casas de prostituição, que passariam a ser estabelecimentos comerciais como todos os outros. As casas existem, sempre existiram e vão continuar existindo.

Levar o Estado para fiscalizar o que ocorre no interior das mesmas, faria com que as profissionais tivessem seus direitos e sua dignidade protegidos e garantiria aos clientes um serviço de qualidade.

No entanto, apesar de no Brasil não se reconhecer o vínculo prostituta -prostíbulo, reconhece-se como relação de emprego verdadeiros “contratos de promiscuidade”. É o que ocorre quando a profissional exerce alguma outra atividade - como dançarina ou garçonete - além da prostituição.

Ou seja, profissões que são consideradas lícitas, tal como a de dançarina, permitem o reconhecimento de vínculo empregatício com uma boate, ainda que esta profissional exerça, no mesmo local de trabalho, a prostituição. Neste sentido, na fala dos Tribunais, a prostituição é vista como objeto ilícito de um contrato de emprego, embora em momento algum se questione a licitude ou não da atividade

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empresarial que emprega tal força de trabalho.10

Por fim, importante salientar que, pelo fato do exercício autônomo da profissão não ser ilegal, há quem afirme que ocorre a formação de um contrato de trabalho entre a prostituta autônoma e seu cliente.

Dentro da natureza jurídica, ela exerce um contrato temporário, outra espécie do gênero contrato de trabalho. Nessa relação, o serviço é prestado por uma pessoa física para outra pessoa física, com uma das partes contratando outra por um tempo determinado sem ter nada assinado, um contrato verbal. A profissional apresenta seu preço e como deseja ser tratada, se o cliente estiver de acordo, aceita. Forma-se, então, a relação contratual temporária.

3.3 - Princípios constitucionais:

Podemos citar quatro princípios presentes na Carta Magna que estão

10 Neste sentido, dois julgados são paradigmais. O primeiro deles é o Recurso Ordinário 1125/00, do

Tribunal Regional da 3ª Região, publicado no Diário de Justiça de Minas Gerais em 18 de novembro de 2009: “DANÇARINA DE CASA DE PROSTITUIÇÃO – POSSIBILIDADE DE RECONHECIMEN TO DE VÍNCULO EMPREGATÍCIO – Restando provado que a autora laborava no estabelecimento patronal como dançarina, sendo revelados os elementos fático-jurídicos da relação de emprego, em tal função, não se tem possível afastar os efeitos jurídicos de tal contratação empregatícia, conforme pretende o reclamado, em decorrência de ter a reclamante também exercido a prostituição, atividade esta que de forma alguma se confunde com aquela, e, pelo que restou provado, era exercida em momentos distintos. Entendimento diverso implicaria favorecimento ao enriquecimento ilícito do reclamado, além de afronta ao princípio consubstanciado no aforismo utile per inutile vitiari non debet. Importa ressaltar a observação ministerial de que a exploração de prostituiç ão, pelo reclamado, agrava-se pelo fato de que "restou comprovado o desrespeito a direitos individuais indisponíveis assegurados constitucionalmente (contratação de dançarinas, menores de 18 anos), o que atrai a atuação deste ministério público do trabalho, através da coordenadoria de defesa dos interesses difusos, coletivos e individuais indisponíveis – Codin". O outro julgado advém do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região, Recurso Ordinário 01279.371/97-8, publicado no DOERS em 06 de outubro de 1999: “RELAÇÃO DE EMPREGO – Garçonete e copeira. Bar e boate. Reconhecido pelas testemunhas do próprio reclamado os serviços de garçonete e copeira, com habitualidade e subordinação jurídica, a atividade de prostituição imputada à autora, mesmo que fique demons trada, não é fato impeditivo de que se reconheça relação de emprego pelo exercício concomitante de outra atividade. Vínculo empregatício reconhecido. Remessa à origem. Apelo provido.”

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ligados ao assunto hora em estudo: o da autonomia de vontade, que permite que se faça o que quiser sem ferir o outro, considerando que cada um tem a sua vontade; o da dignidade humana, que versa sobre dar uma vida digna a todos com melhor convívio social; o da não discriminação, que é significativo em relação ao trabalho da prostituta; e o da liberdade profissional.

Tais princípios contribuem com a ideia de que a profissionalização da prostituição daria garantias mínimas a uma classe trabalhadora, assim como todas as demais já possuem. A seguir, analisaremos tais princípios.

Comecemos pelo princípio da autonomia da vontade. Este princípio consiste basicamente na liberdade contratual das partes, de criarem relações jurídicas de acordo com seus interesses, desde que se submetam as regras impostas pela lei e que seus fins coincidam como o interesse geral, ou não o contradigam.

Para Maria Helena Diniz:

“O principio da autonomia da vontade se funda na liberdade contratual dos contratantes, consistindo no poder de estipular livrement e, como melhor convier, mediante acordo de vontades, a disciplina de seus interesses, suscitando efeitos tutelados pela ordem jurídica.”11

Este princípio foi consagrado no século XIX, quando os modelos clássicos de contratos tinham concepções de ampla liberdade de contratar e total submissão aos seus termos - alguns doutrinadores chegaram a afirmar que os contratos eram lei entre as partes.

Com a ideologia de um estado mais liberal, já no século XX, notou-se que as relações contratuais individuais passaram a apresentar certos desequilibrios, que acabavam por conflitar com os interesses da coletividade.

Atualmente, com a supremacia da ordem pública, a liberdade de contratar

11 DINIZ, Maria Helena. Curdo de direito civil brasileiro. Teoria das Obrigações Contratuais e

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encontra-se limitada pelos interesses da sociedade, estando subordinado ao interesse coletivo, conforme determina o art. 421 do CC: “a liberdade de contratar

será exercida em razão e nos limites da função social do contrato”.

Logo, quando a autonomia confrontar diretamente com o interesse coletivo, o Estado deve atuar, visto que não pode deixar de atender ao bem comum e/ou a fins sociais em prol de um interesse individual.

A partir desse princípio constitucional, se a prostituta autônoma deu seu preço e o cliente aceitou, está firmado o contrato de prestação de serviços temporário, conforme mencionado anteriormente, com obrigações para ambas as partes. Essa forma de contrato não foi legalizada devido à falta de interesse e ao preconceito que até hoje assola nossa sociedade, ainda que esteja em total acordo com o previsto na Carta Magna.

Qualquer pessoa capaz pode licitamente criar uma relação jurídica por meio da livre manifestação de sua vontade. Com a descriminalização das casas de prostituição, o fato da profissional - capaz e de forma voluntária - manifestar vontade de estabelecer aquele contrato, faz com que a relação contratual possa ser estabelecida, com proteção jurídica às partes envolvidas, que terão seus interesses satisfeitos da forma como for melhor para a coletividade.

Logo, se a profissional possui a vontade, e essa não ferir o outro, não por que impedir que essa vontade se concretize.

O segundo princípio presente na Constituição Federal que está relacionado ao PL é o da dignidade da pessoa humana, que está previsto no art. 1º, inciso III. Ingo Wolfgang Sarlet conceitua a dignidade da pessoa humana:

“Temos por dignidade da pessoa humana a qualidade intrínsec a e distintiva de cada ser humano que o faz merecedor do mesmo respeito e consideração por parte do Estado e da comunidade, implicando, neste sentido, um complexo de direitos e deveres fundamentais que asseguram a pessoa tanto contra todo e qualquer ato de cunho degradante e desumano, como venham a lhe garantir as condições existenciais mínimas para uma vida saudável, além de propiciar e promover sua participação ativa e co-responsável nos destinos da própria existência e da vida em

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comunhão com os demais seres humanos”.12

O referido princípio é um dos fundamentos do Estado brasileiro, todos os demais princípios devem se basear no respeito à pessoa humana. As profissionais do sexo não têm sua dignidade preservada como deve e como exige a Carta Magna em seu art. 1º. Sofrem preconceito pelo fato de exercerem uma profissão considerada imoral - porém por elas considerada digna.

Conforme mencionado, não há nenhum ordenamento jurídico que as proteja, apesar de que seja direito de todo trabalhador possuir condições boas de emprego, com direitos e garantias protegidos pelo governo. Ao mesmo tempo em que se questionam o exercício de sua profissão acerca da sua dignidade, deve-se atentar para os motivos pelos quais a prostituta a exerce - como todo profissional, está em busca de um sustento, um meio para se manter viva.

A dignidade humana é um valor universal, não se levando em consideração diferenças socioculturais dos povos. Embora diferentes em sua individualidade, pela sua condição humana, todas as pessoas apresentam as mesmas necessidades e faculdades vitais; ignorando-se diferenças físicas, intelectuais, psicológicas.

Assim, diante de tantos sofrimentos visíveis, há a necessidade de uma inclusão social mais eficiente dessas profissionais. Segundo o princípio da dignidade humana, ninguém poderá ser tratado como objeto, havendo deveres de respeito e de solidariedade uns com os outros visando a proteção de todo ser humano, para, assim, haver um melhor convívio social.

O terceiro princípio constitucional é o da não discriminação, que está diretamente relacionado à garantia da dignidade e à promoção do desenvolvimento humano, e serve como uma espécie de diretriz geral que veda o tratamento desigual

12 SARLET, 2007, p.62

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à uma pessoa com base em fatos injustamente considerados desqualificantes. Importante ressaltar que a não discriminação decorre do princípio constitucional da isonomia, e é uma manifestação do princípio da igualdade - em sua vertente igualdade em direitos -, visto que somente a igualdade perante a lei, fruto do Estado Liberal, não foi o bastante para tutelar os indivíduos.

Discriminar uma pessoa é dar a ela um tratamento pior ou injusto, que não seja compatível com o padrão jurídico estabelecido para o caso concreto vivenciado por ela, tomando como fundamento características puramente pessoais.

Trazendo a questão para as relações de trabalho, fica clara a discriminação, principalmente, de negros e mulheres em função de estereótipos preconceituosos, ainda que existam outros fatores realmente importantes na distinção entre trabalhadores, tais como competência, experiência e qualificação. Logo, o princípio da não discriminação tem como objetivo afastar essas práticas negativas que ocorrem no âmbito das relações de trabalho.

Na Carta Magna, estão estabelecidos direitos que podem ser considerados consequência do princípio da não discriminação no trabalho.

Um exemplo claro é o fato de estar, entre os objetivos fundamentais da nossa República, a promoção do bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.

Importante salientar que também consta na Constituição Federal de 1988 a proibição de diferenças salariais e de critérios de admissão por motivos de sexo, idade, cor ou estado civil, ou de diferenças de critérios de admissão e de salário em razão de deficiência física.

A Declaração Universal dos Direitos do Homem de 1948 já dispunha sobre a importância da não discriminação, com destaque para os arts. 1º e 7º, nos quais estabelece que todos os seres humanos já nascem livres e iguais em dignidade e em direitos, sendo, então, iguais perante a lei, tendo direito à igual

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proteção legal contra qualquer discriminação que viole dispositivos da Declaração, bem como qualquer incitamento a tal discriminação.

Assim, a prostituição, apesar de ser uma profissão como outra qualquer, é tratada de forma preconceituosa, com base em concepções e opiniões pessoais do discriminador, que não só não aceita o trabalho daquela, ainda que legalizado, mas também, muitas vezes, reage com agressões físicas, verbais e morais a essa profissional, que está apenas exercendo sua profissão.

Ressalta-se que qualquer posição interpretativa que faça discriminação suplantando direitos trabalhistas deve ser considerada manifestadamente inconstitucional.

E, por último, o principio da liberdade profissional. A liberdade de ser profissional é um artigo genérico, que não faz especificação ou taxatividade quanto aos profissionais que estão enquadrados, fazendo com que todos estejam incluídos, inclusive as prostitutas.

Escolher a profissão de forma livre é um direito inviolável, de modo que apenas poderá sofrer restrições por parte do Estado em casos de necessidade, cujo objetivo seja a proteção da vida, da saúde, da segurança, além de condições adequadas à educação e à defesa de valores morais. Deste modo, a lei poderá estabelecer restrição fundada em um potencial lesivo do exercício daquela determinada profissão.

A própria Carta Magna admite que possam existir limitações, como a necessidade de qualificação para certas atividades, como, por exemplo, o exame de ordem para o exercício da profissão de advogado. E, como não há qualquer vedação legal à prostituição ou a outro direito constitucional que poderia ser contraposto, a liberdade de ofício da prostituta é plena.

O próprio Estado brasileiro reconheceu, através do Ministério do Trabalho e Emprego, a atividade da profissional do sexo como ocupação no Cadastro Brasileiro de Ocupações (CBO), conforme já explicitado neste trabalho.

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Assim, o princípio reafirma a possibilidade de se exercer a profissão para a qual cada um se sente mais vocacionado. Assim, como qualquer outro trabalhador que tem seus direitos, nossa Constituição permite que as profissionais do sexo também os tenham, podendo exercer sua profissão de forma digna, sem ferir qualquer outro profissional.

Logo, com o advento da lei Gabriela Leite, as profissionais terão mais dignidade em seu ofício, pois poderão ter direitos como trabalhadores comuns, com todas as garantias, sem sofrer discriminação.

4. ANÁLISE COMPARATIVA

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em diversos países, entre ele: Países Baixos, Alemanha, Áustria, Suíça, Grécia, Turquia, Hungria, Nova Zelândia e Letônia, com o grau de proibição e a legislação variando em cada país. A seguir, analisarei, de maneira breve e objetiva, a profissionalização das trabalhadoras do sexo já ocorrida em outros países como base para a formação de uma opinião crítica acerca do tema como um todo.

Inicialmente, cumpre mencionar que no mundo inteiro vê-se a urgência pela tomada de uma medida contra a exploração sexual e pelos direitos das trabalhadoras do sexo.

Não são poucos os movimentos que têm como objetivo a dignidade da profissional, buscando mais do que apenas a regulamentação do exercício da profissão, mas também que se constituam como classe, formando um movimento de natureza coletiva.

Com isso, ficaria mais fácil lutar pelo fim dos preconceitos contra a prostituição, pela concessão de condições salubres para a prática da atividade e exigir o pagamento que lhes é devido.

Nos Países Baixos, a prostituição se encontra regulamentada desde o ano de 2.000, havendo, inclusive, determinados locais das ruas destinados ao exercício dessa atividade. As moças que trabalham em Amsterdã devem exercer a profissão por livre e espontânea vontade, assim como previsto no PL Gabriela Leite.

No entanto, lá existe uma lei que proíbe a exploração de terceiros, o que significa que não há a figura do cafetão como no Brasil, todas trabalham de forma autônoma. Além disso, a lei holandesa de profissionalização prevê que deve haver um registro da trabalhadora na prefeitura, que cobra impostos de acordo com o número de clientes - o controle é feito por câmeras que filmam a frente da chamada "vitrine" onde as prostitutas se expõem.

Uma imobiliária é encarregada de alugar essas vitrines e também pela segurança; Por exemplo, há um botão de pânico dentro do cubículo que chama uma equipe que vai checar o que está ocorrendo quando acionado.

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A regulamentação da prostituição na Holanda também estabeleceu regras rígidas para quem explora menor sexualmente e para quem trafica mulheres. Tais medidas se fazem necessárias porque, com a "autorização" da prostituição, deve-se considerar a possibilidade de um aumento da demanda de profissionais, visto que se torna uma atividade lícita, e a migração de prostitutas estrangeiras - vindas de países nos quais não é legalizada - para trabalharem de maneira legal.

Ainda, é de extrema importância mencionar que os países que profissionalizaram a prostituição, em sua maioria, não têm tido êxito em efetivar tais inscrições. Ocorre que as mulheres hesitam em assumir-se como “trabalhadoras do sexo” e os chefes deixam de proceder a essas inscrições para evitarem pagar os impostos e descontos.

Além disso, há o fato de que as estrangeiras que não possuem autorização de residência serem proibidas de proceder a tais inscrições, o que gerou entre as profissionais uma disputa desonesta, com a diminuição dos preços cobrados pelo serviço, a precarização das relações e o aumento da tensão entre a sociedade civil e as trabalhadoras do sexo.

Há treze anos, foram votadas por parlamentares da Nova Zelândia, reformas nas leis no que tange à prostituição, tendo ocorrido um intenso debate e mobilização de profissionais do sexo, organizações de mulheres e defensores da saúde pública.

O chamado Prostitution Reform Act 2003 (PRA) gerou uma grande mudança e tinha como objetivo a descriminalização da prostituição e a proteção aos direitos humanos das trabalhadoras do sexo, visando protegê-las da exploração.

A PRA não permite que os donos de bordéis promovam seu negócio a partir de propagandas nas quais afirmas que suas funcionárias são livres de doenças sexualmente transmissíveis (DSTs); Pelo contrário, é exigido que eles promovam de maneira explícita o sexo seguro.

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base em consultas com trabalhadoras do sexo e donos de prostíbulos, nas quais indicam formas seguras de prestar os serviços.

Essas diretrizes também abordam temas como saúde sexual e reprodutiva, na qual reforçam a importância de haver testes regulares - porém não obrigatórios -, mas reconhecendo que o uso da camisinha e outros métodos de prevenção que são os meios mais eficientes contra as DSTs.

No entanto, anos após tal reforma, a Nova Zelândia ainda não obteve sucesso em alterar o regime de exploração sexual que havia antes da mudança na lei. Grande parte das mulheres continuou enganando a polícia, deixando de denunciar a violência a que são submetidas. Além disso, há quem afirme que, depois da legalização, houve um aumento do tráfico de crianças.

Outro exemplo é a Suécia, que segue um posicionamento um pouco diferente, visto que a política de lá é descriminalizar quem vende o sexo e culpar quem compra, de modo que, de acordo com a lei sueca, o vendedor é a vítima.

No caso da Alemanha, a chamada Lei de Prostituição foi aprovada em 2002, durante o governo de coalisão de verdes e socialistas, legalizando o trabalho sexual. Antes dessa lei, esse tipo de trabalho não era considerado ilegal e nem proibido, havendo o pagamento de impostos pelas pessoas que exerciam essa atividade. Porém, ao mesmo tempo, a sociedade civil em si considerava a atividade imoral e sem valor jurídico.

Cinco anos após a introdução da lei alemã, o Ministério da Família fez uma avaliação do que a nova legislação havia conseguido. O relatório demonstra que os objetivos haviam sido apenas parcialmente alcançados e que a legalização não havia trazido qualquer melhoria real mensurável na proteção social das profissionais.

Ainda, o relatório afirma que não havia prova sólida de que a nova lei havia reduzido o número de crimes envolvendo o trabalho sexual e que as condições de trabalho e a capacidade de sair da profissão não tinham melhorado.

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Importante salientar, no entanto, que o foco do presente trabalho é analisar apenas a formação do contrato de trabalho entre a profissional e os prostíbulos, nos termos do que foi proposto pelo PL 4.211/12 - o que, conforme já visto, seria benéfico para as prostitutas.

Portanto, a análise comparativa com outros países tem como objetivo apenas demonstrar o que ocorreu na prática, a título exemplificativo, com a aprovação de projetos de lei semelhantes ao em estudo quanto a todos os aspectos que a legalização traz em si, e não apenas quanto ao aspecto contratual.

5. CONCLUSÃO

Diante do exposto, não há dúvidas de que as trabalhadoras do sexo, independentemente de prestarem um serviço lícito ou não, têm direito a garantias básicas e devem ser protegidas pelo ordenamento jurídico. Um mínimo de dignidade se faz necessário pela simples condição de ser humano das profissionais.

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