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Vista do O pensar filosófico segundo Martin Heidegger

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Academic year: 2021

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O pENSAR fILOSófICO SEGUNDO MARTIN HEIDEGGER

Maria Luzia Dantas

Walter Moreira

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Maria Luzia Dantas

Mestre em Filosofia (PUC–SP). Especialista em Filosofia da Existência (Universidade Católica de Brasília).

Docen-te e membro do Comitê de Ética (FaDocen-tea).

Walter Moreira

Doutorando em Ciência da Informação (ECA/USP). Mestre em Biblioteconomia e Ciência da Informação (PUCCamp). Docente e Coordenador do Núcleo de Publicações (Fatea).

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pALAVRAS-CHAVE

KEyWORDS

RESUMO

AbSTRACT

Este artigo pretende refletir sobre os três modos de pensar segundo Heidegger e o que é para ele o pensar filosófico. O filosofar acontece no ser humano, não é algo que se deixa apreender por conceitos. Por isso o pensamento de Heidegger permanece como um desafio para o mundo contemporâneo.

Heidegger; Filosofia; Essência; Metafísica

This paper’s objective is to research how Heidegger conceives philosophy’s essence. What’s metaphysics for him? The word philosophy in Greek me-ans pathways and Heidegger invite to ingress on it. So that is possible be back at the origin of the Greek thinking, moreover, back to the pre-socratic. The end of the paper shows that philosophy happens in human being. The Heidegger’s thinking is a challenge for contemporary word. It’s important to remain in meditation.

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INTRODUçÃO

Algumas questões têm sido colocadas a respeito do pensamento de Heidegger, dentre elas: o que caracteriza seu pensamento? Em que con-siste o pensar tipicamente filosófico para Heidegger? Já não se sustenta mais na filosofia o pensar metafísico da filosofia tradicional, o qual foi assumido pela ciência. Segundo o filósofo o pensar típico da metafísica acabou e a filosofia não pode competir com a ciência.

Como conceber um novo modo de pensar que seja típico da filosofia? Heidegger se debruça sobre essa questão de modo muito sério, como testemunham diversas palestras e escritos. Afinal de contas, o que é pen-sar? Heidegger escreve um livro com este título: Que significa penpen-sar? O que há de novo na concepção de pensar proposta por Heidegger? Sempre se falou do saber filosófico, mas sabemos o que é filosofia? Parece que todo mundo sabe o que ela é, mas Heidegger quer ir mais fundo na questão e fazer ver o que é filosofia em sua vigência essencial. Por isso, ele pergunta no título de um de seus escritos: Que é isto, a filosofia? Nesse escrito, Heidegger reflete sobre a superação da metafísica. Mas o que significa, filosofia após a superação da metafísica? Nos dois primei-ros capítulos de seu livro: Os conceitos fundamentais da Metafísica:

mundo, finitude, solidão, volta a refletir sobre a essência da filosofia,

admitindo-lhe uma essência dúbia.

Neste texto, busca-se compreender como Heidegger, filósofo contempo-râneo, procura responder a estas questões e qual o desafio que lança para o mundo contemporâneo. Esse filósofo é referência imprescindível para quem pretenda tratar da questão da essência da filosofia. Será abordada aqui a questão das três formas de pensar em Heidegger.

TRÊS fORMAS DO pENSAR EM HEIDEGGER

Heidegger distingue três formas de pensar. Seu livro Que significa

pensar?, segundo Stein (2002), pode ser lido como uma introdução

à filosofia que traz algumas das características principais de toda obra heideggeriana. Mas quando Heidegger fala em aprender a pensar ou que “ainda não pensamos”, estas afirmações, podem se referir àquilo

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que o filósofo chamará “fim da filosofia e o começo do pensar” (STEIN, 2002, p. 29).

Stein (2002) afirma ainda que para que compreendamos a abordagem do pensar em Heidegger é importante conhecer aquilo que o filósofo escreveu, sobretudo depois dos anos 40. Além de elaborar as condições da pergunta pelo sentido do ser e realizar incursões pela história do es-quecimento do ser, importa descobrir as conseqüências das duas etapas anteriores que são apresentadas como fazendo parte do Heidegger I e II, quando o filósofo afirma que “a ciência não pensa, porque, segundo o modo de seu procedimento e de seus recursos, ela jamais pode pensar” (HEIDEGGER, 2002, p. 115).

Em “Que significa pensar?”, Heidegger aborda as diferentes formas do pensar que não se identificam propriamente com o pensar que constitui o objeto de sua investigação. Stein (2002) identifica três formas de pensar na obra do filósofo. Nosso objetivo é, então, procurar compreender o que Heidegger quer expor, analisando os três modos de pensar propostos.

pRIMEIRO MODO DE pENSAR: DA pSICOLOGIA

De início, é importante ressaltar que o primeiro tipo de pensar foi apre-sentado de muitas formas na história da filosofia e das ciências ocidentais. Esta é uma atividade que é atribuída ao ser humano, na sua condição própria, específica. Nos últimos séculos, esse pensar foi convertido à dimensão física e sensível de um ser biológico dotado de psiquismo. Desse modo, o pensar é objeto da psicologia, da antropologia e se tornou tema central nas ciências biológicas na atualidade. Esse pensar, que se refere à animalidade, é então uma característica do ser vivo que, como organismo, chegou a uma forma determinada da evolução.

Heidegger não vê, nessa primeira forma do pensar, a essência do animal racional, como fazia a metafísica, embora esse pensar seja imprescindível para que possamos juntar as determinações atuais em que se fala do animal racional. Neste ponto Heidegger (2002) recorre à afirmação de Nietzsche: “O homem é o animal que ainda não foi constatado”. Tenta mostrar que a afirmação de Nietzsche pode ser compreendida como introdução a uma posição em que situa a essência do ser humano, no

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movimento de o homem atual ser levado para além de si mesmo. Temos então algumas conseqüências dessa primeira forma de pensar: a) o ser humano é remetido para uma esfera em que sua definição não resulta da junção entre animal e racional. Fica, portanto na indefinição sobre si mesmo e não pode ser definido como os outros entes e b) no modo de ser humano, há uma forma de ser-no-mundo que não se reduz à definição de animal racional.

Heidegger em sua obra Os conceitos fundamentais da metafísica, (2005, p. 205) afirma que “A pedra não tem mundo, o animal é pobre em mundo e o ser humano é formador de mundo”.

O que se pode aprender dessa afirmação, tendo presente a primeira forma de pensar? Podemos concluir que o ser humano não é animal. Ao afirmar que o ser humano é formador de mundo, se acentua o fato de que esse ente foge de qualquer catalogação e exige, portanto, uma nova forma de explicitação – a fenomenológica, que deve ser descrita e descoberta em seu modo de existir. Essa nova forma, porém não leva o homem à sua essência. Essa primeira forma de pensar, de acordo com Heidegger, envolve todo o modo de existir, incluindo o biológico, e recebe, desde o início, uma dimensão de transcendência, a qual dife-re, porém, das formas de transcendência da metafísica que buscavam sempre uma fuga da sensibilidade, uma fuga da condição de organismo do ser humano.

SEGUNDO MODO DE pENSAR: DA LóGICA

Na segunda forma de pensar aparece a tentativa de resolver os para-doxos do primeiro pensar (STEIN, 2002, p. 33-34). Foram introduzidos conceitos, como espírito, intelecto, alma, consciência, na tentativa de criar lugar para a sensibilidade.

A tradição analisa esse modo de pensar, afirmando que o ser humano possui racionalidade. Esta linha de pensamento é tributária de Aristóteles, o qual, por meio das definições que separam gênero próximo e diferença específica, distingue o homem do animal em três aspectos: o homem é um animal político, é um animal racional e é o único animal que ri. Nietzsche questiona essa definição e se opõe à tradição que sustenta a

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racionalidade absoluta.

Além disso, tradicionalmente a segunda forma de pensar na metafísica ocidental se reduz à lógica. Pensar, segundo esse modelo é ser capaz de raciocínio e argumentação. Esse pensar, no entanto, é um modo singular de pensar. Essa dimensão da racionalidade contida na lógica não se dife-rencia daquela que cabia nos lugares encontrados para a sensibilidade, a mente, a consciência. A questão do ser humano, enquanto “formador do mundo”, não foi resolvida.

A lógica passou a predominar no segundo tipo de pensar. Daí decorre a história da metafísica ocidental, em suas diversas épocas e, em todas as culturas que por ela foram marcadas. Esse é o modo de pensar que passou a caracterizar a filosofia e as ciências. Ao surgir a questão: “o que significa pensar?”, essa segunda forma de pensar era apresentada como solução.

Quando Heidegger se coloca a questão “que significa pensar?”, faz crítica a esta forma de pensar. Afirma então que, com a prisão a essa forma de pensar, a essência dos domínios da cultura ocidental cai no vazio. O mesmo acontece com as ciências que se movem nesse domínio. Heidegger (2002, p. 115) critica essa queda no vazio e remete a uma nova forma de pensar, a partir da qual ele pode afirmar “que as ciências não pensam”.

TERCEIRO MODO DE pENSAR: DA fILOSOfIA

Para Heidegger, portanto, existe uma terceira forma de pensar e esta não se identifica com um pensar que possa ser colocado ao lado dos outros dois modos como mais um pensar ligado a um objeto. Por isso, apresenta esta terceira forma como a tarefa do pensar e designa-a como a mais digna de se pensar. Afirma: “O mais grave é que nós ainda não pensamos: ainda não, apesar de que a situação do mundo continuamente dá mais o que pensar” (HEIDEGGER, 2005, p. 126). Este pensar para Heidegger envolve as outras duas formas, trata-se do pensar não metafísico ou pós-metafísico. O pós-metafísico é um mundo sem fundamentos absolutos. Quem dá a moldura onde se dá o acontecer do que revela os limites da objetivação da ciência é o ser humano, no seu “modo-de-ser-no-mundo”

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que a filosofia pode descrever como sentido.

Podemos afirmar então com Stein (2002, p. 36) que, “com sua filosofia, Heidegger introduz as condições de possibilidade, ou a moldura onde se situa o ser humano, enquanto pensa as duas primeiras formas de pensar”.

Essa terceira forma de pensar é a que serve de elemento substitutivo para a definição de homem como animal racional e procura determinar a essência do ser humano para um modo de existir, em que ele já é um além de si. Introduz desse modo uma transcendência ligada à existência. Essa transcendência de acordo com o pensamento heideggeriano está ligada à condição formadora do mundo. Este terceiro modo de pensar é, então, o pensar propriamente filosófico.

Desse modo, podemos afirmar que a filosofia é responsável pelo sentido. Sentido aqui tem o significado de condição de possibilidade, abertura que sustenta o contato com o real. Stein (2002, p. 24) afirma que sentido pode identificar-se com a transcendência, ou seja, o sentido é a própria capacidade de transcendência do ser humano, é a força que permite que ele tome distância do real, experimente a separação, o corte que o confirma em sua condição única no universo.

Se considerarmos que pensamento é somente aquele capaz de sentido e em oposição a ele a formulação e o cálculo, então “a ciência não pensa”. O pensamento que calcula recolhe dados e os organiza.

É por isso que, nessa tarefa, os computadores substituem, com progressiva eficiência, a mente humana. Quanto mais matematizável o universo, tanto mais cientificamente con-quistável. Essa conquista a filosofia jamais poderá disputar. Se ela o pretendeu algum dia, sob este ponto de vista, ela terminou hoje como filosofia. [...] (STEIN, 2002, p. 25).

A filosofia emerge numa dimensão diferente daquela do cálculo. Situa-se numa dimensão que o cálculo não atinge. Onde Situa-se revela o limite de possibilidade de sistematização do pensamento operatório, começa o verdadeiro lugar da filosofia. A transcendência é essa força, esse poder de ruptura de todo cálculo. É esse o pensamento que a ciência não pensa e é próprio da filosofia. A linguagem calculadora e operatória prende-o ao

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limite, já o pensamento que dá o sentido (abertura) é capaz de assumir, constantemente seus limites; nele (no não limite) surge a consciência do limite.

Nesse terceiro modo de pensar, Heidegger nos remete a um modo práti-co de ser-no-mundo, a uma familiaridade na relação práti-com os entes. Isso aparece de modo claro em seu pensamento quando ele afirma:

Estamos situados fora da ciência. Em vez disso, por exem-plo, estamos diante de uma árvore florida – e a árvore está diante de nós.Ela se apresenta a nós. A árvore e nós nos apresentamos mutuamente à medida que a árvore aí está, e nós diante dela. Na relação mútua – aí estar colocados um em frente ao outro. A árvore e eu somos (HEIDEGGER, 2005, p. 146-147).

AINDA: QUE SIGNIfICA pENSAR?

Schneider (2005) destaca a pergunta de Heidegger que aparece como título de seu livro: “Que significa pensar?”. Afirma, então, que com esta interrogação somos convidados a embarcar na própria pergunta e navegar com as palavras numa determinada direção. A própria tradu-ção do título das conferências de Heidegger sobre o pensar, provoca a possibilidade de sentidos diferentes. O pensar é apresentado como um verbo substantivado sugerindo atividade, exercício. Vejamos algumas das possibilidades de leitura da questão ou do texto em estudo.

primeira possibilidade

Pensar seria algo que estaria apontando para outra coisa, ou seja, seria o signo de algo. Desse modo teríamos o pensar – pensamento – que poderia representar algo que já é e que, então poderia ser captado em sua forma de ser. O pensamento sob esta ótica seria então uma atividade interpretativa posterior ao que capta. Seria uma atividade observadora e descritiva. Consequentemente surge a necessidade de um observador capaz de perceber as duas coisas: o exercício do pensar enquanto des-crição e aquilo que é descrito.

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Segunda possibilidade

A pergunta poderia expressar a intenção de definir ou denominar o que é o pensar por alguém que já distingue o pensar do não pensar; o pensar correto e o incorreto, ou seja, nomear o que na realidade é e deve ser. Essa possibilidade supõe alguém que pensa ao falar e ao mesmo tempo define e nomeia a atividade do pensar. Para que isso aconteça existe ainda a suposição da existência de algo além do próprio pensar, ou seja, uma duplicação de sentido de, ao pensar, julgar o pensar de acordo com os critérios supostamente escolhidos como corretos.

Terceira possibilidade

O que manda ou convoca ao pensar. Aqui de acordo com o sentido do verbo em alemão heissein, que pode também significar befehlen, mandar; segundo Schneider (2005, p.71) algo estaria mandando, ou poderia man-dar, convocar e possibilitar o pensar. Assim a pergunta seria pelo wasm (o que), ou Es (isso), ou ainda Selbe (o mesmo). O pensamento aparece assim como algo inevitável, como facticidade, exigência, urgência, que se manifesta à procura do que envia, manda ou provoca.

Quarta possibilidade

Esta surge como manutenção provisória de indefinição de escolha entre as possibilidades anteriores, uma vez que se trata do pensar, como algo que está em nosso poder de mando e de aplicação; está sempre conosco pelo exercício de juízos, proposições e argumentos e muitas vezes avesso ao comando central denominado Eu, em épocas de crise.

Schneider (2005, p. 72) justifica estas possibilidades de interpretação da questão, afirmando que “o título das conferências provém do fato de que a investigação de Heidegger sobre o pensar direciona-se em grande parte pelo que as próprias palavras utilizadas sugerem ou indicam”. Ob-servamos que o texto quase que se auto-elabora pela demora insistente em alguns núcleos centrais.

Nesta e em outras conferências, podemos observar que a frase inicial nos remete a nós mesmos. No caso desta conferência, Que significa pensar?, não é possível saber o que significa, ou manda pensar, sem que participemos do pensar, sem nos remetermos a essa experiência. O

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pensar aparece como algo a que se chega quando deixamos de lado as fórmulas e conteúdos teóricos. O fato de estarmos muito comprometi-dos com os resultacomprometi-dos teóricos e de os carregarmos como garantia de certeza de sentido pode ser uma dificuldade. Estes nos comprometem pela fixidez de suas amarras e impedem nossos movimentos. A compre-ensão objetivada com as áreas do saber, com as quais nos identificamos, limita, impede o pensar próprio. As teorias fora e independentes do pensar, nos impedem de nos voltar para o que nós mesmos pensamos. Ficamos então numa prisão construída por nós e diante disso podemos afirmar que o que manda pensar, é nossa prisão autoconstruída pelas explicações aceitas muitas vezes de forma inconsciente. Explicações objetivadas dos diferentes setores do senso comum e do mundo cien-tífico e cultural pensam em nós e por nós levando-nos, muitas vezes, a afazeres automatizados.

Para chegar ao pensar próprio, faz-se necessária a disposição para a tentativa de uma caminhada em direção a um centro desconhecido. Precisamos deixar de lado as explicações que derivam da divisão sujeito-objeto. O próprio Heidegger (2005, p. 150) indica o caminho: “Que significa pensar? Guardemo-nos da cega avidez que para essa pergunta deseja alcançar uma resposta na forma de uma fórmula. Prestemos atenção ao modo pelo qual ela pergunta”. O ser humano encontra-se fora da esfera do pensar e se envolve com construções vagas, dispersas. Isso dificulta uma visão clara e a possibilidade da ocorrência imediata do pensar próprio. No entanto,

o homem denomina-se aquele que pode pensar – e isso com razão. Pois ele é o ser vivo [animal] racional. A razão, a ratio, desdobra-se no pensar. Como o ser vivo racional o homem deve poder pensar, desde que queira. Entretanto, talvez o homem queira pensar e, mesmo assim, não pode (HEIDEGGER, 2005, p. 125).

É o pensar que caracteriza o ser humano, pois de acordo com sua deno-minação deve poder pensar sempre que deseje. O acúmulo de explicações construídas pode impedir esse pensar. “No fim das contas, nesse querer pensar ele quer demais e, por isso, pode muito pouco” (HEIDEGGER, 2005, p. 125).

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decor-rência do que ainda não foi pensado ou efeito de compreensões sedi-mentadas. Faz-se necessário fazer a distinção entre querer e pensar. E, além disso, outra pergunta se coloca: podemos administrar o pensar?

O homem pode pensar à medida que tem possibilidade para tanto. Esse possível, porém, ainda não nos garante que somos capazes disso [vermögen], pois apenas somos capazes do que desejamos [mögen] . Por outro lado, nós desejamos verdadeiramente apenas aquilo que, por sua vez, apetece [mag] a nós mesmos, e, com efeito, a nós em nossa essência à medida que à nossa essência concede aquilo que nos mantém nela (HEIDEGGER, 2005, p. 126).

A possibilidade do pensar (SCHNEIDER, 2005) está ligada, portanto, ao desejo à apetência, à tendência. Estas são condicionantes da capacidade de pensar, e nos mantém na essência à medida que a memória reúne o que por nós foi pensado.

O que nos mantém na essência, porém, apenas nos man-tém enquanto nós mesmos, a partir de nós – man – temos o que mantém. Nós o mantemos se não permitimos que fuja da memória. A memória é a reunião do pensar. Em que? No que nos mantém, à medida que isso em nós foi pensado, isto é, pensado pelo fato de que isso permanece o que deve dar o que pensar (HEIDEGGER, 2005, p. 126).

A essência do homem como seu ser mais próprio é um demorar-se no acontecer do pensar. Existe um elo entre os termos usados por Heide-gger. O pensar não pode ser separado do que sobre ele se pensa, nem do pensado, nem da memória que o reúne, nem da recordação que o mantém, nem da possibilidade que representa, nem da procura cons-tante. É necessário aprender a pensar. Só aprendemos a pensar quando começamos a prestar atenção a tudo que dá o que pensar.

O mais grave a ser pensado, não é uma condenação ou privilégio de nossa época. Nosso tempo deve ser pensado, pois é carente de meditação. Essa questão não é um convite para fazer uma análise exaustiva dos problemas de nosso tempo, comparando-o com outros, servindo-nos de sistemas teóricos de diferentes áreas do saber que temos à disposição. Enfatiza-se no mundo contemporâneo sempre a necessidade da ação, do agir e o

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fato de haver um interesse pela filosofia não significa necessariamente disposição para pensar.

E mesmo assim – talvez o homem habitual [bisheig] du-rante séculos tenha obrado demais e pensado de menos. Mas como pode alguém hoje afirmar que nós ainda não pensamos, quando em todos os lugares o interesse pela Filosofia está vivo e se torna cada vez mais ruidoso, quando quase todo mundo quer saber sobre o que há de especial na Filosofia? Os filósofos são “os” pensadores. Eles são de-nominados assim porque o pensar efetua-se propriamente na Filosofia (HEIDEGGER, 2005, p. 127).

Heidegger (2005) concorda que existe realmente um interesse pela filosofia no mundo contemporâneo, porém é importante procurar com-preender o que se entende por “interesse” e afirma (p. 127):

Inter-esse significa: estar misturado entre as coisas, estar no meio a uma coisa e nela permanecer. Mas para o interesse de hoje vale apenas o interessante. Isso é de tal modo verdadeiro que permite ser indiferente já no próximo ins-tante e ser substituído por outra coisa que, então nos diz tão pouco respeito quanto o anterior. Hoje em dia muitas vezes se crê apreciar algo de maneira especial pelo fato de se achá-lo interessante. Por intermédio desse juízo na verdade já se descartou o interessante para o campo do indiferente e, de imediato, do aborrecimento.

Existe em nossa sociedade a busca do que é rápido e lucrativo. Há um retorno igual em forma de mudança rápida em tudo e o fato de se mostrar interesse pela Filosofia não significa necessariamente que existe disposi-ção para o pensar. Em outros termos, todo esforço feito, toda pesquisa realizada em relação à história da filosofia é muito significativo, mas o fato de muitos se ocuparem com os escritos de grandes pensadores, ainda não nos dá a garantia de que nós pensamos.

De acordo com Heidegger (2005), recordemos, “em nosso tempo o que é grave é que ainda não pensamos.” Isso presumivelmente deve-se ao fato de que nós homens ainda não nos volvemos suficientemente para aquilo que deva ser pensado. Então, o fato de nós ainda não

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pensar-mos seria meramente uma negligência, um retardamento do pensar, ou quando muito, um descuido por parte do homem (HEIDEGGER, 2005, p. 128-129).

Heidegger (2005, p. 129) continua seu texto afirmando que o fato de ain-da não pensarmos “provém ain-da circunstância, de que esse a ser pensado mesmo se desvia do homem, de há muito tempo se desviou”. Surge então a necessidade de saber quando aconteceu esse desvio e a necessidade de uma reflexão sobre o significado de tempo e história para se chegar à compreensão do que significa pensar. Sobre o tempo, ensina-nos Sch-neider (2005, p. 83): “o ordenamento do tempo em linha histórica como desenho em figura geométrica esfacela-se enquanto garantia absoluta, e permanece como propriamente se diz: um ordenamento”.

Em nossa história, constata Heidegger, o homem sempre pensou de algum modo e fez isso até com muita profundidade. Confiou isso à memória. Será necessário então conservar distância em relação a tudo que foi dito até agora.

É bom que nós nos aferremos o maior tempo possível nessa atitude de rejeição do que foi dito, pois só assim conservaremos a distância necessária para um arranque, a partir do qual talvez um ou outro tenha sucesso no salto para o pensar (HEIDEGGER, 2005, p. 130).

O salto para o pensar exige ruptura, destruição, reconsideração de cer-teza e critérios cristalizados. Sabemos que o que foi dito até aqui não se relaciona à ciência uma vez que “a ciência não pensa e não pode pensar”, pois, recordemos mais uma vez, o pensar ao qual Heidegger se refere é o pensar filosófico, a persistência e insistência na pergunta pelo significado do pensar.

CONSIDERAçõES fINAIS

O texto de Heidegger aparece como um constante pensar em exercício, demorando num determinado ponto, provocando uma reflexão sobre os conceitos que usamos com freqüência, insiste numa determinada afirmação. A afirmação se transforma em pergunta.

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Ao formular a pergunta sobre o que significa pensar, Heidegger não pretende definir um objeto ou produzir uma nova ciência do pensar; a pergunta pretende provocar um exercício desse próprio pensar. Este questionamento, tal como outros, é testemunho da pedagogia heideg-geriana, conforme Stein (2000, p. 45) que “socraticamente faz participar do processo interrogador aquele a quem se dirige”.

De acordo com Heidegger, o pensar propriamente filosófico se identifica com o pensar sem utilidade, sem objeto. É um pensar que está antes do agir e fazer humanos, descrito como “não tendo um âmbito que lhe tenha sido atribuído pela tradição” (STEIN, 2002, p. 79). Este é o pensar não metafísico.

Ainda segundo Stein (2002) esse pensar de Heidegger não se situa como disciplina, de objeto com os outros dois modos de pensar e seus desdobramentos na área do conhecimento. Pode-se dizer que o pensar filosófico transforma os outros modos de pensar, para que não sejam mais vistos como simples exercício de objetivação. Em vários textos de Heide-gger podemos perceber a presença do apelo aos filósofos pré-socráticos. Antes da relação sujeito-objeto, o ser se apresentava como emergência. Não havia dualidade. Por isso, Heidegger vê, nos pré-socráticos, um pen-sar originário ou principial. Nele pode acontecer o jogo de luz e sombra, em que os entes podem aparecer. O que o filósofo pretende é caminhar em direção à experiência do pensamento, ao pensamento inicial. Não pretende com isso fazer renascer o pensamento pré-socrático, pois esse projeto não teria sentido.

Procuramos conhecer qual é o caminho percorrido por Heidegger em direção á essência da filosofia. Essa questão foi discutida a partir da ne-cessidade da superação do pensamento metafísico tradicional. Chama a atenção para três diferentes formas de pensar, que se entrelaçaram ao longo da história. Aponta o novo modo de pensar ou o pensar da filosofia que responde pelo sentido e não pelo cálculo.

Para Heidegger, o a consciência do caminho é essencial, sendo assim “tanto a pergunta como a resposta fazem parte do caminho”, pois, “da pergunta e da resposta podem surgir novas questões” (DANTAS, 2006, p. 17). Não se pode, então, falar simplesmente sobre filosofia, estando do “lado de fora”; é preciso que nos deixemos envolver por ela.

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REfERÊNCIAS

DANTAS, Maria Luzia. Caminho e círculo no pensamento de Martin

Heidegger. Lorena: Santa Teresa, 2006.

HEIDEGGER, Martin. Que significa pensar? Ijuí: Unijuí, 2002.

______. Os conceitos fundamentais da metafísica: mundo, finitude, solidão. Rio de Janeiro: Forense, 2003.

SCHNEIDER, Paulo Rudi. O outro pensar: sobre Que significa pensar? e

A época da imagem do mundo de Heidegger. Ijuí: Unijuí, 2005.

STEIN, Ernildo. Nota do tradutor. In: OS PENSADORES: Martin Heidegger. São Paulo: Nova Cultural, 2000.

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