MA14 - Aritm´
etica
Unidade 8
Resumo
Equa¸
c˜
oes Diofantinas Lineares
Abramo Hefez
PROFMAT - SBM
Aviso
Este material ´e apenas um resumo de parte do conte´udo da disciplina e o seu estudo n˜ao garante o dom´ınio do assunto.
O material completo a ser estudado encontra-se no Cap´ıtulo 6 - Se¸c˜ao 6.1 do livro texto da disciplina:
Aritm´etica, A. Hefez, Cole¸c˜ao PROFMAT.
A resolu¸c˜ao de v´arios problemas de aritm´etica recai na resolu¸c˜ao, em n´umeros inteiros, de equa¸c˜oes do tipo
aX + bY = c, com a, b, c ∈ Z.
Tais equa¸c˜oes s˜ao chamadasequa¸c˜oes diofantinas linearesem homenagem a Diofanto de Alexandria (aprox. 300 d.C.). Nem sempre estas equa¸c˜oes possuem solu¸c˜ao.
Exemplo
A equa¸c˜ao
4X + 6Y = 3
n˜ao possui nenhuma solu¸c˜ao x0, y0 em n´umeros inteiros pois, caso
´
E, ent˜ao, natural perguntar-se:
1) Em que condi¸c˜oes tal equa¸c˜ao possui solu¸c˜oes? 2) Caso as tenha, como determin´a-las?
As respostas para estas perguntas s˜ao relativamente f´aceis e ser˜ao dadas nas duas proposi¸c˜oes a seguir.
Proposi¸c˜ao
Sejam a, b, c ∈ Z. A equa¸c˜ao aX + bY = c admite solu¸c˜ao em n´umeros inteiros se, e somente se, (a, b) | c.
´
E imediato verificar que a equa¸c˜ao aX + bY = c, com a 6= 0 ou b 6= 0 e (a, b) | c ´e equivalente `a equa¸c˜ao
a1X + b1Y = c1, onde a1 = a (a, b), b1 = b (a, b) e c1 = c (a, b). Note que (a1, b1) = 1 e, portanto, podemos nos retringir `as
equa¸c˜oes do tipo
aX + bY = c, com (a, b) = 1,
que sempre tˆem solu¸c˜oes.
Mostraremos a seguir como as solu¸c˜oes de uma equa¸c˜ao diofantina como acima podem ser determinadas a partir de uma solu¸c˜ao particular qualquer x0, y0.
Proposi¸c˜ao
Seja x0, y0 uma solu¸c˜ao da equa¸c˜ao aX + bY = c, onde (a, b) = 1.
Ent˜ao, as solu¸c˜oes x , y em Z da equa¸c˜ao s˜ao
x = x0+ tb, y = y0− ta; t ∈ Z.
Segue-se da proposi¸c˜ao acima que a equa¸c˜ao diofantina
aX + bY = c, com (a, b) = 1, admite infinitas solu¸c˜oes em Z. A seguir, descreveremos um m´etodo para encontrar uma solu¸c˜ao particular de uma equa¸c˜ao do tipo aX + bY = c, quando (a, b) = 1.
Solu¸c˜
ao particular de aX + bY = c, quando (a, b) = 1
Se |a|, |b| e |c| s˜ao n´umeros pequenos, uma solu¸c˜ao pode ser encontrada por inspe¸c˜ao.
Mais geralmente, o m´etodo descrito abaixo sempre permitir´a achar uma solu¸c˜ao particular da equa¸c˜ao.
Usando o algoritmo euclidiano estendido, ´e poss´ıvel determinar m, n ∈ Z tais que
ma + nb = (a, b) = 1.
Multiplicando ambos os membros da igualdade acima por c, obtemos
cma + cnb = c.
Logo, x0 = cm e y0= cn ´e uma solu¸c˜ao particular da equa¸c˜ao
Exemplo: Resolvamos a equa¸c˜
ao 24X + 14Y = 18
A equa¸c˜ao tem solu¸c˜ao, pois (24, 14) = 2 e 2|18.
Dividindo ambos os membros da equa¸c˜ao por 2 = (24, 14), obtemos a equa¸c˜ao equivalente 12X + 7Y = 9.
Vamos, em seguida, achar uma solu¸c˜ao particular x0, y0 desta
´
ultima equa¸c˜ao. Pelo algoritmo euclidiano, temos
12 = 7 · 1 + 5, 7 = 5 · 1 + 2, 5 = 2 · 2 + 1.
Substituindo as equa¸c˜oes acima umas nas outras, obtemos 1 = 12 · 3 − 7 · 5,
portanto,
9 = 12 · 27 + 7 · (−45).
Logo, x0 = 27 e y0 = −45 ´e solu¸c˜ao particular da equa¸c˜ao e,
consequentemente, as solu¸c˜oes s˜ao
Equa¸c˜
oes Diofantinas sobre N
Algumas vezes ´e necess´ario resolver em N ∪ {0} equa¸c˜oes diofantinas da forma aX + bY = c, onde a, b, c ∈ N. Sejam a, b ∈ N. Definimos o conjunto
S (a, b) = {xa + yb; x , y ∈ N ∪ {0}},
chamado desemigrupogerado por a e b.
´
E claro que aX + bY = c, com (a, b) = 1, tem solu¸c˜ao em N ∪ {0} se, e somente se, c ∈ S (a, b).
Portanto, ´e de fundamental importˆancia caracterizar os elementos do conjunto S (a, b), ou doconjunto de lacunas de S (a, b):
L(a, b) = N \ S(a, b).
Pode-se provar que
Teorema
A equa¸c˜ao aX + bY = c, onde (a, b) = 1, tem solu¸c˜ao em n´umeros naturais se, e somente se,
c 6∈ L(a, b) = {ma − nb ∈ N; m, n ∈ N, m < b}. Note que o conjunto L(a, b) ´e finito e o seu maior elemento ´e
max L(a, b) = (b − 1)a − b. Portanto, se
c > (b − 1)a − b + 1 = (b − 1)(a − 1), a equa¸c˜ao aX + bY = c admite solu¸c˜ao nos naturais. Se c = (b − 1)(a − 1) − 1, ela n˜ao admite solu¸c˜ao.
A ´unica solu¸c˜ao m, n da equa¸c˜ao aX + bY = c, com m < b, ´e umasolu¸c˜ao minimal, no sentido de que se x , y ´e uma solu¸c˜ao, ent˜ao x > m.
Proposi¸c˜ao
Suponha que a equa¸c˜ao aX + bY = c, com (a, b) = 1, tenha
solu¸c˜ao e seja x0= m, y0= n a solu¸c˜ao minimal. As solu¸c˜oes x , y
da equa¸c˜ao s˜ao dadas pelas f´ormulas
x = m + tb, e y = n − ta, t ∈ N ∪ {0}, n − ta > 0.
Note que este tipo de equa¸c˜ao tem, no m´aximo, um n´umero finito de solu¸c˜oes, correspondentes aos seguintes valores de t:
0, 1, . . . , hn a i , onde hn a i
representa o quociente da divis˜ao euclidiana de n por a, ou seja a parte inteira de n
Exemplo
Vamos determinar para quais valores de c ∈ N a equa¸c˜ao 11X + 7Y = c tem solu¸c˜oes em N ∪ {0}.
O conjunto de lacunas de S (11, 7) ´e o conjunto
L(11, 7) = {m11 − n7 ∈ N, m, n ∈ N, m < 7}
= {1, 2, 3, 4, 5, 6, 8, 9, 10, 12, 13, 15, 16, 17, 19, 20, 23, 24, 26, 27, 30, 31, 34, 37, 38, 41, 45, 48, 52, 59}.
Portanto, a equa¸c˜ao 11X + 7Y = c admite solu¸c˜ao em N ∪ {0} se, e somente se, c 6∈ L(11, 7).
Exemplo: Resolver a equa¸c˜
ao 11X + 7Y = 58 em N ∪ {0}
Como, de acordo com o Exemplo anterior, 58 6∈ L(11, 7), a equa¸c˜ao possui solu¸c˜oes.
Para determin´a-las, considere o algoritmo euclidiano,
11 = 7 · 1 + 4, 7 = 4 · 1 + 3, 4 = 3 · 1 + 1
Logo,
1 = 4 − 3 = 4 − (7 − 4) = 2 · 4 − 7 = 2(11 − 7) − 7 = 2 · 11 − 3 · 7. Portanto,
58 = (58 · 2)11 − (58 · 3)7 = (4 + 16 · 7)11 − 174 · 7 = 4 · 11 + 2 · 7. Segue da´ı que x0= 4 e y0 = 2 ´e a solu¸c˜ao minimal da equa¸c˜ao.
Logo, as solu¸c˜oes s˜ao
x = 4 + t7, y = 2 − t11,
que s´o tˆem sentido para t = 0, e, portanto, a equa¸c˜ao s´o possui a solu¸c˜ao x0= 4, y0 = 2.
Para resolver equa¸c˜oes como as acima, n˜ao ´e necess´ario usar toda a t´ecnica que desenvolvemos, pois os n´umeros envolvidos s˜ao suficientemente pequenos para que seja vi´avel achar as solu¸c˜oes por inspe¸c˜ao.
No exemplo acima, bastaria testar os valores X = 0, 1, 2, 3, 4, 5 ou 6 para verificar que apenas x0 = 4 ´e poss´ıvel.