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A PRODUÇÃO TEXTUAL E SUAS IMPLICAÇÕES: UMA SITUAÇÃO REPRESENTATIVA EM SALA DE AULA DE LÍNGUA PORTUGUESA.

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Academic year: 2021

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A PRODUÇÃO TEXTUAL E SUAS IMPLICAÇÕES: UMA SITUAÇÃO REPRESENTATIVA EM SALA DE AULA DE LÍNGUA PORTUGUESA.

Ivandelma Gabriel da Silva¹ Rita de Cássia Souto Maior Siqueira Lima²

RESUMO:

O presente artigo propõe uma discussão a respeito da importância da produção textual nas aulas de língua portuguesa e de como, a depender do tipo de atividade de produção de textos no qual os alunos estão envolvidos, essa pode torná-los ou não apenas reprodutores de modelos. Essa discussão parte da concepção de texto enquanto espaço de interação e como lugar de ratificação do sujeito dialógico (BAKHTIN, 2014). Para isso, o presente artigo apresenta um recorte de dados de uma pesquisa qualitativa (CHIZZOTTI, 2003), feita numa turma de 2º ano de Ensino Médio de uma escola pública da cidade de Maceió/AL e que fundamenta a análise de uma situação de sala de aula que corrobora com a perspectiva do texto como importante aliado na compreensão da língua em condições reais de uso e na constituição ratificada de um sujeito mais participativo.

Palavras-chave: produção textual; ensino de língua portuguesa; pesquisa qualitativa

ABSTRACT:

This article proposes a discussion about the importance of textual production in Portuguese language classes and how , depending on the type of text production activity in which students are involved, this can make them or not just reproducers models. This discussion of the design of text as a space for interaction and a place of ratification of the dialogic subject (BAKHTIN, 2014). For this, this paper presents a data cut of a qualitative research (CHIZZOTTI, 2003), made in a class of 2nd year of high school in a public school in the city of Maceió / AL and that bases the analysis of a room situation class which corroborates the text perspective as an important ally in the understanding of the language in real conditions of use and the constitution ratified in a more participatory subject .

Keywords: textual production; Portuguese language teaching ; qualitative research

_________________________________________________________________________ ¹ Graduada em Letras, Especialista em Língua Portuguesa e Literatura, é mestranda regular do Programa de Pós-Graduação em Letras e Linguística (PPGLL/FALE/UFAL), na área de Linguística Aplicada. Atuou como supervisora do PIBID entre 2012 a 2014. É professora de Língua Portuguesa, da rede pública de ensino, em Maceió–AL, desde o ano de 2001. E-mail: ivandelma@bol.com.br

² Doutora e Mestre em Letras e Linguística pelo Programa de Pós-Graduação em Letras e Linguística (PPGLL/FALE/UFAL), é professora da Faculdade de Letras, atuando na graduação e pós-graduação (PPGLL e ProfLetras). E-mail: ritasoutomaior@gmail.com

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INTRODUÇÃO

Partindo da ideia de que a linguagem é constitutiva das relações humanas por se realizar na interação entre os sujeitos (BAKHTIN, 2014; GERALDI, 1996), este artigo propõe discutir sobre a importância do texto, no formato de produção textual, dentro do contexto de uma sala de aula de Língua Portuguesa (doravante LP), considerando que o que se constata em muitas salas de aula de LP é o ensino da gramática normativa a partir da memorização de suas regras para a mera reprodução posterior em atividades avaliativas estruturais, partindo da concepção de língua enquanto sistema abstrato de signos e regras, sem qualquer consideração do sentido da linguagem em uso e das funções interacionais a que ela responde.

Nesse modelo estrutural de abordagem de aprendizagem, o ensino não prioriza o texto como objeto de estudo, não considera, por isso mesmo, a articulação entre escrita e a função que essa ocupa nas relações sociais, enfim não a concebe como uma forma de ação no mundo. O que se observa, muitas das vezes, quando se utiliza de textos, o professor se volta para a identificação e classificação das regras estudadas, pois as práticas atuais, salvo exceções, não correspondem às reais necessidades educacionais dos alunos (ANTUNES, 2003).

Importante ressaltar, desse modo, que em um modelo que entenda a produção textual de forma diferente da que descrita anteriormente, a concepção de ensino também deve ser pensado processualmente. Nesse sentido, para Geraldi (2006, p. 17), ―a presença do texto em sala de aula implica desistir de um ensino como transmissão de um conhecimento pronto e acabado‖. Isso significa que o conhecimento é algo que deve ser construído e, nessa perspectiva, o texto não é considerado como uma unidade fechada, mas como expansiva, cujos sentidos vão sendo construídos socialmente a partir do processo interlocutivo. O que de certa forma além de demandar da atividade docente certo empreendimento não só de tempo, mas também de investimento intelectual mais autônomo, também demandaria certo envolvimento político com mudanças que seriam necessárias a esse diferente contexto.

Talvez, por esses e outros motivos, muitos professores vivenciem, em sua atividade docente, a estabilidade do ―conhecimento pronto e acabado‖. É interessante observar que essa estabilidade não é verificada só na prática do professor, mas também no discurso do próprio aluno que se reverte, muitas vezes em cobranças de atuação

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docente em relação ao uso do texto. E um dos aspectos constitutivos do uso do texto em sala de aula é o da prática da produção textual.

O texto escrito corresponde à necessidade de ir além da frase, pois possui uma dimensão interativa e, nesse sentido, é uma forma de atuação social (BAKHTIN, 2014; ANTUNES, 2009). Dessa maneira, discute-se nesse artigo quais os objetivos do ensino da produção textual, ou em outras palavras, reflete-se sobre a produção de texto em sala de aula de LP, que torna o aluno reprodutor de propostas.

Para isso, o artigo foi dividido em três partes. Na primeira, discute-se sobre a importância do texto em sala de aula; na segunda, tratam-se das discussões sobre a produção textual em língua portuguesa; e, na última parte, apresenta-se uma análise de dados de uma pesquisa em andamento, correlacionando-a a perspectiva do ensino de língua portuguesa através da implementação de atividades de produção textual.

Convém destacar que essa discussão insere-se no campo da Linguística Aplicada (MOITA LOPES, 1996, 2006), na área de ensino. Essa área do saber procura refletir sobre o ensino/aprendizagem da língua, considerando as situações enunciativo-discursivas em sala de aula. Devido ao seu caráter problematizador e autorreflexivo, a Linguística Aplicada parte da visão de sujeito heterogêneo e historicamente situado, procurando alcançar os múltiplos sentidos que essa heterogeneidade pode suscitar. (MOITA LOPES 1996, 2006, 2013). Dessa forma, parte-se da percepção do aluno como sujeito da linguagem, observado como ser social, com suas diferenças e particularidades que não devem ser ignoradas na prática de produção textual, pois na área de ensino/aprendizagem é de vital importância entender que alunos são sujeitos históricos e sociais que se revelam em seus posicionamentos discursivos (BAKHTIN, 2014).

1. A IMPORTÂNCIA DO TEXTO EM SALA DE AULA

Sabe-se que toda e qualquer comunicação verbal se efetiva através de textos, sejam eles orais ou escritos, e isso é independente do conteúdo ou extensão, pois, segundo Antunes (2003, p. 92), ―ninguém fala ou escreve a não ser sob a forma de textos‖ e, por isso, é tão necessária a presença do texto em sala de aula. Geraldi (2006) também corrobora com a imprescindibilidade da presença do texto em sala de aula. Para este autor:

O processo de fixação de valores demanda o convívio com discursos cujas materializações se dão nos textos; os valores e as concepções

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circulam através dos textos e, sem eles, a escola não cumpriria uma de suas funções mais sofisticadas: a reprodução de valores com que compreender o mundo, os homens e suas ações. Não há escapatória: no ensino de língua materna, o texto há de estar presente. (GERALDI, 2006, p. 22)

Dessa maneira, é possível considerar que a presença do texto em sala de aula tornar-se uma necessidade premente, pois possibilita a compreensão da língua em estado real de uso, permitindo uma amplitude na apreensão dos saberes linguístico-discursivos por parte dos alunos, tendo em vista que, segundo Antunes (2003, p. 119), ―a gramática, na perspectiva da linguagem como forma de atuação social, viria incluída naturalmente‖. Mais ainda, em movimento paralelo, entende-se que, assumindo essa abordagem de ensino, os professores, por sua vez, também se modificam, apreendem e desenvolvem seu conhecimento, haja visto que o texto é lugar de interação. Sendo assim, para ambos os principais sujeitos que compõem o contexto de ensino, a saber, o professor e o aluno, o conhecimento passaria a ser algo construído interlocutivamente, e, nesse processo de construção, todos passariam a ser sujeitos da aprendizagem processualmente. Desse modo, o conhecimento passa a ser algo sempre revisto e reconfigurado a partir do contexto histórico-cultural dos envolvidos, nunca se tornando, por isso mesmo, um conhecimento infértil por não conseguir responder às necessidades de busca de uma maior equidade social para os cidadãos.

A partir desse entendimento, é importante salientar, então, a concepção de texto que fundamenta essa discussão, pois o termo é conceituado de maneiras diferentes a partir de perspectivas diferentes. Segundo Koch e Elias (2012), três são as maneiras de conceber o texto e todas estão atreladas à concepção de leitura, sujeito, língua e construção de sentido. Para a primeira, partindo do foco no autor, o texto é o produto do pensamento, é a representação mental do seu autor. Para a segunda, partindo do foco no próprio texto, esse se constitui como mero produto da decodificação do emissor, como uma espécie de instrumento de comunicação. Ainda segundo as autoras, na terceira concepção, partindo do foco na interação autor-leitor-texto, o texto é considerado um construto, locus da interação entre os interlocutores.

Parte-se, portanto, da concepção de texto, seja ele oral ou escrito, como unidade comunicacional que apresenta começo, meio e fim, considerado como um lugar de interação para alunos e professores, tendo em vista que a reflexão sobre a língua é feita mediante a compreensão, a análise, a interpretação e a produção de textos verbais, sem

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deixar de considerar que, na concepção dialógica de linguagem, o discurso se manifesta por meio de textos.

De acordo com Geraldi (1996), nessa concepção, o sujeito emprega a linguagem não só para expressar o pensamento ou para transmitir conhecimentos, mas também para agir, atuar sobre o outro e sobre o mundo. Ainda para esse autor (1996, p. 139), ―É por isso que na ‗minha‘ palavra me (re)velo na contrapalavra do outro que me constitui como sujeito‖. Assim, nessa acepção, o sujeito se constitui na alteridade (BAKTHIN, 2011)1, na relação como o outro.

Essa construção social do sujeito é basilar na concepção dialógica bakhtiniana. Bakhtin (2014, p. 121) afirma que ―a personalidade que se exprime, por assim dizer, do interior, revela-se um produto total da interrelação social‖. Assim, considera-se o outro como sujeito e esse sujeito é socialmente construído nas relações sociais. Em sala de aula, essa perspectiva procura alcançar o aluno que é sujeito, heterogêneo, com todas as complexidades imanentemente humanas, e essa heterogeneidade também pode ser percebida nas na produção textual desse aluno-sujeito.

2. PRODUÇÃO TEXTUAL EM LÍNGUA PORTUGUESA

A múltipla discussão que um trabalho com produção de textos pode suscitar, leva a alguns questionamentos especialmente relacionados à que tipo de produção os alunos estão submetidos dentro dos muros da escola, ou seja, que tipo de texto o aluno produz na sala de aula de língua portuguesa e com que finalidade.

Isso implica refletir sobre a finalidade do texto produzido na sala de aula de LP,

ou, em outras palavras, refletir sobre a produção que torna o aluno reprodutor de propostas. Para Geraldi (2011), o que se costuma produzir em sala de aula é um produto artificial de uma pseudo atividade linguística. Para este estudioso (2011, p. 90) ―na

escola não se produzem textos, produzem redações. E estas nada mais são do que a simulação do uso da escrita‖. Está claro que o autor faz uma distinção de redação e produção textual. Essa distinção é discutida por outros autores como, por exemplo, por

Marcuschi (2007) que considera a redação escolar como um macro-gênero que abarca subcategorias, a saber: redação endógena ou clássica (nasce e circula dentro do âmbito

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Segundo Bakhtin (2011), o outro tem um papel fundamental na nossa constituição como sujeitos, pois nos constituímos e nos transformamos sempre nas relações sociais.

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escolar); redação mimética (textos que nascem e circulam externos à escola, que são tomados como objeto de ensino e reproduzidos).

O que se observa nas salas de aula de língua portuguesa é predomínio da redação endógena, cujas características acabam por tornar mais evidente a distante relação eu– tu, pois o aluno é apenas reprodutor da relação professor–escola e, por isso mesmo, sua redação é apenas uma resposta às finalidades estabelecidas pelo docente e, dessa forma, o aluno não consegue desempenhar o papel de sujeito da interlocução viva ou situada. Segundo Geraldi (2011, p. 128), ―Ao descaracterizar o aluno como sujeito, impossibilita-se-lhe o uso da linguagem. Na redação, não há um sujeito que diz, mas um aluno que devolve ao professor a palavra que lhe foi dita pela escola‖.

Partindo desse prisma, parece imprescindível colocar que o desafio está em encontrar um caminho para que o aluno que escreve redação na escola se torne, efetivamente, um aluno produtor de textos.

Destarte, para Geraldi (2006, p. 16), ―no texto se encontram os rastros da subjetividade, das posições ideológicas e das vontades políticas em constante atrito‖. Já para Bakhtin (2014, p.128), quando discorre sobre o discurso escrito, afirma que:

O discurso escrito é de certa maneira parte integrante de uma discussão ideológica em grande escala: ele responde a alguma coisa, refuta, confirma, antecipa as respostas e objeções potenciais, procura apoio, etc.

Assim, os traços subjetivos, a ideologia e a vontade política do aluno-sujeito muitas vezes é silenciada e/ou anulada quando o texto é produzido apenas para preencher a lacuna da atividade solicitada. Entende-se que há pelo menos as duas dimensões de inscrição do sujeito – aquela que revela sua subjetividade coletiva e aquela que revela sua coletividade subjetiva – (SOUTO MAIOR, 2014), ao se restringir essa ação linguageira em sala de aula, também se restringe o modus operandus das revisões éticas das ideologias, ou seja, não se promulga a necessidade de desnaturação de certas situações sociais ainda vigentes que lesam, de certa forma, a convivência mais harmoniosa das comunidades (SOUTO MAIOR, 2014). Isso significa que o texto produzido precisa atender a necessidades outras e não somente o cumprimento de uma tarefa escolar. Nas palavras de Antunes (2003, p. 56),

A natureza interativa da escrita impõe procedimentos, cada um implicando análises e diferentes decisões de alguém que é sujeito, que é autor de um dizer e de um fazer, para outro ou outros sujeitos, também ativos e cooperantes.

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Dessa maneira, o aluno é também sujeito da linguagem e deve ser observado como ser social, com heterogeneidade peculiar que precisa ser considerada na construção do texto e, consequentemente, do discurso, devendo ser estimulado, como sujeito histórico e social, a revelar seus posicionamentos discursivos.

Dessa maneira, a escrita de textos deixará de ser mera reprodução e alcançará o status de reprodução/produção, na qual será observado como os alunos se apropriam do discurso para refletir sobre concepções construídas em movimento interlocutivo, contribuindo não só para a construção da percepção do eu pelo aluno, mas também com o caráter processual de escrita. Nesse sentido e de acordo com Geraldi (2011, p. 128),

Para mantermos uma coerência entre uma concepção de linguagem como interação e uma concepção de educação, esta nos conduz uma mudança de atitude – enquanto professores – ante o aluno. Dele precisamos nos tornar interlocutores para, respeitando-lhe a palavra, agirmos como reais parceiros: concordando, discordando, acrescentando, questionando, perguntando, etc.

É importante frisar que a discussão não gira em torno da formação docente e todas as implicações do tema e/ou ainda sobre práticas pedagógicas gerais ou concepções de educação, mas apenas sobre a prática pedagógica que se manifesta através da produção de texto em sala de aula de língua portuguesa.

Retomando a discussão sobre a produção de textos em sala de aula e as respostas professor-aluno que a atividade de escrita pode suscitar, Antunes (2003, p. 45) afirma

que:

numa inter-ação (ação-entre),o que cada um faz depende daquilo que o outro faz também: a iniciativa de um é regulada pelas condições do outro, e toda decisão leva em conta essas condições . Nesse sentido, a escrita é tão interativa, tão dialógica, dinâmica e negociável quanto à fala.

Assim, parece imprescindível que a ‗ação-entre‘ se efetive nas relações professor-aluno e que se materialize nas produções textuais realizadas na sala de aula, pois, talvez dessa maneira, tomando de empréstimo as palavras de Geraldi (2011, p. 131) quando esse diz: ―é devolvendo o direito à palavra e – na nossa sociedade isto

inclui o direito à palavra escrita – que talvez possamos um dia ler a história contida, e não contada, da grande maioria que hoje ocupa os bancos das escolas públicas‖.

É, nesse sentido, que a interlocução entre professor-aluno é tão importante no contexto de sala de aula, pois é um caminho para que a atividade de produção textual deixe de ser, por parte do professor, uma prática de busca de erros, sejam eles sintáticos,

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morfológicos ou semânticos, mas possa vir a ser uma via de crescimento não só de aprendizagem mas também de construção identitária para o aluno e para o próprio professor. A caça ao erro se transformaria, desse modo, uma busca de diálogo com o dito, numa atividade de construção do aprendizado de formas de dizer o que se pretende, a partir da reflexão sobre a linguagem. Nessa abordagem, os questionamentos do sentido promoveriam questionamentos sobre a própria realidade vivenciada num projeto de revisão da própria vida cidadã. O trabalho com o texto, nesse campo de atuação, promove a autonomia do sujeito como um conhecedor da estruturação da linguagem na busca da melhor forma de dizer a partir de suas intenções discursivas. E mais, promove a reflexão das implicações do dito na vida das pessoas.

Nas palavras de Geraldi (2003, p.112) ―[o objetivo do professor] é ser do aluno um interlocutor ou mediador entre o objeto de estudos (no caso, o texto) e a aprendizagem que se vai concretizando nas atividades em sala de aula‖. Assim, a produção textual dos alunos-sujeitos pode contribuir na apreensão da heterogeneidade, na captação das diferenças. Também é tarefa do professor não apenas apontar quem fez ou não a atividade solicitada, quem respondeu ou não as solicitações, mas refletir sobre o porquê não foi feito ou em que medida a resposta foi concordância, discordância ou completude do que foi proposto.

3. UM RECORTE DE ATIVIDADE DE PRODUÇÃO DE TEXTO

Os dados apresentados a seguir fazem parte de uma pesquisa em processo, de natureza qualitativa (CHIZZOTTI, 2003; TRIVIÑOS, 1987), e constituem apenas um recorte dos dados já coletados (no período de 2015-2016). Essa pesquisa está sendo realizada em uma escola pública em Maceió/AL, numa turma de 2º ano do ensino médio e, na presente discussão, foi selecionada uma produção (1ª etapa) e a reelaboração (2ª etapa) dessa mesma produção de um dos sujeitos de pesquisa.2 Em uma breve contextualização, a turma é composta por 34 alunos, sendo 18 declarados meninos, e 16 declaradas meninas, com faixa etária de 16 e 17 anos, dos quais 11 disseram já trabalhar em horário contrário as aulas, atuando como babás, acompanhantes de cães, jovem aprendiz, e mecânico. Desses que trabalham, 06 são

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A escolha do dado foi aleatória. O texto e o processo observado são representativos dos acontecimentos de sala de aula.

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meninos e 05 são meninas e, desses todos, só um diz contribuir com as despesas

domésticas.

É importante destacar do contexto do recorte da presente análise, que o tempo de observação correspondeu a de 02 semanas letivas, ou seja, a 08 h/a. Na sala de aula, a professora diz trabalhar com a perspectiva dos gêneros textuais e a produção apresentada posteriormente foi uma tarefa proposta a partir do gênero relato. Primeiramente, a professora solicitou que os alunos produzissem um texto, no qual eles contassem algo que pudesse ter marcado a vida deles, sem dar maiores detalhes sobre o gênero relato. Essa atividade foi realizada em sala e a professora apenas recolheu a produção textual, sem fazer momento, nenhuma intervenção pedagógica, no sentido de leitura ou orientação.

A seguir, a primeira produção do texto. Por questões éticas, o nome do aluno foi retirado e as fases de reescrita serão identificadas por números.

PRODUÇÃO 1

Apesar de ter limitado o seu relato a apenas um parágrafo, o aluno conseguiu deixar claro que o fato que o marcou foi positivo: ter arrumado o emprego.

Esse fato, segundo o relato, trouxe para ele algumas conquistas de ordem material, como comprar o celular e ter condições de pagar uma academia e, menciona ainda, uma conquista do lado pessoal/emocional: ter conquistado uma namorada. O texto apresenta muitos desvios de ordem gramatical, de escolha de registro e de

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construção, mas, nesse primeiro momento, a professora não fez nenhuma intervenção material no texto, nem de ordem textual nem gramatical. Conversou-se a respeito dessa estratégia e a professora disse que nessa etapa e nas seguintes, quem ―mexe‖ no texto é o aluno, dialogando com a proposta de Antunes (2003) do aluno que constrói o conhecimento.

Nessa mesma aula, a professora solicitou que os alunos pesquisassem sobre o gênero relato pessoal, orientando a pesquisa, realizada fora da escola, para observar as características do gênero. Na aula seguinte, os alunos apresentaram oralmente os aspectos que levantaram na pesquisa, que teve a participação de toda turma. A partir da discussão em sala, a professora já havia selecionado alguns exemplos de texto que marcam esse gênero textual, projetando os exemplos, retirados de vários sites, através de recurso multimídia. Foi uma atividade bastante proveitosa, interativa, na qual os alunos participavam na leitura e identificação das marcas do gênero estudado.

Na aula seguinte, a professora devolveu a primeira versão da produção textual e pediu que os alunos procurassem identificar as marcas do gênero estudado no próprio texto produzido, solicitando que eles reelaborassem seus textos a partir do que foi discutido em sala, procurando reconhecer se o primeiro texto produzido apresentava tais marcas. Essa foi então a primeira reelaboração textual.

O aluno selecionado não fez nenhuma alteração nessa primeira reelaboração textual. Isso pode ter ocorrido como uma consequência do não entendimento, da não compreensão por parte dele do que estava sendo proposto. Antunes (2009), discorrendo sobre o exercício da escrita escolar, levanta uma discussão a respeito da atividade de produção textual ser penalizada como consequência da má-compreensão. Ou pode ter ocorrido porque ele não achou que caberiam alterações.

A aula seguinte foi reservada à segunda reelaboração textual. A professora, baseada na leitura, feita em casa, dos textos produzidos na aula anterior, listou no quadro 08 perguntas para que os alunos reelaborassem os textos produzidos. Ela não fez nenhuma intervenção material nos textos dos alunos, isto é, nenhum tipo de correção. A proposta era que os alunos observassem a segunda versão e aprimorassem o relato produzido. As perguntas foram postas na seguinte ordem:

Sobre o fato que marcou a sua vida de forma positiva ou negativa: Onde e quando aconteceu?

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Como foi que tudo aconteceu? Os detalhes, as reações os resultados? O que esse fato trouxe, para você, como experiência?

O que você pode trazer, para o presente, deste fato?

Suas relações com amigos, pais, família e sociedade mudaram? Que elementos você achou de decisivo para essas mudanças

Você se tornou uma pessoa melhor, mais consciente das coisas ou não?

O aluno que produziu a primeira versão apresentada fez poucas alterações no seu texto para terceira reelaboração, como será visto a seguir. O aluno pode não ter compreendido o que foi proposto para a reelaboração ou a concisão pode ser uma característica de estilo do sujeito pesquisado ou simplesmente pode ter refletido que seu texto contemplava todos os aspectos levantados no quadro de perguntas. Talvez por ser sucinto, o texto não alcançou todas as perguntas, ficando carente de alguns detalhes que pudessem dar uma dimensão maior para o acontecimento narrado.

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Passada essa etapa da aula, na semana seguinte a professora veio com a versão 3 do texto produzido, desta vez com algumas intervenções dela. Baseando-se nos estudos de Ruiz (2013), é possível dizer que a intervenção da professora se dá de duas formas: no próprio texto, seguindo a correção resolutiva, na qual o professor já aponta o desvio cometido pelo aluno fazendo, no próprio texto, a devida correção; no pós-texto, em forma de bilhete, seguindo a proposta da correção textual – interativa.

Na produção em análise, na correção textual – interativa, a professora usou o bilhete para apontar, textualmente, os ―deslizes‖ que foram cometidos pelo aluno, mas partindo dos aspectos micro-estruturais. A interatividade entre a professora e o aluno pode ser verificada no uso do vocativo, que foi suplantado por questões éticas, e no tom de aconselhamento que o bilhete apresenta. Ela o convida, num tom de parceria, a refazer o texto: ―pontuação, acentuação, repetição de palavras e uso de letras maiúsculas e minúsculas em situações inapropriadas‖.

Isso significa que mesmo partindo de uma concepção de ensino de LP que encontra no texto seu objeto de ensino, a distância entre concepção de língua e a prática em sala de aula foi ratificada nas observações pós-texto da produção em análise, tendo em vista que na última etapa de reelaboração textual, duas situações foram, até certo ponto, ratificadas: a primeira refere-se ao fato de que a professora limitou-se a fazer observações de ordem gramatical, a reprodução da caça ao erro, como discutido anteriormente; a segunda, o aluno apenas reproduziu o que havia sido proposto na intervenção da professora.

A partir dessa intervenção, os alunos produziram a última reelaboração textual, a versão final para o texto produzido a partir das marcas do gênero relato, observando os aspectos gramaticais pontuados pela intervenção da professora. O aluno refez seu texto e, em sua última versão, o texto apresentou 26 linhas, distribuídas em 2 parágrafos.

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Nessa última reelaboração, o aluno acrescentou suas reflexões, apontando outros aspectos positivos de ter arrumado um emprego. Expressões como ―eu tava aguniado‖ e ―pressionado‖ continuaram se repetindo na última versão apresentada. Isso significa que suas modificações de ordem linguístico-gramatical se limitaram aquelas que textualmente a professora efetivamente corrigiu.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Buscou-se nesse artigo discutir sobre a produção textual e suas implicações em sala de aula de LP. A produção de texto em LP é uma atividade que necessita de reflexões que desembocam em ‗o quê‘ e ‗para quê‘ discutido por Geraldi (2011). Está claro que a resposta para ‗o que‘ ensinar encontra-se na escolha do texto como objeto de ensino, tendo em vista que é no texto que o sujeito age socialmente e interage com os outros (ANTUNES, 2009). O ‗para quê‘ implica refletir sobre as finalidades da produção de texto em sala de aula e suas limitações como atividade escolar.

A partir dessa reflexão, entende-se o texto como um lugar de natureza dialógica, no qual as diferentes concepções de mundo implicam em diferentes formas de dizer e compreende-se os alunos como sujeitos que reproduzem e elaboram seus próprios saberes através das experiências sociais vividas por eles, sendo o texto o lugar que propicia essa construção. Ainda para Geraldi (1996, p. 71),

centrar o ensino no texto é ocupar-se e preocupar-se com o uso da língua. Trata-se de pensar a relação de ensino como o lugar de práticas de linguagem e a partir delas, com a capacidade de compreendê-las, não para descrevê-las como faz o gramático, mas para aumentar as possibilidades de uso exitoso da língua.

Não se quer dizer com isso que estudos de regras não podem ou não devem ser feitos, mas que o ensino da língua não é só isso e/ou ainda que pode ser realizado de outra maneira, para que o aluno alcance uma dimensão maior do que seja a língua em uso. Nesse sentido, a escolha do texto como objeto de ensino é uma opção, tendo em vista que é no texto que o sujeito age socialmente e interage com os outros (ANTUNES, 2009). A autora (2009, p. 51-52) afirma que:

O texto envolve uma teia de relações, de recursos, de estratégias, de operações, de pressupostos, que promovem a sua construção, que promovem seus modos de sequenciação, que possibilitam seu desenvolvimento temático, sua coesão e sua coerência. De fato, um

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programa de ensino de línguas, comprometido com o desenvolvimento comunicativo dos alunos, somente pode ter como eixo o texto, em todos esses e outros desdobramentos.

As dificuldades de compreender os aspectos constitutivos da língua poderiam ser amenizadas se houvesse uma aplicabilidade do que está sendo ensinado. Antunes (2009) também aponta para essa necessidade. A autora (2009, p. 179) afirma que a aprendizagem ―aconteceria de forma mais produtiva se levássemos os alunos a colocarem, como parâmetro de validade, os usos reais da língua, as coisas que dizemos para nos fazer entender e agir no dia a dia‖. Dessa maneira, o aluno partiria de situações de suas práticas cotidianas para entender os mecanismos de funcionamento da língua e apreendê-la em sua totalidade.

Identificar as marcas identitárias do aluno-sujeito pode ser um começo para, pelo menos, trazer para dentro das salas de aula de língua portuguesa, temáticas que sejam do interesse desse sujeito e a partir daí o trabalho com a linguagem ter um resultado mais efetivo. O uso do texto em sala de aula é um mecanismo importante para que esses interesses possam vir à tona e, nesse contexto, a produção textual pode ser um meio para que questões identitárias possam emergir nas práticas de linguagem, num movimento dialógico contínuo de construção da aprendizagem.

Nesse sentido, Souto Maior (2012, p. 80) assume que:

quando um sujeito posiciona-se, ele age (não necessariamente nessa ordem porque esses dois atos são intrinsecamente inseparáveis), o que se obtém como troca dessa ação/posição pode não ser o esperado, ou necessariamente o dito. As palavras, nesse sentido, encontram-se em elo. Um sujeito assume para si — e, em concomitância para o outro — uma posição, que é ato.

Geraldi (2003, p, 135) também afirma que ―é no texto que a língua – objeto de estudos - se revela em sua totalidade‖. Isso significa que a produção do texto em sala de aula é de extrema importância porque através dela é possível não só estudar a língua enquanto conjunto de formas, mas também apreendê-la como ação discursiva.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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Referências

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