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A TEORIA DO ESQUEMA:' estendendo a compreensão do discurso além da Pragmática

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Academic year: 2021

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A TEORIA DO ESQUEMA:'

estendendo a compreensão do discurso além da Pragmática

Margarida Candara Hauen RESUMO

Este trabalho pretende apresentar a Teoria do Esque-ma e discutir alguEsque-mas conseqüências de sua incorporação à análise do discurso. Mostra a importância da utilização de esquemas no processo de decodificação do discurso.

Ë uma verdade axiomática que a compreensão do dis-curso não depende apenas de competência em Sintaxe, Se-mântica e Pragmática. Mesmo um leigo relutaria em negar, por exemplo, as dificuldades envolvidas na percepção de signi-ficados culturalmente específicos de uma linguagem, seja ela falada, escrita ou não-verbal. Limitações em termos de "back-ground" podem causar problemas não apenas para falantes não-nativos, mas também para nativos cuja situação histórica esteja muito distante do texto.

A título de ilustração, diria que praticamente qualquer pessoa, em qualquer época, poderia entender as implicações trazidas pelo exílio de Romeu para o enredo de Romeu e Julieta, de W. Shakespeare. Um ator interpretando Romeu, contudo, pareceria mais convincente no seu papel se enten-desse que o exílio, durante o século XVI, significava, além da separação da família e amigos, intensa degradação moral. Pora dos muros de Verona, Romeu jamais poderia ter sua plena identidade e status como um Montague, havendo de enfrentar a pobreza e o ostracismo.

Embora todo o acima exposto nos pareça óbvio, pesqui-sadores não haviam, até o final da década de 70, investigado

1 " S c h e m a " (plural "schemata"») é u m t e r m o técnico q u e vem s e n d o u t i l i z a d o l a r g a m e n t e por pesquisadores n o r t c - a m e r i c a n o s n a á r e a do Discurso p a r a d e s i g n a r f u n ç õ e s c relações alem da f o r m a do o b j e t o lingüístico. Adoto, e m p o r t u g u ê s , a p a l a v r a e s q u e m a (cf. FERREIRA, A.B.H. Novo d i c i o n á r i o d a l í n g u a p o r t u g u e s a . R i o de J a n e i r o , Nova F r o n t e i r a . 1975. p. 573, e HABERMAS. J . (Dialética e h e r m e n ê u -t i c a . T r a d . A.L.M.Valls. 8 5 0 P a u l o . L & PM, 1988. p. 31. Vails, em s u a -t r n d u ç S o de H a b e r m a s , u t i l i z a o t e r m o " e s q u e m a s de I n t e r p r e t a ç ã o " .

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RAUEN, M.Q. Teoria da esauema

a influência de conhecimentos genéricos na compreensão do discurso.

Agora, após uma década, pode-se sentir o grande impacto causado pela Teoria do Esquema, que continua motivando intensa pesquisa no exterior. O objetivo deste breve trabalho, com bibliografia seleta, é estimular, no meio de Letras bra-sileiro, maior preocupação com informação que me parece fundamental não só para avanços na análise do discurso, mas em metodologia de ensino de idiomas.

Teoria do Esquema: conceituação e justificativa

Um esquema é, no sentido mais amplo, conhecimento ou informação de um tipo específico. Anderson, Reynolds, Schallert & Goetz, bem como den Uyl e Van Oostendorp, comparam esquemas com as peças (componentes) de uma estrutura altamente organizada e que consiste de comparti-mentos (slots): se falta uma peça, ou se esta não é apropria-da, o compartimento tanto pode permanecer vazio como ser

preenchido de modo incorreto.2 A idéia é simples, lembrando

os recursos de transferência e generalização: um estrangeiro cuja cultura não inclui refeições como o "churrasco" não teria, simplesmente, esquema para decodificar a palavra. Já um norte-americano poderia utilizar seu esquema de "bar-becue party", chegando a um significado parcialmente falso.

Passou-se a tratar conhecimentos genéricos como uma variável importante porque os modelos teóricos ortodoxos, cuja concepção da compreensão do discurso envolve um pro-cesso cognitivo crescente (bottom-up), são inadequados para explicar certos comportamentos. No caso de leitura, por exemplo, a posição tradicional (e.g., Gough; La Berge e Samuels), afirma que o decodificador trabalha a partir de símbolos, passando a palavras e sentenças para chegar ao

significado.3 Mas há decodificadores cuja estratégia maior é

a ativação de conhecimentos genéricos, numa ordem crono-lógica e/ou causai. Goodman e Anderson, portanto, defendem um modelo decrescente (top-down) da compreensão do dis-curso, onde informação sobre conteúdo emerge como mais

2 ANDERSON. R.C.: REYNOLDS. R.E.; SCHALLERT. D.L.: OOETZ. E.T. F r a m e w o r k s f o r c o m p r e h e n d i n g discourse. A m e r i c a n Educational Research J o u r n a l , 14:367-82. 1977. DEN UYL. M. & OOSTEMDORP, K . T h e use of s c r i p t s In t e x t c o m p r e h e n s i o n . Poetics, 9:275-94. 1980.

3 GOUGH. P.B. O n e second ot r e a d i n g . I n : KAVANAGH. J . P . & MATTINOLY, I.O., ed. L a n g u a g e by eye a n d e a r . Cambridge, Mass.,MIT P r e s s . 1972. p. LA BERQE, D. & SAMUELS. S.J. Toward a t h e o r y of a u t o m a t i c I n f o r m a t i o n processing In r e a d i n g . Cognitive Psychology. 6:293-323. 1974.

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RAUEN, M.Q. Teoria da esauema

importante, ao passo que o encadeamento de símbolos e

agru-pamentos morfológicos revelam-se secundários."1

Tendências em pesquisa gerada pela Teoria do Esquema Rumelhart, numa postura eclética, confirma as posições de Goodman e Anderson, demonstrando que o modelo cres-cente não explica o comportamento de colaboradores cuja percepção de palavras, durante um experimento, pareceu fa-cilitada quando havia um meio sintático e semântico. Johnson, investigando os efeitos de complexidade do discurso e conhe-cimentos genéricos na compreensão de textos escritos, tam-bém confirma o modelo de cognição decrescente ao constatar que deficiências na formação cultural dos participantes pre-judicaram mais o entendimento do que a complexidade

se-mântica e sintática.5

Para Pearson e Spiro um esquema inclui toda a rede de associações que um evento, conceito ou idéia possui. Assim, se um texto (pragmáticamente falando) menciona casamen-to, por exemplo, o decodificador, sem descrições fornecidas pelo autor, é capaz de imaginar (conforme seu referencial cultural) detalhes relativos a ambiente, vestuário, ritual, etc... Carrell confirma a influência da formação cultural no processo de entendimento da mensagem: leituras cujo con-teúdo era culturalmente familiar foram mais fáceis para os falantes não-nativos estudados." Aqui, facilidade se define em termos quantitativos ou como habilidade de lembrar infor-mações do texto.

Muitos pesquisadores revelam que há resultados superio-res no processo de compreensão do discurso, tanto escrito como oral, quando o decodificador possui conhecimentos

ge-néricos adequados, em qualidade e quantidade.7 Hudson

de-4 GOODMAN. K B . Behind t h e eye: w h a t h a p p e n s In r e a d i n g . I n : & NILE8, O.S.. ed. Reading: process a n d p r o g r a m . U r b a n a , N a t i o n a l Council of T e a c h e r s of English, 1670. p. ANDERSON. R.C. S c h e m a - d i r e c t e d processes In l a n g u a g e com-p r e h e n s i o n . I n : LESGOLD. A.M. et alll. Cognitive com-psychology aird i n s t r u c t i o n . New Y o r k . P l e n u m P r e s s , 1978. p.

5 RUMELHART. D.E. Toward a n I n t e r a c t i v e model of r e a d i n g . I n DORNIC, 8 . . cd. A t t e n t i o n a n d p e r f o r m a n c e VI. New York. Academic P r e s s . 1977. JOHNSON, P . E f f e c t s o n r e a d i n g c o m p r e h e n s i o n of l a n g u a g e complexity a n d c u l t u r a l b a c k g r o u n d of a t e x t . TESOL Q u a r t e r l y , 15:69-81 ,1981.

6 PEARSON, P.D. & S P I R O , R. T h e new buzz word In r e a d i n g Is s c h e m a . I n s t r u c t o r , 41:468. 1982. CARRELL, P.L. B a c k g r o u n d knowledge In second l a n g u a g e c o m p r e -h e n s i o n . L a n g u a g e Learning aird C o m m u n i c a t i o n , 2:25-33. 1683.

7 E.g. S P I R O , R.J. P r i o r knowledge a n d s t o r y processing: I n t e g r a t i o n , selection, and v a r i a t i o n . Poetics, 9:313-27, 1980. HARE. V.C. P r e a s s e s s m c n t of topical knowledge: a v a l i d a t i o n a n d extension. J o u r n a l of Reading Behavior. 14:77-85, 1982. LANGER, J.A. E x a m i n i n g b a c k g r o u n d knowledge and text c o m p r e h e n s i o n . Reading Research Q u a r t e r l y , 19:488-B1, 1984.

8 HUDSON, T . T h e e f f e c t s of lnduccd r.chemata on t h e " s h o r t c i r c u i t " in L2 r e a d i n g : n o n - d e c o d i n c f a c t o r sin L2 r e a d i n g p e r f o r m a n c e . L a n g u a g e L e a r n i n g , 32: 1-31. 1982. CARRELL. P.L. F a c i l i t a t i n g ESL r e a d i n g b y t e a c h i n g t e x t s t r u c t u r e . T E S O L Q u a r t e r l y , 19:727-51, 1985. SWFFAR. J . IK.

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RAUEN, M.Q. Teoria da esauema

fende o uso de atividades de "aquecimento" mental, exercí-cios visando a ativar ou fornecer esquemas, para enriquecer a experiencia com o texto. Hudson recomenda a sessão de pré-leitura, principalmente, para os níveis básico e interme-diário, constatando que o leitor em níveis avançados tende a ativar por si os esquemas de interpretação. Carrel já desen-volveu estratégias de identificação de esquemas necessários para a melhor compreensão de textos. Lentamente, como su-gere Swaffar, o texto não pode mais ser visto à parte do

lei-tor ou de um referencial esquemático.8

Implicações imediatas: os esquemas e a análise do discurso

A Teoria do Esquema, no sentido mais amplo, nos liberta de uma visão puramente pragmática do discurso, e, especial-mente, da visão que atribui ao texto uma existência indepen-dente do decodificador. Mas ela nos obriga, além disso, a por em xeque diversas perguntas. Estarão os próprios ana-listas de discurso adequadamente dotados de esquemas para "experimentarem" com as diversas formas de texto? Tere-mos que, necessariamente, controlar a variável cultura em nossas investigações? Qual seria a maneira mais eficiente de suprirmos deficiências esquemáticas? Até que ponto podere-mos relacionar a não-efetivação de um objetivo pragmático com deficiências esquemáticas?

Talvez a Teoria do Esquema, aliada à Teoria Semiótica,9

venha a nos fornecer um modelo de análise do discurso mais próximo da "realidade", por assim dizer. A necessidade de tal modelo é grande, porque nossas explicações lingüísticas e/ou pragmáticas já se revelaram limitadas mediante a

com-plexidade do objeto textual.10 Acredito mesmo que nos

encon-tramos tão fascinados com o discurso, seja ele expressivo,

referencial, literário ou persuasivo11 justamente porque o seu

estudo nos coloca no cruzamento de linguagem e praxis, e na fronteira entre linguagem e meta-linguagem. E a chegada a essa fronteira foi uma conseqüência natural de nossa curio-sidade, nosso espírito inquisitivo.

Aparentemente, então, precisaremos assumir uma postu-ra dialética se quisermos nos supepostu-rar. A síntese é um obje-tivo pretensioso, mas emerge como meio de transformação eficaz à medida que exploramos o limiar do conhecimento.

9 Q.v. BARROS. D.L.P. Teoria do discurso. São P a u l o , Atual, 1988.

10 8EBASTIAO UCHOA. LEITE, cm sua lntroduç&o à A v e n t u r a s do Alice (Carroll. Lew::, J o ã o Paulo. S u m m u s Editorial, 1980. 3 cd.) considera, p o r exemplo, " o q u a n t o a f a n t a s i a c a r r o l U a n a e s t á p r e s a a u m universo de r e f e r ê n c i a s . . . s e n d o . . . t ã o m e t a l i t e -r&rla q u a n t o o Ulysses de J a m e s J o y c e . " (p. 15) Desconhecer este r e f e r e n c i a l e 1er h e d o n l s t l c a m e n t e .

11 IKIN.VEAVY. J.L. A t h e o r y of discourse. New York. Nortln. 1971.

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HAUEN, M .G. Teoria do esquema

REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS

1 ANDERSON, R.C.; REYNOLDS, R.E.; SCHALLERT, DX.; GOETZ, E.T. Frameworks for comprehending discourse. American Edu-cational Research Journal, 14:367-82, 1977.

2 BARROS, D.L.P. Teoria do discurso. São Paulo, Atual, 1988. 3 CARRELL, P,L. Background knowledge in second language

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5 DEN UYL, M. & OOSTEMDORP, H. The use of scripts in text comprehension. Poetics, 9:275-94, 1980.

6 DORNIC, S., ed. Attention and performance VI. New York, Acade-mic Press, 1977.

7 FERREIRA, A.B.H. Novo dicionário da língua portuguesa. Rio de Janeiro, Nova Fronteira, 1975.

8 GOODMAN, K.S. & NILES, O.S., ed. Reading: process and program. Urbana, National Council of Teachers of English, 1970.

9 HABERMAS, J. Dialética e hermenêutica. Trad. A.L.M. Vails. São Paulo, L & PM, 1988.

10 HARE, V.C. Preassessment of topical knowledge: a validation and extension. Journal of Reading Behavior, 14:77-85, 1982.

11 HUDSON, T. The effects of induced schemata on the "short circuit" in L2 reading: non-decoding factors in L2 reading performance. Language Learning, 32:1-31, 1982.

12 JOHNSON P. Effects on reading comprehension of language com-plexity and cultural background of a text. TESOL Quartely, 15:169-81, 1981.

13 KAVANAGH, J.F. & MATTINGLY, I.G., ed. Language by eye and ear. Cambridge, Mass., MIT Press, 1972.

14 KINNEAVY, J.L. A theory of discourse. New York, Norton, 1971. 15 LA BERGE, D. & SAMUELS, SJ. Toward a theory of automatic

information processing in reading. Cognitive Psychology, 6:293-323, 1974.

16 LANGER, J.A. Examining background knowledge and text com-prehension. Reading Research Quartely, 19:468-81, 1984.

17 LESGOLD, AM. et alii. Cognitive psychology and instruction. New York, Plenum Press, 1978.

18 PEARSON, PH. & SPIRO, R. The new buzz word in reading is schema. Instructor, 41:46-8, 1982.

19 SPIRO, RJ. Prior knowledge and story processing: integration, selection, and variation. Poetics, 9:313-27, 1980.

20 SWAFFAR, J. K. Readers, texts, and second languages: The interac-tive processes. The Modern Uanguage Journal, 72: 123-149, 1980.

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