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REGISTROS DE REPRESENTAÇÃO SEMIÓTICA: ENTRADA LEXICAL, ENTRADA ENCICLOPÉDICA E ENTRADA LÓGICA

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Academic year: 2021

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ENTRADA LEXICAL, ENTRADA ENCICLOPÉDICA E ENTRADA LÓGICA

Marleide Coan Cardoso Fábio José Rauen

RESUMO: Os objetos matemáticos representados por determinadas unidades significativas de um registro de representação semiótica somente são acessíveis por meio de unidades significativas de outro registro de representação semiótica. Como cada registro de representação recorta o objeto apenas parcialmente, supõe-se que a compreensão ao conceito, embora parcial, vai sendo sucessivamente mais completa na medida em que o indivíduo vai dominando esses diferentes registros, de modo a ser capaz de converter ou traduzir esses registros entre si sempre que necessário. Neste estudo, abordamos essa questão partindo da noção de Sperber e Wilson (1986, 1995) que as informações contidas em cada um dos registros são armazenadas no cérebro em ‘endereços conceituais’ que podem ser acessados a partir de entradas lógicas, enciclopédicas e lexicais. Considerando-se estes aspectos dos registros de representação semiótica, este artigo se constitui a partir da seguinte problemática: Como estão organizadas as unidades significativas em cada registro de representação a partir de suas entradas lógica, enciclopédica e lexical? De maneira geral tem-se: Conhecer a organização das unidades significativas de cada registro de representação a partir das unidades significativas dos registros de representação. Especificamente tem-se: Descrever as unidades significativas de cada registro de representação; aprofundar estudos sobre as entradas lexical, enciclopédica e lógica e suas relações com os registros de representação semiótica utilizados em matemática. Os estudos aqui apresentados pautam-se nos seguintes registros de representação abordados a partir de suas entradas: representação gráfica, representação algébrica, representação em tabelas e a representação figural considerando a Língua Natural como responsável pela intermediação destes registros quando estes estão sendo mobilizados no processo ensino aprendizagem da Matemática. As descrições apresentadas exemplificam a funcionalidade das diferentes entradas no ambiente cognitivo, ou seja, das ‘portas’ de acesso a esse ambiente além de mostrar interfaces entre os registros de representação semiótica em matemática e a Língua Natural.

PALAVRAS-CHAVE: Registros de representação, entrada lexical, lógica e enciclopédica.

INTRODUÇÃO

Os registros de representação semiótica se constituem de distintas unidades significativas. É a partir da identificação do conjunto de unidades significativas dos registros que se constituem a diversidade destes em matemática. Duval (2011, p.69) aponta para as diferenças existentes entre os registros de representação semiótica em matemática, mas considera que cada registro mantém suas unidades significativas específicas que manifestam certos aspectos do objeto representado, mas que permitem relação com outras unidades significativas de outros registros.

O conteúdo desses diferentes tipos de representação recobre cada vez mais vários níveis de organização que ele funde às unidades de sentido. A transformação dessas representações semióticas, por mais simples que sejam, requer que possamos discriminar primeiro as unidades de sentido que não são dadas separadamente. E as operações que permitem transformar uma representação dada não dependem apenas de seu conteúdo, como se fosse simplesmente aplicar as regras, mas do tipo de

Artigo apresentado no VII Simpósio sobre Formação de Professores (SIMFOP) da Universidade do Sul de Santa Catarina – UNISUL

 Doutora. Marleide.cardoso@ifsc.edu.br  Doutor. fabio.rauen@unisul.br

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representação. Essas operações são específicas de cada tipo de representação. Não existem operações cognitivas transemiótica sobre as representações semióticas.

As diferentes unidades significativas e a diversidade de registros permitem o acesso ao ambiente cognitivo. Sperber e Wilson (2001) apresentaram estas entradas aplicadas à língua natural embora também considerem as demais, sem contudo estudá-las com profundidade. São as unidades significativas dos diferentes registros que conferem a estes a relação de maior ou menor congruência quando do processo de conversão entre estes. Este artigo propõe a fazer uma ampliação destas entradas, agora aplicadas aos demais registros de representação semiótica utilizados em matemática. a partir da seguinte problemática: Como estão organizadas as unidades significativas em cada registro de representação a partir de suas entradas lógica, enciclopédica e lexical? De maneira geral tem-se: Conhecer a organização das unidades significativas de cada registro de representação a partir de suas entradas lógica, lexical e enciclopédica. Especificamente tem-se: Descrever as unidades significativas de cada registro de representação; aprofundar estudos sobre as entradas lexical, enciclopédica e lógica e suas relações com os registros de representação semiótica utilizados em matemática Para a realização desta descrição inicialmente se apresentará um breve estudo e identificação em cada uma destas entradas e em seguida se apresenta sua funcionalidade relacional nos processos de tratamentos e conversões realizados entre objetos matemáticos por meio de exemplos de objetos matemáticos em diferentes registros de representação.

A ENTRADA LEXICAL

Para se referenciar a entrada lexical de cada registro de representação necessita-se admitir que cada registro é constituído de um conjunto de unidades significativas mínimas que compõem o seu léxico. Definimos aqui as unidades significantes em Duval (2009, p.68), “Cada unidade significante simples de uma das representações, pode-se associar uma unidade significante elementar. Considera-se como unidade significante elementar toda unidade que se destaca do “léxico” de um registro”.

O conceito de léxico encontrado em grande parte da literatura envolve apenas o léxico na Língua Natural, no entanto, este artigo ampliará para a descrição não apenas do registro em Língua Natural, mas para os demais registros de representação que são utilizados para representar os objetos matemáticos.

O “léxico” é um dos componentes centrais dos sistemas de processamento das línguas naturais. Essa centralidade deve-se ao fato de que o “léxico” armazena, além das unidades lexicais, um complexo conjunto de informações que, de acordo com a especificidade do sistema, pode englobar propriedades fonológicas, morfológicas, sintáticas, semânticas e pragmático-discursivas dos itens lexicais da(s) língua(a). Tais informações fornecidas pelo léxico são manipuladas pelo sistema durante os processos de interpretação e/ou geração de língua natural. (FELIPPO e SILVA, 2004, p. 4).

Entretanto, o processo de representação envolve em estrutura cerebral o domínio do léxico de qualquer registro. O processo de elaboração conceitual que envolve um objeto matemático a ser representado ou o aspecto do objeto que se pretende tornar evidente depende do conjunto de unidades significativas que compõem o léxico do registro que são de domínio de quem pretende representar e ou evidenciar algum aspecto do objeto representado. Assim, adotar-se-á neste artigo que a entrada lexical, consiste nas unidades significativas estruturadas

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que possibilitam acessar a um conceito por meio de um registro de representação. Em língua natural, por exemplo, a entrada lexical é composta pelas ‘palavras’ que uma determinada comunidade dispõe para socializar de forma oral ou escrita o conhecimento. Quando referenciamos o registro gráfico, por exemplo, uma das unidades significativas do léxico são os eixos coordenados para representar a relação entre as grandezas variáveis e os pares ordenados.

Vale ressaltar neste contexto que os objetos matemáticos em seus registros de representação e no processo de elaboração conceitual requerem o domínio do léxico de cada um deles. As informações que os registros carregam somente serão processadas pelo cérebro, se este reconhecer o objeto representado por meio de seu registro, bem como estabelecer relações no próprio ambiente cognitivo capaz de transformar o objeto representado, ou conceito a partir do acesso deste novo registro.

O acesso ao objeto matemático por meio de registros de representação mobiliza informações diferenciadas do objeto, ou ainda revela aspectos do mesmo que o registro anterior não era capaz de mostrar. Cada entrada lexical de um registro mobiliza informações diferentes do objeto representado, ou também insere informações deste objeto no ambiente cognitivo, gerando uma transformação do objeto representado. A entrada lexical se processa no plano central e no plano da expressão.

Reconhecer as diferenças e semelhanças que existem entre os registros de representação semiótica e as relações existentes entre os mesmos pode potencializar o processo de aprendizagem. Conforme já mencionado, para entender os registros de representação em sua entrada lexical necessita-se de uma descrição de suas unidades significativas, ou seja, os termos que possibilitam ao registro transmitir informações em relação ao objeto representado. O léxico de cada registro apresenta uma sintaxe que combina as unidades significativas de forma a comunicar algo a partir da representação do objeto. Se na abordagem de um objeto matemático há a possibilidade da utilização de diferentes registros de representação, então se admite a variedade de entradas lexicais e uma relação léxica entre estes registros.

Figura 01 – Representação das unidades significativas do sistema bidimensional de coordenadas cartesianas e um ponto genérico A(x,y) e do registro tabular

Fonte: Elaboração da autora

Também se pode ilustrar a relação entre a entrada lexical do registro algébrico e registro figural que corresponde ao ‘o quadrado da soma de dois termos m e n’ expresso na representação em língua natural e algébrica: sejam quaisquer números m e n tem-se

. ² 2 ² )² (mnmmnn x y (x, y)

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Figura 02– Representação do quadrado da soma de dois termos m e n .

Fonte: elaboração da autora.

Rotineiramente quando se referencia o léxico, mentalmente se busca um ponto de partida no sistema da língua natural, o qual se constitui de palavras que se organizam segundo um conjunto de regras a sua (sintaxe) que estrutura as unidades significativas (palavras) dentro deste registro de representação. No entanto, em se tratando da Matemática, sabe-se que esta apresenta outros registros de representação com uma sintaxe própria de suas unidades significativas que são organizadas objetivando representar outros aspectos de seus objetos.

A entrada lexical contém informações sobre o item lexical da linguagem natural utilizada para as exprimir. Supomos que essa entrada inclui aquela espécie de informação sintática e fonológica que estaria contida na entrada lexical para esse item numa gramática gerativa: informações sobre a categoria sintática a que pertence as possibilidades de co-ocorrência, a estrutura fonológica, e assim por diante. (SPERBER; WILSON, 2001, p. 149)

Em se tratando da matemática, há outros registros distintos da língua natural que são utilizados para representar os objetos matemáticos. As informações contidas nos registros de representação da matemática e suas respectivas unidades significativas necessitam de um estudo mais detalhado de como estes se constituem e significam em matemática como meios de representar os objetos matemáticos.

ENTRADA ENCICLOPÉDICA

A entrada enciclopédica constitui-se do conjunto de conhecimentos já construídos pelo indivíduo ao longo de sua vida. Estes conhecimentos são advindos de inúmeras fontes. “A entrada enciclopédica contém informações sobre a extensão e /ou denotação do conceito. Isto é, sobre os objetos, acontecimentos e/ou propriedades que o representam” (SPERBER; WILSON, 2001, p. 144). As informações acessam ao ambiente cognitivo por meio de registros de representação. No entanto, estas informações podem ser inéditas ou já construídas pelo indivíduo. De qualquer forma, elas apenas são acessíveis por meio de registros de representação pelas características e propriedades que devem ter suas unidades significativas devidamente identificadas e processadas pelo sujeito em seu ambiente cognitivo.

Sperber e Wilson (2001) consideram que o ambiente cognitivo é o conjunto de suposições que o indivíduo tem a capacidade de representar mentalmente e que são aceitas como verdadeira. O conjunto de suposições que constituem este conhecimento é construído a partir das entradas lexicais dos diferentes registros de representação que se reorganizam por meio de relações e constituem o que podemos denominar de conceito. As limitações do ambiente cognitivo não podem ser determinadas uma vez que é impossível controlar as relações que são estabelecidas dentro deste ambiente a partir das entradas dos registros de

² 2

² )²

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representação. Neste contexto, as suposições manifestas não representam o conhecimento enciclopédico de um indivíduo, pois este também se constitui de representações internas que talvez nunca sejam acessíveis por meio de registros de representação.

O acesso às representações internas por meio dos registros de representação semiótica é o que pode se tornar manifesto quando se estabelece o processo comunicativo entre indivíduos. Em se tratando dos objetos matemáticos, estes por serem objetos ideais, constituídos de forma e não de conteúdo, necessitam sempre de definições para serem acessados. Para entender a definição de um objeto matemático ou conceito é necessário também o reconhecimento das unidades significativas que são comuns a estes registros.

Sperber e Wilson (2001, p. 89) destacam a necessidade de se ter um ambiente cognitivo mútuo para que seja estabelecida a comunicação. “Os ambientes cognitivos mútuos fornecem diretamente todas as informações necessárias para a comunicação e para a compreensão”. Conhecimento mútuo são as informações sobre um determinado objeto que são compartilhadas por indivíduos de uma comunidade ou entre quem se pretende estabelecer o processo comunicativo. No entanto, o processo comunicativo só terá êxito se o receptor aceitar a intenção informativa mutuamente manifesta. Então ela foi bem sucedida.

“Uma pessoa que comunica está normalmente interessada em saber se foi bem sucedida ou não na realização de sua intenção informativa, e esse interesse é mutuamente manifesto a ela e ao receptor” (SPERBER e WILSON, 2002, p.111). Aqui se apresenta a ideia defendida pelos autores da necessária manifestabilidade no processo comunicativo exitoso.

O conhecimento mútuo constitui-se nos conceitos iniciais e necessários que fundamentam os novos conhecimentos no processo ensino e aprendizagem. Trata-se do que se pode denominar de pré-requisitos para a construção de novos conhecimentos ou ainda provocarem a modificação dos conceitos já construídos no ambiente cognitivo que são capazes de gerar estímulo ostensivo de domínio de quem pretende estabelecer o processo comunicativo.

Cada registro de representação apresenta sua entrada enciclopédica com a intensão que este ‘clarifique’ em alguns aspectos o objeto representado. Para ilustrar apresenta-se um exemplo desta entrada. Em língua natural, quando dizemos ‘representação gráfica em R² de uma função do primeiro grau definida em reais’ todos que têm em seu ambiente cognitivo construído o endereço conceitual de função do primeiro grau, poderão manifestar inúmeras representações, sendo impossível ilustrar todas as possibilidades.

Figura 03: Possíveis registros de representação gráfica de funções do primeiro grau

Fonte: elaboração da autora

No entanto, se utilizarmos o registro gráfico para ilustrar o mesmo enunciado haveria restrição no registro enciclopédico uma vez, que já se efetuou um recorte na

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abrangência significativa do registro semiótico. Se para o mesmo enunciado ‘representação gráfica em R² de uma função do primeiro grau definida em reais’ apresentarmos o registro da figura 04 não haverá possibilidade para outra entrada enciclopédica. Mas haverá a interpretação desta a partir do pré-conhecimento já existente em relação a outros aspectos do objeto representado.

Figura 04: representação gráfica da função do primeiro grau

Fonte: elaboração da autora.

A totalidade da representação de um objeto é inatingível uma vez que não é possível determinar ou identificar todas as propriedades destes que estão construídos pelo indivíduo, ou o conjunto de unidades significativas que estão presentes nas suposições. A diversidade de registros, neste aspecto, potencializa o reconhecimento destas propriedades dos objetos representados, no entanto, não garante sua totalidade nem mesmo sua compreensão.

Cada registro de representação de um objeto mobiliza um conjunto de estímulos ostensivos capazes de alterar o ambiente cognitivo, possibilitando que o processo de elaboração conceitual se torne diferente. As relações que se estabelecem entre as informações construídas no ambiente cognitivo podem se combinar e alterar este ambiente permitindo observar o objeto representado sob um aspecto diferente do que os próprios registros em si eram capazes de acessar.

O processamento de informações é uma tarefa permanente de uma vida inteira. Os recursos totais do indivíduo para o processamento de informações são, se não praticamente fixos, pelo menos não muito flexíveis. Assim, a eficiência cognitiva a longo prazo é constituída pelo melhoramento, tanto quanto possível, do conhecimento que uma pessoa tem do mundo, dados os recursos disponíveis. (SPERBER; WILSON, 2001, p. 91)

Não é difícil perceber que o conhecimento mobilizado pela entrada enciclopédica de um registro de representação depende dos estímulos ostensivos que as unidades significativas do mesmo mobilizam no ambiente cognitivo do ouvinte.

Considerando que o conhecimento é uma construção individual influenciada pelas possibilidades e oportunidades que os indivíduos têm contato ou acesso por meio dos registros de representação, estes respondem de maneira diversificada no momento que são colocados novamente em contato com o mesmo registro de representação. Assim, não se pode garantir que a aprendizagem de um objeto matemático por meio de um registro de representação seja igual para todos os indivíduos. Esta aprendizagem depende de, entre outros fatores, dos conceitos já construídos nos endereços conceituais no ambiente cognitivo e da potencialidade do novo registro em mobilizar, produzir e multiplicar efeitos a partir de seu processamento.

A terceira entrada de acesso ao ambiente cognitivo é a entrada lógica, objeto de estudo da próxima seção.

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ENTRADA LÓGICA

As informações relacionadas a um objeto são acessadas pelo ambiente cognitivo por meio das unidades significativas que constituem a entrada lexical de um registro de representação que se organizam em endereços conceituais num conjunto de suposições que são passíveis de representação, constituindo a entrada enciclopédica para um objeto.

O processamento destas informações que se organizam no ambiente cognitivo acorre pela computação dos conteúdos que foram envolvidas na entrada lexical que passa a constituir a entrada enciclopédica para um aspecto do objeto representado. Este processamento constitui a entrada lógica dos registros de representação. Conforme Sperber e Wilson (2001, p. 144), “uma entrada lógica é constituída por um conjunto de regras de dedução, cada uma delas a descrever formalmente um conjunto de suposições da entrada de dados e do resultado: isto é, um conjunto composto de premissas e de conclusões”.

A entrada lógica de um registro de representação é organizada num conjunto de regras finitas que combinam as unidades significativas de um registro de representação para constituir um aspecto do objeto representado. Assim, não se pode deixar de considerar que embora a entrada lógica para um registro de representação esteja concluído, este não garante que o conceito do objeto representado seja plenamente dominado na sua totalidade. Sempre há aspectos do objeto que um registro torna manifesto de forma diferente do outro registro, pois estes são formados de unidades significativas diferentes e que são processadas de forma diferente pelo ambiente cognitivo.

Para se argumentar sobre a entrada lógica dos registros de representação é importante compreender a funcionalidade desta para o ambiente cognitivo. Nem todas as informações que são armazenadas no ambiente cognitivo apresentam uma forma lógica. O conjunto de suposições e informações que se encontram armazenadas no ambiente cognitivo de um indivíduo constituem a sua representação do mundo.

“Uma representação do mundo é composta por um armazém de suposições factuais que se encontram dentro de uma organização interna qualquer” (SPERBER; WILSON, 2001, p. 168).

O processo de relevância de um registro de representação é analisado a partir das alterações que este provoca nas suposições já construídas anteriormente e que estão à disposição do indivíduo na sua representação do mundo.

Para se referenciar a entrada lógica de um registro de representação e sua relevância de processamento é importante entender como acontece a organização e acomodação das informações no processamento pelo ambiente cognitivo. O processamento de uma informação pelo ambiente cognitivo acontece via mecanismo dedutivo.

Sperber e Wilson (2001, p. 160) afirmam que “o mecanismo dedutivo humano é um sistema que explicita o conteúdo de qualquer conjunto de suposições que lhe seja submetido”.

No entanto, é preciso compreender o funcionamento deste mecanismo a partir do entendimento de que este é capaz de reconhecer regras de dedução que compõem a entrada lógica de um registro de representação para um conceito. Não é possível delimitar as informações que cada registro de representação carrega em suas unidades significativas relacionadas ao objeto representado, mas o sistema dedutivo é capaz de criar um aparato lógico para estabelecer relações entre estes registros de forma que elimine as contradições, se existirem, de informações que compõem o objeto representado.

Assim, um mesmo objeto pode conter informações diferentes e até mesmo contraditórias em suas unidades significativas de seu registro de representação. É o caso, por exemplo, de uma informação incorreta sobre determinado objeto que se encontra armazenada em suposições constituindo o conhecimento enciclopédico relacionado a um aspecto do

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objeto. Quando o indivíduo, em outro momento de sua vida, tiver acesso a outras informações sobre o mesmo objeto, e que são diferentes ou contrastam das que estão armazenadas, há um conflito no processamento e este aguarda até que sejam corrigidas tais distorções. Assim, as novas informações podem provocar alterações nas suposições já armazenadas, ou até mesmo eliminar e substituir estas pelas novas informações, desde que sejam consideradas verdadeiras, ou apresentem seu valor de verdade superior às informações que se encontram no ambiente cognitivo já construídas e organizadas em suposições.

O processo dedutivo é passível de representações conceituais e não perceptuais. Assim o processamento dedutivo envolve as representações que tem uma forma lógica ou proposicional.

Uma regra de dedução é uma computação que se aplica às suposições em virtude da sua forma lógica. Uma implicação lógica é uma relação sintática por existir puramente em virtude das propriedades formais das suposições, e por não estar incluída em nenhuma referência no que se refere às suas propriedades semânticas. (SPERBER; WILSON, 2001, 141)

Ainda de acordo com Sperber e Wilson (2001) as regras de dedução se encontram na capacidade humana objetivando tomar conta dos aspectos semânticos das suposições desde que sejam organizadas dentro de sua forma.

Uma informação pode ser armazenada ora num registro e ora em outro. Isso torna vantajosa para a matemática a utilização dos diferentes registros de representação semiótica, tal como proposta por Duval (2009) (2011), pois as informações que suas unidades significativas carregam podem ser processadas e armazenadas simultaneamente em diferentes endereços conceituais. Isso permite acessar ao objeto representado em seus diferentes aspectos, desde que se mantenha a coerência entre as informações armazenadas de forma que estas não sejam contraditórias entre si.

Se as suposições sobre um determinado objeto são armazenadas de formas diferentes também seu processo de recuperação fica relacionado com mais de uma entrada, bem como as regras de dedução aplicadas sobre estas. É o caso, por exemplo, das entradas do registro algébrico, gráfico, figural, tabular entre outros.

Se os conceitos apresentam entradas lógicas diferentes, estas possuem características do objeto representado também distintas, ou ainda possibilitam que as propriedades e características dos objetos sejam manifestas pelas suposições em contextos diversos. Esta característica da entrada lógica possibilita distingui-la também da entrada enciclopédica e lexical. É muito difícil determinar as fronteiras de cada entrada de acesso ao ambiente cognitivo, onde uma inicia ou onde finaliza sua função no papel da compreensão.

O sistema dedutivo humano é capaz de otimizar o processo de armazenamento de suposições e de estabelecer relações entre elas sempre que uma nova suposição é armazenada potencializando as representações conceituais do mundo que já estão organizadas nos endereços conceituais.

É neste contexto que Sperber e Wilson (2001, p. 167) consideram que o processamento das implicações triviais é diferente do processamento das implicações não triviais. As implicações triviais não desempenham papel algum no processo de compreensão.

A função do mecanismo é essencialmente a de analisar e a de manipular o conteúdo conceitual das suposições, sendo essa função desempenhada pelas regras de eliminação ligadas as entradas lógicas dos conceitos. A nossa tese central tem sido a de que no processamento dedutivo de uma suposição em circunstâncias normais existe uma computação das suas implicações não triviais, nunca das triviais.

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No entanto, o funcionamento do sistema dedutivo humano está relacionado com o conteúdo proposicional escolhido dentro de um contexto.

Não é possível determinar a quantidade de conteúdos armazenados nas suposições do ambiente cognitivo, nem determinar o que cada registro de representação é capaz de recuperar dos conteúdos armazenados nestas suposições. O fato de um mesmo conceito apresentar inúmeros acessos, envolvendo este conceito, que muitas vezes são apreendidos separadamente não significa que o conteúdo envolvido em cada um destes registros não tenha sido compreendido adequadamente. O que fica limitado, neste caso, é a visão total do objeto representado, ou as suposições envolvidas aqui serão de natureza diferente.

As informações que acessam ao ambiente cognitivo quando muito complexas são repartidas em unidades mais simples por suas unidades constituintes que podem também ser armazenadas em endereços conceituais em entradas enciclopédicas diferentes. É o caso de um mesmo objeto matemático ser acessado por diferentes registros de representação, a unidade significativa de cada registro apresenta uma entrada enciclopédica com características distintas do objeto representado.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os fundamentos deste artigo relacionado às entradas lexicais, enciclopédicas e lógicas ao ambiente cognitivo provem da língua natural, porém, ampliaram-se estes conceitos para os registros de representação semiótica utilizados em matemática tais como registro algébrico, gráfico, tabular entre outros. Considera-se a Língua Natural como responsável pela intermediação dos registros de representação semiótica quando estes estão sendo mobilizados no processo ensino aprendizagem da Matemática. Os exemplos de representações apenas ilustraram de forma simplificada a funcionalidade das diferentes entradas no ambiente cognitivo, ou seja, das ‘portas’ de acesso a esse ambiente por meio dos registros de representação semiótica.

No processo ensino e aprendizagem dos objetos matemáticos, além da Língua Natural, outras formas de acesso ao conceito são importantes devendo ser devidamente abordados em sala de aula de maneira que o estudante domine estas diferentes formas de representar os objetos de estudo. O que se discutiu neste artigo a partir da teoria de Duval (2009, 2011) e a Teoria Relevância de Sperber e Wilson(2001) foi a possibilidade de ampliação das ‘entradas’ de acesso aos conceitos matemáticos por meio da articulação entre as unidades significativas dos registros de representação semiótica em matemática.

REFERÊNCIAS

DUVAL, Raymond. Registres de représentation sémiotique et functionnement cognitive de la pensée. Annales de didactique et sciences cognitives, v. 5. Strasbourg: IREM-ULP, 1993. p. 37-65.

______. Registros de representações semióticas e funcionamento cognitivo da compreensão em matemática. In: MACHADO, Silvia Dias Alcântara (Org.). Aprendizagem em

Matemática: registros de representação semiótica. 2 ed. Campinas: Papirus, 2005. p.11-33. ______. Semiósis e pensamento humano: registros semióticos e aprendizagens intelectuais. Trad. de Lênio Fernandes Levy e Marisa Roâni Abreu da Silveira. São Paulo: Livraria da Física, 2009.

______. Ver e ensinar a Matemática de outra forma: entrar no modo matemático de pensar: os registros de representações semióticas. Organização Tânia M. M. Campos. Tradução Marlene Alves Dias. São Paulo: PROEM, 2011.

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SPERBER, Dan; WILSON, Deirdre. Relevância: comunicação e cognição. Lisboa: Fundação Galouste Gulbenkian, 2001.

______; ______. Relevance: communication & cognition. 2nd. ed. Oxford: Blackwell, 1995. [1st. ed. 1986].

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