Doação
doação - ato de mera liberalidade na transferência entre patrimônios
Art. 538. Considera-se doação o contrato em que uma pessoa, por liberalidade, transfere do seu patrimônio bens ou vantagens para o de outra.
A coisa doada não fica sujeita a vícios redibitórios (defeitos materiais) ou evicção (defeitos jurídicos). Vícios Redibitórios - É defeito material na coisa cuja existência somente o exame ou teste pode revelar. Confere ao contratante prejudicado o direito de redibir (anular) o contrato, devolvendo a coisa e recebendo do vendedor a quantia paga. Entretanto, se a coisa foi obtida mediante doação. não fica sujeita à vícios redibitórios.
O vício redibitório se aplica aos contratos comutativos (locação, empreitada, compra e venda, doações onerosas).
Art. 441. A coisa recebida em virtude de contrato comutativo pode ser enjeitada por vícios ou defeitos ocultos, que a tornem imprópria ao uso a que é destinada, ou lhe diminuam o valor.
Características dos vícios redibitórios
Evicção - É a perda total ou parcial do direito de propriedade de coisa que não poda ser alienado por ser propriedade de terceiro.
Art. 447. Nos contratos onerosos, o alienante responde pela evicção. Subsiste esta garantia ainda que a aquisição se tenha realizado em hasta pública.
Requisitos da doação
Espécies de Doação
O Capítulo IV, Seção I, do Código Civil, contém as disposições gerais sobre a Doação. Algumas das espécies de doação são:
1. Doação: doação por liberalidade ou generosidade, sem nenhum tipo de contrapartida. 2. Doação condicional: é a doação condicionada por evento futuro incerto.
Art. 121. Considera-se condição a cláusula que, derivando exclusivamente da vontade das partes, subordina o efeito do negócio jurídico a evento futuro e incerto.
3 Doação à prazo ou termo: é a doação condicionada por evento futuro certo.
4. Doação modal: exige uma contraprestação (ônus) de pequena monta de modo a não caracterizar troca. 5. Doação em fraude contra credor: é a doação efetuada pelo insolvente (Código Civil, art.158).
6. Doação ilegítima: quando o donatário não possui legitimidade para ser proprietário da coisa.
Art. 550. A doação do cônjuge adúltero ao seu cúmplice pode ser anulada pelo outro cônjuge, ou por seus herdeiros necessários, até dois anos depois de dissolvida a sociedade conjugal.
Art. 1.749. Ainda com a autorização judicial, não pode o tutor, sob pena de nulidade: (...) II - dispor dos bens do menor a título gratuito;
7. Doação inoficiosa: O cônjuge não pode doar seus bens além do que tem legalmente direito. Art. 549. Nula é também a doação quanto à parte que exceder à de que o doador, no momento da liberalidade, poderia dispor em testamento.
Art. 1.846. Pertence aos herdeiros necessários, de pleno direito, a metade dos bens da herança, constituindo a legítima.
8. Doação com cláusula de reversão:
Art. 547. O doador pode estipular que os bens doados voltem ao seu patrimônio, se sobreviver ao donatário. Parágrafo único. Não prevalece cláusula de reversão em favor de terceiro.
9. Doação universal: legalmente proibida.
doador.
Revogação da doação
Por ser liberalidade e generosidade, a doação não admite ingratidão por parte do donatário, constituindo-se o respeito ao doador pelo donatário em obrigação de não fazer.
Art. 557. Podem ser revogadas por ingratidão as doações:
I - se o donatário atentou contra a vida do doador ou cometeu crime de homicídio doloso contra ele; II - se cometeu contra ele ofensa física;
III - se o injuriou gravemente ou o caluniou;
IV - se, podendo ministrá-los, recusou ao doador os alimentos de que este necessitava. Exercício Prático
Considere o seguinte agravo de instrumento, reproduzido do Tribunal de Justiça de São Paulo.
AGRAVO DE INSTRUMENTO - execução de titulo extrajudicial fraude à execução - insurgência em face da decisão pela qual foi reconhecida a fraude de execução em doação de imóvel à filha do agravante após este ter sido citado na execução - conluio evidenciado pela
transferência gratuita do imóvel à filha, não obstante a inexistência de penhora ou averbação a respeito do ajuizamento da execução na matrícula do bem - configuração dos requisitos previstos no art. 593, II do CPC/1973 situação consolidada - recurso não provido.
Trata-se de recurso de agravo de instrumento contra a r. decisão de fls. 186/187 (autos originais, em consulta ao sítio do TJSP), proferida pelo MM. Juiz de Direito da 3ª Vara Cível da Comarca de Araras, Dr. Antônio César Hildebrand e Silva que, nos autos da ação de execução de título extrajudicial movida pelo agravado em face do agravante, declarou ineficaz a doação efetuada e determinou o registro da penhora.
Busca o agravante a reforma do decidido. Recurso regularmente processado. É o relatório.
Narra a inicial que a exequente, ora agravada, ajuizou ação de execução de título extrajudicial contra a executada, ora interessada, por dívida representada por Instrumento Particular de Confissão de Dívida no valor de R$ 21.278,61, que foi inadimplida.
Citada a executada, na pessoa do representante legal (fls. 13 e 28), apresentou pedido de parcelamento da dívida (fls. 31/32).
O exequente apresentou pedido de penhora em bens (fls. 43/44) e o oficial de justiça certificou que não há bens a penhorar (fls. 49).
O exequente apresentou pedido de desconsideração da personalidade jurídica (fls. 54/57), o qual foi aceito pelo i. Magistrado (fls. 61), com determinação de citação do sócio (fls. 83/85).
O exequente formulou pedido de penhora on line, o qual foi deferido (fls. 91), porém resultou negativo e, ainda, aduz que houve fraude à execução por conta da transferência imobiliária gratuita realizada em outubro de 2015 (fls. 145/146).
O executado afirma (fls. 155/156) que já estava em tramitação sua ação de divórcio, na qual estava prevista a transferência da propriedade, por doação, para sua filha menor, desde data anterior à decretação da desconsideração da personalidade jurídica. Afirma ser o único bem que possui, sendo impenhorável por ser bem de família.
A decisão de fls. 186/187 declarou ineficaz a doação do imóvel realizada pelo agravado para sua filha, perante o exequente e, ainda, determinou o registro da penhora da parte cabente à executada (50%), tendo em vista a desconsideração da personalidade jurídica e a intimação dos demais proprietários constantes do registro.
Insurge-se o agravante contra tal decisão.
Em suas razões, o agravante afirma que o artigo 1046 do CPC/2015 estabelece sua vigência para os processos pendentes, o que é seu caso.
Afirma que afastar o artigo 792 do CPC/2015 para este caso fere o direito do agravante, pois quando da doação não havia qualquer averbação na matrícula do imóvel e o agravante não havia sido citado.
Requer a aplicação da Lei 13097/15 para afastar a anulação da doação.
Afirma que não tem outros imóveis, de forma que o bem doado se apresenta como bem de família.
Requer a reforma da decisão. É a síntese do necessário.
De início, cumpre assinalar o cabimento do recurso, ante o permissivo do artigo 1015, parágrafo único do Código de Processo Civil de 2015.
Dispõe o artigo 1046 do CPC/2015 que:
“Ao entrar em vigor este Código, suas disposições se aplicarão desde logo aos processos pendentes, ficando revogada a Lei nº 5.869 de 11 de janeiro de 1973”. Em complemento, o artigo 14 do mesmo Código afirma que:
“A norma processual não retroagirá e será aplicável imediatamente aos processos em curso, respeitados os atos processuais praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada.”
Cediço que a teoria do isolamento dos atos processuais preceitua a preservação dos atos praticados antes da vigência de nova norma processual.
Em outro dizer, a lei nova não alcança os efeitos produzidos em atos já realizados por força da garantia constitucional do ato jurídico perfeito (artigo 5º, inciso XXXVI da Constituição da República) anote-se que a doutrina entende ser possível falar-se em ato jurídico processual perfeito.
Por conseguinte, em termos gerais, os atos já realizados ou consumados não são atingidos pela lei nova.
Daí porque as regras do CPC/1973 não são automaticamente afastadas no julgamento do recurso.
Porém, acertou o i. Magistrado ao proferir a decisão recorrida (fls. 186/187 autos originais), pois que os fatos se deram sob e égide da antiga norma (fls. 157/162), em maio de 2015 ( partilha, homologação, trânsito em julgado e doação).
Nesse passo, a teor do artigo 14 copiado acima, não incide mesmo o artigo 792 do CPC/2015, mas sim o seu correspondente do revogado CPC/1973, o artigo 593, pois a situação jurídica impugnada já estava consolidada no tempo.
Dispunha o art. 593, inciso II do Código de Processo Civil/1973:
“Art. 593. Considera-se em fraude de execução a alienação ou oneração de bens: (...)
II quando, ao tempo da alienação ou oneração, corria contra o devedor demanda capaz de reduzi-lo à insolvência”
Embora não se olvide que a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça tenha firmado entendimento de que o reconhecimento da fraude de execução depende do registro da penhora do bem alienado ou da prova de má-fé do terceiro adquirente (Súmula 375 daquele Tribunal), no caso em análise, o conluio existente entre as partes para fraudar a execução se mostra evidente, considerando as datas da citação e da doação e,
principalmente, o fato de se tratar de transferência a título gratuito, feita à filha do devedor, ora agravante.
O fato de que havia, na época da doação, sentença de homologação da partilha de bens do agravante não elide a fraude, visto que ele estava ciente de que a questão estava pendente de apreciação.
A alegação do agravante de que, se houvesse retorno ao estado anterior, seria reconhecido ao imóvel o status de bem de família, não prospera.
Isso porque, analisando os documentos apresentados nos autos originais (fls. 105/106; 112/113; 118/119; 125/126; 131/133), o agravante possui outros bens imóveis.
Acerca da aplicação da Lei 13097/15, tem-se que, no artigo 54, há disposição no sentido de que é importante registrar situações que possam interferir na titularidade do imóvel objeto do registro, como, por exemplo, a citação de ações reais ou ações pessoais reipersecutórias, a constrição judicial, a execução e a fase de cumprimento de sentença, bem como outros atos que possam reduzir o proprietário à insolvência em razão da responsabilidade patrimonial.
Isso para dar efetividade ao princípio da publicidade, possibilitando às instituições de Registros Públicos eliminar os riscos referentes à alienação, conferindo segurança jurídica ao sistema imobiliário, especificamente no que tange à constituição, transferência ou modificação de direitos reais incidentes sobre o imóvel.
Portanto, a questão levantada pelo agravante não tem pertinência, pois não se trata, aqui de nenhuma dessas hipóteses.
Destarte, agiu com acerto o i. Magistrado ao reconhecer que a doação do imóvel à filha consistiu em fraude de execução, razão pela qual deve ser considerada ineficaz com relação à agravada, nos termos da decisão recorrida.
Ante o exposto, NEGA-SE PROVIMENTO ao recurso. (TJSP, Agravo de Instrumento nº 2149025-97.2016.8.26.0000. Relator: Achile Alesina).
1. O quê é o "princípio da publicidade" e qual sua função jurídica?
2. Qual espécie de doação praticou o Apelante nas considerações do Relator? 3. Qual a definição jurídica de Doação?
4. A Doação é uma norma de direito objetivo ou direito subjetivo?
Identifique um comportamento de direito subjetivo praticado pela Apelante e que conste no Agravo. Direito Objetivo e Direito Subjetivo
"Direito objetivo é o conjunto de normas impostas pelo Estado, de caráter geral, a cuja inobservância os indivíduos podem ser compelidos mediante coerção. Esse conjunto de regras jurídicas comportamentais (norma agendi) gera para os indivíduos a faculdade de satisfazer determinadas pretensões e de praticar os atos destinados a alcançar tais objetivos (facultas agendi). Encarado sob esse aspecto, denomina-se direito subjetivo, que nada mais é do que a faculdade individual de agir de acordo com o direito objetivo, de invocar a sua proteção.
Silvio Rodrigues, com precisão, esclarece: “O fenômeno jurídico, embora seja um só, pode ser encarado sob mais de um ângulo. Vendo-o como um conjunto de normas que a todos se dirige e a todos vincula, temos o direito objetivo. É a norma da ação humana, isto é, a norma agendi. Se, entretanto, o observador encara o fenômeno através da prerrogativa que para o indivíduo decorre da norma, tem-se o direito subjetivo. Trata-se da faculdade conferida ao indivíduo de invocar a norma em seu favor, ou seja, da faculdade de agir sob a sombra da regra, isto é, a facultas agendi”.
Direito subjetivo é “o poder que a ordem jurídica confere a alguém de agir e de exigir de outrem determinado comportamento”. É, portanto, o meio de satisfazer interesses humanos e deriva do direito objetivo, nascendo com ele. Se o direito objetivo é modificado, altera-se o direito subjetivo. Podemos dizer que há referência ao direito objetivo quando se diz, por exemplo, que “o direito impõe a todos o respeito à propriedade”; e que é feita alusão ao direito subjetivo quando se proclama que “o proprietário tem o direito de repelir a agressão à coisa que lhe pertence”." (GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro: Parte Geral. São Paulo: Saraiva, 2012, 10 ed., p 25)