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OS HINOS DAS ESTELAS FUNERÁRIAS DE SUTI E HOR NO CONTEXTO DO CULTO SOLAR EGÍPCIO DA XVIIIª DINASTIA

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OS HINOS DAS ESTELAS FUNERÁRIAS DE SUTI E HOR NO CONTEXTO DO CULTO SOLAR EGÍPCIO DA XVIIIª DINASTIA

Regina Coeli Pinheiro da Silva1

O CULTO SOLAR

Na mitologia egípcia, o culto ao sol destaca-se em relação aos dos demais deuses e chega ao seu ápice durante o Antigo Império (2575 a 2134 a.C.2). Seu simbolismo se relaciona ao movimento cíclico do seu ritmo diário.

Durante o Novo Império, quando a capital do Egito Antigo era Tebas, a principal divindade de culto em Karnak e em Luxor era Amon-Re, fruto de uma junção entre os deuses Re de Heliópolis e Amon de Tebas3. Efetiva-se assim uma identificação que já teria se iniciado desde o Médio Império, com Amon-Re reconhecido pelos egípcios como um deus universal e com poderes de criação. Seu culto passa a adquirir cada vez maior força e influência como deus estatal, chegando à situação de concorrer com o poder real.

Durante o reinado do faraó Amenhotep III (c.1380 a.C.4), período que antecede à reforma amarniana, o culto a Amon Re passa a desenvolver uma crença em que este deus vem a se orientar para a característica solar. Amon Re passa então a ser celebrado sob esse aspecto, uma mudança que não reflete mais aquelas características presentes no Grande Hino a Amon. Uma prova arqueológica dessa afirmativa é encontrada na estela objeto de nosso estudo, pertencente aos arquitetos do reinado de Amenhotep III, Suti e Hor (Ermann:1952:135-136), atualmente no Museu Britânico (nº 826). Nela, Amon aparece

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Arqueóloga IPHAN e Mestre pelo Museu Nacional/UFRJ( regcoeli@yahoo.com) 2

Cronologia elaborada pelo Prof. Dr. Antônio Brancaglion Jr, tendo por base Baines, J. e Malek, 2000. 3

Possivelmente por união de interesses desses dois cleros. 4

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equiparado a uma listagem dos nomes múltiplos do sol tais como Harakhti, Re, Khépri, e Aton, assemelhando-se muito à idéia de primazia do sol como deus criador e mantenedor da vida.

Quanto ao deus solar Aton (ítn – o disco solar), este teve como principal local de adoração a cidade de Akhetaton, localizada na atual vila de El-Amarna. Adotado por Akhenaton durante o período de seu reinado, antecede, entretanto, à reforma empreendida por esse faraó e assume grandes poderes quase se tornando uma deidade universal e exclusiva durante seu reinado.

Uma primitiva e talvez mais antiga iconografia de Aton como deus aparece em uma estela em Gizé, como um disco solar alado, com braços estendidos que seguravam em suas mãos um cartucho com o nome do faraó.

Existem referências a Aton desde o Médio Império, na passagem do “Conto de Sinuhe” (Papiro de Berlim 10499-B), onde pode ser lido:

(...) quando o rei foi para o céu, unindo-se ao disco solar/Aton, o corpo do deus se uniu àquele que o criou.

Nesse texto Aton aparece com o determinativo de deus5 ( ).Quando usado nos textos religiosos dos Caixões, Aton refere-se somente ao disco solar.

O CRESCIEMNTO GRADUAL DA IMPORTÂNCIA GRADUAL DE ATON DURANTE A XVIIIª DINASTIA

Posta sob confronto com as teologias anteriores, a atoniana trouxe em seu cerne uma relação com a teologia de Heliópolis, com a diferença que, nesse novo culto, o deus age sem a intervenção de outras divindades. Se Amon era o deus Oculto, Aton era o deus

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manifestado, revelado. HART vê uma relação entre Aton e o culto solar de Heliópolis, esta reforçada no fato do nome do local construído para culto atoniano em Karnak ter recebido o nome de

Casa do Benben, simbolizando o monte primordial no qual o deu-sol se elevou do Nun, o criador do universo. Benben era o nome do santuário em Heliópolis, cujo determinativo hieroglífico era um obelisco - outro empréstimo do culto heliopolitano - possivelmente indicando que um obelisco se situava ali a leste de Karnak (HART: 1998, 40).

No início do Novo Império e consequentemente da XVIIIª Dinastia, Aton, o disco solar, era compreendido como uma das três fases do percurso do sol no céu. O faraó Ahmose é referido em uma estela como sendo relacionado a Aton quando brilha, e seu sucessor, Amenhotep I, quando de sua morte, torna-se unido com Aton, juntando-se àquele do qual veio.6

A rainha Hatshepsut usou seu símbolo no lado sul de um dos seus obeliscos no Templo de Karnak significando entretanto o conceito astronômico do disco (Hart:1998, 37), ou seja, o disco do sol - mas não o deus sol. Entretanto, existe uma inscrição datada de cerca de 1500a.C. (Hart:1998, 38), achada na Núbia, em que a palavra Aton ocorre seguida do símbolo de deus, na forma de uma deidade ostentando um disco solar na sua cabeça.

Seguindo a sequência de registros da representação de Aton, esta obtém maior destaque a partir da XVIIIª Dinastia, sendo então identificado como uma deidade solar somente no reinado de Tuthmés IV. Este faraó manda fazer um escaravelho comemorativo no qual Aton aparece protegendo-o como um deus associado à guerra, num contexto que coloca esse deus na vanguarda do exercício do faraó em batalha (Hart:1998, 38 e Wilkinson: 2003, 236) – um lugar geralmente dado a Amon.

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Seu sucessor Amenhotep III mandou construir um templo para Aton fora dos muros do perímetro leste do templo de Karnak, cujo espaço era dedicado ao deus Amon. Essa estrutura se chamava Per Aton, que significa A Casa de Aton (Ermann, 1952: 138-143). Aton adquire então cada vez mais prestígio com Amenhotep III, tendo entretanto seu apogeu somente durante o reinado de Amenhotep IV (que posteriormente assume o nome de Akhenaton). Este faraó apresenta-nos um Aton doador de vida, deus único, sem igual, que tomaria o lugar de Amon-Ra com exclusividade.

Com o reinado do faraó Amenhotep III, Aton começa a assumir uma posição mais importante, sendo que já existiam evidências de um culto a esse deus, indicando que estava estabelecido em Heliópolis, onde contava com um corpo de sacerdotes e um templo. Em decorrência deste fato, muitos dos oficiais desse faraó usaram títulos ligados a Aton, como Administrador da Grande Casa de Aton.

Amenhotep III estimulou extraordinariamente o culto solar a Aton, fato demonstrado dentre outros exemplos, em um dos seus epítetos Tjekhen - Aton ou “Radiância de Aton”, um termo que também foi usado em vários outros contextos durante seu reinado.

Ele constrói o palácio em Malkata, complexo arquitetônico que se localizava no lado oeste de Tebas; chamava-se “A casa de Nebmaatre é o esplendor de Aton”. Nele existia o Per Hay, ou Casa do Júbilo, referência esta que também será encontrada, em parte do Grande Templo de Aton amarniano. Essa extraordinária construção pode significar uma primeira tentativa de isolamento por parte do rei e de seu corpo administrativo, com relação ao sacerdócio de Amon, que exercia então grande influência nos assuntos políticos daquela época. Nesse sentido, a construção da cidade de Akhetaton por parte Amenhotep IV, pode significar uma conclusão ou aperfeiçoamento dessa estratégia isoladora.

Destaca-se também a presença do nome do deus em Baketaton, filha mais nova de Amenhotep III com a esposa real Tiye. Também seu barco era chamado Aton Brilha.

Entretanto, Amenhotep III não negligenciou os cultos dos outros deuses e não existem indícios de que tenha considerado Aton como uma deidade especial, destacada do

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panteão egípcio. Registros arqueológicos demonstram esse expressivo estímulo ao deus, mas esse monarca foi um governante que poderíamos chamar de tradicional, respeitoso a Amon-Re. Só, não podemos negar que, aos poucos, Aton passa a ocupar um espaço maior no repertório religioso da XVIIIª dinastia, até chegar ao seu ápice no reinado de Akhenaton.

Na parte inicial do seu reinado, no período conhecido como pré-amarniano, Akhenaton construiu no Templo de Karnak - dedicado ao deus Amon - um novo espaço para culto a Aton. Trata-se de um momento de transição, quando ainda pensava ser possível fazer Tebas abrir mão de seu tradicional deus Amon em favor de Aton.

Interessante destacar que na pedreira de onde se retirava matéria prima para as construções no Templo de Karnak, Amenhotep IV/Akhenaton é mostrado em adoração a Amon-Re, mas com uma inscrição em que se auto-refere como O primeiro profeta de Re-Harakhte em júbilo no Horizonte em seu nome A Luz que é Aton. Este título já aponta para o futuro reformador, intermediando as antigas idéias de Heliópolis e as novas criadas para o culto a Aton.

AS ESTELAS FUNERÁRIAS DE SUTI E HOR – DESCRIÇÃO E

CARACTERÍSTICAS DAS PEÇAS

Já nos referimos às duas estelas pertencentes aos irmãos gêmeos Suti e Hor, arquitetos e supervisores do templo de Amon em Tebas. Datam de c.1390 a 1352 a.C., período que compreende o reinado do faraó Amenhotep III. São originárias de Tebas, sendo que uma se encontra quase que totalmente destruída. Supõe-se que essas duas estelas ficavam na entrada da tumba, uma de cada lado. São estelas de cume arredondado, esculpido no quadro retangular da porta.

Possuem as seguintes dimensões:

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Largura: 90 cm.

Espessura: 29 cm.

Matéria prima: granito cinza

Por seu bom estado de conservação, podemos ver que a moldura da estela do Museu Britânico apresenta invocações para oferendas funerárias, e a sua área central mostra os dois irmão fazendo oferendas a Osiris e a Anubis

Composta por vinte e uma linhas de hino ao deus sol, suas inscrições estão gravadas ao longo e figuras esculpidas em relevo. No lintel da porta são três linhas horizontais de leitura de texto a partir do centro para fora. No lado direito e no direito existem três linhas de texto vertical.

À direita e à esquerda do topo do arco da estela, no ângulo formado pela moldura da porta, estão os olhos "wedjat'. No arco da estela há um disco alado.

A estela inclui dois registros:

1º - está dividido em duas cenas simétricas:

a - Anubis à direita,mostrado com cabeça de chacal, vestindo uma saia curta e segurando um cetro na mão esquerda e "ankh" no canto direito, é adorado por Hor e uma mulher (ambos de quase totalmente apagados). Acima de Anúbis, há duas colunas de texto vertical. Acima de Hor e a mulher, estão quatro colunas verticais de texto.

b – Osiris à esquerda, mostrado em forma de múmia, usando uma coroa, barba, colar, segurando um cetro na mão; é adorado por Suty e uma mulher (também apagados). Logo acima Suty e da mulher, estão quatro colunas verticais de texto. Sobre Osíris estão duas colunas de texto vertical.

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2º - uma inscrição em 21 linhas horizontais. Essa estela está bem preservada, mas existem pequenas escoriações. O nome do Suty no painel do lado esquerdo da porta e todas as figuras com as suas inscrições de acompanhamento (com exceção das dos deuses), foram apagadas na antiguidade.

OS TEXTOS 7

HINO nº 1 DA ESTELA DE SUTY E HOR (da linha 1 ao meio da linha 8) "(...) hail to you, beaultiful Re

When you are moved to rise at dawn, your brightness opens the eyes of catthe;

and when you set in Manu, then they sleep in the fashion of death“

“(...) Saudação para você, formoso Re Quando se move para surgir no amanhecer,

seu brilho abre os olhos do rebanho; e quando você se põe na colina ocidental, então eles dormem como se estivessem mortos “

HINO nº 2 DA ESTELA DE SUTY E HOR (do meio da linha 8 até a linha 14) “Hail to you Aten of the daytime,

Who was created all and made them live (...)”

“Saudação a você Aton do dia, Que criou tudo e os fez vivos (...)”

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As linhas restantes consistem de depoimentos pessoais e súplicas dos dois irmãos

CONCLUSÕES

Os textos da estela de Suti e Hor avançam no conceito da unicidade de uma deidade egípcia, apresentando o domínio da teologia solar, numa concepção universalista do culto ao sol. A vida está relacionada à presença do astro solar. O segundo texto da estela é dedicado a Aton;

Testemunham a inclusão, entre as manifestações do deus-sol, do disco solar/Aton, visto como uma deidade distinta já durante o reinado de Amenhotep III.

Esse hino ao deus sol destaca o disco solar como um legítimo deus e o descreve como o único criador de tudo e doador e mantenedor de vida, concepção essa também adotada por Akhenaton.

Assim Aton, em destaque nesse hino, convive com outros deuses (Amon, Horus, Nut, Khnum, Khepri). Quanto a Amon, este aparece equiparado a uma listagem de múltiplos nomes do sol, tais como Harakhti, Re, Khépri, e Aton, compondo a idéia já referida de primazia do sol.

Os dois hinos da estela de Suti e Hor do Museu Britânico apresentam de, modo antecipado, idéias contidas no Hino a Aton, composto no reinado seguinte (Akhenaton).

A composição da estela mostra a transição do culto tradicionalista a Amon para o atoniano, base da reforma político-religiosa do faraó Akhenaton.

É nosso entendimento que a reforma amarniana, não deve ser vista como um episódio único, sem antecedentes, mas sim como a conclusão de um processo que já vinha se firmando desde faraós antecessores, sendo Amenhotep III o responsável por um maior implemento ao culto ao deus Aton, mais tarde reforçado por Akhenaton.

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Destaca-se o fato do Hino a Aton da reforma amarniana manter elementos comuns com a estela de Suty e Hor, levando a idéia de continuidade na concepção da reforma amarniana.

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS

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REFERÊNCIAS ELETRÔNICAS

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