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RELATÓRIO FINAL. Aula de música na escola e o canto na sala de aula

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Aula de música na escola e o canto na sala de aula

Teresa Mateiro

1

Tâmara Shizuka Alves Okada

2

Marisleusa de Souza Egg

3

Palavras-chave: canto; aula de música; formação do professor.

Resumo: Este trabalho investigou que atividades estavam sendo trabalhadas na aula de

música de uma turma do 6º ano de uma escola pública da cidade de Curitiba.

Verificou-se

que o canto foi uma prática presente em todos os momentos e auxiliou a compreensão e

aprendizagem de conceitos básicos de teoria musical, além de facilitar a assimilação das

melodias a serem tocadas na flauta doce. Constatou-se que por necessitar de

conhecimento e cuidados básicos, é imprescindível que o professor de música, durante

sua formação, seja capacitado para poder trabalhar com a voz infantil.

Introdução

Há muito tempo, o ensino de música no currículo escolar vem sendo debatido e,

após a implementação da Lei nº 11.769, de 18 agosto de 2008, que alterou a Lei de

Diretrizes e Bases da Educação nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, em que o conteúdo

de música na educação básica tornou-se obrigatório, vários profissionais tem se

interessado sobre o tema e diversos estudos tem sido realizados com a finalidade de

entender como se daria este processo na rede pública de ensino. Acompanhando este

panorama tão importante na história da Educação Musical no nosso país, o presente

trabalho buscou investigar a aula de música, observando e analisando as atividades que

são propostas e desenvolvidas em sala de aula. Outros estudos paralelos a este estão

sendo realizados, como parte de uma pesquisa mais ampla, sobre as aulas de música no

currículo escolar.

Diversos trabalhos da área de educação musical têm mostrado que o canto é um

recurso presente não só nas aulas de música, mas em várias práticas e situações presentes

na escola (SOUZA et al., 2002; FUCKS, 1993; FUCCI-AMATO, 2012). De acordo com

Fernandes (2009, p.31 e 32), documentos que registram a presença da música nas escolas

do Brasil durante o século XIX apontam que o canto era papel primordial na escola, pois

1 Orientadora, Professora do Departamento de Música do CEART – teresa.mateiro@udesc.br. 2 Acadêmica do Curso de Música – CEART-UDESC, bolsista de iniciação científica

PROBIC/UDESC.

3 Professora da Educação Básica, participante voluntária do Grupo de Pesquisa Educação Musical

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2

era através do canto conjunto que, na prática, a música mostrava-se importante como

disciplina. A autora aponta ainda, que neste período a prevalência da música europeia no

país era também observada nas escolas e que, com o surgimento do movimento

nacionalista ela passou, gradativamente, a ser substituída por músicas patrióticas e que o

canto foi uma forte ferramenta para tal mudança, mesmo não sendo trabalhado com os

cuidados específicos.

Cáricol (2012) traz que, em 18 de abril 1931, o então presidente Getúlio Vargas

assinou o Decreto Federal nº 19.890 que aprovava o projeto de educação musical de

Villa-Lobos. O projeto utilizava o canto coletivo como forte ferramenta educacional

devido ao fato deste trazer consigo a capacidade de integrar e socializar a comunidade,

além de ter grande papel na formação moral e cívica da infância brasileira.

Souza (1991) descreve que Villa-Lobos, ao observar a utilidade do canto coletivo

na escola com os objetivos nacionalistas, viu uma forma de resolver o problema da

identidade do povo com a pátria. Isso porque o repertório trabalhado trazia canções que

cultuavam a pátria, a figura do presidente e exaltavam à nação brasileira. Desta forma,

conforme a autora, o canto tinha um caráter funcional, pois tinha a proposta oficial de

uma educação moral e cívica clara, tanto que as canções trabalhadas neste período tinham

como principal objetivo exaltar o sentimento nacionalista e promover a aprovação das

decisões políticas do governo. Segundo Cáricol (2012, p.23), oficialmente no ensino

público brasileiro, o projeto foi adotado durante as décadas de 1930, 1940 e 1950 em todo

o território nacional e foi posteriormente substituído pela disciplina educação musical,

por meio da Lei de Diretrizes e Bases da Educação nº 4.024, de 1961.

A pesquisa de Tourinho (1993) discute as várias funções e múltiplas

interpretações que podem ser dadas ao ensino da música na escola fundamental e aponta

que o canto é a atividade mais reconhecida e valorizada entre as demais atividades de

execução realizadas nas salas de aula. As professoras participantes do trabalho de Souza

et al.

(2002) mencionaram que o canto, a execução instrumental, a confecção de

instrumentos, a audição/apreciação e a composição poderiam ser atividades

desenvolvidas pela educação musical escolar. No entanto, mais uma vez, a ênfase foi

dada às atividades de execução vocal.

Houve um momento na história da educação musical em que “as aulas de música

deixariam, aos poucos, de ser cantadas” (FUCKS, 1993, p.146), em consequência tanto

da contestação ao canto orfeônico quanto do movimento das novas propostas pedagógicas

voltadas para a educação artística. Gradativamente a música foi perdendo o seu espaço na

sala de aula, mas, de uma forma ou de outra, continuou presente no cotidiano escolar

(SOUZA, et al., 2002), tanto que, de acordo com Fucks (1993, p.148) “apesar do

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3

professor de música haver silenciado a sua prática cantada, a escola continua a priorizar o

seu canto”.

Levando em conta o apanhado histórico e o destaque do canto como recurso

pedagógico nas atividades das aulas de música da turma analisada, este estudo teve como

questão de pesquisa: de que forma a atividade do canto se desenvolveu nas aulas de

música observadas?

O professor e o ensino do canto na educação básica

Barboza (2008) descreve que cantar é um desejo demonstrado espontaneamente

pelas crianças e, por conta disso, é um recurso pedagógico privilegiado para a

musicalização. Schmeling (2005) aponta que a prática do canto é vivenciada com

frequência, em diversas ocasiões, possibiltando inúmeras abordagens. O canto, conforme

Ilari (2003), está presente nas atividades de musicalização infantil no mundo todo e

afirma que o período escolar é a época em que esta prática deve ser bastante estimulada e

desenvolvida. De acordo com a pesquisadora, o ato de cantar, independentemente se é de

forma espontânea ou direcionada, pode estimular os sistemas vitais para o

desenvolvimento cognitivo infantil, sendo estes os sistemas da linguagem, da memória e

da ordenação sequencial.

Ainda relacionado aos benefícios cognitivos, Ferreira (2007) expõe sobre o

desempenho e domínio da voz na emissão sonora, no que diz respeito ao seu uso correto,

saudável, estético e musical, seja na voz falada ou cantada, envolvendo aspectos técnicos,

expressivos e cognitivos. A autora investigou os aspectos indicativos da influência da

performance vocal no desenvolvimento das funções cognitivas e comunicativas da

linguagem oral da criança, apontando a importância da escolha do repertório e sua

prática, pois existem condições de performance vocal que podem colaborar ou influenciar

no desenvolvimento da linguagem. Ao confirmar essa hipótese, Ferreira insere o canto

no mesmo patamar de significância da fala para a educação infantil.

Tourinho (2003) coloca que, apesar de ser muito utilizado no espaço escolar, o

canto na sala de aula não tem sido concebido como meio para ampla percepção e

apreensão dos conceitos musicais, e não tem sido reconhecido como uma ferramenta que

pode ser utilizada para fins variados e contrastantes, sendo pouco utilizado em cenário de

ensino e aprendizagem. Já Fucks (1993) diz que os aspectos musicais e extramusicais são

indissociáveis no canto escolar.

Conforme Tourinho (2003), a maneira como o canto é explanado em sala de aula

pode ser justificado conforme a formação oferecida aos professores. Embasando tal

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4

argumento, Figueiredo (2004) atenta que são indispensáveis conhecimentos mínimos para

que se desenvolvam atividades com canto em sala de aula e frisa que o acesso limitado

dos professores generalistas e a pouca importância dada ao canto nos cursos de

Licenciatura em Música, estimulam a falta de habilidade destes profissionais, por

priorizarem mais a prática de canto coral ou o estudo de algum instrumento.

Para Specht (2007), o fato do professor cantar menos na escola está diretamente

relacionado ao seu despreparo vocal, que além de não ter experiência com canto na escola

também não teve acesso a informações e não adquiriu conhecimento sobre esta prática

durante sua formação pedagógica. Para a autora, o professor necessita dispor de

informações técnicas fundamentais para entender como a voz funciona. Ao compreender

seu aparelho fonador e a fisiologia da voz, ele irá adquirir novas possibilidades em sua

emissão vocal pelo simples fato de que conhecendo a voz e sabendo como trabalhar com

ela, o professor poderá explorar as mais diversas atividades com a voz cantada durante

suas aulas. É essencial ter conhecimento para estimular um cantar saudável, seguro,

criativo e com qualidade.

Afirmando que o professor age como modelo vocal em diversos momentos no

espaço escolar, Egg (2011) expõe a necessidade de formação do professor no que diz

respeito à utilização do canto e seu desenvolvimento na sala de aula. Ressalta a

importância de o professor conhecer os princípios sobre a formação da voz infantil,

principalmente pelo fato deste ser um modelo vocal a ser seguido e de que a criança,

naturalmente, tem a característica de imitar o que ouve. A autora coloca que o canto é a

forma mais ampla para o alcance do desenvolvimento musical, devido ao fato de ser uma

expressão musical acessível, que trabalha habilidades vocais gerais na criança, auxilia no

desenvolvimento da voz falada e contribui para o treinamento da memória, concentração

e autocontrole, além de contribuir para na formação musical e a fixação de conteúdos.

Metodologia

Este estudo procurou observar e analisar como o cantar foi abordado nas aulas de

música curriculares de uma escola pública. A instituição escolhida foi selecionada através

da Secretaria Municipal de Educação, de acordo com os critérios expostos no projeto de

pesquisa enviado: escola que ofereça aulas de música, como disciplina curricular, para

séries do ensino fundamental ministradas por um(a) professor(a) especialista.

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5

Eram requisitos do estudo em questão

4

que fossem preferencialmente turmas

entre o 4º e o 6º ano, bem como levar em conta a disponibilidade de horário das

pesquisadoras, exigência atendida tanto pelas duas turmas selecionadas, como pelas

outras sugeridas pela professora de música da escola. Para o presente trabalho, foram

analisadas as aulas de uma das turmas: um 6º ano, com 29 alunos, com idade média entre

11 e 13 anos.

A coleta de dados ocorreu após os contatos estabelecidos com a escola e a professora

via telefone e correio eletrônico e foi executada em duas fases: visita à escola e

observação das aulas. Consideramos importante a visita à escola para conhecermos tanto

o ambiente e a infraestrutura como o corpo docente, discente, a direção e os funcionários.

A postura assumida pelo pesquisador durante as observações foi o de observador

participante (LÜDKE; ANDRÉ, 1986), pois registrou os eventos sem influenciar o meio,

não interagindo nem com os alunos e nem com a professora. FLICK, (2004) e

TRIVIÑOS, (1994) denominam tal técnica como observação não participante, pelo fato

de o observador ser um agente passivo que não intervém nos acontecimentos, o que torna

esta uma observação natural. A utilização das técnicas de observação foi muito

importante para o trabalho, pois foi possível captar a realidade da sala de aula.

As aulas foram observadas e gravadas em vídeo continuamente por cinco

semanas, sendo que cada uma delas tinha duração de 45 minutos. As gravações em vídeo

foram transcritas seguindo o sistema de minutagem, organizando a sequência dos

acontecimentos em ordem cronológica. As transcrições, feitas de forma não-literal e de

forma extremamente imparcial e cuidadosa, não receberam comentários particulares e

trazem, exclusivamente, os acontecimentos ocorridos nas aulas. Após isto, os arquivos

foram revisados por duas pessoas diferentes, pertencentes ao grupo de pesquisa

5

. As

etapas de transcrição e revisão foram fundamentadas, sobretudo, em Loizos (2004) e

Rose (2004).

Seguindo as fases do processo de análise propostas por Maroy (1997),

inicialmente se fez a redução de todo o material bruto para, em seguida, ser feita a

organização e sua interpretação para assim, fazer a verificação. Utilizando as palavras de

Gaskell (2004, p.85): “o objetivo amplo da análise é procurar sentidos e compreensão. O

que é realmente falado constitui os dados, mas a análise deve ir além da aceitação deste

valor aparente. A procura é por temas com conteúdo comum e pelas funções destes

temas”. Confirmou-se claramente esta afirmação ao verificar a necessidade de ler e reler

4

Aulas de música de outras escolas em cidades diferentes fazem parte da pesquisa mencionada anteriormente e, por isso, as turmas participantes são entre 4º e 6º anos.

5 Educação Musical e Formação Docente: o grupo integra o Diretório dos Grupos de Pesquisa no

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6

os dados, o que possibilitou amplo conhecimento acerca do material coletado e permitiu

não só a reflexão, mas também o retorno aos objetivos principais e iniciais da pesquisa

quando necessário.

Sendo a aula de música o principal tema do trabalho, os dados foram dispostos

nas seguintes categorias: repertório, conteúdo, flauta doce, canto, aspectos técnicos e

musicais, professora e alunos. Neste trabalho, especificamente, apresentaremos e iremos

discutir os resultados relacionados à categoria canto, sendo incluídos nesta categoria

todos os trechos transcritos das cinco aulas observadas em que os relatos descrevem o

momento em que a execução vocal está sendo desenvolvida, ou seja, quando professora

ensina alguma canção ou quando está dando algum exemplo musical por meio da voz

cantada ou ainda, quando os alunos cantam.

Apresentação e discussão dos dados

Analisando as gravações em vídeo, despertou nossa atenção o modo como a

professora desenvolvia o trabalho na sala de aula baseando-se no livro Canto e flauta

doce

, de autoria de Walmir Marcelino Teixeira (TEIXEIRA, 2008)

6

. Mesmo não sendo a

principal atividade a ser desenvolvida na aula, que tinha o foco no ensino de flauta doce,

o canto estava presente em todas as aulas observadas. A professora sempre cantava

quando ia exemplificar algum conceito musical ou destacar a melodia praticada na flauta.

Tourinho (1993) ressalta que ensinar música por meio da voz é um artifício pouco

utilizado pelos professores. Durante as cinco aulas observadas, algumas vezes a

professora utilizou o canto explorando aspectos musicais. Em uma das aulas, cantou a

escala de Dó Maior, explicando este assunto para os alunos. A professora buscou diversas

maneiras de expor o conteúdo para os alunos, visando sempre um melhor aprendizado.

Isto pode ser comprovado num dos trechos da entrevista, onde ela cita que “tem coisas

que a gente trabalha, por exemplo, os elementos da música que eu falo o ano inteirinho,

altura, duração, intensidade, timbre e vou fazendo atividades que se relacionam com isto.

A própria flauta, às vezes quando eu ensino uma música daí eu mostro a intensidade, né?

Um só toca, todos tocam. Volume, então vou usando o que eles estão fazendo na aula e

isto eles gostam muito. Na mesma aula ela deu exemplos de sons graves e agudos

cantando uma escala ascendente e descendente, iniciando na nota Sol 2 e terminando no

Sol 3, completando uma oitava. A tonalidade de Sol Maior pareceu ser a adotada pela

professora para os exemplos vocais.

6

Esse livro se deve a uma iniciativa do governo do estado do Paranáem estabelecer um programa de aula de música em torno do instrumento e do canto.

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7

Ao trabalhar sons e escalas, a professora usa da criatividade para estimular o

interesse e a aprendizagem dos alunos, como pode ser atestado no seguinte trecho da

entrevista: “eles fazem uma dobradura de teclado pra saber onde é o dó, onde é o ré. E aí

logo vem a pergunta, pra quê é a tecla preta, né? Daí logo falo de tom, semitom e que

entre o dó e o ré tem uma notinha, então acabo fazendo assim, prá eles não serem leigos.”

As canções utilizadas durante as aulas são de repertório variado, incluindo

músicas populares brasileiras e do cancioneiro infantil. Os temas trabalhados, foram:

Minha Canção

(L. Enriquez – tradução e adaptação de Chico Buarque), Canto do povo de

um lugar

(Caetano Veloso), Orquestra (Anônimo), As mocinhas da cidade (Belarmino e

Gabriela), Pão quentinho e Bamba-lalão (Folclore). A música Minha Canção foi cantada

pela professora enquanto os alunos tocavam a melodia na flauta doce. Por não se sentir

confortável com a tonalidade da flauta, durante a execução da música, a professora

passou a cantar uma oitava abaixo (Dó 3 para a melodia da flauta e Dó 2 transposta pela

professora). Por vezes, o canto foi utilizado para recordar a melodia de uma música, como

o que aconteceu na aula em que a professora e os alunos cantaram a canção de Caetano

Veloso antes de tocar no instrumento.

As melodias são tocadas pelos alunos de memória, sem o auxílio da partitura.

Assim, as canções são, inicialmente, ensinadas pela professora por meio do canto. Os

alunos memorizam as canções para, em seguida, tocar na flauta doce. Às vezes, a

professora utiliza outros procedimentos metodológicos, como escrever por extenso as

notas no quadro (sol-lá-si-dó) e reforçar a aprendizagem do ritmo a partir da melodia

cantada. A professora, durante a entrevista comentou que “a criança é... mecaniza um

nome e não a percepção, a sensação rítmica. Então ela me abriu os olhos prá isto, foi bem

legal. Porque, nem a gente tem o controle, por a palavrinha ou não, não vai fazer

diferença, mas a criança que não tem o conhecimento prévio, daí ela não vai sentir, ela vai

decorar : esse é assim”

Percebe-se que o ato de cantar as músicas reforça a memorização e a

aprendizagem, complementando a experiência com o instrumento. Isso evidencia o que foi

apontado por Ilari (2003), que defende que o canto pode ativar os sistemas da linguagem,

da memória e da ordenação sequencial e por Barboza (2008), que afirma que o canto é um

ótimo recurso pedagógico para a musicalização, já que o cantar é uma vontade espontânea

demonstrada pelas crianças.

Outra forma evidenciada de utilização do canto foi que enquanto os alunos

tocavam a flauta, a professora cantava a melodia. Interpretamos esse cantar junto como

uma forma de auxiliar os alunos a não se perderem na execução melódica e rítmica das

canções. Entretanto, a professora, frequentemente, cantava uma oitava abaixo por não se

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8

sentir confortável com a tonalidade original proposta no material didático que,

geralmente, encontra-se entre o Sol 3 e o Ré 4, como se pode observar na Figura 1.

Figura 1: Partitura com a tessitura da flauta doce e com a transposição feita pela

professora

Fonte: autoras

Essa prática de transposição revelou que a tonalidade adotada pela professora

dificultou a execução por parte dos alunos, pois estava em uma região muito grave, não

adequada à tessitura do grupo. Na terceira aula, observou-se outro exemplo: os alunos não

alcançavam algumas notas ao cantarem (por exemplo, Lá 3), apesar de ser uma região

confortável para a voz infantil e, consequentemente, cantavam gritando. Em ambos os

momentos, nos remetemos ao debate sobre a importância do professor conhecer os

princípios acerca da formação da voz infantil (EGG, 2011) e compreender o

funcionamento da mesma (SPECHT, 2007). Por um lado, o exemplo vocal é essencial

para os alunos e, por outro, propor formas para desenvolver a voz infantil são técnicas

didáticas fundamentais para as aulas de música.

Mársico, (1982, p.83) ressalta que “o desenvolvimento da audição e da voz vai

depender dos bons exemplos e modelos que lhes forem propostos, da organização

sequencial das canções, dos exercícios e atividades e de sua sistematização, bem como da

formação de hábitos auditivos”. O aluno precisa aprender a ouvir. Portanto, como as

canções são ensinadas por audição, isto é, por imitação ao modelo apresentado, é

importante que o(a) professor(a), como recurso pedagógico, adapte seu registro vocal ao

do aluno, cantando na tessitura que convém ao grupo, conclui a autora.

Nesse sentido, Specht (2007) afirma que o conhecimento vocal fornece as bases

de um cantar saudável, seguro e com qualidade para o desenvolvimento de atividades

com o canto em sala de aula. Outro ponto de debate é a escolha do repertório. Ferreira

(2007) ao tratar sobre o canto como recurso pedagógico na educação infantil e no ensino

fundamental afirma que “a influência da performance vocal no desenvolvimento oral da

criança [...] através do canto, está diretamente associada à qualidade do repertório,

considerando aspectos técnicos e expressivos” (p.76). Na aula de música analisada neste

trabalho verificou-se a adequação do repertório tanto para sua execução na flauta doce

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9

quanto para cantar, uma vez que a canções foram tocadas entre o Sol 3 e o Ré 4, região

esta considerada confortável para crianças entre 5 a 11 anos de idade.

Estudos sobre extensão e tessitura das crianças apontam várias conclusões e

variam conforme o autor e os objetivos ou o tipo de aula de que se trata. Pensando num

contexto mais específico de aula de música e baseando-se em estudos de autores

norte-americanos, Carnassale (1995) apresenta um quadro de tessituras que variam conforme a

idade e que ficam no âmbito de Ré até Lá, para crianças de 7 anos e de Ré a Ré para a

idade de 11 anos, conforme apresentado na figura 2.

Figura 2: Tessituras indicadas por Carnassale (1995), para criança de 7 e 11 anos.

Carnassale (1995) diferencia “extensão” de “tessitura”, sendo o primeiro termo

usado para as notas que os alunos são capazes de atingir em exercícios vocais e

preferindo “tessitura” como o âmbito de notas que as crianças são capazes de executar

com dicção, ou seja, no contexto de uma canção. Considera também que “a tessitura das

crianças é consideravelmente menor do que sua extensão, tendendo a aumentar com o

treino e a maturação do aparelho fonador” (p.85).

Considerações finais

Este trabalho apresentou e discutiu acerca do canto nas aulas de música.

Buscou-se perceber de que forma a atividade de cantar Buscou-se deBuscou-senvolveu, durante as aulas de

música, na turma do 6º ano de uma escola pública da cidade de Curitiba. Respondendo à

questão de pesquisa é possível afirmar que o canto foi uma prática presente em todos os

momentos da aula, sendo um elemento de grande importância tanto para a professora, que

utilizou a voz cantada para dar exemplos de conceitos musicais, quanto para os alunos, na

aprendizagem de conceitos básicos de teoria musical e assimilação das melodias das

canções que tocavam na flauta doce. Em ambos os casos, cantar foi um recurso

pedagógico.

A utilização do canto e da flauta doce nas aulas observadas justifica-se pela

adoção do livro de Teixeira (2008). Ao apresentar as duas propostas de aprendizagem no

material didático, o autor considerou apropriada a relação da flauta doce com a extensão

vocal do público infanto juvenil. As atividades são apresentadas de forma que se faz

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necessária a intervenção da professora para mediar as práticas cantadas. Nesse sentido,

observou-se que a abordagem adotada ao direcionar o canto nem sempre seguiu o

recomendado no material que a professora tinha em mãos, pois a escolha das tonalidades

dificultou a execução vocal dos alunos por serem tonalidades graves.

Outra questão é a da memória musical ou, mais especificamente, da memória

vocal (de intervalos) que necessita de tempo, experiência e bons exemplos para adquirir

independência. A voz reproduz o que ouve, evidentemente, o aluno canta o que escuta.

Tendo um bom modelo vocal o aluno terá parâmetros para distinguir entre o afinado ou

não, se a tonalidade é a ideal ou não. Estes cuidados e outras informações são adquiridos

inconscientemente durante as atividades cantadas. Com o tempo o aluno adquire

confiança e estará apto a mudar a tonalidade quando esta não estiver no registro ideal para

a sua voz, adquirindo subsídios para brincar, experimentar, criar e inventar.

A partir de uma simples canção bem desenvolvida e explorada na aula de música,

a compreensão de fundamentos básicos como ritmo, tonalidade, fraseado, estrutura e

memória musical podem ser estimuladas. Nas aulas observadas, verificou-se que a

professora trabalhou diversos elementos musicais utilizando a voz cantada como

ferramenta de ensino. Fizeram parte do processo de ensino e aprendizagem os sons graves

e agudos, escalas ascendentes e descendentes, frases rítmicas e a relação entre a melodia e

o nome das notas musicais correspondentes. Musicalmente falando, o canto tem muito a

contribuir se bem explorado em sala de aula.

Os autores referenciados neste trabalho concordam em afirmar que a atividade do

canto em sala de aula é uma prática recorrente. Sendo tão importante na vida da escola, é

estratégico que o professor tenha um bom preparo para trabalhar a voz infantil e juvenil,

planejando as atividades de modo que elas tenham um bom resultado pedagógico. Desse

modo, o canto será mais do que apenas uma ferramenta ou um canto funcional (SOUZA,

1991), contribuindo para o desenvolvimento vocal do aluno.

Observamos que os exemplos vocais utilizados pela professora demonstraram a

necessidade de capacitação específica para se desenvolver um trabalho que lide com a

voz infantil, que deveria partir do desenvolvimento da própria voz como modelo, e que

oferecer cursos de formação continuada seria um incentivo aos professores especialistas

e/ou generalistas. Tal ponto é um tema comum nas escolas, levando-se em conta o fato de

que a formação docente não estimula o estudo da voz infantil e o desenvolvimento da voz

do graduando, seja ele da Licenciatura em Música ou da Pedagogia.

Este micro estudo constata a necessidade de se observar mais aulas de música

confirma a importância deste tipo de trabalho para o desenvolvimento vocal e musical do

aluno, já que o cantar é um fenômeno complexo e corriqueiro nas aulas e que o papel do

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professor é primordial neste processo de aprendizagem. Investir na formação continuada

dos professores da rede pública que trabalham com a voz cantada nas aulas de música é

muito importante, pois amplia as possibilidades do uso da voz e as consequências destes

modelos quanto ao desenvolvimento vocal dos alunos do ensino fundamental.

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Referências

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