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O PREPARO PROFISSIONAL E A ESCOLARIZAÇÃO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA INTELECTUAL

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Educação e Fronteiras On-Line, Dourados/MS, v.1, n.3, p.05-22, set./dez. 2011 5

O PREPARO PROFISSIONAL E A ESCOLARIZAÇÃO DA

PESSOA COM DEFICIÊNCIA INTELECTUAL

Professional preparation and the intellectual disability person’s scholarization La formación profesional y la escolarización de la persona con deficiencia intelectual Alexandra Ayach Anache RESUMO: Este trabalho resulta de um conjunto de reflexões produzidas durante as nossas experiências com a formação de professores na área de Educação, incluindo as pesquisas em Educação Especial. Elas nos motivaram a dar voz às professoras que atuavam no ensino comum que afirmaram não terem tido experiências com os alunos que apresentam deficiência intelectual. Interessávamos saber o que elas estavam considerando como necessário para ensinarem os alunos com a referida característica. Para esse fim, a entrevista semi-estruturada se mostrou mais indicada para possibilitar a o contato mais direto com 06 sujeitos eleitos para esta pesquisa. As entrevistas foram realizadas em 2 escolas de Ensino municipal de Campo Grande, MS, considerando a disponibilidade de cada professora. O conteúdo dos relatos foi analisado com base na perspectiva histórico cultural. Esta pesquisa revelou que o preparo profissional das professoras foi entendido por elas como sendo um conjunto de saberes necessários para promover a aprendizagem dos alunos com deficiência intelectual, assumindo para si a exclusividade dessa responsabilidade, assim como preconizaram os dispositivos legais brasileiros. Além disso, os relatos das professoras apontaram para a dicotomia entre o saber e o fazer, cabendo-lhes a execução das orientações realizadas pelos professores especializados, pois a estes últimos foram atribuídas competências para identificar as deficiências e planificar as intervenções, na perspectiva de que as necessidades educacionais especiais requerem atendimento individual.

Palavras-chave: preparo profissional; formação de professores e deficiência inte-lectual

ABSTRACT: This essay comes from a set of reflections produced during our experiences with teacher formation in the area of Education, including the Special Education researches. They motivated us to give voice to the teachers who acted in common teaching who affirmed they had no experience with the students that display intellectual deficiency. We were interested in knowing what they were considering necessary to teach the students with the aforementioned characteristic. To this end, semi-structured interview was more suited to enable the most direct

Professora do Departamento de Ciências Humanas do Centro de Ciências Humanas e Sociais da UFMS. Contato: Fone: (67) 3345 7588 – Email: alexandra.anache@gmail.com

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Educação e Fronteiras On-Line, Dourados/MS, v.1, n.3, p.05-22, set./dez. 2011 6 contact with 06 subjects chosen for this research. The interviews were performed in 2 municipal schools in Campo Grande, MS, considering the availability of each teacher. The content of the reports was analyzed based on the historic-cultural perspective. This research revealed that the professional preparation of the teachers was understood by them as being a set of knowledge required to promote the learning of students with intellectual deficiency, assuming for themselves the exclusivity of this responsibility, just as they acknowledged the value of Brazilian legal procedures. Aside from that, the teachers‟ reports pointed to the dichotomy between knowing and doing, leaving to them the execution of the orientations made by the specialized teachers, for to these were attributed competencies to identify the deficiencies and plan the interventions, in the perspective that the special educational needs require individual support.

Keywords: professional preparation; teacher training and intellectual disability. RESUMEN: Este trabajo proviene de un conjunto de reflexiones producidas durante nuestras experiencias con la formación docente en el área de la educación, incluyendo las investigaciones de educación especial. Ellos nos motivaron a dar voz a los profesores que actuaban en común enseñanza quien afirmó que no tenían experiencia con los estudiantes que muestran deficiencia intelectual. Estábamos interesados en saber lo que estaban considerando necesarios para enseñar a los estudiantes con las características mencionadas. Con este fin, la entrevista semiestructurada era más adecuado para permitir el contacto más directo con 06 temas elegidos para esta investigación. Las entrevistas se realizaron en dos escuelas municipales en Campo Grande, MS, Brazil- teniendo en cuenta la disponibilidad de cada profesor. El contenido de los informes fue analizado basado en la perspectiva histórica y cultural. Esta investigación reveló que la preparación profesional de los maestros fue entendida por ellos como un conjunto de conocimientos necesarios para promover el aprendizaje de los alumnos con deficiencia intelectual, asumiendo para sí la exclusividad de esta responsabilidad, tal como reconocieron el valor de procedimientos jurídicos brasileños. Aparte de eso, informes de los profesores señalados la dicotomía entre el saber y hacer, dejando la ejecución de las orientaciones formuladas por los profesores especializados, para estos eran atribuidos competencias para identificar las deficiencias y planear las interven-ciones, en la perspectiva de que la educación especial requiera apoyo individual. Palabras clave: preparación profesional; formación docente y la discapacidad inte-lectual.

INTRODUÇÃO

Este estudo foi fruto de reflexões decorrentes das experiências da autora em cursos de formação de professores na área de Educação, incluindo a Especial; da participação no projeto de pesquisa denominado “O preconceito e as atitudes em relação à educação inclusiva tendo a exclusão social como base”, apoiado financeiramente pela Fundação de Apoio ao Desenvolvimento do Ensino, Ciência e Tecnologia do Estado de Mato Grosso do Sul - FUNDECT, sob a coordenação e a orientação,

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respec-Educação e Fronteiras On-Line, Dourados/MS, v.1, n.3, p.05-22, set./dez. 2011 7 tivamente, da Profª Drª Dulce Regina dos Santos Pedrossian (UFMS) e do Prof. Dr. José Leon Crochík (USP/SP); das orientações de acadêmicos do Programa de Iniciação Científica do Conselho Nacional de Desenvol-vimento Científico e Tecnológico – PIBIC/CNPq, cujos planos de trabalho vinculavam-se ao projeto citado; e da orientação de uma acadêmica do Curso de Psicologia, cujo Trabalho de Conclusão do Curso teve como objeto de estudo as dimensões subjetivas do processo de escolarização de alunos com deficiência intelectual.

Essas experiências permitiram, neste escrito, centrar a atenção no estudo do preparo profissional que os docentes sem experiência com alunos com algum tipo de deficiência esperavam ter para ensinar pessoas com deficiência intelectual em suas salas de aula. No decurso dessas experiências detectou-se, também, que os professores clamavam por boas condições de trabalho, como melhores salários, tempo para planejamento e estudos e menor número de alunos por sala de aula. No entanto, sem desconsiderar a relevância desses fatores, eles não foram objeto desta pesquisa.

Os estudos sobre a formação profissional do professor intensi-ficaram-se nos últimos anos, em decorrência da promulgação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação 9394/96. Pode-se considerar, como expressão dessa preocupação, o levantamento do estado da arte sobre a Formação de Professores no período de 1990 a 1996 realizado por André, Simões, Carvalho e Brzezinski (1999), quando identificaram 284 trabalhos. Dentre eles, 216 (76%) abordaram o tema „formação inicial‟, 42 (14,8%) referiram-se à „formação continuada‟ e 26 (9,2%) pesquisaram os temas identidade e profissionalização docente.

Em uma consulta simplificada, em julho de 2009, na Base de Dados da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Ensino Superior, utilizando-se o descritor „formação de professores‟, obtiveram-se 2.819 registros, computando-se um aumento de 2.535 produções acadêmicas. Desse conjunto, 268 referiram-se à formação de professores para Educação Especial. Foram, também, identificados 87 trabalhos com a palavra-chave „formação de professores para a educação inclusiva‟.

No que se refere especificamente aos cursos de formação de profissionais para atuação junto às pessoas com deficiência intelectual, Anache e Mitjans (2007) encontraram sete (6%) de um conjunto de 122 das produções acadêmicas.Segundo as autoras:

Os resumos das produções indicaram que essas discussões fomentaram o debate entre os pesquisadores que se dedicam a estudar a formação de profissionais que atuam junto às pessoas com deficiência, pois, na perspectiva da inclusão, há que se pensar em uma outra configuração para o profissional das diferentes áreas do conhecimento. Alternativas educacionais que minimizem os efeitos da deficiência para o sujeito

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Educação e Fronteiras On-Line, Dourados/MS, v.1, n.3, p.05-22, set./dez. 2011 8 requerem dos profissionais orientações teóricas e meto-dológicas que ofereçam oportunidades de aprendizagem a todos os alunos (ANACHE E MITJANS, 2007, p. 19).

O Ministério da Educação estabelece, entre suas metas, a qualificação dos professores da educação da rede pública de ensino - Plano Nacional de Formação dos Professores da Educação Básica. Trata-se de uma ação conjunta do Ministério da Educação (MEC), de Instituições Públicas de Educação Superior (IPES) e das Secretarias de Educação dos Estados e Municípios, no âmbito do PDE - Plano de Metas Compromisso Todos pela Educação. Assim, a partir de 2007, os estados e municípios brasileiros elaboraram seus respectivos Planos de Ações Articuladas.

O Plano Nacional de Formação destinava-se aos professores em exercício das escolas públicas estaduais e municipais sem formação prevista pela LDB. Pretendia oferecer cursos superiores públicos, gratuitos e de qualidade, para os municípios de 21 estados da Federação, por meio de 76 Instituições Públicas de Educação Superior, das quais 48 Federais e 28 Estaduais, com a colaboração de 14 universidades comunitárias. Segundo o Ministério da Educação:

Por meio deste Plano, o docente sem formação adequada poderá se graduar nos cursos de 1ª Licenciatura, com carga horária de 2.800 horas mais 400 horas de estágio para professores sem graduação, de 2ª Licenciatura, com carga horária de 800 a 1.200 horas para professores que atuam fora da área de formação, e de Formação Pedagógica, para bacharéis sem licenciatura. Todas as licenciaturas das áreas de conhecimento da educação básica serão ministradas no Plano, com cursos gratuitos para professores em exercício das escolas públicas, nas modalidades presencial e a distância. Extraído em 16 de maio de 2009. (http://freire.mec.gov.br/index/principal.)

Com referência à formação profissional da educação, a LDB 9394/96, em seu artigo 61, apresentou os seguintes incisos orientadores:

I- A associação entre teorias e práticas, inclusive mediante a capacitação em serviço;

II- aproveitamento da formação e experiências anteriores em instituições de ensino e outras atividades.

Os dois incisos permitiram discutir a relação entre formação e preparo profissional dos professores que estão atuando em escolas públicas e que, a qualquer momento, irão receber alunos com deficiência física, sensorial, intelectual e múltipla.

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Educação e Fronteiras On-Line, Dourados/MS, v.1, n.3, p.05-22, set./dez. 2011 9 FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PREPARO PROFISSIONAL

O tema „formação profissional do professor‟ é amplo, pois abarca os diferentes níveis e áreas de ensino. Conservadas as especificidades do termo formação, Abbagnano (1982, p. 448) contribuiu com a seguinte definição:

No sentido específico que esta palavra assume em filosofia e em pedagogia, em relação ao termo alemão correspondente, ela indica o processo de educação ou de civilização, que se expressa nas duas significações de cultura; compreendida de um lado como educação, e de outro como sistema de valores simbólicos.

Analisando a conferência “A formação de professores como objeto de pesquisa - contributos para a construção do campo de estudo a partir de pesquisas portuguesas”, proferida por Roldão, foi possível encontrar o conceito relativo ao campo de estudo de formação de professores:

[...] conceitos estruturantes que tendencialmente deverão delimitar e centrar a investigação a produzir, tomando em devida conta as necessárias interfaces com o que designámos por campos adjacentes, mas que não podem ser subsumidos num campo difuso, porque demasiado amplo, que perde dessa forma parte do seu potencial interpretativo e teorizante (ROLDÃO, 2006, p. 3)1.

Os conceitos que estruturam o campo de estudo „formação de professores‟ na Conferência foram: processos de aprendizagem, desenvolvimento do conhecimento e do desempenho profissional dos docentes. Eles estão especificados em três elementos que definem a profissão docente: a função docente e sua natureza; o desempenho docente; e a natureza e os componentes do conhecimento profissional. Integram os campos adjacentes o currículo, a didática e os campos das culturas docentes, e a cultura organizacional da escola. Em um segundo nível de proximidade e resultantes do cruzamento das culturas profissional e organizacional, foram os domínios de estudo ligados ao pensamento e concepções dos professores, identidade profissional e percursos profissionais.

O preparo profissional resulta do processo de formação do professor, que extrapola o âmbito da educação formal e se remete à constituição da pessoa/profissional em suas condições concretas de vida. Diante disso, vale considerar que “o sonhado preparo” ocorre em uma sociedade determinada pelas regras do reordenamento do sistema capitalista de produção. É nesse contexto que as discussões sobre as políticas de inclusão ocorrem.

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Educação e Fronteiras On-Line, Dourados/MS, v.1, n.3, p.05-22, set./dez. 2011 10 No Brasil, as mudanças na educação vêm ocorrendo de forma mais sistemática desde 1990. A reforma do Estado, orientada pelas Diretrizes do Banco Mundial, limitou sua ação à avaliação das políticas em ação. Ocorreu a descentralização dos recursos, por meio da municipalização; a sociedade civil foi responsabilizada para promover a educação da população.

A flexibilização, um dos princípios das políticas do Banco Mundial, interferiu substancialmente na (re)organização escolar. Segundo Michels (2006), ela se expressou em diversos campos, como no currículo, na avaliação, na arrecadação de recursos, na formação de professores e na gestão escolar. Certamente, o princípio ganha contornos diferentes tanto nos discursos quanto nas práticas dos profissionais.

As Diretrizes Curriculares Nacionais para a Formação de Professores da Educação Básica, em nível superior (curso de licenciatura, de graduação plena), exigiram que fosse revisto o processo de formação dos professores:

[...] na perspectiva de fortalecer ou instaurar processos de mudança no interior das instituições formadoras, respondendo às novas tarefas e aos desafios apontados, que incluem o desenvolvimento de disposição para atualização constante de modo a inteirar-se dos avanços do conhecimento nas diversas áreas, incorporando-os, bem como aprofundar a compreensão da complexidade do ato educativo em sua relação com a sociedade. (p. 8).

O documento orientou que aspectos essenciais da formação de professores passassem por uma profunda revisão. Portanto, tornou-se necessário reformular

[...] a organização institucional, a definição e estruturação dos conteúdos para que respondam às necessidades da atuação do professor, os processos formativos que envolvem aprendizagem e desenvolvimento das competências do professor, a vinculação entre as escolas de formação e os sistemas de ensino, de modo a assegurar-lhes a indispensável preparação profissional. (p. 9).

O discurso do governo brasileiro defendeu a democratização da educação, por intermédio da gestão participativa. Os professores, como membros da sociedade civil e atores do processo educativo, foram convidados a participar ativamente da gestão escolar. Certamente essa proposta exigiu dos profissionais novas competências, para as quais não foram formados.

Não obstante, uma escola que pretenda incluir todos, indistintamente, necessitará de um corpo de profissionais que atendam à nova organização. Para viabilizar a educação inclusiva, os professores deveriam adotar seis princípios norteadores: aprendizagem significativa,

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Educação e Fronteiras On-Line, Dourados/MS, v.1, n.3, p.05-22, set./dez. 2011 11 demonstração, prática e feedback, negociação de objetivos, avaliação continuada, apoio e colaboração (MEC/SEESP, 2005).

Para Michels (2006), um dos elementos de sustentação da reforma educacional foi e tem sido o professor. Segundo a autora, a importância do trabalho docente é destacada nos documentos internacionais, vez que também ao professor é conferida a responsabilidade pelo fracasso escolar dos alunos. Sua formação deve ser alvo de investimento para a aquisição de competências necessárias para trabalhar em parceria com a comunidade escolar, solucionar de forma criativa os problemas da escola e avaliar a relação ensino-aprendizagem, no que se refere aos alunos e demais envolvidos. Como exemplo disso, há investimentos nos cursos de formação continuada na modalidade de Educação a Distância, Educar na Diversidade. Eles são ministrados pelos docentes das Universidades Públicas Brasileiras que concorreram e ganharam o Edital expedido pela Secretaria de Educação Especial do Ministério da Educação.

Esse projeto e outros dessa natureza visavam a incluir prioritariamente os professores da rede pública de ensino, para que pudessem garantir o acesso à escola, ao currículo e à conclusão da escolarização básica. Ressalta-se a necessidade de se realizarem pesquisas sobre esse assunto.

No que tange à formação dos professores para atender a todos os alunos, com observância das suas necessidades educacionais especiais, a Resolução CNE nº 02/2001 apresentou dois modelos: os capacitados e os especializados. No parágrafo 1º do artigo 18, foram definidas as competências para os considerados professores capacitados:

§ 1º São considerados professores capacitados para atuar em classes comuns com alunos que apresentam necessidades educacionais especiais aqueles que comprovem que, em sua formação, de nível médio ou superior, foram incluídos conteúdos sobre educação especial adequados ao desenvolvimento de competências e valores para:

I - perceber as necessidades educacionais especiais dos alunos e valorizar a educação inclusiva;

II- flexibilizar a ação pedagógica nas diferentes áreas de conhecimento de modo adequado às necessidades especiais de aprendizagem;

III - avaliar continuamente a eficácia do processo educativo para o atendimento de necessidades educacionais especiais; IV - atuar em equipe, inclusive com professores especializados em educação especial.

A capacitação dos professores, tanto em nível médio quanto superior, ocorre por meio da inserção de disciplinas ou conteúdos pertinentes à área, sobretudo em relação às especificidades das deficiências. Os profissionais, após o término de seus cursos, deveriam buscar

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Educação e Fronteiras On-Line, Dourados/MS, v.1, n.3, p.05-22, set./dez. 2011 12 complementar sua formação em cursos oferecidos por instituições de ensino, programas de formação em serviço e continuada. Imputou-se a esses professores a responsabilidade de seguir o planejamento proposto pelos especialistas em educação especial, conforme previsto no parágrafo 4º do artigo 18 da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Brasileira (1996).

O professor especialista é o responsável pelo planejamento pedagógico dos alunos considerados especiais. Sua formação poderá ocorrer por intermédio dos cursos de graduação ou de especialização, conforme consta nos parágrafos 2º e 3º do artigo 18 da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Brasileira (1996):

§ 2º São considerados professores especializados em educação

especial aqueles que desenvolveram competências para

identificar as necessidades educacionais especiais para definir, implementar, liderar e apoiar a implementação de estratégias de flexibilização, adaptação curricular, procedimentos didáticos pedagógicos e práticas alternativas, adequadas aos atendimentos das mesmas, bem como trabalhar em equipe, assistindo o professor de classe comum nas práticas que são necessárias para promover a inclusão dos alunos com necessidades educacionais especiais.

§ 3º Os professores especializados em educação especial deverão comprovar:

I - formação em cursos de licenciatura em educação especial ou em uma de suas áreas, preferencialmente de modo concomitante e associado à licenciatura para a educação infantil ou para os anos iniciais do ensino fundamental; II - complementação de estudos ou pós-graduação em áreas específicas da educação especial, posterior à licenciatura nas diferentes áreas de conhecimento, para atuação nos anos finais do ensino fundamental e no ensino médio.

Para a legislação em vigor, a formação profissional deve ocorrer em cursos de Licenciatura, de Pedagogia, com habilitação em Educação Especial. Em nível de especialização, pode ocorrer em uma das áreas da deficiência ou relacionada ao atendimento educacional especializado2 para alunos com deficiências.

A resolução do Conselho Nacional de Educação n°. 02/2001 apresentou um conjunto de competências necessárias para cada tipo de professor. Cabe aos docentes capacitados identificar os alunos com necessidades educacionais especiais e oferecer-lhes atividade pedagógica

2

Na forma da Lei, o Decreto N°. 6.571, de 17 de setembro de 2008, regulamentou o atendimento educacional especializado aos alunos com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades ou superdotação que se encontram matriculados na rede pública de ensino regular. Sob essa orientação, o parágrafo 2° desse Decreto definiu como: “atendimento educacional especializado o conjunto de recursos de acessibilidade e pedagógicos organizados institucionalmente, prestação de forma complementar ou suplementar à formação dos alunos no ensino regular”.

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Educação e Fronteiras On-Line, Dourados/MS, v.1, n.3, p.05-22, set./dez. 2011 13 para proporcionar sua aprendizagem. Os professores especializados, além de identificar esses alunos, devem planejar e orientar os professores capacitados.

Muitos cursos de formação em nível superior deveriam adequar seus currículos para incluir disciplinas ou tópicos que versassem sobre a educação de alunos com deficiências e sobre a formação de recursos humanos em educação especial, segundo a recomendação da Portaria Ministerial n° 1.793, de 27.12.1994. A Portaria recomendou a disciplina „Aspectos Ético-Político-Educacionais da Normalização e Integração da Pessoa Portadora de Necessidades Especiais‟, prioritariamente, nos cursos de Pedagogia e Psicologia, bem como nas licenciaturas, e que os conteúdos dessa disciplina fossem ministrados nos cursos de Educação Física, Enfermagem, Farmácia, Fisioterapia, Medicina, entre outros. Para Chacon (2001), nas universidades brasileiras que pesquisou, a Portaria foi atendida conforme a orientação proposta.

A proposta de formação vigente no país reproduz a divisão social do trabalho dentro das escolas. Os professores são treinados para executar as tarefas indicadas pelos especialistas. Essa situação agrava-se para aqueles que se sentem incapazes de ensinar a todos, indistintamente. Note-se que, para alguns professores, sobretudo para aqueles com quem a autora deste estudo teve contato, os cursos de formação continuada ainda são algo distante, corroborando com as análises de Michels (2006), quando analisou a proposta de educação especial na educação básica segundo a Resolução CNE/CEB 2/2001.

Para a autora, as ambiguidades na formação de professores se acirraram vez que, de forma ou de outra, esses profissionais terão que desenvolver atividades acadêmicas com todos os alunos deficientes. Para ela:

[...] a formação de professores proposta hoje pela política educacional brasileira não possibilita a superação da exclusão. Ao contrário, tal proposição consolida a exclusão dos alunos das classes populares, sendo eles considerados deficientes ou não, no seio mesmo da escola. Não mais falamos em excluídos da escola (do ensino fundamental), mas em excluídos do processo de aprendizagem no interior da escola. (MICHELS, 2006, p. 417).

O modelo de formação anunciada pelo Ministério da Educação aprofunda as dificuldades de se proporcionar o ensino às pessoas com deficiência, exclusivamente àquelas com deficiência intelectual.

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Educação e Fronteiras On-Line, Dourados/MS, v.1, n.3, p.05-22, set./dez. 2011 14 O PREPARO PROFISSIONAL

Nesta parte do texto, dar-se-á voz às professoras que afirmaram não terem tido experiências com alunos que apresentaram deficiência intelectual. Havia interesse em saber o que elas estavam considerando como necessário para ensinarem esses alunos. O significado de experiência implica dar significado a algo que se constitui nas relações sociais. No entendimento de Tardif e Lessard (2005), toda experiência individual é, também, social: “[...] a experiência de cada docente que encontramos é bem própria, ela não deixa de ser também a de uma coletividade que partilha o mesmo universo de trabalho, com todos os seus desafios e suas condições” (p. 53).

As experiências profissionais são constituídas por orientações, acertos, desacertos, tensões, dilemas e contradições, produzidas no curso de sua atividade como professor, fora e dentro do ambiente escolar, que permitem ou não que o profissional se perceba preparado para o enfrentamento das situações adversas do seu cotidiano. Para facilitar a expressão das experiências profissionais dos professores, a entrevista semi-estruturada mostrou-se mais indicada, vez que é flexível e possibilitou o contato direto com os sujeitos eleitos para esta pesquisa3.

As entrevistas foram realizadas em duas escolas da rede de ensino municipal de Campo Grande, MS, considerando a disponibilidade de cada professora. A duração de cada uma delas foi de aproximadamente uma hora. Todas as entrevistas realizadas foram gravadas, transcritas e seu conteúdo analisado à luz da perspectiva histórico-cultural.

Essa abordagem compreende o ser humano em seu devir e considera que as funções psíquicas, dentre elas a capacidade de comunicação, são constituídas nas relações sociais. Portanto, as diferentes formas de manifestações simbólicas são necessárias para se analisar o significado de preparo profissional atribuído pelas professoras para trabalharem com alunos que apresentam deficiência intelectual. Para González Rey (2005, p. 14): “A comunicação será via em que os participantes de uma pesquisa se converterão em sujeitos, implicando-se no problema pesquisado a partir de seus interesses, desejos e contradições”.

Foram entrevistadas seis professoras do ensino fundamental que afirmaram nunca terem tido contato com alunos com nenhum tipo de deficiência. A faixa etária das professoras variou de 28 a 57 anos. Registre-se que todas as profissionais entrevistadas são mulheres, confirmando a tendência de ser essa uma profissão eminentemente feminina.

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Os sujeitos que aceitaram participar da pesquisa assinaram o Termo de Consentimento Livre Es-clarecido.

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Educação e Fronteiras On-Line, Dourados/MS, v.1, n.3, p.05-22, set./dez. 2011 15 No que se refere à área de formação profissional, cinco professoras eram formadas em Pedagogia e uma em Matemática; quatro possuíam pós-graduação em Educação. Cabe destacar que duas professoras fizeram cursos de pós-graduação em Educação com a parceria da Prefeitura Municipal de Campo Grande. Essa iniciativa foi uma das ações do município para capacitá-las, segundo as mudanças anunciadas pelas Políticas Educacionais Brasileiras sobre a (re)organização escolar. As entrevistadas4 não esclareceram se os cursos que fizeram foram suficientes para prepará-las.

As professoras entrevistadas afirmaram que deveriam trabalhar considerando as necessidades especiais do aluno, que eram concebidas por elas como sinônimo de deficiência intelectual. Indagava-se sobre as características dessas necessidades. Em decorrência disso, elas demonstraram interesse em obter conhecimentos sobre o assunto, conforme ilustrou o episódio que se segue:

[...] eu tenho que buscar esse conhecimento, saber trabalhar com isso. E facilidade é uma pessoa, um aluno normal como outro, só que vamos ter umas especificidades e que isso ocorre também com alunos quando ele tem dificuldade na aprendizagem. Agora, a única diferença é que eu não sei no caso da aprendizagem eu não sei quais as técnicas que eu tenho que executar (P1).

O preparo profissional que as professoras almejavam consistia em obter conhecimentos sobre as características dos alunos com deficiência intelectual e sobre o planejamento do ensino mediante as necessidades específicas de suas aprendizagens. O relato que se segue ilustra essa afirmação:

Não existiu no currículo. Não, era assunto, mas o assunto geral sempre era essa questão, a preocupação de que eles estavam chegando na escola, na época, e que nós professores não estávamos preparados e que a escola não tava preparada o suficiente, ninguém estava preparado para receber e até hoje, ainda é muito precário [...] Não tive disciplina não. (P6) Concordamos que os conteúdos que as professoras almejavam em seu currículo poderiam instrumentalizá-las em suas práticas pedagógicas. No entanto, não nos pareceu ainda suficiente para gerar mudanças substanciais na vida acadêmica dos alunos em foco, conforme o relato de P5, que mencionou ter procurado complementar seus conhecimentos sobre o assunto. Fornecer conteúdos específicos por meio de cursos em diferentes níveis e modalidades não nos pareceu como uma única solução para que o professor pudesse se sentir preparado para trabalhar com todos os alunos.

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Educação e Fronteiras On-Line, Dourados/MS, v.1, n.3, p.05-22, set./dez. 2011 16 Isso nos permitiu concluir que a educação sob a perspectiva da inclusão exigirá transformações profundas no projeto educacional brasileiro, que vai além dos cursos de formação de professores.

As professoras entrevistadas entenderam como necessário conhecer cada criança, identificando suas necessidades educacionais. No entanto, registraram suas limitações para compreender o que seria específico para cada aluno, conforme o relato que se segue: “Se o professor não tem esse

preparo, como que eu vou fazer? Eu, no caso, hoje, eu conseguiria no máximo trabalhar, o quê? Oralidade e coordenação motora, o tato dele, o concreto; mas e como é que ficaria essa questão da leitura?” (P2).

A título de esclarecimento, o conceito de deficiência intelectual adotado no Brasil é o proposto pela Associação Americana de Retardo Mental (2002): uma incapacidade que se expressa por limitações no funcionamento individual dentro do contexto social e representa uma desvantagem substancial para o indivíduo. A incapacidade do indivíduo pode ser caracterizada por problemas severos na capacidade, habilidade e oportunidade de funcionamento, em contexto. A Associação apresentou um modelo ampliado de abordagem multifatorial para etiologia, que aponta quatro fatores causais: biomédico, social, comportamental e educacional.

Os pressupostos adotados em 2002 pela Associação são praticamente os mesmos de 1992, com o acréscimo de que as limitações devem estar relacionadas ao desenvolvimento do perfil de suportes necessários. O sistema de diagnóstico, classificação e indicação de suportes é um processo que incide diretamente na ação educacional. A utilização e o acompanhamento do sistema envolvem três funções.

A primeira função refere-se à identificação e triagem, ou seja, o diagnóstico de deficiência intelectual. Para esse fim, devem-se considerar três aspectos: (1) foram constatadas limitações significativas no funcionamento intelectual; (2) foram constatadas limitações significativas no comportamento adaptativo; (3) a idade de instalação da deficiência foi antes dos 18 anos. A segunda função diz respeito à classificação e à descrição, que visam a identificar os pontos fortes e fracos nas cinco dimensões e a necessidade de suporte. É necessário descrever as capacidades e as limitações em cada uma das cinco dimensões: (1) habilidades intelectuais; (2) comportamento adaptativo; (3) participação, interação e regras sociais; (4) saúde física, mental e etiológica; (5) contexto (ambiente e cultura). A terceira função está relacionada com a definição do perfil do suporte para melhorar o funcionamento do sujeito: o tipo, a intensidade e a pessoa e/ou profissional responsável em cada uma das nove áreas: desenvolvimento humano; ensino e educação; vida doméstica; vida na comunidade; emprego; saúde e segurança; comportamental; social; e proteção e defesa.

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Educação e Fronteiras On-Line, Dourados/MS, v.1, n.3, p.05-22, set./dez. 2011 17 Dependendo do objetivo da aplicação da definição (diagnóstico, classificação, ou planejamento de níveis de suporte), um indivíduo será considerado elegível para um serviço destinado a pessoas com deficiência intelectual se, em sua classificação, forem considerados os seguintes aspectos: intensidade do suporte que necessitará para se desenvolver; variação de quociente de inteligência; limitações no comportamento adaptativo; e etiologia. Nessa orientação, o comportamento adaptativo está expresso em termos de habilidades adaptativas, conceituais e práticas que as pessoas aprendem para funcionar diariamente.

A deficiência intelectual se expressa nas diferentes formas de relações, condicionadas às exigências estabelecidas nas diversas situações. Desse modo, caberia ao professor construir estratégias de ensino para que os seus alunos aprendessem. Mas, nos relatos das entrevistadas, esses alunos foram identificados como “aqueles deficientes que não aprendem mesmo” (P1, P2, P3, P4, P5) e, portanto, terão dificuldades de adaptação na escola e na aprendizagem dos conteúdos acadêmicos, ou seja, na aquisição dos conhecimentos transmitidos durante as aulas. As visões deterministas sobre as possibilidades de desenvolvimento dessas pessoas adquiriram efeitos paralisantes; seus efeitos expressaram-se na falta de investimento na carreira profissional do professor.

Quanto ao desempenho dos alunos, as entrevistadas entenderam que a deficiência pode interferir no rendimento. Para elas, o nível de desempenho está atrelado ao grau da deficiência, conforme ilustra este episódio de P5: “[...] eu acredito que o com deficiência tem mais

dificuldade, ele teria mais dificuldade em acompanhar o nível dos demais, mas não seria impossível. Vai depender do grau da deficiência e a maneira que se é trabalhada, porque existem vários tipos de deficiência”.

P6 afirmou que a dificuldade do aluno com deficiência é semelhante à de uma criança „normal‟, conforme o relato:

Tem muitos alunos considerados, entre aspas, regular, que têm mais dificuldade na aprendizagem que aluno especial. Às vezes, tem um aluno que não é considerado aluno especial, mas ele não consegue aprender muito mais rápido. Então, as dificuldades são as mesmas. (P7).

Contraditoriamente ao exposto por P6, as demais professoras afirmaram que os alunos com deficiência intelectual possuíam ritmos de aprendizagens distintos, que precisavam ser considerados, pois há fatores que influenciam o desempenho de cada um deles, como a falta de estímulo, a sobrecarga emocional, além do despreparo do professor para lidar com tempos diferentes de aprendizagem.

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Educação e Fronteiras On-Line, Dourados/MS, v.1, n.3, p.05-22, set./dez. 2011 18 Todas as pessoas possuem ritmos e estilos diferentes para aprenderem. No entanto, os discursos das professoras registraram que tais características são exclusivas de alunos com deficiência intelectual, quando, na perspectiva de uma educação inclusiva, isso deveria ser princípio. Esse é um aspecto que remete às discussões sobre a terminalidade e a certificação.

O tempo previsto pela escola e o tempo pessoal impõem a homogeneização dos processos de aprendizagem, e os alunos com deficiência intelectual precisariam de mais tempo para concluir seu processo de escolarização. Talvez esta seja uma das justificativas para o „silêncio‟ por parte da legislação brasileira. Essa questão merece aprofundamentos, pois exigirá outro formato de organização escolar, que incidirá em todas as ações implicadas no processo educativo, dentre elas, a planificação do ensino.

O planejamento oferece condições para que o profissional antecipe sua ação; o autor do planejamento faz um diálogo com sua prática profissional. Esse processo sintetiza um conjunto de ideias, conhecimentos e intuições, agregando também valores, concepção de educação, de escola, de aluno e, sobretudo, sobre a função de ser professor. O plano dos professores envolve uma série de operações, como pensar, refletir, construir alternativas para o ensino, ordenar, delimitar os passos a serem dados, delimitar o contexto e os recursos (SÁCRISTÁN E GÓMEZ, 1998).

Esse processo agrega experiências pessoais, sociais e educacionais vividas na trajetória escolar dos alunos. O planejamento não poderá engessar a prática educativa, pois tem função orientadora para proporcionar as avaliações do que foi proposto e do que foi efetivado. Costumeiramente, as professoras afirmaram que planejavam um conjunto de conteúdos, que deveriam ser assimilados ao mesmo tempo e da mesma forma por todos os alunos.

Diante de alunos com deficiência intelectual, as professoras manifestaram suas preocupações em relação aos conteúdos a serem ministrados. Há unanimidade nos relatos de que se deveriam observar as possibilidades de aprendizagem dos alunos, para selecionar os conteúdos que tinham condições de assimilar. Nota-se uma visão de ensino atrelada às condições biológicas do sujeito, desconsiderando-se a função formativa da escola. Preparava-se o mínimo de conteúdos, pois havia o entendimento de que a deficiência intelectual era limitante para o aprendizado dos conhecimentos ensinados na escola. O relato de P4 registrou essa preocupação: “as dificuldades, eu penso que devido às dificuldades dele,

vão estar sempre atrás dos conteúdos, devagar em relação aos outros”.

Mereceu destaque a afirmação da P6 sobre a necessidade de planejar as aulas, promovendo atividades desafiadoras. O desafio promove o interes-se dos alunos sobre os conteúdos e, coninteres-sequentemente, gera disciplina, fortalece vínculos e torna o processo de escolarização significativo. Isso

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exi-Educação e Fronteiras On-Line, Dourados/MS, v.1, n.3, p.05-22, set./dez. 2011 19 girá investimentos dos envolvidos, professores, coordenadores, familiares, entre outros. As aulas consideradas prazerosas eram aquelas que se valiam de recursos didáticos variados, como equipamentos tecnológicos, multi-mídia. Para as entrevistadas, a diversificação de recursos e estratégias de ensino promovia a concentração dos alunos com deficiência.

A maioria das entrevistadas afirmou que a relação entre professores e alunos com deficiência não difere daqueles que não apresentam deficiência. Contraditoriamente, P5 destacou que esses alunos precisavam de mais atenção e carinho: “Eu não sei como ensinar, só sei que elas

precisam de amor e carinho”.

A inserção de aluno com deficiência na sala de aula foi considerada cumprimento de direitos e facilitava a socialização, minimizando as diferenças. Proporcionou crescimento pessoal dos profissionais, pois tiveram que adquirir conhecimentos para atendê-los. No entanto, aspectos negativos foram arrolados, como o despreparo do professor e a sobrecarga de trabalho.

No que se refere à escola, P6 afirmou ser necessário construir uma proposta pedagógica inclusiva, com a participação de professores, alunos, pais e representantes das secretarias ou de órgão responsável pela inclusão social para prepararem a escola para receber os alunos com deficiência, vez que seria uma oportunidade de trazê-los para dentro da escola e socializá-los. Note-se que a professora cometeu dois equívocos: o primeiro foi tomar unicamente para a escola a responsabilidade pela inclusão social, quando esse é um projeto de sociedade. O segundo é a redução do processo de inclusão às pessoas com deficiências.

A socialização tem sido atribuída à escola, e esse processo poderá exigir mudanças substanciais no enfretamento do preconceito. A convivência entre os alunos com e sem deficiência foi entendida como benéfica para ambas as partes, pois desperta sentimentos de cooperação e pertencimento ao grupo.Pondera-se que a socialização pode ser promovida em outros espaços sociais; a escola precisa rever esse discurso, retomando sua finalidade primeira, que é promover a escolarização dos seus alunos.

A socialização é fundamental para o desenvolvimento do ser humano, sobretudo porque provoca o enfrentamento dos conflitos gerados a partir do convívio diário com aqueles que despertam os mais variados tipos de sentimentos, colocando em evidência os limites pessoais para superá-los. Essa afirmação confirmou-se no relato de P1:

[...] para a criança, o diferente não é tão diferente. Porque a

criança, quando ela convive com outra criança, especial, ela não vê tanta diferença; é o adulto que faz com que ela veja essa diferença. Eu acho. O preconceito vem de onde? Vem de casa. Vem dos pais, do adulto, que coloca o preconceito nessa

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Educação e Fronteiras On-Line, Dourados/MS, v.1, n.3, p.05-22, set./dez. 2011 20 criança. Porque você percebe que, às vezes, ele brinca normalmente, voltando-se para o lado do negro, do índio. A pessoa com deficiência intelectual sofre preconceito, sobretudo, por ser incluída de forma marginal5, contribuindo para o aumento dos números estatísticos. Entretanto, isso não quer dizer que seu processo de aprendizagem tenha se efetivado, exigindo-se novos estudos. Concluiu-se que os conhecimentos que as entrevistadas possuíam não foram considerados suficientes para romper com a visão estereotipada da deficiência intelectual. A multiplicidade de suposições sobre o processo de aprendizagem permitiu afirmar que há suspeita implícita sobre a inviabilidade de ensinar às crianças com deficiência intelectual, mediante as condições pelas quais as professoras se encontravam, permanecendo a indagação sobre a relação ensino-aprendizagem desses alunos.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Esta pesquisa revelou que o preparo profissional das professoras foi entendido por elas como um conjunto de saberes necessários para promover a aprendizagem dos alunos com deficiência intelectual, assumindo para si a exclusividade dessa responsabilidade, assim como preconizaram a exigência da inclusão pelos dispositivos legais brasileiros.

Os relatos das professoras apontaram para a dicotomia entre o saber e o fazer, cabendo-lhes a execução das orientações realizadas pelos professores especializados, pois a estes últimos foram atribuídas competências para identificar as deficiências e planificar as intervenções, na perspectiva de que as necessidades educacionais especiais requerem atendimento individual.

As reflexões resultantes desta pesquisa permitiram-nos referendar a crítica já realizada por Michels (2006), quando se referiu às contradições que decorreram das reformas de Estado. Para ela, essas reformas, fundamentadas nos princípios neoliberais, contribuíram para a produção de práticas que, aparentemente, se apresentam como inclusivas, mas promovem a inclusão de professores e alunos de forma precária e alienada ao modelo de organização das instituições de ensino. Como exemplo disso, a proliferação dos cursos de graduação e de pós-graduação em nível de especialização surge como promessa de promoção profissional. Eles são realizados de forma aligeirada, oferecendo aos cursistas informações fragmentadas, conforme se pode encontrar no discurso das professoras entrevistadas.

Quanto ao preparo profissional reivindicado pelas entrevistadas, arrisca-se afirmar que elas buscavam obter alguns conhecimentos sobre os

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Educação e Fronteiras On-Line, Dourados/MS, v.1, n.3, p.05-22, set./dez. 2011 21 alunos com deficiência intelectual, cabendo-lhes orientação sobre as especificidades dos processos de aprendizagem, que precisam ir além de uma leitura determinista de desenvolvimento. Isso exigirá o desenvolvimento de teorias do campo da Didática, que superem a dicotomia entre a prática e a teoria, e favoreçam a construção de um trabalho coletivo. REFERÊNCIAS

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Referências

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