BOAS PRÁTICAS APÍCOLAS E A QUALIDADE DO MEL DE ABELHAS
Apis mellifera Linnaeus, 1758
SINEVALDO GONÇALVES DE MOURA
Tese apresentada ao Programa de Pós- Graduação em
Ciência Animal do Centro de Ciências Agrárias da
Universidade Federal do Piauí, como parte dos
pré-requisitos para a obtenção do título de Doutor na Área
de Concentração: Sanidade e Reprodução Animal.
Teresina
Estado do Piauí - Brasil
Dezembro- 2010
BOAS PRÁTICAS APÍCOLAS E A QUALIDADE DO MEL DE ABELHAS
Apis mellifera Linnaeus, 1758
SINEVALDO GONÇALVES DE MOURA
Engenheiro Agrônomo
Tese apresentada ao Programa de Pós-
Graduação em Ciência Animal do Centro de
Ciências Agrárias da Universidade Federal do
Piauí, como parte dos pré-requisitos para a
obtenção do título de Doutor na Área de
Concentração:
Sanidade
e
Reprodução
Animal.
Orientadora: Dr.ª Maria Christina Sanches Muratori
Co-orientador: Dr. Darcet Costa Souza
Teresina
Estado do Piauí – Brasil
Dezembro - 2010
FICHA CATALOGRÁFICA
Serviço de Processamento Técnico da Universidade Federal do Piauí Biblioteca Comunitária Jornalista Carlos Castello Branco
M929b Moura, Sinevaldo Gonçalves de
Boas práticas apícolas e a qualidade do mel de abelhas Apis mellifera Linnaeus, 1758 [manuscrito] / Sinevaldo Gonçalves de Moura. – 2010.
76f: il.
Cópia de computador (printout).
Tese (Doutorado) – Programa de Pós-Graduação em Ciência Animal, Universidade Federal do Piauí, 2010.
“Orientadora: Profª. Drª. Maria Christina Sanches Muratori” “Co-orientador: Dr. Darcet Costa Souza”
1. Físico-química. 2. Microbiologia. 3. Manipulação adequada. I. Título.
BOAS PRÁTICAS APÍCOLAS E A QUALIDADE DO MEL DE ABELHAS
Apis mellifera Linnaeus, 1758
SINEVALDO GONÇALVES DE MOURA
Tese aprovada em: 10/12/2010 pela banca examinadora:
____________________________________________
Prof. Dr.ª Maria Christina Sanches Muratori/UFPI-DMV
Orientadora
____________________________________________
Prof. Dr. Darcet Costa Souza / UFPI-DZO
Co-orientador
____________________________________________
Profª. Drª. Júlia Geracila de Mello e Carneiro/ UFPI-DF
Examinador Interno
______________________________________________
Pesquisador: Dr. Bruno de Almeida Souza/ Embrapa Meio-Norte
Examinador Externo
_______________________________________________
Dr.
aMaria Cristina Affonso Lorenzon/ UFRRJ
Não é digno de saborear o mel, aquele que se afasta da colmeia com medo das
picadas das abelhas (W. Shakespeare).
DEDICO
A Deus, supremo entre todos, que nos deu livre escolha
para decidirmos os nossos passos.
A minha esposa Jaqueline Zanon de Moura, e minha filha
Joana Zanon de Moura pelo amor e amizade a mim dedicados
em mais essa conquista.
Aos meus pais Gabriel Moura Gonçalves e Ana dos
Santos Gonçalves, pela dedicação e perseverança em sempre
sonhar com passos mais altos de seus filhos.
Aos meus irmãos: Sandovaldo Gonçalves de Moura,
Solange Gonçalves de Moura, Sinvaldo Gonçalves de Moura e
Sâmia Érica Gonçalves de Moura, pela família que formamos
sustentada em base sólida, no caráter e na honestidade.
Ao meu avô: Antonio de Sousa Santos (in memorian) pelo
ensinamento de que sempre temos que observar cada fenômeno
de uma ótica que nenhuma pessoa ainda o observou.
AGRADECIMENTOS
À Universidade Federal do Piauí, por me proporcionar a oportunidade do
curso técnico, curso superior, do mestrado, do doutorado e da realização profissional
como professor da mesma. Em especial ao Campus Amilcar Ferreira Sobral (CAFS).
À Profª. Dra. Maria Christina Sanches Muratori, pela orientação e discussões
sempre pertinentes à diversidade de idéias e respeito ao limites entre a emoção e a
razão científica.
Ao Prof. Dr. Darcet Costa Souza, pela orientação desde a graduação,
contribuindo com ensinamentos valiosos para minha formação profissional.
À Profª. Dr
a. Júlia Geracila de Mello e Carneiro, pela contribuição na
formação de um censo crítico e na realização de pesquisas simples, essenciais e
aplicáveis.
À Profª. M.Sc. Maraísa Lopes, pela tradução e pela revisão ortográfica.
À Bibliotecária Hária Arêa Leão Oliveira, pela ajuda com as referências
bibliográficas.
À Coordenação do Programa de Pós-graduação em Ciência Animal.
À Cooperativa Mista de Apicultores de Simplício Mendes Piauí (COMAPI),
pelo apoio concedido durante toda a fase de experimentação, em especial a Valdete
Moura, Anchieta Moura, Paulo José e Dionísio Mauriz.
Aos Apicultores dos municípios de São Raimundo Nonato, Anísio de Abreu,
Jurema, Caracol, São Brás, Várzea Branca, Bela Vista e Simplício Mendes que
contribuíram com as amostras e com os dados para a realização do trabalho.
Ao Prof. Dr. João Batista Lopes, pela dedicação e empenho para uma
pós-graduação cada vez melhor.
Ao Luís Gomes, secretário da pós-graduação, por sua dedicação e atenção em
todos os momentos.
Aos colegas do Doutorado em Ciência Animal, pelo convívio durante a
realização do curso.
Aos professores do Doutorado em Ciência Animal, pelos valiosos
ensinamentos repassados.
Aos colegas de trabalho da UFPI de Bom Jesus, em especial: Leilson Bezerra,
Marcos Jacome, Leonardo Atta, Daniel Louçana, Leilane Barros, Carlos Humberto,
Stélio Bezerra, Marcio Cleto e Adriana Mancin.
Especialmente, à Aline Monte e Rosana Madeira pela ajuda na realização das
análises.
A todos os servidores do Centro de Ciências Agrárias da UFPI, em especial,
os que integram o NUEPPA.
SUMÁRIO
LISTA DE ABREVIATURAS E SÍMBOLOS ...
x
LISTA DE TABELAS ...
xi
LISTA DE FOTOS ...
xii
RESUMO GERAL - Boas práticas apícolas e a qualidade do mel de abelhas
(Apis mellifera Linnaeus, 1758). ... xiii
ABSTRACT ...
xv
1. INTRODUÇÃO ...
1
2. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA e Capítulo 1 ...
3
RESUMO - Critérios de qualidade do mel de abelhas Apis mellifera L.: revisão
3
ABSTRACT ...
3
INTRODUÇÃO ...
4
1 Apicultura ...
4
2. Mel ...
4
2.1. Composição do mel ...
4
3. Legislação Brasileira ...
5
3.1. Características Sensoriais...
5
3.2. Características Físico-químicas ...
5
3.2.1. Indicadoras de Maturidade ...
5
a) Açúcares Redutores e Sacarose Aparente...
5
b) Umidade ...
6
3.2.2. Indicadoras de Pureza ...
6
a) Sólidos Insolúveis em água...
6
b) Cinzas ...
6
3.2.3. Indicadoras de Deterioração ...
6
a) Hidroximetilfurfural ...
6
b) pH e Acidez ...
7
c) Diastases (Enzimas) ...
7
4. Outros critérios de qualidade ...
7
b) Atividade de água...
8
c) Microrganismos no mel ...
8
5. Exigências Legais e de mercado ...
8
a) Boas Práticas Apícolas ...
9
b) Contaminantes químicos ...
9
CONCLUSÕES ...
9
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ...
9
3. MATERIAL E MÉTODOS GERAIS ...
17
4. Capítulo 2: Perfil sanitário dos apicultores piauienses quanto às boas práticas
apícolas ... 19
RESUMO ...
19
ABSTRACT ...
20
INTRODUÇÃO ...
21
MATERIAL E MÉTODOS ...
23
RESULTADO E DISCUSSÃO ...
24
CONCLUSÕES ...
29
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ...
30
5. Capítulo 3: Boas práticas apícolas relacionadas com a qualidade do mel de
abelhas Apis mellifera L. ...
32
RESUMO ...
31
ABSTRACT ...
32
INTRODUÇÃO ...
33
MATERIAL E MÉTODOS ...
34
RESULTADO E DISCUSSÃO ...
35
CONCLUSÕES ...
36
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ...
36
6. CONCLUSÕES GERAIS ...
41
7. CONSIDERAÇÕES FINAIS ...
42
8. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS GERAIS ...
43
LISTA DE ABREVIATURAS E SÍMBOLOS
°
Graus
g
Gramas
HMF
Hidroximetilfurfural
IN
Instrução Normativa
Inc.
Incidência
Kg
Quilograma
mg
Miligramas
mm
Milímetros
ºC
Graus Celsius
TRAT.
Tratamento
m.mol
milimol
Ufc
Unidade Formadora de Colônia
Aa
Atividade de água
UEPA
Unidade de Extração de Produtos Apícolas
BPA
Boas Práticas Apícolas
Meq
miliequivalente
PI
Piauí
LISTA DE TABELAS
Capítulo 1
Tabela 1
Composição físico-química de amostras de méis de Apis mellifera L. em
vários estados do Brasil.
Tabela 2
Composição físico-química de amostras de méis de Apis mellifera L. em
vários países do mundo.
Tabela 3
Classificação da cor do mel de acordo com Pfund.
Tabela 4
Parâmetros de qualidade estabelecidos pelo Codex Alimentarius (2001) e pela
legislação brasileira (BRASIL, 2000) para méis florais produzidos por Apis
mellifera L.
Tabela 5
Efeitos da temperatura de estocagem sobre a formação do HMF (WHITE JR,
1992).
Capítulo 2
Tabela 1
Nível de utilização de Boas Práticas Apícolas e material dos equipamentos
utilizados na extração do mel no estado do Piauí.
Tabela 2
Nível de utilização de Boas Práticas Apícolas e sistema de abastecimento e
tratamento de água utilizado nas UEPA ou na higienização dos materiais e
equipamentos utilizados na extração do mel no estado do Piauí.
Tabela 3
Nível de utilização de Boas Práticas Apícolas e predominância do dia e
horário da coleta dos favos no estado do Piauí.
Tabela 4
Nível de utilização de Boas Práticas Apícolas e características do transporte e
da proteção para as melgueiras durante a condução dos favos do campo à
Unidade de Extração de Produtos Apícolas.
Tabela 5
Nível de utilização de Boas Práticas Apícolas e características da higienização
dos manipuladores antes de iniciar os trabalhos na Unidade de Extração de
Produtos Apícolas ou de extração no estado do Piauí.
Capítulo 3
Tabela 1
Itens importantes para a qualidade e produção de mel de abelhas Apis
mellifera L. em função do nível de utilização das Boas Práticas Apícolas.
Tabela 2
Parâmetros físicos - químicos e microbiológicos obtidos em méis de abelhas
LISTA DE FOTOS
Foto 01
Unidade de Extração de Produtos Apícolas dentro dos padrões da
legislação vigente - tratamento 1.
Foto 02
Equipamentos da Unidade de Extração de Produtos Apícolas
dentro dos padrões da legislação vigente – tratamento 1.
Foto 03
Embalagens para armazenamento do mel da Unidade de Extração
de Produtos Apícolas dentro dos padrões da legislação vigente –
tratamento 1.
Foto 04
Unidade de Extração de Produtos Apícolas fora dos padrões da
legislação vigente - tratamento 2.
Foto 05
Equipamentos da Unidade de Extração de Produtos Apícolas fora
dos padrões da legislação vigente - tratamento 2.
Foto 06
Armazenamento do mel da Unidade de Extração de Produtos
Apícolas dentro dos padrões da legislação vigente- tratamento 2.
Foto 07
Local improvisado de extração de mel (casa de farinha) -
tratamento 2.
Foto 08
Equipamento de ferro e zinco utilizado na extração de mel no
tratamento 2.
Foto 09
Embalagens e locais inadequados utilizados por apicultores do
tratamento 3.
Foto 10
Local improvisado de extração de mel (ao relento) – tratamento 3.
Foto 11
Local improvisado de extração de mel (casa em ruínas) –
tratamento 3.
Foto 12
Local improvisado de decantação de mel (PVC) – tratamento 3.
Foto 13
Local improvisado para extração de mel (PVC) – tratamento 3.
Foto 14
Equipamentos de ferro utilizados na desoperculação de mel -
BOAS PRÁTICAS APÍCOLAS E A QUALIDADE DO MEL DE ABELHAS
Apis mellifera Linnaeus, 1758
Autor: SINEVALDO GONÇALVES DE MOURA
Orientadora: Profa. Dra. MARIA CHRISTINA SANCHES MURATORI
Co-orientador: Prof. Dr. DARCET COSTA SOUZA
RESUMO: Este trabalho foi realizado para avaliar a qualidade do mel de abelhas Apis
mellifera L. em função do nível de utilização das Boas Práticas Apícolas (BPA) nas
condições do Piauí. Para tanto, utilizaram-se 60 amostras de mel produzido na safra de
2009. O experimento foi montado em Delineamento Inteiramente Casualizado (DIC),
com três tratamentos (níveis de BPA) e 20 repetições. Os tratamentos foram:
Apicultores que utilizam em um melhor nível as BPA, com unidades de extração de
produtos apícolas (UEPA) dentro dos padrões exigidos pela legislação vigente
(Tratamento 1); Apicultores que não utilizam as BPA corretamente, com UEPA fora
dos padrões exigidos pela legislação vigente (Tratamento 2) e Apicultores que não
utilizam corretamente as BPA, não possuindo UEPA (Tratamento 3). Foi aplicado um
questionário de coletas de dados a todos os produtores amostrados. O questionário, com
questões abertas e fechadas, foi dividido em cinco blocos, a saber: A- Materiais
Utilizados; B- Localização e instalação de apiários; C- Manejo de Colmeias, D- Coleta
e transporte dos favos com mel; F- Unidade de Extração de Produtos Apícolas. As
amostras foram analisadas quantos aos parâmetros físico-químicos (umidade, acidez,
pH, HMF, cinzas, sólidos insolúveis em água e atividade de água - Aa), sensoriais (cor)
e microbiológicos (pesquisa de Salmonella, contagem de coliformes a 37ºC e 45ºC e
contagem de fungos filamentosos e leveduras). Para os parâmetros físico-químicos
analisados, foram observadas diferenças (com exceção de cinzas) (p< 0,05) entre o
tratamento um e os demais, sendo que as amostras de todos os traramentos
mantiveram-se dentro dos padrões da legislação vigente. Não foram obmantiveram-servados coliformes a 37ºC e
a 45°C nem Salmonella spp. nas amostras. Quanto aos fungos filamentosos e leveduras,
foram encontrados valores superiores a 1,0 UFC/g (log10) em 50%, 90% e 80% das
amostras para os tratamentos um, dois e três, respectivamente. Após seis meses de
estocagem, foi observada a ocorrência de fermentação em 20% e 15% das amostras dos
tratamentos dois e três. Esse fato pode ser explicado pelos maiores teores de umidade e
Aa observados para estes tratamentos, dos quais 60% e 45% das amostras apresentaram
Aa superiores a 0,61, contra 5% para o tratamento um. A utilização das BPA é uma
ferramenta eficiente para diferenciar os apicultores e manter a qualidade físico-química
e microbiológica do mel abelhas A. mellifera do campo à UEPA É importante avaliar
aspectos microbiológicos e físico-químicos (principalmente umidade e Aa) do mel
durante a estocagem para que possa ser avaliado o tempo de prateleira.
GOOD APICULTURAL PRACTICES AND QUALITY Apis mellifera Linnaeus,
1758 BEE HONEY
Author: SINEVALDO GONÇALVES DE MOURA
Advisor: Profa. Dra. MARIA CHRISTINA SANCHES MURATORI
Co-advisor: Prof. Dr. DARCET COSTA SOUZA
ABSTRACT: This research was carried out to evaluate the quality of the Apis mellifera
L. honey according to the level of use of Good Apicultural Practices (GAP) as for
conditions in Piaui. In order to do this, we used 60 samples of honey produced during
the 2009 harvest. The experiment was conducted in completely randomized design, with
three treatments (three levels of GAP) and 20 repetitions. The treatments were:
Beekeepers using the GAP on a higher level, with bee product extraction unit (BPEU)
within the standards required by legislation (Treatment 1 – Level 1), Beekeepers that do
not use correctly the GAP with BPEU out of the standards required by legislation
(Treatment 2 - Level 2), Beekeepers who do not use correctly the GAP and do not have
BPEU (Treatment 3 - Level 3). We applied a questionnaire to collect data from all
Beekeepers sampled. The questionnaire, with opened and closed questions, was divided
into five sections, namely: A- Materials Used, B-Location and installation of apiaries;
C-Management of beehives, D-Collection and transportation of the comb with honey;
F- Bee Product Extraction Unit. The samples were analyzed as for physic-chemical
(moisture, acidity, pH, HMF, ash, solids insoluble in water and water activity - Aa),
sensorial (color) and microbiological parameters (Salmonella, coliform count at 35ºC
and 45°C and counting of yeasts and molds). As for the physic-chemical parameters
analyzed the results were the same (except ash) (p <0.05) among treatment one and the
others, the samples remained within the current legislation standards. There were no
coliforms at 35ºC and 45°C or Salmonella spp. in the samples. As for filamentous molds
and yeasts values higher than 1.0 CFU / g (log 10) were found in 50%, 90% and 80% of
the samples as for treatments one, two and three, respectively. After six months storage,
the occurrence of fermentation was observed in 20% and 15% of samples from
treatment two and three. This fact can be explained by higher moisture Aa observed as
for these treatments, from which 60% and 45% of samples exceeded Aa 0.61, versus
5% for treatment one. The use of GAP is an effective tool for differentiating beekeepers
and to reduce possible risks to mellifera. honey, from field to BPEU, mainly for the
maintenance of the physic-chemical and microbiological qualities of mellifera honey. It
is important to assess microbiological and physic-chemical aspects (mainly moisture
and Aa) of honey during storage, so that the storage length can be evaluated.
1. INTRODUÇÃO
A criação de abelhas é hoje uma importante atividade agropecuária no
Brasil, representando trabalho e renda para muitas famílias de pequenos e médios
produtores rurais. O grande impulso ao crescimento da apicultura aconteceu após 2001,
quando o Brasil iniciou as exportações de mel para a Europa e Estados Unidos. Até
então, toda a produção nacional era comercializada no mercado interno (SENAI,
2009a).
No Brasil, a apicultura forma uma cadeia produtiva com mais de 300 mil
apicultores e cerca de 100
unidades de processamento de mel, que juntos empregam,
temporária ou permanentemente, quase 500 mil pessoas (USAID, 2006).
Dos produtos obtidos da colmeia, o mel é o mais importante, sendo o
principal objetivo da exploração apícola brasileira. A quantidade de mel produzida no
Brasil aumentou em mais de 50% entre os anos de 2005 e 2009. Estima-se que a
produção total esteja em torno de 40 a 45 mil toneladas por ano. A participação do setor
apícola brasileiro no mercado internacional provocou mudanças em toda a cadeia
produtiva da apicultura, sendo a busca por qualidade uma das mais observadas (SENAI,
2009a).
A produção de mel existe praticamente em todo o território brasileiro.
Porém, é na região Sul em que se tem a maior produção (42,5%), sendo o Rio Grande
do Sul o maior produtor nacional, detendo 18,4% da produção. A região Nordeste é a
segunda maior produtora nacional, com 38,6% da totalidade, destacando-se o Piauí, o
quinto maior produtor nacional (IBGE, 2009).
Neste contexto, é crescente a preocupação com a manutenção da qualidade
do mel produzido no Brasil, bem como o conhecimento da variação das características
utilizadas como indicadoras de qualidade.
Desta forma, torna-se importante estudar e quantificar o comportamento de
parâmetros indicadores de qualidade, em todas as etapas do processo produtivo, gerando
informações que possam minimizar a deterioração e, consequentemente, prolongar a
vida de prateleira dos méis.
Estruturalmente este trabalho está dividido em três capítulos, sendo uma
revisão de literatura e dois artigos científicos em que: os capítulos 1 e 3 obedecem ao
formato da revista Archivos de Zootecnia (Espanha) e o capitulo 2 o da revista Ciência
e Agrotecnologia (UFLA). O restante da tese segue a formatação recomendada pelo
Programa de Pós-Graduação em Ciência Animal da UFPI.
No estudo realizado, os objetivos foram:
Geral:
Analisar a qualidade do mel de abelhas em função do nível de utilização das
boas práticas apícolas pelos apicultores.
Específicos:
Apresentar uma revisão de literatura com os principais critérios indicadores da
qualidade do mel de abelhas Apis mellifera L..
Avaliar as condições higiênico-sanitárias, do campo às unidades de extração de
produtos apícolas, em três diferentes níveis de utilização de boas práticas no estado
do
Piauí.
Analisar as características físico-químicas e microbiológicas de amostras de mel
de abelhas Apis mellifera L., em função do nível de utilização das boas práticas apícolas
no Estado do Piauí.
2. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA e CAPÍTULO 1
Critérios de qualidade do mel das abelhas Apis mellifera L: revisão
1Criteria for quality of honey Apis mellifera L.: review
Moura, S. G.
2, Muratori, M.C.S.
3, Monte, A. M.
4, Carneiro, R. M.
5; Souza, D.C.
61
Parte da Tese de Doutorado do primeiro autor.
2
Engenheiro Agrônomo, Mestre- Professor- Departamento de Zootecnia-Universidade Federal do Piauí. Campus Professora Cinobelina Elvas (UFPI/CPCE), BR 135, Km 3, Bairro Planalto Horizonte/Cibrazém, CEP: 64.900-000. Bom Jesus. Piauí. Brasil. sinevaldo.moura@yahoo.com.br;
3
Medica Veterinária, Doutora, Professora-Departamento de Morfofisiologia Veterinária-CCA-UFPI-- christina@ufpi.br
4
Médica Veterinária- montealine@yahoo.com.br
5
Nutricionista. Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Alimentos e Nutrição UFPI- madeira@yahoo.com.br
6
Engenheiro Agrônomo, Doutor- Professor-Departamento de Zootecnia – CCA – UFPI. darcet@terra.com.br
Palavras-Chave: Físico-química, microbiologia, legislação, Exigências de mercado, Boas Práticas Apícolas.
Keywords: Physic-chemistry, microbiology, laws, Market Requirements, Good Apicultural Practices.
Resumo
Na presente revisão objetivou-se apresentar os principais critérios indicadores da qualidade do mel de abelhas Apis
mellifera L.. Para tanto, foram apresentadas as análises preconizadas na legislação brasileira (BRASIL, 2000), que
estão divididas em: sensorial (Cor) e físico-químicas que compõem três grupos: A- Indicadoras de maturidade
(umidade, açúcares redutores e sacarose aparente), B- Indicadoras de pureza (minerais-cinzas e sólidos insolúveis
em água), C- indicadoras de deterioração (acidez, atividade de diástases e hidroximetilfurfural-HMF); bem como
são descritos outros critérios e características que constam na literatura como importantes para qualidade do mel,
tais como: atividade de água, pH, higroscopicidade, cristalização, pesquisa de sujidades e matérias estranhas e
microbiologia. Além destes indicadores, são apontadas as seguintes exigências de mercado: Boas Práticas Apícolas
(BPA) e a participação no Programa Nacional de Controle de Resíduos para o mel (PNCR). O conhecimento dos
indicadores de qualidade do mel é ferramenta imprescindível para o entendimento de como proceder corretamente
em todas as etapas do processo produtivo. A implantação de BPA é indicada como garantia para obtenção de
alimentos com melhor qualidade físico-química e microbiológica, garantindo a permanência em mercados
exigentes, reduzindo o risco de contaminação do mel com Clostridium botulinum.
Abstract
In this review, we aimed at presenting the main quality indicator criteria for honey bee Apis mellifera L. More
specifically, we presented the analysis recommended for the Brazilian legislation (BRASIL, 2000) that are divided
into sensory (color) and physical-chemical properties, which constitute three groups: 1 - Indicator of maturity
(moisture, reducing sugars and apparent sucrose), 2 - indicator of purity (mineral-ashes and insoluble solids in
water), 3 - spoil index (acidity, diastases activity and hydroxymethylfurfural,-HMF), other criteria and
characteristics are described as they appear in literature as important to honey quality, such as: water activity, pH,
hygroscopicity, crystallization, search for dirt and strange material and microbiology. In addition to these
indicators, the following market requirements are pointed out: Good Agricultural Practices (GAP) and the
participation in the Honey National Waste Control (HNWC). The implementation of GAP is indicated as a
guarantee for a better physic-chemical and microbiological quality of food, guaranteeing the maintenance in
demanding markets, reducing the risk of honey contamination with Clostridium botulinum.
INTRODUÇÃO:
1 - Apicultura
A criação de abelhas é hoje uma importante atividade agropecuária no Brasil, representando trabalho e
renda para muitas famílias de pequenos e médios produtores rurais. O grande impulso ao crescimento da apicultura
aconteceu após 2001, quando o Brasil iniciou as exportações de mel para a Europa e Estados Unidos. Até então,
toda a nossa produção era comercializada no mercado interno (SENAI, 2009a). A apicultura forma uma cadeia
produtiva com mais de 300 mil apicultores e cerca de cem unidades de processamento de mel, que juntos
empregam, temporária ou permanentemente, quase 500 mil pessoas. (USAID, 2006).
Dos produtos obtidos da colmeia, o mel é o mais importante, sendo o principal objetivo da exploração
apícola brasileira. A quantidade de mel produzida no Brasil aumentou em mais de 50% entre os anos de 2005 e
2009. Estima-se que a produção total esteja em torno de 40 a 45 mil toneladas por ano. A participação do setor
apícola brasileiro no mercado internacional provocou mudanças em toda a cadeia produtiva da apicultura, sendo a
busca por qualidade uma das mais observadas (SENAI, 2009a).
A produção de mel existe praticamente em todo o território brasileiro. Porém, é na região Sul em que
se tem a maior produção (42,5%), sendo o estado do Rio Grande do Sul o maior produtor nacional, detendo 18,4%
da produção. A região Nordeste é a segunda maior produtora nacional, com 38,6% da totalidade, destacando-se o
estado do Piauí, o quinto maior produtor nacional (IBGE, 2009).
As características indicadoras da qualidade do mel ainda são pouco conhecidas, principalmente nas
regiões tropicais onde existe uma flora apícola bastante diversificada, associada a taxas elevadas de umidade e
temperatura. No Brasil, devido à grande diversidade na flora apícola, torna-se necessária uma caracterização e,
posteriormente, criações de padrões de qualidade do mel, levando em consideração os fatores vegetais, edáficos e
climáticos das respectivas regiões onde são produzidos (SODRÉ et al., 2000).
Neste contexto, é crescente a preocupação com a manutenção da qualidade do mel produzido no
Brasil, bem como o conhecimento das características utilizadas como indicadoras de qualidade.
Na presente revisão, objetivou-se apresentar os principais critérios indicadores da qualidade do mel de
abelhas Apis mellifera L., bem como descrever outros critérios e características importantes que constam na
literatura brasileira e internacional.
2 – Mel
2.1. Conceito.
Pela definição da legislação brasileira (BRASIL, 2000), entende-se por mel “o produto alimentício
produzido pelas abelhas a partir do néctar das flores e de secreções procedentes de partes vivas de certas plantas, ou
de secreções de insetos sugadores de plantas que vivem sobre algumas espécies vegetais que as abelhas recolhem,
transformam, combinam com substâncias específicas próprias, armazenam e deixam maturar nos favos da
colmeia”.
O néctar é uma secreção das flores composta de uma solução de açúcares que varia de 5,0% a 80,0%,
dos quais cerca de 95,0% destas substâncias são açúcares e o restante são aminoácidos (0,05%), minerais
(0,02-0,45%), ácidos orgânicos, vitaminas e compostos aromáticos. O valor de uma planta para as abelhas é determinado
pela qualidade e quantidade secretada destes açúcares (BOGDANOV, 2010).
Na produção do mel, as abelhas carregam o néctar, misturam com secreções das suas glândulas
salivares, transportam para a colmeia, passando o produto em seguida para as abelhas encarregadas, que o
distribuem entre elas para o processo de amadurecimento, depositam nos favos, misturando mais secreções
glandulares. Em seguida retiram aproximadamente 50% de água pela formação de corrente de ar seco, causada pela
ventilação até que o teor de umidade atinja em torno de 18%, quando as mesmas promovem a operculação
(SIDDIQUI, 1971, HUCHET ET COUSTEL, 2003).
2.2 Composição do mel
Segundo Crane (1983), 181 substâncias diferentes já haviam sido identificadas no mel, algumas
exclusivas. Os principais componentes são os açúcares, dos quais os monossacarídeos frutose e glicose (cerca de
70,0% do total); dissacarídeos, incluindo sacarose (em torno de 10%) e a água na qual estes açúcares estão
dissolvidos (17,0 a 20,0%).
Bogdanov (2010) argumenta que o mel de abelhas Apis possui para os parâmetros físico-químicos as
seguintes médias: 17,3% para o teor de umidade ; 79,7% de açúcares totais (Glicose de 31,3% e Frutose de 38,2%);
0,2 de minerais e 3,9 de pH.
Os méis brasileiros foram caracterizados pela utilização dos parâmetros físicos e químicos, visando
gerar subsídios para orientar a produção e processamento adequados, visando garantir a qualidade deste produto no
mercado. Para a caracterização dos méis também é importante considerar a diversidade botânica e variações
edafoclimáticas de cada região (SODRÉ et al., 2000). Assim, trabalhos têm sido desenvolvidos no Brasil (Tabela
01) e em vários países do mundo (Tabela 02), com a finalidade de se estudar as características físico-químicas do
mel.
3. Legislação Brasileira
A legislação brasileira estabelece parâmetros sensoriais, físicos e químicos como requisitos para a
qualidade e classificação do mel, no entanto, não contempla padrões microbiológicos, que fazem parte da
legislação anterior (BRASIL, 1997). Assim, são descritos a seguir as características preconizadas na legislação,
bem como outros requisitos que continuam sendo estudados em várias partes do mundo, inclusive no Brasil.
3.1 - Características Sensoriais
As características sensoriais estão intimamente relacionadas à origem floral de cada mel, sendo a cor
um dos principais parâmetros na hora da compra.
3.1.1 Sabor
De um modo geral, o sabor do mel está relacionado ao seu aroma e a doçura. Estas duas características
dependem de substâncias complexas no mel, ou derivadas das suas fontes vegetais, por isto, méis diferentes têm
aromas e sabores diferentes (CRANE, 1983).
3.1.2 Cor
A cor do mel é uma das características sensoriais (BRASIL, 2000) e um dos parâmetros de
classificação comercial. Os méis são ordenados do branco d’água ao âmbar escuro (Tabela 3), conforme padrões
estabelecidos na escala de Pfund (MARCHINI et al., 2004b). Este parâmetro pode ser determinante para o valor do
mel no mercado internacional, neste contexto, os mais claros atingem os melhores preços em relação aos escuros.
Dentre os fatores são determinantes para a cor do mel destacam-se: origem floral, processamento,
armazenamento, aspectos climáticos durante o fluxo do néctar e a temperatura na qual o mel amadurece na colmeia
(SEEMANN; NEIRA, 1988). A cor também pode ser influenciada pelo conteúdo de minerais, em que méis mais
claros contem níveis mais baixos deste componente. Outros fatores como: ácidos, conteúdo de nitrogênio e de
frutose, cor inicial e produção de HMF também interferem na coloração dos méis. Durante o armazenamento o mel
torna-se mais escuro e este processo pode ser acelerado ela estocagem em temperaturas altas (CRANE, 1983).
3.1.3. Consistência
A consistência do mel é variável de acordo com o estado físico em que o mel se apresenta, sendo que
na legislação brasileira (BRASIL, 2000), o mel pode ser classificado em cristalizado ou granulado (que sofreu um
processo natural de solidificação, como conseqüência da cristalização dos açúcares) e cremoso (é o mel que tem
uma estrutura cristalina fina e que pode ter sido submetido a um processo físico, que lhe confira essa característica
e que o torne fácil de untar).
3.2. - Características Físico-químicas
A legislação brasileira (BRASIL, 2000) e o Codex Alimentarius (2001) estabelecem parâmetros
indicadores de qualidade físico-química do mel de abelhas melliferas que estão divididos em três grupos:
indicadoras de maturidade, pureza e deterioração (Tabela 04) e que podem ser utilizadas para auxiliar na detecção
de possíveis falhas no processo produtivo.
3.2.1. - Indicadores de maturidade
Os indicadores de maturidade do mel são os parâmetros que representam a maior parte da composição
final do produto e que em função do néctar coletado pela abelha apresenta para méis florais a seguintes exigências
composição.
a) Açúcares (glicose, frutose e sacarose)
As propriedades físico-químicas do mel como a viscosidade, higroscopicidade e granulação, são
influenciadas pelos açúcares do mel (CAVIA et al., 2002). Os açúcares estão presentes na maior proporção dentre
os constituintes do mel, dos quais cerca de 70% são monossacarídeos (frutose e glicose), 10% são dissacarídeos
(incluindo sacarose) e 17% a 20% de água na qual os açúcares estão dissolvidos. A frutose e a glicose existentes no
mel podem já estar presentes nos substratos utilizados, ou podem ser produzidos pela inversão da sacarose pela
ação da enzima invertase durante o processamento do mel pelas abelhas (CRANE, 1983; MOREIRA; DE, 2001;
BOGDANOV, 2010).
Méis de diferentes origens florais diferem quanto à tendência a cristalização, sendo a mesma acelerada
em méis refrigerados. A formação de cristais no mel pode ser influenciada por várias causas, dentre elas: cristais
puros de hidratos de dextrose, bolhas de ar e pólen. Os estudos que tentam explicar a previsão da cristalização são
contraditórios e utilizam, principalmente, a razão entre os principais componentes do mel (glicose, frutose e água)
e, o que tem se proposto, para a maioria dos casos, é que a presença ou ausência de núcleos de cristalização tem
sido utilizada como a causa verdadeiramente envolvida com a granulação. A cristalização pode ser classificada
como: rápida (até um mês); mediana (entre um e 12 meses); lenta (entre um e quatro anos) e escassa (entre quatro e
cinco anos) (CRANE, 1975; MOREIRA; DE MARIA; 2001; MANIKIS; THASIVOULOU, 2001).
b) Umidade
Na composição do mel a água constitui o segundo componente em quantidade, variando de 15,0 a
21,0%, conforme o clima, a origem floral e a colheita antes da maturação completa. Normalmente o mel maduro
possui umidade inferior a 18,5%. Este parâmetro é uma das características mais importantes pela influência na
viscosidade, peso específico, maturidade, cristalização, sabor, conservação e palatabilidade (SEEMANN; NEIRA,
1988; HUCHET ET COUSTEL, 2003).
Bogdanov (2010) estabelece um intervalo de 15% a 20% para a umidade nos méis e ressalta que este
parâmetro é importante para avaliar a vida de prateleira sendo obseravados que valores superiores a 17,0% podem
ocasionar fermentação, por favorecerem o desenvolvimento das leveduras. Estes índices podem ser alterados
durante o processamento e estocagem, pois o mel, por ser higroscópico, absorve a umidade relativa de ambientes
com valores superiores a 60% (BOGDANOV, 2010). Devido à sua importância, a umidade é pesquisada em
diferentes
países com valores que oscilam entre 13,0% (SORIA et al., 2004) a maiores que 21% (SANTOS, 2009)
(Tabelas 1 e 2).
3.2.2. Indicadores de Pureza
Os indicadores de pureza estão relacionados ao processamento adequado do mel, uma vez que os
valores máximos permitidos indicam apenas o que é proveniente do próprio processamento do mel pela abelha.
a) Sólidos Insolúveis em água
Os sólidos insolúveis são as partículas do mel maiores que 15,40µm e que não são solúveis em água a
80º C. Grãos de areia, restos vegetais e madeira que não atendem a essa determinação significam falhas na
execução das BPA em todo o processo produtivo (SENAI, 2009b). As partículas inerentes ao mel que compõem os
sólidos insolúveis devem estar presentes em quantidades inferiores a 0,1% (BRASIL, 2000).
Na literatura os resultados para esse parâmetro são escassos e os valores médios para sólidos em
percentual variaram de 0,01 (RODRIGUES et al., 2005) a 1,56 (SANTOS, 2009), (Tabelas 1 e 2).
b) Cinzas
A análise de cinzas permite determinar algumas irregularidades no mel, como a falta de higiene e a
não decantação e/ou filtração no final do processo de retirada do mel pelo apicultor. O seu conteúdo no mel floral
deve ser de no máximo 0,6% (BRASIL, 2000), e esse depende da composição do néctar e do tipo de solo em que a
planta se encontra (CRANE, 1975).
O conteúdo de cinzas é considerado como critério de qualidade relacionado à origem botânica do mel
(BOGDANOV, 2010) e está entre os componentes que interferem na cor do mel (CRANE, 1983). Na literatura
(Tabelas 1 e 2) foram observados valores médios para o teor de cinzas, variando de 0,003 (SORIA et al., 2004) a
2.67% (SANTOS, 2009).
3.2.3. Indicadores de Deterioração
Os indicadores de deterioração estão entre os mais importantes para a qualidade do mel, destacando-se
o hidroximetilfurfural (HMF) que, por sua relevância, é o composto mais discutido na literatura. As temperaturas
elevadas consistem no principal fator que pode acelerar a alteração destes indicadores e, consequentemente, do mel.
a) Hidroximetilfurfural (HMF)
Alcázar et al. (2006) afirmaram que o HMF é formado durante uma hidrólise ácida de hexoses,
formado a partir de açúcares simples, como glicose e frutose que são quebrados na presença de ácido glucônico e
outros ácidos do mel. Assim, a formação de HMF no mel é acompanhada por uma correspondente redução de
açúcares simples a D-glicose.
A importância da detecção do HMF no mel tem crescido uma vez que a quantidade deste composto é
aumentada em méis submetidos a altas temperaturas (CRANE, 1983). Louise et al. (2009) argumentam que ainda
não está definida se a exposição humana ao HMF representa um risco potencial à saúde, porém, ressaltam os
seguintes pontos para discussão sobre o assunto: em concentrações elevadas é citotóxico, causa irritação nos olhos,
no trato respiratório superior, na pele, nas mucosas e nas membranas. Em ratos foi determinada como DL50 por via
oral doses de 3,1 g de HMF por kg de peso. Também há uma indicação de papilomas da pele descrita após
aplicação tópica de 10 ± 25 mmol de HMF em ratos. Para Janzowski et al. (2000) e Louise et al. (2009) o HMF só
ocasiona dano ao DNA em concentrações muito elevadas e, que normalmente, estão associadas a diminuição
concomitante na viabilidade celular.
Relação entre HMF e temperatura:
A exposição direta ao sol favorece a diminuição da vida útil das colmeias, dificulta a termorregulação,
o que aumenta a mortalidade das crias e pode aumentar o teor de HMF, e diminuir a invertase e diastase do mel.
(CAMARGO, 1972). O aquecimento ou altas temperaturas de estocagem favorecem a formação acelerada de HMF
no mel, causando perda de aroma e da atividade bacteriostática. Por este motivo, países têm estipulado padrões para
valores máximos deste composto (PICHELER et al., 1984).
Devido à elevada temperatura ambiente dos países subtropicais os méis podem apresentar
naturalmente HMF em valores altos sem que tenha havido superaquecimento ou adulteração, sendo que cada 10ºC
acrescido à temperatura de estocagem acelera em 4,5 vezes a formação de HMF (Tabela 05) (WHITE JR, 1975;
WHITE JR, 1992). Na literatura foram observados, em várias partes do mundo, valores médios em mg.kg
-1de
HMF, variando de 0,0 (SORIA et al., 2004) a 471,0 (MENDES et al., 1997) (Tabelas 1 e 2).
b) pH e Acidez
O mel é um alimento ácido por possuir pH médio de 3,9 e esta acidez é importante tanto para
preservação, por dificultar a ação de microrganismos, como também para realçar seu sabor. O principal ácido
presente no mel é o ácido glucônico, embora existam outros, como o fórmico, acético, benzóico, butírico, cítrico,
iso-valérico, lático, maleico, málico, oxálico, fenilacético, propiônico, piroglutânico, succínico e valérico. O pH no
mel pode estar diretamente relacionado com a composição floral nas áreas de coleta e pelas condições de solos,
uma vez que o mesmo poderá ser influenciado pelo pH do néctar (CRANE, 1983).
Na literatura os valore médios de pH vão desde 2,66 (SANTOS, 2009) a 5,90 (ZAPPALAM et al.,
2005). O conteúdo de ácidos no mel é relativamente baixo, porém, são importantes para o sabor do mesmo. Os
valores médios para acidez em meq.kg
-1encontrados em trabalhos oscilam de 8,81 (ARRUDA et al., 2005) a
118,41 (SANTOS, 2009), (Tabelas 1 e 2). Muitos ácidos são adicionados pelas abelhas. O principal é o ácido
glucônico, que resulta da oxidação da glicose pela glucose oxidase (BOGDANOV, 2010).
c) Diastases (Enzimas)
Numerosas enzimas são encontradas no mel: invertase, -amilase, -amilase, -glucosidade e a
glucoseoxidase que é capaz de transformar a glicose em ácido glicônico. O mel contém também uma catalase e
uma fosfatase. Estas diastases são destruídas pelo aquecimento exagerado do mel (HUCHET, 2003).
A atividade da diástase no mel, quantificada usualmente através da α-amilase, é um fator de
qualidade que pode ser alterado durante o processamento e armazenamento do mel, por isso, é utilizado como
indicador de aquecimento e frescor (BOGDANOV et al., 2006). A atividade diastásica varia com a origem botânica
do mel, sendo que o valor mínimo permitido na legislação (BRASIL, 2000) é de 8,0 unidades de diástase.
Entretanto, ao interpretar os resultados da atividade de diástase, deve-se considerar que alguns méis monoflorais
possuem uma atividade baixa natural, implicando em uma análise que tem um poder limitado como indicadora de
deterioração (BOGDANOV et al., 2010).
4- Outros Critérios de Qualidade
a) Pesquisa de sujidades e matérias estranhas
Qualquer material diferente, não pertencente ao alimento, que possa estar nele contido, devido à
ocorrência anormal ou de condições e práticas inadequadas durante as fases de produção, armazenagem ou
distribuição é denominado sujidades ou matérias estranhas (AOAC, 2000).
As sujidades podem indicar contaminação por fontes secundárias que incluem os manipuladores,
equipamentos e instalações. Estas fontes secundárias são controladas por meio de BPA (SNOWDON; CLIVER,
1996; SODRÉ, 2003).
No Manual de Segurança Alimentar para Apicultura (SENAI, 2009b) pode ser observado o perigo de
contaminação do mel por sujidades como grãos de areia, restos vegetais e madeira, que estão presentes desde o
manejo das colmeias no campo, até o envase na unidade de extração de produtos apícolas (UEPA), sendo as
mesmas controladas pela implantação das BPA.
Este perigo foi confirmado por Souza; Carneiro (2008) em pesquisa sobre sujidades e matérias
estranhas em mel de abelhas melliferas do Piauí, em que 65,47% das amostras estudadas não atendiam aos aspectos
macroscópicos e microscópicos e aos padrões de identidade e qualidade estabelecidos para o mel (BRASIL, 2000),
por apresentarem sujidades e matérias estranhas, tais como: insetos, larvas, ácaros, pelos humanos e de roedores,
traças, dentre outras.
b) Atividade de água (Aa)
A atividade de água de um alimento expressa a relação entre a pressão do vapor de água do alimento e
a pressão do vapor da água pura, medidas à mesma temperatura, graduada em escala de zero a um (MUNGOI,
2008) e mensurada em valores de Aa. É uma unidade proporcional ao conteúdo de água e também de solutos
presentes nos alimentos (BOGDANOV, 2010).
Em méis, a quantidade de água (17,2%) e de açúcares (79,7%) é limitante para o crescimento de
microrganismos e os valores totais de atividade não são critérios determinantes para deterioração por bactérias
(BOGDANOV, 2010). Contudo, valores de Aa inferiores a 0,61 são limitantes para o crescimento de fungos
filamentosos e de leveduras (DENARDI et al., 2005).
Assim, o uso de atividade de água é recomendado para presumir a estabilidade do armazenamento do
mel, como forma complementar a avaliação da umidade. Esta conjectura se deve não apenas pela previsão da
possível fermentação durante a estocagem, mas também, para calcular a variação da umidade quando o mel é
exposto a diferentes ambientes de umidade relativa (CHIRIFE et al., 2006). Na literatura, autores encontraram
valores para Aa variando de 0,46 (KAČÁNIOVÁ et al., 2007) a 0,72 (BENDINI; SOUZA, 2008) (Tabelas 1 e 2).
c) Microrganismos
A legislação Brasileira (BRASIL, 2000) e Internacional (MERCOSUL, 1999) não estabelecem os
padrões microbiológicos para o mel de abelhas. No Brasil, essas exigências faziam parte do regulamento técnico de
identidade e qualidade do mel (BRASIL, 1997). A fundamentação provável da retirada destes parâmetros foi
baseada nas próprias características do mel, tais como: baixa atividade de água, alta concentração de açúcares e
baixo pH, o que lhe confere, uma proteção natural contra microrganismos.
Dentre os perigos aos quais o mel está exposto, o biológico é o mais importante por estar relacionado à
alteração por fermentação causada por leveduras, até a presença de bactérias esporuladas como o Clostridium
botulinum, que podem causar doenças e morte para o consumidor. Por ser um microrganismo ambiental, o mel
pode ser contaminado por seus esporos aderidos às pernas das abelhas ou veiculados pelo vento, quando os favos
ainda estão no campo (FINOLA et al., 2007; SENAI, 2009a). Embora não existam casos confirmados de botulismo
infantil no Brasil, relacionado ao consumo de mel, o mesmo não é recomendado para crianças menores de um ano
de idade, pois foram detectadas colônias de botulinum que produzem toxinas ativas em 7% das amostras de mel
comercial em pesquisa realizada em São Paulo ( RAGAZANI et al., 2008). Apesar de ser raro, no Japão ocorreu
um caso relacionado ao consumo de mel por crianças menores de três meses (ABE et al., 2008) e na França
ocorreram dois casos de botulismo infantil (KING et al., 2010).
Quando se refere aos fungos filamentosos e leveduras, altas contagens foram encontradas por: Barros
(2003) que obteve contagens de menores que 1,0 a 3,69 UFC/g
-1(log
10) para méis industriais e menores que 1,0 a
2,69 UFC/g
-1(log
10) para méis artesanais, apontando correlação entre a contagem de fungos e o teor de umidade;
enquanto para Malika (2005), os valores oscilaram de 0,0 a 2,3 UFC/g
-1(log
10); Kačániová (2007) de 2 a 3,65
UFC/g
-1(log
10) e Boff et al (2008) de 1,3 a
2,89 UFC/g
-1(log
10).
Estes resultados apontam para a necessidade se levar em conta as análises microbiológicas, associadas
às físico-químicas no mel, como forma de se ter uma maior garantia das condições higiênico-sanitárias e do uso de
BPA em todas as etapas do processo produtivo.
5 – Exigências Legais e de Mercado
O Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) estabelece regulamentos de
funcionamento para os estabelecimentos que processam mel, exigindo deles programas de garantia da qualidade
como as BPA, a Análise de Perigos e Pontos Críticos de Controle (APPCC) e a participação no Programa Nacional
de Controle de Resíduos para o mel (PNCR) (BRASIL, 2007; SENAI, 2009a).
a) Boas Práticas Apícolas (BPA)
A alternativa para a produção de um alimento seguro é a implantação das Boas Práticas Apícolas
(BPA) em todas as etapas do processo produtivo. As BPA consistem em ferramentas que o apicultor utiliza para a
diminuição de riscos de contaminação e a manutenção da qualidade do mel produzido e, sem a aplicação das
mesmas, será cada vez mais difícil o apicultor conseguir comercializar o seu mel e permanecer no mercado
(SENAI, 2009a).
O mel produzido por mellifera, quando comparado com outros produtos de origem animal, apresenta
um baixo número e menor variedade de microrganismos, porém, não é um alimento estéril, estando susceptível às
contaminações. Esta contaminação pode estar associada à veiculação de microrganismos pelas próprias abelhas, ao
seu beneficiamento ou manipulação inadequada e às más condições de armazenamento e acondicionamento
(SILVA, 2004).
Após a colheita, o mel continua sujeito às modificações físico-químicas, microbiológicas e sensoriais.
Isto gera a necessidade de produzi-lo dentro de níveis elevados de qualidade, controlando todas as etapas do seu
processamento, afim de que se possa garantir um produto de melhor qualidade (ARAÚJO et al., 2006). As fontes
secundárias de contaminação, que influenciam outros produtos alimentícios, também podem ocorrer no mel. Estas
incluem os manipuladores, contaminação cruzada, equipamentos e instalações, que podem ser controladas pelas
BPA, reduzindo ainda os riscos de contaminação do mel com esporos de botulinum (SNOWDON; CLIVER, 1996;
RAGAZANI et al., 2008; SENAI, 2009a).
Deste modo, recomenda-se que sejam aplicadas as BPA desde os apiários até os entrepostos para que
haja a garantia da qualidade do mel produzido e processado (SILVA et al., 2008).
b) Contaminantes químicos
A garantia da inocuidade de grande parcela dos alimentos ofertada ao consumo, quanto à presença de
resíduos decorrentes do emprego de drogas veterinárias, agroquímicos e contaminantes ambientais, é possibilitada
pelo controle de resíduos.
O Programa de Controle de Resíduos Biológicos em Mel (PCRBM), objetiva garantir a produção e a
produtividade do mel no território nacional, bem como o aporte dos produtos similares importados. Dentre os
contaminantes do PNCR constam: antibióticos (Penicilina, Estreptomicina, Cloranfenicol, Tetraciclina,
Eritromicina, Neomicina, Oxitetraciclina, Clortetraciclina); Sulfonamidas (Sulfadimetoxina, Sulfametazina,
Sulfatiazol); outras drogas (Nitrofurazona e Furazolidona) e Metais Pesados (Arsênio, Chumbo, Cádmio)
(BRASIL, 2007). A abelha explorada no Brasil (Africanizada) apresenta como principal característica, a resistência
às pragas e doenças e, por isso, não há nos méis no Brasil registros de contaminação com antibióticos.
Quando se refere aos metais pesados, alguns trabalhos apontam a presença destes no mel, sendo o Pb e
Cd os mais comuns, por estarem presentes no solo, podendo alcançar as matérias-primas de produtos apícolas
(néctar, pólen e exu dado de plantas) por ar, água, solo e plantas e, em seguida, ser transportada para a colmeia
pelas abelhas (BOGDANOV, 2006).
CONCLUSÕES
O conhecimento dos principais critérios indicadores da qualidade do mel e da legislação são
ferramentas imprescindíveis para o entendimento de como proceder corretamente em todas as etapas do processo
produtivo.
A implantação de BPA é colocada na literatura como garantia para se obter um alimento com melhor
qualidade físico-química e microbiológica e a permanência em mercados exigentes e, reduzem, mas não eliminam
o risco de contaminação do mel com botulinum.
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