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A (in)admissibilidade da prova psicografada no processo penal

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UNIJUI – UNIVERSIDADE REGIONAL DO NOROESTE DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL

ANDERSON SCHERNER KIST

A (IN)ADMISSIBILIDADE DA PROVA PSICOGRAFADA NO PROCESSO PENAL

Ijuí (RS) 2012

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ANDERSON SCHERNER KIST

A (IN)ADMISSIBILIDADE DA PROVA PSICOGRAFADA NO PROCESSO PENAL

Monografia final do Curso de Graduação em Direito da Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul – UNIJUI, apresentado como requisito parcial para a aprovação no componente curricular de Trabalho de Curso - TC.

DCJS - Departamento de Ciências Jurídicas e Sociais.

Orientadora: MSc. Patrícia Marques Oliveski

Ijuí (RS) 2012

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Dedico este trabalho aos meus avós maternos, Ilga e Ubaldo, por terem me cuidado com tanto amor e carinho na minha infância. Pois, se hoje sou um bom sujeito, devo isso a eles com certeza.

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AGRADECIMENTOS

Àqueles que me proporcionaram a vida, a formação moral e intelectual, e as oportunidades que tive: meus pais, Pedro e Nelci.

Ao meu irmão, Cristófer, pelo carinho e amizade e, principalmente, pela paciência com que me aguenta.

A professora, Patrícia Marques Oliveski, que aceitou me orientar e por ter me conduzido na realização deste trabalho.

A todos os professores do Curso de Direito da Unijuí, pela amizade e pelos ensinamentos e conhecimentos compartilhados ao longo da faculdade.

Ao meu primo, Rodolfo, que sempre esteve disposto e me ajudou por diversas vezes no decorrer do curso e por ter me dado dicas para a realização desta monografia.

Agradeço aos meus amigos e colegas pela parceria, por sempre estarem ao meu lado e que de alguma forma ajudaram para a execução do presente trabalho.

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“Pode-se admitir a dúvida, antes de estudar; a negativa, depois de se estudar; mas a negativa simples, sem estudos e provas, é vazia de senso e de responsabilidade.”

Miguel Timponi

“O maior benefício que se pode prestar às pessoas é ajudá-las a pensar criticamente sobre todas as coisas.”

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RESUMO

O presente estudo visa, a partir de uma caminhada processual, a discutir a admissibilidade da prova psicografada frente o princípio da ampla defesa. Iniciando-se desde a conceituação de prova e seu objeto, passando pelos sistemas de avaliação de prova, o ônus da prova, os meios de prova possíveis no processo penal, bem como os princípios basilares processuais e constitucionais. O ordenamento processual penal brasileiro não prevê a admissibilidade da carta psicografada como meio de prova, mas também não a exclui, embora vigente um Estado laico, no qual a liberdade de crença religiosa é garantia constitucional e todo meio de prova é admitido, exceto os ilícitos e ilegítimos. É, portanto, uma questão polêmica que repercute na comunidade jurídica e é discutida por duas correntes de entendimento. Entretanto, sua admissibilidade se torna possível pelo princípio constitucional da ampla defesa e o da plenitude de defesa, este último em especial aos procedimentos do Tribunal do Júri, mas sua utilização, porém, deve ocorrer com cautela e prudência.

Palavras-Chave: Processo penal. Meios de prova. Prova psicografada. Admissibilidade.

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ABSTRACT

The present study, from a procedural walk, wants to discuss the admissibility of psychographed evidence in the face of the principle of ample defense. Beginning from the concept of proof and its object, passing the assessment systems of proof, the burden of proof, the possible means of proof in criminal proceedings, as well as the basic principles of procedural and constitutional. The Brazilian penal procedural order does not provide their admissibility as an mean of proof, but also does not delete, although a prevailing a secular State, in which freedom of religious belief is constitutionally guaranteed and all evidence is admitted, except the illicit and illegitimate. It is, therefore, a contentious issue that affects the legal community and is discussed by two chains of understanding. However its admissibility is made possible by the constitutional principle of ample defense and fullness of defense, the latter in particular the procedures of the jury, but its use, however, should occur with caution and prudence.

Keywords: Criminal proceedings. Means of proof. Proof psychographed. Admissibility.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ... 9

1 A PROVA NO PROCESSO PENAL BRASILEIRO ... 10 1.1 Conceito e objeto da prova penal no Brasil ... 10-12 1.2 Sistemas de avaliação da prova penal ... 13-17 1.3 Ônus probatório e meios de prova ... 17-24

2 A AMPLA DEFESA E A PROVA PSICOGRAFADA ... 25 2.1 Princípios informadores da prova no processo penal brasileiro ... 25-26 2.2 Distinções entre provas legítimas, ilegítimas, lícitas e ilícitas ... 26-30 2.3 A ampla defesa e a prova psicografada ... 30-40

CONCLUSÃO ... 41-43

REFERÊNCIAS ... 44-47

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INTRODUÇÃO

A investigação pelo assunto se dá pelo fato de ser misterioso e causar fascínio. Busca-se com o preBusca-sente trabalho trazer algumas considerações e, quem sabe, clarear outras que Busca-se apresentem no seu desenvolvimento, sobre o uso da carta psicografada em processos penais, estudando-se, inicialmente, no primeiro capítulo o conceito e o objeto da prova, os sistemas de avaliação da prova, o ônus probatório e os meios de prova possíveis no processo criminal. Em seguida, no segundo capítulo, serão estudados os princípios informadores do processo penal, bem como as distinções entre prova lícita/ilícita e legítimas/ilegítimas, e ao final o uso da prova psicografada frente o princípio da ampla defesa.

A questão episódica já conta com nove julgados na seara criminal brasileira, que começaram a aparecer a partir do ano de 1976, sendo que a maioria teve, de certo modo, influência definitiva nos julgamentos, havendo, inclusive, posicionamento em instância superior sobre o tema. Serão apresentados também, no desenvolvimento do presente estudo, alguns casos judiciais já resolvidos em que se fez uso de tal carta.

No mais, sabe-se que o uso da carta psicografada como prova em processos penais tem sido tímido por seus aplicadores, mas quando o fazem, inquietam a comunidade jurídica e trazem novos e reflexivos debates sobre sua admissibilidade ou não no processo.

É sábio também deixar claro que o presente estudo não vem para dar ares finais ao debate que é, sem sombra de dúvidas, muito polêmico, denso e delicado, e sim trazer alguns argumentos que vem sendo desenvolvidos, por ambas as correntes, a fim de se defender ou não a admissibilidade da carta psicografada frente ao princípio da ampla defesa e, principalmente, sobre o peso/valor que tal prova não tipificada em lei pode atingir para auxiliar a decidir um processo judicial.

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1 A PROVA NO PROCESSO PENAL BRASILEIRO

Na busca pela verdade dos fatos no processo penal a produção da prova e sua apreciação judicial assume relevante importância no ordenamento jurídico brasileiro, notadamente quando um dos princípios fundantes da ação penal é a busca da verdade real. Neste propósito, o Código de Processo Penal prevê e arrola inúmeros meios de prova que estão à disposição das partes (acusação e defesa) para que possam cumprir seu ônus probatório e demonstrar em juízo a certeza e veracidade de suas teses.

A questão central desta pesquisa é questionar se somente as provas previstas em lei é que podem ser admitidas no processo penal brasileiro ou se é possível a produção de outras, em especial a prova psicografada e, neste caso, qual a sua validade jurídica. Para se cumprir com tal objetivo, necessário o estudo e a compreensão de todos os elementos e aspectos que norteiam a produção, utilização e valoração ou validade desta no processo penal, tal como se fará a seguir.

1.1 Conceito e objeto da prova penal no Brasil

Assim sendo, antes de adentrar em definitivo no tema deste estudo, imprescindível a análise do significado do termo “prova”. A palavra “prova” deriva do latim probare, que tem o significado de convencer, tornar crível, persuadir, estabelecer uma verdade, comprovar. (SANTOS FILHA, 2010, p. 57-58)

O termo “prova” no Dicionário Jurídico (1996, p. 645-646), possui 8 definições. Para o momento, destacam-se as seguintes:

(1) Meio legal empregado no processo para efeito de ministrar o órgão judicante os elementos de convicção necessários ao julgamento. [...] (3) Diz-se de todos os elementos legais, inclusive os moralmente legítimos, hábeis para apurar a verdade dos fatos em que se funda o pedido ou a defesa. [...] (7) Apresentação ou alegação do que têm as partes a oferecer em defesa de seu interesse.

O conceito de “prova” varia um pouco entre os doutrinadores penalistas, face sua múltipla utilização, mas, no entanto, segue sempre a mesma linha, na qual é

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o meio instrumental de que se valem os sujeitos processuais (autor, juiz e réu), de comprovar os fatos da causa, ou seja, os fatos deduzidos pelas partes como fundamento do exercício dos direitos de ação e de defesa. (RANGEL, 2009, p. 419) A produção de provas no processo penal tem como finalidade/objetivo construir um juízo de convencimento no julgador, as provas são apresentadas a ele a fim de que ao final, em sentença, conclua pela procedência ou improcedência da ação penal.

Acertadamente, Mirabete (2005, p. 274), em seu ensinamento, diz que

“provar” é produzir um estado de certeza, na consciência e mente do juiz, para sua convicção, a respeito da existência ou inexistência de um fato, ou da verdade ou falsidade de uma afirmação sobre uma situação de fato, que se considera de interesse para uma decisão judicial ou a solução de um processo.

Já o objeto da prova é o que se deve demonstrar, ou melhor, e como leciona Mirabete (2005, p. 275), é “aquilo sobre o que o juiz deve adquirir o conhecimento necessário para resolver o litígio. Abrange [...] todas circunstâncias objetivas e subjetivas que possam influir na responsabilidade penal e na fixação da pena ou na imposição de medida de segurança.”

Avena (2011, p. 468) sintetiza dizendo que: “São todos os fato, principais ou secundários, que reclamem uma apreciação judicial e exijam uma comprovação.” Em suma, são os acontecimentos, circunstâncias e alegações referentes a ação penal que possuem incerteza e precisam ser demonstrados ao magistrado, a fim de que emita um juízo de valor. Trata-se dos fatos relevantes.

Há, entretanto, algumas alegações que não necessitam de comprovação, os quais consistem em:

- Fatos axiomáticos ou intuitivos: são considerados aqueles evidentes por si mesmo, que decorrem da própria intuição, gerando grau de certeza irrefutável. “Nesses casos, se o fato é evidente, a convicção já está formada; logo, não carece de prova.” (CAPEZ, 2010, p. 343)

- Fatos notórios: são “aqueles cujo conhecimento integra a cultura normal, a informação dos indivíduos de determinado meio. Não há necessidade de se provar, p. ex., [...] que o Natal é comemorado em 25 de dezembro [...]” (MIRABETE, 2005, p. 276)

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- Presunções legais: são juízos de certeza que decorrem da lei. Com clareza, Mirabete (2005, p. 276), também classifica como “fatos presumidos” e ensina que presumir é

tomar como verdadeiro um fato, independentemente de prova, levando em conta aquilo que em geral acontece. Distingue-se a presunção absoluta (juris et de jure), que não admite prova em contrário, da presunção relativa (juris tantum), que pode ser afastada quando há prova que a contradiz.

Nesse caso, se a lei dá como verdadeiro determinado fato, está a parte dispensada de prová-lo, é a presunção absoluta. (GRECO FILHO, [s.d.])

- Fatos inúteis: são os que não possuem nenhuma relevância na decisão da causa, dispensando a análise pelo julgador. Esses fatos podem, inclusive, ser excluídos por não apresentarem qualquer relação com o que é discutido. (AVENA, 2011)

Fora os casos arrolados acima, todos os demais fatos devem ser provados no processo, “inclusive o fato admitido ou aceito (também chamado fato incontroverso, porque admitido pelas parte).” (CAPEZ, 2010, p. 344, grifo do autor)

Resumidamente, os fatos incontroversos são os fatos que não foram impugnados pelas partes e podem ser alvo de diligência, requerida pelo magistrado, em caso de dúvida. (AVENA, 2011) O direito, em regra, não necessita de prova, quanto mais se tratando de direito federal. Agora, se se tratar de direito municipal, estadual, estrangeiro ou consuetudinário o juiz pode determinar que a parte alegante lhe faça a prova do teor e da vigência. (CAPEZ, 2010)

Visto que provar tem como principal objetivo formar um juízo de convicção/certeza para o magistrado e que o objeto da prova tem por finalidade dar conhecimento ao julgador acerca das provas trazidas aos autos, no ponto a seguir estudar-se-á o sistema pelo qual o juiz forma sua convicção e fundamenta sua decisão a partir das provas apresentadas no processo.

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1.2 Sistemas de avaliação da prova penal

O sistema de provas que vai reger a forma de avaliação e interpretação de uma prova no processo penal é de fundamental importância, no entanto, antes de ingressar no assunto dos sistemas de prova do direito brasileiro, traz-se à baila um breve resgate histórico de como os juízes julgavam as pessoas no passado.

Aplicava-se, primitivamente, o sistema étnico e/ou pagão, em que a apreciação das provas era deixada por conta do juiz, por suas próprias impressões, e as valorava de acordo com a sua própria experiência, num sistema empírico. Ou seja, o julgador se apoiava exclusivamente no seu conhecimento e na sua experiência, e não em uma teoria/regra. Em seguida, vigorou o sistema religioso em que se invocava o julgamento divino, através das ordálias (ou ordálios), dos duelos judiciários e dos juízos de Deus. Nessa época religião e direito andavam juntos. (MIRABETE, 2005)

As ordálias consistiam em submeter pessoas acusadas a determinadas provas, afinal os povos antigos acreditavam que Deus se envolvia nas coisas terrenas, indicando os culpados. Daí o nome, juízos de Deus. Nesse sistema o juiz era o fiscal da prova submetida ao acusado, assim, a prova fugia do controle do julgador, que, em verdade, não julgava, apenas acompanhava o resultado final do ritual. (SISTEMA DAS..., 2009)

A prática das ordálias submetia o acusado a uma prova torturante, entre elas estavam: prova das bebidas amargas – a mulher acusada de adultério bebia uma mistura, se o seu rosto se contraísse e os seus olhos se injetassem de sangue era culpada; prova das serpentes – em que o acusado era lançado no meio de cobras venenosas, caso fosse picado por alguma das serpentes, seria considerado culpado; prova do fogo – que obrigava o acusado a andar em brasas ou a tocar com a língua no ferro quente, caso manifestasse dor era culpado; prova da água fria – jogando o indiciado à água, se submergisse, era inocente, se viesse à tona era culpado. O fogo costumava ser reservado para testar acusados de origem nobre, enquanto que a água era mais usada para os plebeus/homem do povo. (ORDÁLIA, 2011)

O duelo judiciário era considerado a ordália mais famosa e utilizada, consistia em uma batalha entre acusador e acusado, muitas vezes o duelo só acabava com a morte de um dos

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participantes. No caso de vitória daquele que havia sido apontado como acusado, as acusações eram revogadas. (SISTEMA DAS..., 2009)

Os julgamentos por ordálias começaram a ser abolidos somente no final da Idade Média (século XV), em geral substituídos pela confissão mediante tortura, mas a prática caiu em desuso apenas no século XVI nos países menos cristianizados. (ORDÁLIA, 2011)

Ao longo dos anos, a justiça penal evoluiu paulatinamente e ao mesmo tempo os sistemas de apreciação de provas sofreram grandes alterações. Essa evolução se deu em razão dos costumes e crenças de cada povo, que ao passar dos anos, deixavam de acreditar que aquele sistema de punição, muitos desses cruéis, realmente fosse adequado e assim buscando novas alternativas para um julgamento mais correto e justo.

No sistema jurídico processual penal brasileiro houve três fases históricas em relação aos sistemas de avaliação das provas, que foram desde uma visão extremamente legalista e condicionada ao que estava estabelecido na lei ao atual sistema que permite ao juiz analisar a prova de acordo com seu livre convencimento motivado, tudo conforme se demonstrará a seguir.

Como já se mencionou, o processo penal brasileiro adotou em épocas e momentos distintos de sua história, sistemas distintos de avaliação da prova que podem ser classificados, de acordo com Capez (2003), como:

a) Sistema da prova legal, da certeza moral do legislador, da verdade legal, da verdade formal ou tarifado;

b) Sistema da certeza moral do juiz ou da íntima convicção; e

c) Sistema da livre (e não íntima) convicção, da verdade real, do livre convencimento ou da persuasão racional.

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Esta classificação é utilizada de forma praticamente unânime pelos doutrinadores. O sistema da prova legal era rígido de tal forma que o juiz tinha que cumprir rigorosamente as regras estabelecidas na lei, inclusive, cada prova tinha valor preestabelecido, não deixando ao

[...] julgador qualquer margem de discricionariedade para emprestar-lhe maior ou menor importância. Não existe convicção pessoal do magistrado na valoração do contexto probatório, mas obediência estrita ao sistema de pesos e valores impostos pela lei. (CAPEZ, 2003, p. 266)

Tal sistema seguia, friamente, o que a lei mandava para avaliar os fatos, objetos da prova. Como tal nome diz – tarifado e certeza moral do legislador –, as provas possuíam um valor já fixado pelo legislador. Bem explica Rangel (2009, p. 468), que “se a lei dizia que aquela prova valia tanto, o magistrado não poderia dizer que valia menos tanto.”

Diferentemente do que se preconiza atualmente, a confissão era a rainha das provas no sistema da prova legal e era praticamente impossível derrubá-la por meio de prova testemunhal. (RANGEL, 2009)

Além de seguir as regras de julgamento imposta pela lei, o julgador não precisava fundamentar sua decisão, o que, em algumas vezes, resultava em abuso. Atualmente, esse sistema vigora somente como exceção, nas hipóteses, segundo Capez (2010), dispostas nos artigos 155, § único (estado de pessoa somente se prova mediante certidão, não se admitindo a prova testemunhal), este antes da nova redação dada ao artigo pela Lei 11.690/08, e artigo 158 (quando a infração deixar vestígios, nem a confissão do acusado supre a falta do exame de corpo de delito, estando o juiz limitado à prova pericial), todos do Código de Processo Penal.

Na ótica de Rangel, há também outros resquícios do sistema da prova tarifada no atual Código de Processo Penal e a previsão é do artigo 232, parágrafo único, pois, segundo o autor: “condiciona a validade da fotografia do documento a sua autenticação. Ou seja, é o legislador dizendo o quanto vale a fotografia do documento, ou melhor, quando e como ela será válida.” E, ainda, o artigo 237 do mesmo código, em relação aos documentos, pois: “a pública forma (cópia de documento avulso extraída por oficial público) só terá valor quando conferida com o original perante a autoridade.” (RANGEL, 2009, p. 469, grifo do autor)

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No sistema da certeza moral do juiz, vai-se de um extremo a outro, neste a liberdade do julgador era ilimitada, podendo decidir como quisesse e as provas não tinham valoração preestabelecida. Nesse caso a

[...] convicção íntima, formada não importa por quais critérios, é o que basta, não havendo critérios balizadores para o julgamento. Esse sistema vigora entre nós, como exceção, nas decisões proferidas pelo júri popular, nas quais o jurado profere seu voto, sem necessidade de fundamentação. (CAPEZ, 2003, p. 266-267)

Com a costumeira precisão de suas lições, Mirabete (2005, p. 285), explica que: “a lei nada diz sobre o valor das provas e a decisão funda-se exclusivamente na certeza moral do juiz, que decide sobre sua admissibilidade, sua avaliação, seu carreamento para os autos.”

O terceiro sistema é o da livre convicção, também conhecido como da verdade real, do livre convencimento ou da persuasão racional. Nesse sistema o julgador tem liberdade para formar sua convicção, sem estar preso a critérios pré-existentes na lei para proceder a valoração das provas, podendo, inclusive, em caso de dúvida, diligenciar a fim de sanar tal ponto. No entanto, ao formar tal convicção deve fundamentar sua decisão única e exclusivamente nas provas produzidas nos autos do processo penal.

Mirabete (2005, p. 285), leciona que: “o juiz forma sua convicção pela livre apreciação da prova. Não fica adstrito a critérios valorativos e apriorísticos e é livre na sua escolha, aceitação e valoração.”

Não obstante, Capez (2010, p. 381-382), adverte que

[...] essa liberdade não é absoluta, sendo necessária a devida fundamentação. O juiz, portanto, decide livremente de acordo com a sua consciência, devendo, contudo, explicitar motivadamente as razões de sua opção e obedecer a certos balizamentos legais [...] O convencimento do juiz deve ser tal que produza o mesmo resultado na maior parte das pessoas que, porventura, examinem o conteúdo probatório.

Esse sistema foi adotado pelo Código de Processo Penal em vigor, em substituição ao sistema da prova legal da legislação anterior, pois de acordo com o artigo 155, com redação determinada pela Lei nº 11.690/08: “O juiz formará sua convicção pela livre apreciação da prova [...]”. (BRASIL, 2012) O presente sistema, segundo Capez (2010, p. 381): “atende às

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exigências da busca da verdade real, rejeitando o formalismo exacerbado e impede o absolutismo pleno do julgador.”

Apesar da evolução do código processual, atualmente nosso sistema penal contém resquícios do sistema da certeza moral, no qual o julgador, além de obedecer à lei, não precisava fundamentar sua decisão. Nesse diapasão ainda ficou o Tribunal do Júri, em que os jurados votam por sua íntima convicção e sem apresentar fundamentação. O jurado é “leigo” no que diz respeito aos critérios balizadores do julgamento, assim, tomará sua decisão com base na sua experiência de vida e pelos argumentos expostos a ele no julgamento.

A toda evidência, o atual sistema é o que melhor se adequa aos preceitos de um estado democrático de direito, no qual o juiz ao formar sua convicção, deve fundamentar e justificar sua decisão nas provas que foram produzidas nos autos pelas partes, observando se estas cumpriram seu ônus probatório ou não.

Assim sendo, para se atingir os objetivos da presente pesquisa, passa-se a estudar a seguir os meios de prova que as partes têm à sua disposição para cumprir com seu encargo de provar a procedência da tese acusatória ou da tese defensiva.

1.3 Ônus probatório e meios de prova

Determinou o Código de Processo Penal em seu artigo 156 que: “A prova da alegação incumbirá a quem a fizer [...]” (BRASIL, 2012) Ou seja, é a faculdade que as partes têm de demonstrar no processo a verdade de uma pretensão pretendida por ela.

O ônus de provar não é uma obrigação, é, sim, um ato facultativo que em não sendo praticado o único lesado é o próprio litigante que deixou de demonstrar algo em seu favor, em razão de sua inércia e/ou ineficiência. (CAPEZ, 2010)

Para a acusação caberá provar

a existência do fato imputado e sua autoria, a tipicidade da conduta, os elementos subjetivos de dolo ou culpa, a existência de circunstâncias agravantes e

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qualificadoras. Já à defesa, por outro lado, incumbirá a prova de eventuais causas excludentes de ilicitude, de culpabilidade e de tipicidade, circunstâncias atenuantes, minorantes e privilegiadoras que tenha alegado. (AVENA, 2011, p. 479)

A doutrina expõe de forma integral que o ônus da prova não incumbe de forma absoluta apenas as partes de trazer provas ao processo. Com base no princípio da verdade real e o que dispõe a parte final do caput do artigo 156 e seus incisos, do Código de Processo Penal, cabe ao juiz também, em caso de dúvida ou divergência, buscar a verdade.

Art. 156. A prova da alegação incumbirá a quem a fizer, sendo, porém, facultado ao juiz de ofício:

I – ordenar, mesmo antes de iniciada a ação penal, a produção antecipada de provas consideradas urgentes e relevantes, observando a necessidade, adequação e proporcionalidade da medida;

II – determinar, no curso da instrução, ou antes de proferir sentença, a realização de diligências para dirimir dúvida sobre ponto relevante. (BRASIL, 2012, grifo nosso) Explica Mirabete (2005, p. 284), que “embora o juiz não deva assumir o papel de parte acusadora ou da defesa, permite a lei que, em casos de dúvida, procure esclarecê-la determinando a realização de diligências.”

No mesmo sentido, Avena (2011) aduz que apesar do magistrado não poder trazer para si a iniciativa probatória, vez que o ônus compete às partes, não é correto que assuma uma postura estática ou de mero espectador. Essa possibilidade do juiz agir de ofício ajuda na busca pela verdade real e diminui as incertezas no processo.

A fim de persuadir o julgador e fazer com que crie um estado de certeza em razão do que está sendo discutido, se faz necessário por a sua disposição um aparato de provas hábeis a formar sua convicção. Mas como se deve proceder e quais são os meios de prova e indícios que se pode apresentar ao magistrado?

Meios de prova é o método/caminho pela qual a prova pode ser levada ao processo. O modelo processual penal pátrio adota o sistema da verdade real, no qual não deve haver limitação à prova, para garantir uma justa atuação do Estado e da aplicação da lei. (MIRABETE, 2005)

Lopes Jr. (2012, p. 565, grifo do autor), a respeito da verdade real no processo penal, acha equivocado o termo, e cita frase de Joseph Goebbels: “uma boa mentira, repetida

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centenas de vezes, acaba se tornando uma verdade e, no caso do processo penal, uma verdade real ou substancial.” Disserta, em suma, que o processo penal é um modo de construção do convencimento do juiz e quanto as provas trazidas aos autos faça-se questionar por qual verdade está se buscando. No entanto, aponta Lopes Jr. que o mais adequando seria falar em verdade formal ou processual.

Por sua vez, Tourinho Filho (2002, p. 219) explica que os meios de prova são “tudo quanto possa servir, direta ou indiretamente, à comprovação da verdade que se procura no processo.” Rangel (2009, p. 421) ajuda a conceituar referindo que: “Podem ser os [meios] especificados em lei ou todos aqueles que forem moralmente legítimos, embora não previstos no ordenamento jurídico sendo chamados de provas inominadas.”

Deste modo, as partes tem ampla liberdade para produzirem provas, podendo, até mesmo, buscar outros meios além daqueles que o Código de Processo Penal apresenta, tudo com a finalidade de convencer o magistrado da sua verdade. Os meios de prova, portanto, tem ligação direta com o tema do presente estudo monográfico.

Nessa ótica, depoimentos, perícias, reconhecimentos, gravações em fita magnética, fotos, filmes, videofonograma, entre outros, também são meios de prova utilizáveis. Ou seja,

[...] são as coisas ou ações utilizadas para pesquisar ou demonstrar a verdade [...]. Nada impede, portanto, que se utilizem provas com a utilização de meios técnicos ou científicos, [...] desde que obtidas licitamente. (MIRABETE, 2005, p. 277) Na legislação processual penal brasileira os meios de prova existentes são os seguintes: I - exame de corpo de delito e das perícias em geral (arts. 158 a 184), II - interrogatório do acusado (arts. 185 a 196), III - confissão (arts. 197 a 200), IV - perguntas ao ofendido (art. 201), V - testemunhas (arts. 202 a 225), VI - reconhecimento de pessoas e coisas (arts. 226 a 228), VII - acareação (arts. 229 e 230), VIII - documentos (arts. 231 a 238), IX - indícios (art. 239) e, X - busca e apreensão (arts. 240 a 250). (BRASIL, 2012)

O exame de corpo e delito (I), segundo Capez (2003, p. 275), “É o conjunto de vestígios materiais deixados pela infração [...]”, é o que representa a materialidade do crime. No caso, são ilícitos que deixam vestígios materiais como a falsificação, o estupro, entre outros.

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A perícia, por sua vez, é entendida como um exame procedido por pessoa que tenha conhecimentos técnicos, científicos, artísticos ou práticos acerca dos fatos. O perito “é um apreciador técnico, assessor do juiz, com uma função estatal destinada a fornecer dados instrutórios de ordem técnica [...]” (MIRABETE, 2005, p. 286) A perícia pode ser realizada a qualquer momento, desde o inquérito policial até a execução e ela pode ser de: necropsia, exame grafotécnico ou reconhecimento de escritos, exame complementar, exame do local da infração, exame de laboratório e avaliação. (AVENA, 2011)

O interrogatório (II), apesar se estar no rol dos meios de prova, no ponto de vista da doutrina é um ato processual, no qual o juiz escuta o(a) acusado(a) sobre a imputação que contra ele(a) foi formulada. O interrogatório é público, oral (salvo para o mudo, o surdo e o surdo-mudo), personalíssimo e individual. Nesse sentido, afirma Tourinho Filho (2002, p. 221) o interrogatório é, sem dúvidas: “Um dos atos processuais mais importes [...]”

Contudo, o(a) acusado(a) tem o direito constitucional (art. 5, inc. LXIII, da CF/88) de permanecer em silêncio. Se optar por responder, não estará obrigado a dizer a verdade. Há ainda a possibilidade de o acusado ser interrogado por precatória. (BRASIL, 2012)

A confissão (III) ocorre com a aceitação, pelo réu, da autoria dos fatos a ele imputados. A confissão se refere apenas à autoria e se dita perante a autoridade judicial configura uma atenuante. É ato personalíssimo, livre, espontâneo, retratável e divisível, ou seja, no caso da divisibilidade, o juiz não é obrigado a acatar a confissão como um todo, podendo acatá-la parcialmente. (CAPEZ, 2010)

Quanto às perguntas ao ofendido (IV), essa modalidade de prova é autoexplicativa, todavia seu depoimento é dispensado de compromisso. A testemunha (V) é toda pessoa chamada em juízo para depor sobre os fatos que viu ou tomou conhecimento. A testemunha não pode trazer o depoimento por escrito, sendo permitida somente a consulta a apontamentos. As testemunhas devem ser, em tese, estranhas ao processo, não ter interesse no resultado da ação e que não tenha, em princípio, relação de amizade ou parental com as partes. O depoimento da testemunha deve ser oral e objetivo, não deve emitir opiniões pessoais. A colheita de seu depoimento também pode ser feita por precatória.

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O reconhecimento de pessoas e coisas (VI) é o ato processual de prova pelo qual alguém é chamado para verificar e confirmar a identidade de uma pessoa ou objeto que lhe é apresentada. O reconhecimento, segundo Capez (2010), pode ser: imediato, mediato, analítico, mediante recordação mental, direto e indireto.

A acareação (VII) consiste na colocação frente a frente de duas ou mais pessoas que fizeram declarações distintas acerca de um mesmo fato, destinando-se a trazer ao juiz o convencimento sobre a verdade fática. A acareação pode ser feita a requerimento de qualquer das partes e o nosso Código de Processo Penal admite a acareação entre: acusados, acusado e testemunha, testemunhas, testemunha e ofendido, acusado e ofendido, e ofendidos. (TOURINHO FILHO, 2002).

Documento (VIII), no entendimento de Mirabete (2005, p. 338), “é o escrito que condensa graficamente o pensamento de alguém, podendo provar um fato ou a realização de algum ato dotado de significação ou relevância jurídica.” Além disso, a prova documental não se limita somente ao escrito, ela compreende também a fotografia, a filmagem, a gravação, a pintura, o desenho, entre outros. (MIRABETE, 2005)

Nesse sentido:

RESP - PROCESSUAL PENAL - PROVA - RECONHECIMENTO FOTOGRÁFICO - O reconhecimento fotográfico é admissível para fazer prova em juízo, salvo se colhido por meio ilícito. (BRASIL, 2011)

PROVA. RECONHECIMENTO FOTOGRÁFICO. O reconhecimento fotográfico tem valor probante pleno quando acompanhado e reforçado por outros elementos de convicção. (BRASIL, 2011)

Indício (IX), conforme explica Capez (2003), é toda circunstância conhecida e provada, a partir da qual, mediante raciocínio lógico, chega-se à conclusão da existência do fato principal. É o sinal demonstrativo do crime.

Por fim, a busca e apreensão (X) é uma medida cautelar que visa reunir elementos de prova para o esclarecimento das circunstâncias do crime e sua autoria, bem como a encontrar pessoa ou coisa que se procura, e a apreensão é medida que a ela se segue. A busca poderá ser determinada de ofício ou a requerimento de qualquer das partes. (MIRABETE, 2005)

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Em linhas gerais, e quanto aos meios de prova, Capez (2010, p. 344, grifo do autor) garante, com a clareza que lhe é pertinente, que: “A previsão legal das provas (CPP, arts. 158 a 250) não é exaustiva, mas exemplificativa, uma vez que admite em nosso direito as chamadas provas inominadas, ou seja, aquelas não previstas expressamente na legislação.”

O artigo 332 do Código de Processo Civil, o qual é aplicado supletivamente ao Código de Processo Penal nesta ocasião, reforça o entendimento das provas inominadas, aduzindo que:

Art. 332. Todos os meio legais, bem como os moralmente legítimos, ainda que não especificados neste Código, são hábeis para provar a verdade dos fatos, em que se funda a ação ou a defesa. (BRASIL, 2012)

Tourinho Filho (2002) ressalta, ainda, que não há, em princípio, maiores restrições aos meios de prova, com ressalva daqueles que repugnam a moralidade ou atentam contra a dignidade da pessoa humana, ou seja, as provas obtidas por meios ilícitos.

Além disso, a busca pela verdade real e o sistema do livre convencimento do juiz

[...] levam a doutrina a concluir que não se esgotam nos artigos 158 a 250 do CPP os meios de prova permitidos na nossa legislação. A previsão legal não é, portanto, exaustiva, mas exemplificativa, sendo admitidas as chamadas provas inominadas, aquelas não previstas expressamente na legislação. (MIRABETE, 2009, p. 278, grifo do autor)

Assim, podem-se dividir os meios de provas em dois grupos: os meios típicos/nominados e atípicos/inominados. Nos quais os típicos são os documentos, acareações, reconhecimento de pessoas e objetos, interrogatório. Ou seja, são todos os meios de prova previstos na legislação. Os atípicos, por sua vez, são aqueles meios de prova que não estão previstos expressamente na legislação, mas são admitidos da mesma forma.

É natural, em razão da acelerada transformação da sociedade em comparação com o Direito, que haja lacunas não previstas na legislação, tornando a interpretação da mesma em extensiva.

Ainda, Tourinho Filho (2002, p. 221), questiona: “Quais as provas que o nosso CPP admite? Apenas aquelas elencadas nos arts. 158 a 250?” E responde dizendo que:

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[...] seria muitas pretensão do legislador não prever a sua própria falibilidade. Por isso mesmo grande parte da doutrina entende que essa enumeração não é taxativa. Por outro lado, os que defendem a tese da não-taxatividade fazem restrição a todo e qualquer meio de prova que atende contra a moralidade ou viole o respeito à dignidade humana. Sendo assim, podemos afirmar que a tendência, hoje, é no sentido de se abolir a taxatividade [...] (TOURINHO FILHO, 2002, p. 221-222) Como forma de demonstrar ser meramente exemplificativo o rol que vai do artigo 158 ao 250, há a possibilidade da intercepção telefônica e da interceptação ambiental serem usadas como prova. Apesar de ambas não estarem previstas no rol do Código de Processo Penal, entretanto são admitidas, vez que a primeira possui legislação própria (Lei 9.296/96) e a segunda é regulada pela Lei 9.034/95.

Destaca-se, para o momento, a redação do artigo 2º da Lei 9.034/95 (BRASIL, 2012):

Art. 2o Em qualquer fase de persecução criminal são permitidos, sem prejuízo dos já previstos em lei, os seguintes procedimentos de investigação e formação de provas: IV – a captação e a interceptação ambiental de sinais eletromagnéticos [...]

Há ainda a possibilidade da prova emprestada. Essa nada mais é do que uma prova que foi utilizada em um processo e agora, se requerida, passa para outro, por óbvio, mais recente. Avena (2011, p. 489), explica que para ser admissível “é preciso que ambos os feitos envolvam as mesmas partes e que, na respectiva produção, tenha sido observado o contraditório. Satisfeitas estas duas condições, terá a prova [...] o mesmo valor das demais [...]”

Sobre esse meio de prova, Rubin (2010, p. 17), explica que

trata-se de relevante meio de prova atípico usualmente direto, produzido em outro feito (cível ou penal), desde que admitido pelo julgador do feito secundário; sendo necessário para tanto que no feito originário tenha tido a participação da parte contra quem a prova desfavorece (garantido o contraditório com a parte prejudicada) e que tenha sido ali considerada lícita (desimportando, prima facie, se o resultado final obtido no juízo originário foi favorável ou não a quem a está requerendo). No entanto, admitida a prova emprestada, ingressa no segundo processo sob a forma de documento, podendo manter, de qualquer forma, seu valor originário [...]

Ainda, a fim de solidificar a ideia de que o rol de prova é meramente exemplificativo, surgem, com o crescente avanço científico e tecnológico, distintos meios de prova, mas com fraca utilização, como o documento eletrônico (por exemplo: e-mail), a prova judicial via satélite (“rogatória eletrônica”) e o interrogatório “on line” (ou à distância), essa última mais

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sujeita a críticas, em face de uma maior preocupação com a efetivação, na esfera penal, dos direitos/garantias constitucionais do acusado. (RUBIN, 2010)

Visto que o rol do Código de Processo Penal não é taxativo, é, portanto, possível produzir outras provas além daquelas pautadas no livro processual, contudo, o princípio da liberdade probatória não é absoluto, sendo vedadas algumas provas, tais como as ilícitas, as quais serão objeto de estudo do próximo capítulo.

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2 A AMPLA DEFESA E A PROVA PSICOGRAFADA

Visto que rol do Código de Processo Penal permite – segundo a doutrina majoritária – a produção de outras provas além das relacionadas no referido código, da mesma forma que a valoração das provas passará pela avaliação do magistrado que ao final deverá fundamentar a sua decisão. Chega-se, então, ao ponto de discussão central do presente estudo em que a carta psicografada será confrontada com princípio basilares do processo, principalmente com o princípio constitucional da ampla defesa, os quais começarão a ser estudados no item a seguir, para, ao final, apontar sobre a admissão ou não desta espécie de prova não tipificada no processo penal.

2.1 Princípios informadores da prova no processo penal brasileiro

Para se analisar acerca da possibilidade ou não do uso da prova psicografada, que é o objeto principal da presente pesquisa, imprescindível o estudo dos princípios informadores da utilização da prova no processo penal brasileiro. Vários são os princípios que orientam a produção e utilização de uma prova no processo penal, dentre os quais destaca-se o princípio do contraditório, da auto-responsabilidade das partes, da comunhão das provas, da oralidade, da publicidade e da inadmissibilidade das provas ilícitas, que serão objeto de breve análise a seguir.

O princípio do contraditório, estabelecido pela Constituição Federal em seu artigo 5º, inciso LV, em relação a prova, quer dizer que tudo o que pode ser produzido e apresentado como prova por uma das partes, permite a contraprova e o seu conhecimento pela parte adversária. É “um método de confrontação da prova e comprovação da verdade [...] É imprescindível para a própria existência da estrutura dialética do processo.” (LOPES JR., 2012, p. 239)

O princípio da auto-responsabilidade das partes é quase que explicativo por sua nomenclatura. Por esse princípio entende-se que “as partes assumirão as consequências de sua inatividade, erro ou negligência relativamente à prova de suas alegações.” (AVENA, 2011, p. 472)

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Por sua vez, o princípio da comunhão das provas ensina que depois de a prova ser juntada aos autos, essa pertence ao processo e a todos os envolvidos e não apenas àquele que apresentou, seja o juiz ou as partes. (RANGEL, 2009)

Pelo princípio da oralidade, requer-se, quando possível, que a produção de provas seja realizada de forma oral e na presença do juiz. Segundo Avena (2011, p. 471): “Isto existe para que, nos momentos relevantes do processo, predomine a palavra falada, possibilitando-se ao magistrado participar dos atos de obtenção da prova.”

O princípio da publicidade refere-se que todos os atos judicias são públicos, excetos os de segredo de justiça. O princípio que também é garantido pela Constituição Federal em seu artigo 5º, inciso LX, visa “garantir ao cidadão comum acesso e confiança no sistema de administração da justiça.” (AVENA, 2009, p. 472)

Outro princípio informador também estabelecido pela Constituição Federal é o da inadmissibilidade das provas obtidas por meios ilícitos, encontrado no artigo 5º, inciso LVI e reforçado pelo artigo 157 do Código de Processo Penal. Esse princípio prega pela não juntada das provas adquiridas por meios ilícitos, mesmo que estas possam provar a real autoria do fato, vez que o direito a prova encontra limites nos direitos e garantias constitucionais e a busca pela verdade não pode transpor os direitos do cidadão. (RANGEL, 2009)

Vistos os princípios informadores da prova no processo penal, não vigora, entretanto, no Brasil o princípio da liberdade probatória, sendo vedadas algumas provas, que serão arroladas e tratadas no item a seguir.

2.2 Distinções entre provas legítimas, ilegítimas, lícitas e ilícitas

Como já ventilado, o princípio da liberdade probatória não é absoluta, encontrando barreira nas disposições da Constituição Federal e do Código de Processo Penal. Quanto às provas produzidas com incompatibilidade aos princípios de proteção e à dignidade humana, a Constituição Federal brasileira estabeleceu em seu artigo 5º, inciso LVI, como direito e garantia fundamental, a inadmissibilidade das provas obtidas por meios ilícitos. Verifica-se:

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LVI – são inadmissíveis, no processo, as provas obtidas por meios ilícitos. (BRASIL, 2012)

É possível, também, usar a nomenclatura “prova proibida”. O termo não é utilizado constantemente na doutrina, mas para Aranha (1999, p. 47), a expressão foi “empregada com muita felicidade.”

A expressão traz consigo o conceito de que “é toda aquela que é defesa, impedida mediante uma sanção, impedida que se faça pelo direito. A que deve ser conservada à distância pelo ordenamento jurídico. Por ser proibida, ofende, molesta, opõe-se ao Direito.” (ARANHA, 1999, p. 48)

A prova obtida por esse(s) meio(s) enquadra-se como prova vedada, e em caso de admissão e valoração pelo juiz em sua sentença, acarreta em nulidade desta. Seguindo a mesma corrente, Rangel (2009, p. 430) deixa cristalino que “o legislador veda é a admissão. Se admitida, não deve ser valorada pelo juiz, pois é como se não existisse no plano jurídico. Sendo valorado, a sentença é nula de pleno direito e deve ser cassada.” Igual sentido trouxe a nova redação do artigo 157 do Código de Processo Penal, com a reforma da Lei 11.690/08:

Art. 157. São inadmissíveis, devendo ser desentranhas do processo, as provas ilícitas, assim entendidas as obtidas em violação a normas constitucionais ou legais. § 1º São também inadmissíveis as provas derivadas das ilícitas, salvo quando não evidenciado o nexo de causalidade entre umas e outras, ou quando as derivadas puderem ser obtidas por uma fonte independente das primeiras. (BRASIL, 2012) O fundamento da limitação da liberdade probatória

está em que a lei considera certos interesses de maior valor do que a simples prova de um fato, mesmo que seja ilícito. Pois os princípios constitucionais de proteção e garantia da pessoa humana impedem que a procura da verdade utilize-se de meios e expedientes condenáveis dentro de um Estado Democrático de Direito. (RANGEL, 2009, p. 425)

Quanto aos meios e expedientes condenáveis, Rangel (2009) quer dizer, e o que já éde conhecimento da sociedade, que ninguém poderá ser submetido, para fins de confissão ou testemunho, à tortura ou qualquer outro meio desumano ou degradante (art. 5º, III da Constituição Federal), tampouco não é possível a utilização da interceptação telefônica sem antes possuir a devida autorização judicial, e ainda, aquelas provas chamadas de invasivas, no

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caso daquelas intervenções corporais feitas no indivíduo, contra sua vontade, como instrumento de prova, por exemplo, exames de DNA e o bafômetro.

Os exemplos arrolados acima, se admitidos em processo, tratar-se-iam de produção de prova ilícita. Se a Constituição Federal assim estabelece que as provas obtidas por meios ilícitos sejam inadmissíveis no processo, para Tourinho Filho (2002), fica claro que aquelas provas obtidas em afronta à dignidade humana e aos direitos fundamentais, de que trata a Lei das Leis, não podem integrar ou serem admitidas no processo.

Outrossim, quanto a liberdade probatória, a nova redação dada pela Lei 11.690/08 ao artigo 155 do Código de Processo Penal, impõe limitação quanto às provas que podem convencer o julgador, devendo ele dar prioridade às provas formadas durante a instrução criminal e abster-se das adquiridas em fase policial. (BRASIL, 2012) Afinal, o inquérito policial possui conteúdo informativo e tem a finalidade de fornecer elementos para a propositura de uma ação penal.

Assevera Capez (2010, p. 118) que o inquérito policial “tem valor probatório, embora relativo, haja vista que os elementos de informação não são colhidos sob a égide do contraditório e da ampla defesa, nem tampouco na presença do juiz de direito.” Deve-se tomar cuidado também quanto à possibilidade de vícios e falhas por parte de agentes despreparados, ou, por conta de agentes mal intencionados.

No que diz respeito às provas legítimas e lícitas, essas estão presentes dentro das possibilidades dos meios de prova já vistos anteriormente (1º Capítulo), podendo ser elas provas nominadas/típicas (elencadas do art. 158 ao art. 250 do CPP), ou provas inominadas/atípicas (aquelas não previstas na legislação, mas admitidas de igual forma), desde que não adquiridas com afronta à dignidade humana e aos direitos fundamentais.

Seguindo essa linha, surge, em nível doutrinário, a diferença, mas com entendimento praticamente unificado, entre provas ilícitas e ilegítimas. Em suma, prova ilícita é toda aquela que caracterizar violação, direta ou indireta, as normas constitucionais e/ou legais. Por sua vez, a prova ilegítima é aquela adquirida ou produzida com ofensa às normas processuais.

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Capez (2010, p. 345-346), esclarece que será chamada de ilícita quando

a prova for vedada, em virtude de ter sido produzida com afronta a normas de direito material [...] Pode ocorrer, [...], que a prova não seja obtida por meio da realização de infração penal, mas considere-se ilícita por afronta a princípio constitucional [...] Quanto às provas ilegítimas, são “as que afrontam norma de Direito Processual, tanto na produção quanto na introdução da prova no processo.” (MIRABETE, 2009, p. 278) Apesar de haver essa distinção em nível doutrinário entre prova ilícita e ilegítima, com a nova redação do artigo 157, do Código de Processo Penal, dada pela Lei 11.690/08, não há mais que se falar nessa diferença, assim, toda prova adquirida com afronta a alguma norma constitucional ou legal é prova ilícita.

Exemplificando, Mirabete (2005, p. 279), traz à baila um rol de provas proibidas, que seriam:

as provas obtidas com violação de correspondência, de transmissão telegráfica e de dados, e com a captação não autorizada judicialmente das conversações telefônicas, (art. 5º, XII); com violação do domicílio, exceto nas hipóteses de flagrante delito, desastre, para prestar socorro ou determinação judicial (art. 5º, XI); com violação da intimidade, como as fonográficas, de fitas gravadas de contatos em encontros de caráter privado e sigiloso (art. 5º, X); com abuso de poder, como a tortura, p. ex., [...]

O artigo 157, em seu parágrafo primeiro, já arrolado no presente estudo, veta ainda as provas derivadas das ilícitas. O que acontece nesse caso é que embora uma prova seja lícita na sua essência, o que a torna ilícita é o ato ilegal que ocorreu anterior a sua produção. Doutrinadores explicam tal ponto com base na teoria dos frutos da árvore envenenada, ou seja, o defeito existente está no tronco e este contamina os frutos. (AVENA, 2011)

Lopes Jr. (2012, p. 600), elucida:

Exemplo típico é a apreensão de objetos utilizados para a prática de um crime (armas, carros etc.) ou mesmo que constituam o corpo de delito, e que tenham sido obtidos a partir da escuta telefônica ilegal ou através da violação de correspondência eletrônica. Mesmo que a busca e apreensão seja regular, com o mandado respectivo, é um ato derivado do anterior, ilícito. Portanto, contaminado está.

Se averiguada esta contaminação na prova, esta deve ser, conforme preconiza o artigo 157 do código processual, desentranhada dos autos. Mas e a prova psicografada, de qual tipo

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de prova se trata? É possível a sua utilização frente o princípio constitucional da ampla defesa? Essas indagações serão analisadas no item a seguir.

2.3 A ampla defesa e a prova psicografada

O princípio da ampla defesa é resguardado pela Constituição Federal em seu artigo 5º, inciso LV, e atua em conformidade com o princípio do contraditório, e é, em síntese, um garantidor de que toda pessoa terá direito de, como a própria terminologia do princípio refere, usar amplamente os meios de defesa contra a imputação que lhe foi feita.

O Dicionário Jurídico (1996, p. 49) define “ampla defesa” como: “Princípio em que assenta o processo contraditório, seja cível, penal ou administrativo, segundo o qual ninguém pode ser considerado culpado se não ouvido (inauditus).”

Entende-se por ampla defesa a

[...] defesa técnica, relativa aos aspectos jurídicos, sendo: o direito de trazer ao processo todos os elementos necessários a esclarecer a verdade, o direito de omitir-se, calar-omitir-se, produzir provas, recorrer de decisões, contraditar testemunhas, conhecer de todos atos e documentos do processo etc. (Christófaro, 2009, p. 1)

Ainda, De Almeida (2002, p. 05), elucida perfeitamente que

Apesar desse princípio vir expresso pela fórmula "ampla defesa", seu raio de aplicação não se limita exclusivamente a beneficiar o réu, posto que visa também favorecer outros sujeitos da relação processual. Sendo assim, não é errôneo dizer que a ampla defesa constitui direito que protege tanto o réu quanto o autor, bem como terceiros juridicamente interessados. Diante disso, é forçoso reconhecer que somente haverá ampla defesa processual quando todas as partes envolvidas no litígio puderem exercer, sem limitações, os direitos que a legislação vigente lhes assegura, dentre os quais se pode enumerar o relativo à dedução de suas alegações e à produção de prova.

Possível, a partir disso, fazer um comparativo com a presunção de inocência que opera no sistema penal pelo que também consagra o artigo 5º, inciso LVII da Constituição Federal (BRASIL, 2012), onde a parte acusada não poderá ser tratada como culpada até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória.

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Lopes Jr. (2012), além de falar da presunção de inocência aponta a mesma como um dever de tratamento e a assinala como princípio reitor do processo penal. Carvalho (2001), citado por Lopes Jr. (2012, p. 236), alega que “o Princípio da Presunção de Inocência não precisa estar positivado em lugar nenhum: é „pressuposto‟ [...] da condição humana.”

Além disso, o inciso XXXVIII do artigo 5º, da Constituição Federal (BRASIL, 2012), garante a “plenitude de defesa”, essa, no entanto, atuante nos procedimentos decididos em plenário e é garantidora da utilização dos mais variados meios de prova. No ensinamento de Christófaro (2009, p. 1): “A plenitude de defesa é exercida no Tribunal do Júri, onde poderão ser usados todos os meios de defesa possíveis para convencer os jurados, inclusive argumentos não jurídicos, tais como: sociológicos, políticos, religiosos, morais etc.”

No processo, seja qual for a natureza, o que se busca é a verdade dos fatos, e para tanto, há que se admitirem diferentes meios de provas, hábeis a formar o convencimento do julgador. Ainda, o elenco das provas admissíveis em Direito é apenas exemplificativo, pois, se não o fosse, seria um obstáculo para o exercício da ampla defesa.

Há, entretanto, um meio de prova que gera polêmica quando da sua utilização, e sobre ela existem diferentes correntes em razão de sua admissibilidade ou não. É a prova psicografada, eis que já utilizada e admitida na seara jurisprudencial.

Antes de abordá-la como possível meio de prova, cabe explicar que a palavra “psicografia” tem origem do grego “psyché”, que significa “borboleta”, “alma”, e “graphô” significa “eu escrevo”, podendo ser traduzida para “escrita da mente ou da alma”. (SANTOS FILHA, 2010) A carta psicografada é um dos mecanismos, segundo o espiritismo kardecista, que comprova a comunicação dos vivos com os mortos. Por certo, não é a única, mas uma das mais convincentes na demonstração de que existe vida após a morte. (RUBIN, 2011)

A carta consiste na escrita feita, em estado de inconsciência/mecânica ou semiconsciência/semi-mecânica, por alguém dotado de determinada capacidade espiritual e que recebe mensagem enviada por alguém já falecido (entidade desencarnada), ou seja, um médium. Essas modalidades citadas de escrita são as mais comuns para os médiuns, apesar de existir ainda a intuitiva. (POLÍZIO, 2009)

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A nomenclatura “médium” vem do latim e quer dizer: “meio”, “intermediário”. São as pessoas que tem a facilidade de comunicação com os espíritos e dotadas da faculdade de receber e transmitir suas comunicações. (SANTOS FILHA, 2010)

Na psicografia semi-mecânica o espírito faz um acesso mais direto aos centros nervosos que controlam a escrita e a fala, mas também faz passar pelo consciente do médium seus pensamentos. Assim sendo, o médium mantém plena consciência da comunicação, em seu teor, mas sente um impulso na mão na psicografia, ou a formação de palavras no seu aparelho fonador. (RESUMO..., [s.d.]) Já na psicografia mecânica, o espírito controla totalmente os centros nervosos que possibilitam a escrita, conduzindo e imprimindo a velocidade que pretender à mão do médium, sem que haja qualquer controle ou interferência deste, que fica apenas na condição de aparelho receptor. O espírito não fala nem sugere, apenas escreve. Ainda, na psicografia intuitiva o pensamento do espirito é passado ao médium que irá aceitar ou não o que lhe é transmitido, ou seja, o espírito sugere e o médium executa. (POLÍZIO, 2009)

No Brasil, pelo que se tem notícia, são nove os casos em que o plano espiritual se fez presente em julgamentos criminais, seis deles foram originados da mediunidade de Francisco Cândido Xavier, o Chico Xavier, e diretamente ligados a essa área. Os primeiros casos penais começaram a surgir a partir de 1976, antes disso, na esfera civil em 1944. (POLÍZIO, 2009)

O primeiro fato ocorreu no mês de fevereiro, do mencionado ano, em Hidrolândia-GO, entretanto a carta psicografada não foi a juízo, pois o processo já tinha sido julgado, tendo sido o acusado absolvido. (POLÍZIO, 2009) No conteúdo da carta a vítima pedia para que sua mãe perdoasse o acusado, seu amigo, e referia que os dois eram culpados pelo acidente com a arma de fogo. No mês de maio do aludido ano, outro incidente envolvendo arma de fogo. Esse processo teve a carta psicografada apresentada como meio de prova e juntamente com a prova testemunhal e pericial o acusado não foi pronunciado ao júri, o Ministério Público recorreu da decisão, tendo sido reformada a sentença, mas no ano de 1980, em plenário, o acusado foi absolvido. De comum nesses dois casos é que as cartas foram psicografadas pelo médium mineiro, Chico Xavier, e tiveram a atuação do juiz Orimar de Bastos.

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Outro caso ocorrido ainda em 1976 foi em São Paulo, capital. Um jovem que servia à Força Aérea Brasileira veio a falecer fatalmente enquanto manuseava sua arma, a bala acertou sua cabeça. Inicialmente acreditava-se em suicídio, mas, posteriormente, uma carta do médium mineiro é que esclareceu o caso, onde o jovem falecido explicava o acidente que deu fim a sua vida. Em Campos do Jordão-SP, em 1987, outro acusado foi absolvido pelos jurados em razão das cartas. Na oportunidade, Chico Xavier havia psicografado três cartas. O quarto caso, em Campo Grande-MS, o médium mais conhecido do Brasil psicografou uma carta de 41 páginas, e em 1985 o acusado foi absolvido pelo júri, mas a acusação apresentou recurso e novo julgamento saiu em 1990, em que o acusado foi condenado a um ano de detenção. Tamanha foi a repercussão do caso que o processo ficou três anos exposto na área de historiografia do Tribunal de Justiça de Campo Grande. (POLÍZIO, 2009)

Em Mandaguari-PR, 1982, o então Deputado Federal Heitor Cavalcante de Alencar Furtado foi baleado por um policial e faleceu dentro do carro. O julgamento ocorreu em 1984 e o acusado foi condenado em pouco mais de oito anos de reclusão, o Ministério Público ainda recorreu dizendo que a carta psicografada por Chico Xavier não tinha valor legal, o Tribunal de Justiça manteve a decisão. O sexto caso foi um dos mais interessantes e ocorreu em Gurupi-TO, na virada para o ano de 1983. Dois irmãos brigaram e um acabou acertando o outro com uma faca. Na carta psicografada pelo médium mineiro, o irmão falecido inocentava o outro. O curioso nesse caso é que o magistrado intimou o médium, Chico Xavier, para falar da carta, tendo sido colhido seu depoimento na oportunidade.

Eu nunca tive a intenção de que as mensagens recebidas por mim pudessem atuar em qualquer setor Judiciário. Estou dizendo isso ao senhor de coração. Nunca pensei. Se essas mensagens têm comparecido como peças para defesa de alguém, não é a meu pedido, nem por interferência minha, porque eu respeito as pessoas e respeito os espíritos que se comunicam, com muita veneração pelo intercâmbio espiritual. O que eu recebo é com finalidade de consolo, reconforto, instrução, nunca por influência judiciária, nem política, nem coisa alguma. (POLÍZIO, 2009, p. 148) O sétimo caso se passou em Ourinhos-SP (POLÍZIO, 2009), a vítima foi morta a tiros em 1997, o homicídio não tinha autoria definida, mas em 1999 um dos acusados confessou o crime e se entregou à polícia, indicando também os outros envolvidos, um inclusive era concunhado do falecido. Em 2004 o médium Rogério Leite psicografou uma carta de 11 páginas de autoria da vítima na qual afastava a autoria do crime ao seu concunhado. No ano de 2007 o concunhado foi absolvido pelo júri, o promotor, conhecendo o teor da carta, não recorreu da decisão. Os outros acusados já haviam sido condenados em 2001.

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O último e mais recente caso em que a carta psicografada foi utilizada como prova aconteceu no Rio Grande do Sul, na cidade de Viamão. No ano de 2003, uma mulher foi acusada de ter encomendado a morte do amante pelo caseiro deste. Em 2005, duas cartas psicografadas foram entregues ao marido da acusada e usadas em sua defesa, no conteúdo delas a vítima lamentava a injusta acusação contra a mulher e dizia que ela era inocente. Em razão da insuficiência de provas materiais do delito contra a denunciada combinado com o teor de duas cartas psicografadas pela vítima, a acusada foi inocentada por maioria de votos no Tribunal do Júri e o caseiro condenado a mais de 15 anos de prisão, em 2006. Posterior, houve apelação ao Tribunal de Justiça, no entanto tendo sido confirmada, em 11/11/2009, a possibilidade de utilização criteriosa da prova psicografada no processo, sendo mantida a decisão que inocentava a ré. (POLÍZIO, 2009) (Anexo A)

Verifica-se a ementa do caso citado:

Ementa: JÚRI. DECISÃO ABSOLUTÓRIA. CARTA PSICOGRAFADA NÃO CONSTITUI MEIO ILÍCITO DE PROVA. DECISÃO QUE NÃO SE MOSTRA MANIFESTAMENTE CONTRÁRIA À PROVA DOS AUTOS. Carta psicografada não constitui meio ilícito de prova, podendo, portanto, ser utilizada perante o Tribunal do Júri, cujos julgamentos são proferidos por íntima convicção. Havendo apenas frágeis elementos de prova que imputam à pessoa da ré a autoria do homicídio, consistentes sobretudo em declarações policiais do co-réu, que depois delas se retratou, a decisão absolutória não se mostra manifestamente contrária à prova dos autos e, por isso, deve ser mantida, até em respeito ao preceito constitucional que consagra a soberania dos veredictos do Tribunal do Júri. Apelo improvido. (RIO GRANDE DO SUL, 2012)

O posicionamento do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul acabou retomando a celeuma em torno do tema que divide opiniões quanto à admissibilidade da carta psicografada como meio de prova no processo penal.

Ganhou, ainda, maior repercussão com a apresentação, junto ao Congresso Nacional, do Projeto de Lei n° 1.705/2007, proposto pelo Deputado Federal Robson Lemos Rodovalho, também teólogo e bispo evangélico. (POLÍZIO, 2009). O referido projeto sugeria a alteração do caput do artigo 232 do Código de Processo Penal, cuja redação seria alterada para: “Consideram-se documentos quaisquer escritos, instrumentos ou papéis, públicos ou particulares, exceto os resultantes de psicografia.” O texto do parágrafo único seria mantido.

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O Deputado Rodovalho, em sua justificativa, explicou, em síntese, que aceitar como prova um documento ditado ou sugerido por algum espírito desencarnado implica resolver uma questão de fé, diferenciando-se da análise de um dado concreto e passível de contestação. O julgamento, segundo ele, deve necessariamente ser motivado por dados da vida real, e não se pode “permitir que o livre convencimento do juiz seja, essencialmente, fundado meramente na fé religiosa”. (CÂMARA DOS..., 2012)

Por sua vez, o Deputado Federal Costa Ferreira, na tentativa de melhorar a proposta inicial de seu colega, apresentou o Projeto de Lei nº 3.314/2008 (cujo teve trâmite em conjunto com a proposta inicial, Projeto de Lei nº 1.705/2007), oferecendo um segundo parágrafo ao artigo 232, com a seguinte redação: “Não se considera documento o texto psicografado”. Seguindo a mesma linha de pensamento do Deputado Rodovalho, Costa Ferreira comentou que: “O texto psicografado não tem como ser submetido ao contraditório e assim não há como ver obedecido o devido processo legal.” (POLÍZIO, 2009)

Como o Direito não é uma ciência exata, partindo-se do pressuposto que acerca de um tema existem diversas linhas de pensamento e, no caso da carta psicografada, além da polêmica que a envolve, não é diferente.

Resumidamente, os que refutam a carta psicografada como meio de prova insistem que: a psicografia é religião e o judiciário não é religioso, e não haveria forma de se usufruir da ampla defesa e do contraditório.

Quanto ao primeiro ponto, o Estado brasileiro não pertence a uma ordem religiosa, é laico, ou seja, não possui uma religião oficial, mantem-se neutro e imparcial no que diz as religiões e respeitando todas as crenças. Admitindo, entretanto, a espiritualidade, como se verifica pelo preâmbulo da Constituição Federal:

Nós, representantes do povo brasileiro, reunidos em Assembleia Nacional Constituinte para instituir em Estado Democrático [...] promulgamos, sob a proteção de Deus, a seguinte CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL. (BRASIL, 2012)

Ainda o inciso VI, do artigo 5º, da Constituição Federal (BRASIL, 2012), dispõe também que: “é inviolável a liberdade de consciência e de crença [...]” Em razão da laicidade,

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o Estado não pode referir-se normativamente à validade ou não de material psicografado como meio de prova.

Nessa ótica, Nucci (2006), refere que as cartas psicografadas são fruto da fé, tanto de que as escreve como quem as recebe. Quanto ao segundo argumento, alerta ao perigo na utilização da psicografia no processo penal, pois,

fere-se preceito constitucional de proteção à crença de cada brasileiro; lesa-se o princípio do contraditório; coloca-se em risco a credibilidade das provas produzidas; invade-se a seara da ilicitude das provas; pode-se, inclusive, romper o princípio da ampla defesa. (NUCCI, 2006, p. 2)

Na concepção de Lopes (2006, p. 2), criminalista gaúcho, o processo criminal é uma coisa séria, é regido por uma ciência, que é o direito penal. Quanto à juntada da carta psicografada, ele afirma

Isso é o mesmo que documento apócrifo. [...] O Tribunal do Júri se presta a essas coisas fantásticas. O jurado pode julgar segundo sua convicção íntima, eles não têm obrigação de julgar de acordo com a prova.

No ponto de vista de Gandra (2008, p. 1), jurista brasileiro, a utilização da carta em tribunal deve ser descartada, e acrescenta:

Essa carta não pode ser aceita, pois não é prova. Se a lei admitisse, eu podia não concordar, mas teria que aceitar. Mas quando a lei não admite esse tipo de prova, é evidente que isso (usar psicografia como prova), quando analisado pelos tribunais superiores, deve ser reformulado.

Da Silva Júnior, presidente da Ajufe (Associação dos Juízes Federais do Brasil),citado por Polízio (2009, p. 158), expressa que: “Escorar uma decisão com base numa prova psicografada não tem ressonância no mundo jurídico. É indevida uma decisão que se embasa na psicografia, que cientificamente não é comprovada.”

No entendimento de Dallari, citado por Polízio, (2009, p. 157-158), o uso da “psicografia é claramente ilegal. [...] Não há o reconhecimento disso no sistema jurídico brasileiro. Se isso for a prova, o julgamento é nulo. [...] Não existe amparo legal na utilização do sobrenatural.”

Referências

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