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Defensoria Pública no Brasil: a constitucionalização da assistência jurídica e os desafios de sua ampliação à luz da EC Nº 80/2014

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS E ECONÔMICAS

FACULDADE NACIONAL DE DIREITO

DEFENSORIA PÚBLICA NO BRASIL: A CONSTITUCIONALIZAÇÃO DA ASSISTÊNCIA JURÍDICA E OS DESAFIOS DE SUA AMPLIAÇÃO À LUZ DA

EC Nº 80/2014

MAXSAMUEL RIBEIRO FERRAZ QUEIRÓZ

RIO DE JANEIRO 2017 / 2º Semestre

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MAXSAMUEL RIBEIRO FERRAZ QUEIRÓZ

DEFENSORIA PÚBLICA NO BRASIL: A CONSTITUCIONALIZAÇÃO DA ASSISTÊNCIA JURÍDICA E OS DESAFIOS DE SUA AMPLIAÇÃO À LUZ DA

EC Nº 80/2014

Monografia de final de curso, elaborado no âmbito da graduação em Direito da Universidade Federal do Rio de Janeiro, como pré-requisito para obtenção do grau de bacharel em Direito, sob a orientação da Professora Dra. Lilian

Márcia Balmant Emerique.

Rio de Janeiro 2º Semestre/2017

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MAXSAMUEL RIBEIRO FERRAZ QUEIRÓZ

DEFENSORIA PÚBLICA NO BRASIL: A CONSTITUCIONALIZAÇÃO DA ASSISTÊNCIA JURÍDICA E OS DESAFIOS DE SUA AMPLIAÇÃO À LUZ DA

EC Nº 80/2014

Monografia de final de curso, elaborada no âmbito da graduação em Direito da Universidade Federal do Rio de Janeiro, como pré-requisito para obtenção do grau de bacharel em Direito, sob a orientação da Professora Dra. Lilian

Márcia Balmant Emerique

Data da Aprovação: __/__/____.

Banca Examinadora:

______________________________________

Orientadora Profa. Dra. Lilian Márcia Balmant Emerique

______________________________________ Membro da Banca ______________________________________ Membro da Banca Rio de Janeiro 2º Semestre/2017

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“A justiça é o pão do povo, às vezes bastante, às vezes pouca. Às vezes de gosto bom, às vezes de gosto ruim.

Quando o pão é pouco, há fome. Quando o pão é ruim, há descontentamento.”

BERTOLT BRECHT

“Bem aventurados os que tem fome e sede de justiça, Porque serão fartos”

(6)

À vovó Idalina, por ter sido o meu porto seguro na vida.

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AGRADECIMENTOS

Em primeiro lugar, agradeço ao meu Deus, por ser o meu refúgio seguro em todos os momentos difíceis da minha vida. Sou imensamente grato por ter realizado o meu sonho de estudar em uma Universidade Federal e de ter me dado sabedoria para cumprir a árdua trajetória na Faculdade Nacional de Direito. Estou certo de que todas as coisas cooperam para o bem daqueles que amam a Deus!

Em segundo lugar, agradeço em memória, a minha avó Idalina, por ter cuidado de mim e de ter ajudado os meus pais a conduzirem da melhor maneira a minha educação. Não foi fácil tê-la perdido, mas Deus, que fez a alma imortal, nos unirá na eternidade. Sou eternamente grato. Te amo.

Agradeço a minha Mãe Dora, por ter me educado e de ter me orientado desde o berço a seguir o caminho dos estudos. Obrigado por não ter medido esforços. Te amo.

Ao meu querido Pai, pelo exemplo de honestidade e retidão e por todo apoio dedicado a mim. Te amo.

Ao meu querido irmão Guilherme, por ser o meu melhor amigo e de me conceder a companhia mais agradável. A sua força de vontade me faz nunca pensar em desistir. Te amo.

Agradeço a Defensoria Pública da União no Rio de Janeiro, pelos dois anos de estágio, que me fez refletir sobre a importância da assistência jurídica gratuita aos menos favorecidos em um país extremamente desigual.

Agradeço a Doutora Defensora Pública Federal, Patrícia Ubal Przybylski, por todo o aprendizado e paciência que teve comigo na DPU.

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Agradeço a Doutora Lilian Márcia Balmant Emerique por ter aceitado ser a minha orientadora neste presente trabalho. Agradeço, ainda, a Samir Zaidan, pela orientação e atenção que teve comigo. Muito Obrigado.

Agradeço a todas as pessoas que durante a minha passagem pelo Rio de Janeiro me auxiliaram sem pedirem nada em troca, são elas as queridas Rose e Renata. Meus sinceros agradecimentos.

Agradeço a todos os professores Universidade Federal do Rio de Janeiro e a Faculdade Nacional de Direito, por terem sido parte da minha vida nestes últimos cinco anos. Muito obrigado!

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RESUMO

QUEIRÓZ, Maxsamuel Ribeiro Ferraz. Defensoria Pública no Brasil: A

Constitucionalização da Assistência Jurídica e os Desafios de sua Ampliação à Luz da EC nº 80/2014. 2017: 76 páginas. Monografia (Graduação/Bacharelado em Direito)

– Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2017.

O presente trabalho tem por objetivo analisar, com base na doutrina e jurisprudência, a moldagem institucional que é dada à Defensoria Pública no Brasil, tendo como principal premissa enfatizar a deficiência do cumprimento da assistência jurídica integral e gratuita à luz da Emenda Constitucional n° 80/2014. O ponto de partida será a compreensão da teoria das três ondas renovatórias de Cappelletti, que delineou o estudo da temática do acesso à justiça no Brasil e no mundo. A segunda parte dedica-se ao estudo de toda a trajetória legislativa constitucional da Defensoria Pública, desde o modelo apresentado na Constituição Federal de 1988 até a última Emenda Constitucional nº 80/2014. Por fim, será realizada uma análise da abrangência das Defensorias Públicas no território nacional, tanto na esfera federal quanto da esfera estadual e dos desafios inerentes ao (des) cumprimento da efetivação constitucional da assistência jurídica como conseqüência da omissão do Estado.

Palavras-Chave: Acesso à Justiça, Trajetória Legislativa, Constitucionalização,

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ABSTRACT

QUEIRÓZ, Maxsamuel Ribeiro Ferraz. Public Defender in Brazil: The

Constitutionalisation of Legal Assistance and the Challenges of its Extension to the Light of EC No. 80/2014. 2017: 76pages. Monograph. (Graduation/Bachelor in Law) -

Federal University of Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2017.

The objective of the present study is not only to analyze the institutional framework of the Public Defender Office in Brazil as established by the modern legal doctrine and case law, but also to draw attention to the obstacles that hinder the right to free and integral judicial assistance as inscribed in the Constitutional Amendment nº 80/2014. The starting point of this analysis is dedicated to Capppelletti's "Three Renovatory Waves" theory, which comprehensively mapped the development and evolution of the studies on the right of access to justice in Brazil and around the world. The following segment presents a chronological study of the legislative trajectory of the Public Defender Office's framework, from the model presented in the Federal Constitution of 1988 to the latest Constitutional Amendment nº 80/2014. Finally, the last segment intends to scrutinize the purview of the Public Defender Offices around the country, on the federal and state levels, and also to examine the challenges presented by the lack of constitutional efficacy of the right to free judicial assistance as a consequence of government omissions.

Keywords: Access to Justice, Legislative Path, Constitutionalisation, Public Defender,

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ... 12

CAPÍTULO 1 O ACESSO À JUSTIÇA COMO DIREITO FUNDAMENTAL ... 14

1.1A EVOLUÇÃO DO CONCEITO DE ACESSO À JUSTIÇA SEGUNDO MAURO CAPPELLETTI E BRYAN GARTH: AS ONDAS RENOVATÓRIAS ... 14

1.1.1 A Primeira Onda: a assistência judiciária aos pobres ... 17

1.1.2 A Segunda Onda: os interesses difusos ... 18

1.1.3 A Terceira Onda: os juizados especiais ... 20

1.2O ACESSO À JUSTIÇA E A EFETIVIDADE DA TUTELA JURISDICIONAL NAS CONVENÇÕES INTERNACIONAIS E NA CONSTITUIÇÃO DE 1988 ... 22

1.3 O ACESSO À JUSTIÇA NO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015: O PAPEL DA DEFENSORIA PÚBLICA ... 27

CAPÍTULO 2 A CONSTITUCIONALIZAÇÃO DA ASSISTÊNCIA JURÍDICA NO BRASIL E A DEFENSORIA PÚBLICA ... 30

2.1HISTÓRICO ... 30

2.2O DELINEAMENTO JURÍDICO-INSTITUCIONAL DA DEFENSORIA PÚBLICA ... 36

2.3O MODELO APRESENTADO NA CONSTITUIÇÃO DE 1988 ... 39

2.4AS INOVAÇÕES TRAZIDAS PELA LEI COMPLEMENTAR Nº 132/2009 ... 43

2.5AS INOVAÇÃO TRAZIDAS PELA EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 74 DE 2013 ... 45

2.6AS INOVAÇÕES TRAZIDAS PELA EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 80/2014... 47

2.6.1 Os Princípios Institucionais da Defensoria Pública ... 48

CAPÍTULO 3 OS DESAFIOS DA AMPLIAÇÃO DA DEFENSORIA PÚBLICA NO BRASIL À LUZ DA EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 80/2014 ... 54

3.1 O MAPA DAS DEFENSORIAS PÚBLICAS NO TERRITÓRIO NACIONAL: ANÁLISE DO CENÁRIO ... 54

3.3.1 As Defensorias Públicas Estaduais ... 55

3.3.2 Projeção de cumprimento da Emenda Constitucional nº 80/2014 nas Defensorias Estaduais... 62

3.3.3 As Defensorias Públicas da União ... 63

3.2 O DEVER ESTATAL DE AMPLIAÇÃO PROGRESSIVA DOS SERVIÇOS PÚBLICOS DE ASSISTÊNCIA JURÍDICA NO BRASIL ... 67

CONCLUSÃO ... 72

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12

INTRODUÇÃO

Este trabalho monográfico tem como base de conhecimento a área do Direito Constitucional, com o título “Defensoria Pública no Brasil: A Constitucionalização da Assistência Jurídica e os Desafios de sua Ampliação à luz da Emenda Constitucional nº 80/2014”.

No Brasil, a falta de acesso da população pobre e vulnerável aos seus direitos fundamentais e, acima de tudo, a uma condição de vida digna, tem sido recorrente na nossa história política e realidade socioeconômica, caracterizando, muitas vezes, a omissão dos entes federativos em atenderem de modo minimamente satisfatório as demandas sociais. O mesmo ocorre com a prestação do serviço público de assistência jurídica integral e gratuita às pessoas necessitadas, com ausência, mesmo após a nossa Lei Fundamental ter completado vinte e nove anos, de Defensorias Públicas efetivamente existentes e estruturadas no país, porém em números ainda não satisfatórios.

A Constituição de 1988, no Brasil, é o marco histórico de nosso processo de redemocratização. Em verdade, no cenário constitucional pós-88, é seguro dizer que o direito constitucional se transformou. É possível identificar três principais mudanças de paradigma. O primeiro foi o reconhecimento da tríade dignidade da pessoa humana, direitos fundamentais e proteção dos vulneráveis, encontrando o seu alicerce no centro normativo do nosso sistema constitucional; a segunda transformação se deu na primazia do acesso à justiça no cenário brasileiro, como meio de democratizar o Sistema de Justiça e; por fim, a terceira modificação, que tem pertinência com o objeto do presente trabalho, foi justamente a consolidação da Defensoria Pública, como órgão fundamental para a materialização da assistência jurídica gratuita.

Desse modo, o presente trabalho tem por objetivo analisar, com base na doutrina e jurisprudência, a moldagem institucional que é dada no direito brasileiro à Defensoria Pública, tendo como parâmetro o cumprimento constitucional da assistência jurídica integral e gratuita aos comprovadamente necessitados. Seu primeiro capítulo será destinado ao estudo da teoria do acesso à justiça de Mauro Cappelletti, que instituiu esta compreensão sob o paradigma das Ondas Tridimensionais. Será apresentado, ainda,

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13 como se deu a compreensão do acesso à justiça através das principais conversões internacionais sobre Direitos Humanos e, mais recentemente, no novo Código de Processo Civil de 2015.

O segundo capítulo se voltará primeiramente a realizar um breve histórico do modelo de assistência jurídica existente no país até a promulgação da Constituição Federal de 1988. Em sequência, analisar-se-á em detalhes toda a trajetória constitucional envolvendo a instituição da Defensoria Pública, principalmente no que se refere às inovações legislativas trazidas pelas Leis Complementares (LC 80/94 e LC 132/2009) e Emendas Constitucionais (EC 74/2013 e EC 80/2014). O objetivo é analisar os principais avanços que moldaram a organização institucional do Órgão de Defesa.

O terceiro capítulo tem por objetivo analisar, com base em gráficos e dados levantados pelo Ministério da Justiça em 2015 acerca da atuação da Defensoria Pública nos estados brasileiros. O ponto crucial dessa análise se pauta no que dispõe a Emenda Constitucional nº 80 de 2014, que acrescentou ao Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT) o art. 98, no qual estabelece o prazo categórico de 8 (oito) anos para a instalação da Defensoria Pública em todas as comarcas do País. Em síntese, busca-se analisar o atual cenário e se a União e os estados da Federação tem cumprido os mandamentos advindos da Emenda Constitucional, uma vez já se passaram mais de três anos que foi positivada a previsão.

Conforme se extrai da Emenda Constitucional em questão, existe um forte viés programático que deverá ser cumprido pelo Estado, em respeito ao princípio da proibição de insuficiência e da ampliação progressiva das políticas públicas de assistência jurídica aos necessitados.1

1SARLET, Ingo Wolfgang. Constituição e proporcionalidade: o direito penal e os direitos fundamentais

entre proibição de excesso e proibição de insuficiência. Revista Brasileira de Ciências Criminais, n.47, mar.-abr. 2004, p. 99-100.

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14

CAPÍTULO 1 O ACESSO À JUSTIÇA COMO DIREITO FUNDAMENTAL

1.1 A evolução do conceito de acesso à justiça segundo Mauro Cappelletti e Bryan Garth: as ondas renovatórias

No decorrer de toda a história da humanidade, a sociedade sempre viveu em constantes conflitos. A problemática do acesso à justiça pelas pessoas hipossuficientes apesar de não ser algo novo, ainda é uma das principais questões que merecem respaldo na conjuntura jurídica atual.

A Grécia antiga foi o ponto inicial do movimento do acesso à justiça. Nesta época também florescia o conceito de isonomia, base de inúmeras discussões sobre os direitos e deveres dos cidadãos. Nesse sentido, o pensamento pitagórico usava um quadrado como símbolo da justiça, já que a figura geométrica em questão possuía partes iguais, o que denotava paridade e isonomia.

Sob a perspectiva aristotélica, ocorreu uma intensa revolução do pensamento jurídico e filosófico, ao desenvolver o que atualmente se denomina como teoria da justiça. Reestruturando conceitos matemáticos e de proporcionalidade, Aristóteles designou variáveis racionais de igualdade e proporcionalidade das razões.

No apreço pela lição aristotélica, o jurista Ruy Barbosa apregoou que

A regra da igualdade não consiste senão em tratar desigualmente os desiguais na medida em que se desigualam. Nesta desigualdade social, proporcional e desigualdade natural, é que se acha a verdadeira lei da igualdade. Os mais são desvarios da inveja, do orgulho ou da loucura. Tratar com desigualdade os iguais, ou os desiguais com igualdade, seria desigualdade flagrante, e não igualdade real. Os apetites humanos conceberam inverter a norma universal da criação, pretendendo, não dar a cada um, na razão do que vale, mas atribuir os mesmos a todos, como se todos se equivalessem.2

2 BARBOSA, Ruy. Trecho do discurso de paraninfo "Oração aos Moços". Original no Arquivo da FCRB.

Disponível em: http://www.casaruibarbosa.gov.br/scripts/scripts/rui/mostrafrasesrui.idc?CodFrase=1107. Acesso em 01 de setembro de 2017.

(16)

15 Para Moreira Alves, o Direito nos séculos V e XV, por sua vez foi maculado pela luta da Igreja, encenado pela Escola de Glosadores e dos Pós-Glosadores e a aplicação das leis adotadas por líderes da Igreja, com intensa interferência do Direito Canônico no Direito Romano, conhecida seguidamente de Corpus Iuris Civilis.3

Pode-se afirmar que o acesso à justiça, na constância da intervenção da Igreja nas leis, consubstanciou-se na apresentação dos incriminados aos tribunais em face de seus senhores, fazendo com que os seus subordinados fossem submetidos a julgamentos antes os que detinham sua posse. Durante esse ínterim, não vigorava as discussões concernentes aos princípios da igualdade e isonomia, o que de certa razão os sujeitos não faziam jus a um julgamento justo.

Para além disso, desde os tempos mais remotos da sociedade, as relações entre os povos amplificaram-se tanto em conflitos quanto na discussão da resolução dos mesmos. Estes, todavia, em muitas das ocasiões eram levados aos tribunais, entretanto, somente os conflitos entre os que detinham maior poder aquisitivo e prestígio perante as suas comunidades eram solucionados ou havia pelo menos a intenção de ser. A tutela jurisdicional, por fim, era muito simplória no atendimento para o benefício do povo (Pro Bono).

Doravante o Projeto de Florença, Mauro Cappelletti insistiu em apurar dados acerca do acesso à justiça em diversos países.4 Coligindo-os, apontou sua reformulação histórica e o direito de acesso à justiça como movimentos, numa evolução dinâmica das sociedades e seus indivíduos na satisfação de seus direitos.5

A partir de 1965, Cappelletti identificou no ocidente três posições fundamentais que consubstanciaria a sua posição, quais sejam: a assistência judiciária para os desassistidos, a representação jurídica para os interesses difusos na proteção ao meio ambiente, ao consumidor e ao interesse coletivo e o mais contemporâneo, conhecido como “enfoque de acesso à justiça”, uma vez que envolve questões passadas e as sobrepujam, buscando eliminar as imposições de acesso à justiça de maneira mais compreensiva e profunda.

3 ALVES, José Carlos Moreira. Direito Romano. Editora: Forense. 10.ed. Rio de Janeiro, 1996, pp.57-68. 4O Projeto de Florença foi a compilação de dados e estatísticas realizada por Cappelletti, gerando um relatório

que foi publicado pelo autor, comparando como se deu o acesso à justiça nos diversos países analisando as experiências, identificando problemas e apontando soluções para a amplificação do acesso à justiça.

(17)

16 Segundo define Cappelletti, a expressão “acesso à justiça” adequa-se para “(...)determinar duas finalidades básicas do sistema jurídico: (...) primeiro, ele deve ser realmente acessível a todos; segundo, ele deve produzir resultados que sejam individual e socialmente justos”6. Assim, à medida que as sociedades do laissez-faire cresceram em tamanho e complexidade, o conceito de direitos humanos começou a sofrer uma transformação radical, conforme nos afirma Cappelletti.7

Dado isso, a atuação do Estado intervenha para assegurar o gozo de todos esses direitos sociais básicos.8 Diante disso, a plenitude do chamado acesso à justiça somente se consuma quando há mecanismos materialmente essenciais para a sua efetivação.

Mauro Cappelletti mostra que “o acesso à justiça pode ser encarado como o requisito fundamental – o mais básico dos direitos humanos – de um sistema jurídico moderno e igualitário que pretenda garantir, e não apenas proclamar o direito de todos”.9

A efetividade de tais direitos requer a aplicabilidade das técnicas processuais modernas que sirvam a questões sociais resolvidas não somente nas cortes judiciais, mas, também, em “modelos alternativos ao sistema judiciário formal”, quais sejam, a conciliação, a mediação ou a arbitragem.

Diante dessa conjuntura, defende Fontainha que os obstáculos que impedem o pleno o acesso à justiça aprimorados por Cappelletti são: a desigualdade material (não há paridade de armas entre as partes), o obstáculo econômico (quaisquer óbices por que passe um cidadão no uso do aparato da justiça), o obstáculo organizacional (identificado nos interesses difusos na era pós-globalização) e o obstáculo processual (com a ineficiência do processo do contencioso ordinário).10

6CAPPELLETTI, Mauro; GARTH, Bryan. Acesso à Justiça. Porto Alegre: Fabris Editora, 1988, p. 6. 7Laissez-faire é expressão escrita em francês que simboliza o liberalismo econômico, na versão mais pura de

capitalismo de que o mercado deve funcionar livremente, sem interferência, apenas com regulamentos suficientes para proteger os direitos de propriedade.

8CAPPELLETTI, Mauro; GARTH, Bryan. Idem, p. 9-10. 9Ibidem.

10FONTAINHA, Fernando de Castro. Acesso à Justiça: da contribuição de Mauro Cappelletti à realidade

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17 No olhar de Alexandre Freitas Câmara, é necessário reafirmar a importância das três ondas renovatórias de Cappelletti como caminho a ser seguido para alcançar o efetivo acesso à justiça. Dispõe ainda que o acesso à justiça “como integrante do plano dos direitos humanos”, põe em foco a temática das garantias fundamentais, no acesso à justiça, explicitando os princípios axiológicos supremos como liberdade, igualdade e fraternidade, e princípios estruturais da irrevogabilidade e a complementariedade solidária.11

Nesse prisma, Gilton Batista Brito aponta que:

A atenção na atualidade é dirigida a instituições e mecanismos usados na prevenção e no processamento de disputas, embora retomando uma perspectiva clássica da Teoria de Direito Processual: aquela que considera a jurisdição uma atividade secundária, meramente substitutiva da resolução de controvérsia espontaneamente pelas partes e cujo insucesso autoriza a intervenção estatal.12

Desta maneira, serão analisadas as ondas renovatórias de acesso à justiça, destacando sua aplicabilidade no acesso à justiça no Brasil.

1.1.1 A Primeira Onda: a assistência judiciária aos pobres

De início, a primeira onda sustentada por Cappelletti manifestou-se nos países do ocidente, sustentada na prestação de assistência judiciária aos menos favorecidos da sociedade. Como primeiras diligências no intuito de promover o acesso à justiça nos países, Cappelletti constatou o implemento dos serviços jurídicos aos pobres na efetivação da primeira onda renovatória. Todavia, a modernidade vivenciada pela sociedade se ampara na essencialidade do patrocínio de advogados pela complexidade das leis e a difícil aplicação das técnicas processuais.13

Existem inúmeras barreiras que dificultam o acesso à justiça, sobretudo em relação às classes desprovidas de recursos econômicos, pelas quais recaem maiores dificuldades e, se não bastassem pela própria ignorância. Nessa forma, existem inúmeros prejuízos a estes

11CÂMARA, Alexandre Feitas. Lições de direito Processual Civil. Vol. 1. Lúmen Juris: Rio de Janeiro,

pp.31-38.

12BRITO, Gilton Batista. O Acesso à Justiça, a Teoria da Mediação e a Resolução 125/2010 do CNJ. In:

Revista da Ejuse, Nº 20, 2014 - Doutrina – 103.

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18 indivíduos específicos, já que pela impossibilidade de suprir financeiramente uma ação, carecem de informação para assim buscarem os seus direitos.

Estas inconveniências são ocasionadas por debilidade jurídica pessoal, no qual impede o reconhecimento da “existência de um direito juridicamente exigível”. Ainda podemos apontar em desfavor aos necessitados seu desconhecimento processual, além da dificuldade de superação da barreira da “disposição psicológica para recorrer a processos judiciais”.14

Mauro Cappelletti concluiu que a assistência judiciária também apresenta possibilidades de queda de barreiras de acesso à justiça, ampliação para outras matérias de direito além da criminal ou de família e limitações (pequeno número de advogados participantes, disponibilidade para atendimento, orçamento estatal adequado para custear uma contraprestação salarial compatível aos valores de mercado, a baixa atuação em pequenas causas individuais e o não-atendimento aos interesses difusos do consumidor sem focar apenas no interesse do “pobre”). Neste contexto, “uma ação positiva do Estado tornou-se necessária à plena realização de uma ordem jurídica mais igualitária e democrática”.15

Segundo infere Suzana Gastaldi, a primeira onda renovatória foi factualmente executada no Brasil após a entrada em vigor da Lei de Assistência Judiciária no início da década de 60, e mais tarde reforçada com a instituição da Defensoria Pública em todo país, com o advento da Lei Complementar 80, de 12 de janeiro de 1994.16

1.1.2 A Segunda Onda: os interesses difusos

Mauro Cappelletti destaca que a visão tradicional do processo civil não oportunizava a proteção dos direitos difusos, ao ser tratado como litígio entre duas partes como se fossem interesses individuais e não interesses particulares de determinada coletividade. O procedimento não dava crédito na defesa dessas causas. Daí passou-se a se discutir reformas

14Idem 15Idem, p. 32.

16GASTALDI, Suzana. As ondas renovatórias de acesso à justiça sob enfoque dos interesses

metaindividuais. In: Jus Navegandi. Disponível em: https://jus.com.br/art igos/26143/as-ondas-renovatorias-de-acesso-a-justica-sob-enfoque-dos-interesses-metaindividuais. Acesso em 03 de setembro de 2017.

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19 que culminaram em alterações, em direção ao direito público em virtude da vinculação a assuntos de política pública voltadas para comunidades específicas.

Inicialmente, as reformas legislativas e as decisões dos tribunais ampararam a legitimação de indivíduos ou grupos na representação dos interesses difusos. A seguir, a proteção de tais interesses levou à transformação do papel do juiz, de inúmeros instrumentos processuais (citação, direito de defesa etc.) e a representação por uma pessoa (capacidade) em benefício de uma coletividade.17

Um problema vislumbrado por Cappelletti é a precaução de promover o encontro das partes interessadas, seja pela probabilidade de difusão ou incapacidade de haver um empenho similar. Isso em razão da complexidade de se “coadunar diversos litigantes numa mesma ação, o que torna difícil assegurar que uma ação coordenada ocorra, então se mobiliza a máquina governamental para a proteção dos interesses difusos”.18

Em similaridade com Carreira Alvim, a preocupação da segunda onda resultou da incapacidade de o processo civil tradicional, de cunho individualista, servir para a proteção dos direitos ou interesse difusos ou também chamados de coletivos. É que o processo foi sempre visto como campo de disputa entre particulares, tendo por objetivo a solução de controvérsia entre eles a respeito de seus próprios interesses individuais.

Segundo manifesta Michele Mello, “tal onda renovatória permitiu a mudança de postura do processo civil, que, de uma visão individualista, funde-se em uma concepção social e coletiva, como forma de assegurar a realização dos ‘direitos públicos’ relativos a interesses difusos”.19

A segunda onda renovatória, no Brasil, é de considerável importância, em razão de que coloca em xeque a imagem dos interesses difusos e de grupos, posto que a primeira onda somente se direcionava à assistência conferida aos menos favorecidos da sociedade.

17CAPPELLETTI, Mauro; GARTH, Bryan. Acesso à Justiça. Porto Alegre: Fabris Editora, 1988, p. 33-34. 18CAPPELLETTI, Mauro; GARTH, Bryan. Acesso à Justiça. Porto Alegre: Fabris Editora, 1988, p. 19-20. 19 MELLO, Michele Damasceno Marques. Considerações sobre a influência das ondas renovatórias de

Mauro Cappelletti no ordenamento jurídico brasileiro. 2010, p. 23. Disponível em:

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20 Nisso, Cappelletti vai aduzir que

Centrando seu foco de preocupação especificamente nos interesses difusos, esta segunda onda de reformas forçou a reflexão sobre noções tradicionais muito básicas do processo civil e sobre o papel dos tribunais. Sem dúvida, uma verdadeira “revolução” está-se desenvolvendo do processo civil.20

No mesmo sentido, o Código de Defesa do Consumidor (Lei nº. 8.078/90) e a Lei da Ação Civil Pública (Lei nº 7.347/85), tiveram suas ideias basilares amparadas na segunda onda. O Código de Defesa do Consumidor, no art. 81, conceitua os direitos difusos, coletivos e individuais homogêneos, conforme dispõe no inciso I. Este primeiro inciso prevê a defesa dos direitos transindividuais, de natureza indivisível, de que sejam titulares pessoas indeterminadas e ligadas por circunstâncias de fato.

No inciso II, se preconiza a defesa dos interesses ou direitos coletivos, assim entendidos, ou transindividuais de natureza indivisível de que seja titular grupo, categoria ou classe de pessoas, ligadas entre si ou com a parte contrária com uma relação jurídica base. Já no inciso III, há a previsão da defesa de interesses ou direitos individuais homogêneos, assim entendidos os decorrentes de origem comum.

1.1.3 A Terceira Onda: os juizados especiais

Os arranjos precedentes, com seus instrumentos criados e elaborados, foram, segundo Cappelletti, imprescindíveis para possibilitarem o acesso à justiça aos pobres e para defender os interesses difusos, como o consumo, a preservação ambiental e o interesse público de toda a comunidade.

No entanto, numa nova perspectiva de acesso à justiça, Cappelletti desenvolve esse campo, acrescentando

A advocacia, judicial ou extrajudicial, seja por meio de advogados particulares ou públicos, mas vai além. Ela centra sua atenção no conjunto geral de instituições e

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21 mecanismos, pessoas e procedimentos utilizados para processar e mesmo prevenir disputas nas sociedades modernas.21

Por sua abrangência, esse novo panorama não olvida as técnicas das duas ondas renovatórias, mas as utiliza na representação legal das partes desfavorecidas e no seu direito de acesso a uma justiça igualitária. Não obstante, conforme nos relata Cappelletti “(...) nós aprendemos, agora, que esses novos direitos frequentemente exigem novos mecanismos procedimentais que os tornem exequíveis”.22

Ou melhor, as disposições de procedimento despertam os direitos substantivos e dão-lhes efetividade, chegando assim no sistema organizacional do Judiciário que, além das reformas processuais e legislativas, carecia de reformas procedimentais, estruturais, do entendimento e envolvimento dos magistrados, bem como capacitação de serventuários e auxiliares da justiça, na alternativa ao litígio, enfim.

Como pontua o autor, esse “enfoque reconhece a necessidade de correlacionar e adaptar o processo civil ao tipo de litígio”, ou seja, os mecanismos da terceira onda renovatória podem ser utilizados para amparar o indivíduo pessoalmente e, ainda assim, impor os direitos coletivos de uma classe.

As consequências desse ponto de vista do acesso à justiça são muitas e se pautam de todos os meios do judiciário. As disposições constatadas são fruto de um esforço inovador no mundo, e possuem imensa capacidade de êxito. Para tal fim, os procedimentos judiciais, adicionados da possibilidade do uso de métodos alternativos para decidir causas judiciais, como os mecanismos do juízo arbitral, da conciliação, da mediação, dentre outros.

Neste aspecto, Cavalcanti conclui pela busca de outros meios, pois

Hoje em dia, os métodos alternativos de solução de disputas são ferramentas essenciais na pacificação de litígios. A dinâmica e a complexidade das relações comerciais no mundo de hoje exigem que os operadores do direito busquem

21CAPPELLETTI, Mauro; GARTH, Bryan. Acesso à Justiça. Porto Alegre. Fabris Editora, 1988, p. 43-44. 22Idem, p. 44-45.

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22 soluções adequadas para cada situação específica, para prevenir e resolver os litígios entre as partes.23

Infere-se, pois, o grande envolvimento do Estado no acesso à justiça, não somente por via judicial, mas através de implementação de políticas públicas de incentivo à conciliação, mediação e arbitragem com a inclusão de mecanismos administrativos de proteção das relações sociais, familiares, civis, de consumo etc. Evidencia-se, todavia, que esses mecanismos processuais devem ser priorizados dentro das relações jurídicas.

Nas palavras de César Felipe Cury:

Numa sociedade de consumo de massa, a utilização exclusiva do Judiciário para obtenção de tutela expõe a inaptidão do modelo adversarial das questões mais triviais e seriadas, que privilegia o antagonismo como construtor da decisão em vez da negociação facilitada e responsável.24

Diante da desavença que envolvia o bem-estar social, e também objetivando proteger a parte mais débil do vínculo de demanda, o Estado, em suma, tomou para si a tutela jurisdicional dos conflitos, abstraindo experiências de outros países ao modelo judicial brasileiro.

1.2 O acesso à justiça e a efetividade da tutela jurisdicional nas convenções internacionais e na Constituição de 1988

Na Constituição Federal de 1988, estabelecendo a efetividade da tutela jurisdicional, são claras as garantias fundamentais previstas, como o acesso à Justiça (art. 5º, XXXV) e a razoável duração do processo (art. 5º, LXXVIII), reconhecidos como direitos humanos e

23CAVALCANTI, Fabiano Robalinho. Arbitragem. In: Cadernos Colaborativos, 1.ed., FGV: Rio de Janeiro,

2016, p. 6.

24CURY, César Felipe. Novos tempos na Justiça. Revista da EMERJ, Rio de Janeiro, RJ, v. 18, n. 70, p. 51-55,

set/out. 2015, p. 51. Disponível em: http://www.emerj.tjrj. jus.br/revistaemerjonline/edicoes/revista70 /revista70_51.pdf. Acesso em: 05 de setembro de 2017.

(24)

23 princípios de natureza constitucional nos ordenamentos jurídicos de Estados Democráticos, conforme defende João Batista Lazzari.25

Chama a atenção para o fato de que os Princípios presentes na CRFB/1988 são: o Princípio do devido processo legal previsto no artigo 5.º, inciso LIV, quando aponta que “ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal”; os Princípios do contraditório e da ampla defesa no art. 5.º, LV, ao preconizar que “aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes”; a Inadmissibilidade de provas ilícitas: art. 5.º, LVI – “são inadmissíveis, no processo, as provas obtidas por meios ilícitos”; o Princípio do juiz natural: art. 5.º, LIII – “ninguém será processado nem sentenciado senão pela autoridade competente”; e art. 5.º XXXVII – “não haverá juízo ou tribunal de exceção”; o Princípio da inafastabilidade da apreciação jurisdicional: art. 5.º, XXXV – “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”; Princípio da razoável duração do processo: art. 5.º, LXXVIII – “a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação” (incluído pela Emenda Constitucional n.º 45, de 2004).

A Declaração Universal dos Direitos do Homem, aprovada pela ONU em 10/12/1948, na qual o sentido intrínseco foi incorporado pela Constituição de 1988, possui disposição expressa em seu inciso VIII, definindo que "Todo homem tem direito a receber, dos tribunais nacionais competentes, remédio efetivo para os atos que violem os direitos fundamentais que lhe sejam reconhecidos pela constituição ou pela lei”.26

O art. 14, n° 1, do Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos de 1966, logo no início do dispositivo que trata do acesso à justiça, expõe que “todas as pessoas são iguais perante Tribunais e Cortes de Justiça (...)”, igualmente, já com o foco no direito de defesa na área criminal, incumbência legitimada pela atuação da Defensoria Pública, dispõe no mesmo art. 14 n° 3, que

25LAZZARI, João Batista. Os princípios constitucionais do acesso à justiça e da razoável duração do

processo.GenJurídico, 2015. Disponível em: http://genjuridico.com.br/

2015/08/11/os-principios-constitucionais-do-acesso-a-justica-e-da-razoavel-duracao-do-processo/. Acesso em 05 de setembro de 2017.

26Disponível em: http://unesdoc.unesco.org/images/0013/001394/139423por.pdf. Acesso em 05 de setembro de

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24 Toda pessoa acusada de um delito terá direito, em plena igualdade, às seguintes garantias mínima: (...) d) a estar presente no julgamento e a defender-se pessoalmente ou por intermédio de defensor de sua escolha; a ser informada, caso não tenha defensor, do direito que lhe assiste de tê-lo e, sempre que o interesse da justiça assim exija, a ter um defensor designado ex ofício gratuitamente, se não tiver meios para remunerá-lo.

O artigo supracitado, apesar do seu cerne no âmbito da defesa criminal, preza suas intenções jurídicas gerais de acordo com as concepções do direito humano à assistência jurídica dos sujeitos que possuem necessidades econômicas na seara da Conjuntura Internacional de Direitos Humanos e Fundamentais.

Nas palavras de Carlos Weis, no que se refere a questão:

A ideia que todos tem direito a se defender perante um tribunal guarda relação com o estabelecimento do due process of Law e suas garantias inerentes, como contrafação ao poder estatal de privar o ser humano de um dos seus mais caros bens, a liberdade de locomoção. Vale observar, no entanto, que o Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos em seu art. 14.3.d, vai muito além das previsões tradicionalmente associadas à liberdade de defesa, provocando algumas reflexões, a começar pela gratuidade do serviço. Ora, embora o tratado não estipule quem deverá arcar com o ônus de remunerar o defensor, é evidente que se trata de uma obrigação estatal, na medida em que o Direito Internacional dos Direitos Humanos aponta o Estado como obrigado primário dos direitos ali consagrados.27

Na esfera do Sistema Interamericano dos Direitos Humanos, a Convenção Americana de Direitos Humanos – Pacto de San José da Costa Rica dedicou, de forma escritural, no item dedicado às garantias judiciais, a seguinte disposição:

Toda pessoa acusada de delito tem direito a que se presuma sua inocência enquanto não se comprove legalmente sua culpa. Durante o processo, toda pessoa tem direito, em plena igualdade, às seguintes garantias mínimas: (...) e) direito irrenunciável de ser assistido por um defensor proporcionado pelo Estado, remunerado ou não, segundo a legislação interna, se o acusado não se defender ele próprio nem nomear defensor dentro do prazo estabelecido pela lei.28

27 WEIS, Carlos. Direitos Humanos e Defensoria Pública. Boletim do IBCRIM. São Paulo, 2002. P. 5-6.

Disponível em:https://www.ibccrim.org.br/boletim/135-115-Junho-2002/?ano_filtro=2002. Acesso em 08 de novembro de 2017.

28 Disponível em: https://www.cidh.oas.org/basicos/portugues/c.convencao_americana.htm. Acesso em 05 de

(26)

25

Neste prisma, a Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica), de 22.11.1969, estabelece no art. 8.1 que:

Toda pessoa tem direito a ser ouvida, com as devidas garantias e dentro de um prazo razoável, por um juiz ou tribunal competente, independente e imparcial, estabelecido anteriormente por lei, na apuração de qualquer acusação penal formulada contra ela, ou para que se determinem seus direitos ou obrigações de natureza civil, trabalhista, fiscal ou de qualquer outra natureza. 29

Em razão desta necessidade incorporada à nossa Carta Magna pelo legislador constituinte, inúmeros dispositivos tratam do acesso à justiça como forma de amparo jurisdicional ao cidadão, seja ele de qual classe social ou poder aquisitivo for.

Mais recentemente, inclusive pela perspectiva de um “processo equitativo”, resultou consagrado na Carta de Direitos Fundamentais da União Europeia (2000), precisamente no seu art. 47, que

Toda pessoa cujos direitos e liberdades garantidos pelo direito da União tenham sido violados tem direito a uma ação perante um tribunal. Toda pessoa tem direito a que sua causa seja julgada de forma equitativa, publicamente e num prazo razoável, por um tribunal independente e imparcial, previamente estabelecido por lei. Toda pessoa tem a possibilidade de se fazer aconselhar, defender e representar em juízo. É concedida assistência judiciária a quem não disponha de recursos para garantir a efetividade do acesso à justiça.30

No final do que se dispõe tal artigo, se verifica a forma paradigmática como se mostra a relevância do direito humano e fundamental à assistência jurídica gratuita, e que, para isso, é necessário a plena efetivação do acesso à justiça parte. Essa análise tem como objetivo primar pela igualdade entre as partes nas mais diversas esferas do Sistema de Justiça.

29 Disponível em: https://www.cidh.oas.org/basicos/portugues/c.convencao_americana.htm. Acesso em 05 de

setembro de 2017.

30Carta de Direitos Fundamentais da União Europeia do ano 2000. Disponível em:

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26 Para além da concessão do acesso à justiça nas instituições jurídicas, fica a cargo do Estado estabelecer todas as condições necessárias para o pleno acesso do indivíduo ou de grupos sociais. Isso se dá quando se materializa meios importantes, como por exemplo, a gratuidade de justiça em relação ao pagamento de custas judiciais, ou do patrocínio de profissionais capacitados como os Defensores Públicos.

Segundo Souza e Oliveira, “os três grandes fundamentos jurídico-constitucionais para a adoção de métodos que possibilitem o pleno acesso ao judiciário, em que se vê envolvido o Poder Público, seja na esfera administrativa, seja na esfera judicial”, são:

a) o princípio do acesso à justiça (art. 5º., XXXV, da Const. Federal), que exige a disponibilização de métodos adequados (sob os aspectos temporal, econômico e de resultados) de resolução de conflitos, não se subsumindo a uma simples garantia de acesso formal ao sistema judicial – princípio do qual decorre o também positivado princípio da razoabilidade na duração do processo administrativo e judicial (art. 5º, LXXIV);

b) o princípio da eficiência (art. 37, caput), que demanda sejam os conflitos resolvidos da forma que apresente a melhor relação entre custo e benefício, ou seja, menores custos, menos tempo, menos desgaste para a relação entre as partes e melhores resultados para ambas;

c) o princípio democrático, fundamento de nossa ordem constitucional (art. 1º.), que decorre de o Estado não ser um fim em si mesmo e reclama, portanto, que, quando o Poder Público se veja envolvido em conflitos com particulares, ele se disponha, em primeiro lugar, a dialogar com estes para encontrar uma solução adequada para o problema.31

A conjuntura normativa traçada mediante o Direito Internacional dos Direitos Humanos, tanto no sentido global quanto nacional, em conformidade com o que foi exposto neste item, foi decisivo para a consagração do direito à assistência jurídica como um direito fundamental e, também, para a criação e fortalecimento do maior órgão de defesa que é a Defensoria Pública, como foi idealizada na Constituição Federal de 1988.

31SOUZA, Luciane Moessa de; OLIVEIRA, Igor Lima Goettenauer de Oliveira. Resolução consensual de

conflitos coletivos envolvendo políticas públicas. 1. ed. – Brasília, DF: FUNDAÇÃO UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA/FUB, 2014 FUB: Brasília, 2014, p. 63. Disponível em: https://issuu.com/adamsistemas/docs/adam _resol_cons_conf_pp Acesso em 07 de setembro de 2017.

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27

1.3 O Acesso à Justiça no Código de Processo Civil de 2015 : O Papel da Defensoria Pública

A Lei nº 13.105 de 16 de março de 2015, mais conhecida como Novo Código de Processo Civil – NCPC, trouxe uma série de inovações e aborda o acesso à justiça como política pública necessária à garantia de direitos e garantias fundamentais a todo cidadão.

Inova ao prever, expressamente no artigo 3º, o direito ao acesso à justiça para todos, permitir a arbitragem e estabelecer que o Estado seja o promotor da resolução consensual dos conflitos, devendo estimulá-la através das soluções alternativas que antecipem o fim do processo.

O novo delineamento constitucional da Defensoria Pública, principalmente após a edição da EC 80/2014, reflete-se no Código de Processo Civil de 2015. O atual código reconhece a instituição da Defensoria Pública como uma instituição autônoma e peculiar para o cenário jurídico.

Precedente a esse reconhecimento, o Código de Processo Civil de 1973 não tratava a Defensoria Pública como integrante do sistema de justiça, sequer fazia referência ao órgão.32As únicas referências constantes no código anterior faziam menção apenas aos atores jurídicos, como aos membros do Ministério Público, os juízes e os causídicos.

Devido a isto, a Defensoria Pública era sempre associada com a figura da advocacia, que, no entendimento de muitos, os defensores públicos e os advogados seriam sinônimos, detinham as mesmas funções. A defensoria Pública, por fim, não era observada como uma instituição de aspectos próprios.33

O Novo Código de Processo Civil dedica o título VII do livro III à Defensoria Pública, mais precisamente nos arts. 185 a 187, como se aduz:

32 A Defensoria Pública, aos tempos da promulgação do Código de Processo Civil de 1973, não tinha relevância

constitucional aos moldes do que se verifica hoje no art. 134 da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.

(29)

28 Art. 185. A Defensoria Pública exercerá a orientação jurídica, a promoção dos direitos humanos e a defesa dos direitos individuais e coletivos aos necessitados, em todos os graus, de forma integral e gratuita.

Art. 186. A Defensoria Pública gozará de prazo em dobro para todas as suas manifestações processuais.

§ 1º O prazo tem início coma intimação pessoal do defensor público, nos termos do art. 183, § 1º.

§ 2º A requerimento da Defensoria Pública, o juiz determinará a intimação pessoal da parte patrocinada quando o ato processual depender de providencia ou informação que somente por ela possa ser realizada ou prestada.

§ 3º O disposto no caput aplica-se aos escritórios de prática jurídica das faculdades de Direito reconhecidas na forma da lei e às entidades que prestam assistência jurídica gratuita em razão de convênios firmados com a Defensoria Pública.

§ 4º Não se aplica o benefício da contagem em dobro quando a lei estabelecer, de forma expressa, prazo próprio para a Defensoria Pública.

Art. 187 O membro da Defensoria Pública será civil e regressivamente responsável quando agir com dolo ou fraude no exercício de suas funções.34

Conforme se verifica, algumas das disposições inseridas no Título VII repetem o conteúdo de outras disposições já postas na Constituição Federal, assim como nas Leis Complementares Federais e Estaduais. O intuito, porém, tem fundamento quando se preza pelo respeito às competências legislativas constitucionais, uma vez que estas servem de parâmetro de validade para todas as outras normas infraconstitucionais.

Desse modo, destaca-se o art. 185 do NCPC que reitera a disposição do art. 134 da Constituição Federal, onde se aponta que a atuação da Defensoria Pública se pautará na promoção da assistência jurídica, na orientação jurídica, na promoção dos direitos humanos e na defesa dos direitos individuais e coletivos dos necessitados.35

O reconhecimento do papel e das peculiaridades da atuação da Defensoria Pública como bem tratada no Código de Processo Civil de 2015, mostra que a instituição defensiva exerce função pública, não podendo as prerrogativas inerentes e concedidas pela Constituição Federal serem declinadas a um viés menos relevante.

34 Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm. Acesso em 14 de

outubro de 2017.

35 CRFB, art. 134, caput A Defensoria Pública é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do

Estado, incumbindo-lhe, como expressão e instrumento do regime democrático, fundamentalmente, a orientação jurídica, a promoção dos direitos humanos e a defesa, em todos os graus, judicial e extrajudicial, dos direitos individuais e coletivos, de forma integral e gratuita, aos necessitados, na forma do inciso LXXIV do art. 5º desta Constituição Federal.

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29 Na análise de Frederico Rodrigues Viana de Lima:

Não se trata de privilégio ou de benesse indevida, mas, sim, de diretriz que visa acomodar a instituição em um quadro que lhe permita atuar de modo compatível com o exercício da função pública de prestação de assistência jurídica gratuita- sobretudo para que não sejam acarretados prejuízos àqueles que são por ela assistidos.36

A desigualdade jurídica que se via no antigo código de processo civil não foi pretendida pelo atual código, concedendo a Defensoria Pública maior protagonismo na atuação em defesa dos hipossuficientes.

É nesta segurança jurídica que se desponta os entendimentos acerca do acesso à justiça, como sendo um direito fundamental pelo qual deve ser assegurado pelo Estado Brasileiro e pelo Sistema Internacional dos Direitos Humanos.

(31)

30

CAPÍTULO 2 A CONSTITUCIONALIZAÇÃO DA ASSISTÊNCIA JURÍDICA NO

BRASIL E A DEFENSORIA PÚBLICA

2.1 Histórico

Não há como falar em assistência jurídica e da constitucionalização da Defensoria Pública sem tecer algumas considerações acerca do modo como se iniciou a assistência aos necessitados no Brasil. Trata-se de um antecedente lógico para o correto tratamento da questão.

Muito se discute quanto ao período no qual os pobres tiverem as primeiras oportunidades de serem assistidos perante aos órgãos ou instancias de justiça consolidadas em suas diversas épocas. No caso específico do Brasil, desde o início da colonização portuguesa, a defesa da população desfavorecida perante os tribunais era considerada uma obra de filantropia, com fortes traços religiosos.37

O Código das Ordenações Filipinas, no Livro III, Título 84, parágrafo 10, definia critérios aos pobres que não detinham condições financeiras para quitarem as custas processuais. Desse modo, assim determinava:

Em sendo o agravante tão pobre que jure não ter bens móveis, nem de raiz (imóveis), nem por onde pague o agravo, e dizendo na audiência uma vez o Pater

Noster pela alma do Rei Dom Diniz, ser-lhe-á havido como que se pagasse os

novecentos réis, contanto que tire de tudo certidão dentro do tempo, em que havia de pagar o agravo.38

Além dessa previsão, as determinações das Ordenações Filipinas também asseguravam aos menores e aos loucos curadores para o patrocínio dos mesmos, haja vista a dificuldade existencial de se defenderem perante as cortes de justiça:

“E sendo o menor de quatorze anos, então será necessário (posto que sem curador queira fazer por ele a demanda) aparecer ele, o menor, em juízo, e fazer seu Procurador com autoridade do curador, ou do juízo do feito”.39

37O Código das Ordenações Filipinas. Disponível em: http://www1.ci.uc.pt/ihti/proj/filipinas/ordenacoes.htm.

Acesso em 14 de outubro de 2017.

38 Disponível em: http://www1.ci.uc.pt/ihti/proj/filipinas/l3p695.htm. Acesso em 14 de outubro de 2017. 39 Disponível em: http://www1.ci.uc.pt/ihti/proj/filipinas/l3p625.htm. Acesso em 14 de outubro de 2017.

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31 “Porque além dos curadores, que hão de ser dados aos menores de vinte e cinco anos, se devem também dar Curadores aos desassisados e desmemoriados, e aos pródigos, que mal gastarem suas fazendas”.40

No século XIX, período no qual de fato foram instituídas as primeiras legislações em âmbito territorial brasileiro, enfatiza-se, por exemplo, a promulgação do primeiro Código de Processo Criminal do Império, no ano de 1832. Nove anos depois, o Código de Processo Criminal do Império sofreu uma grande alteração no que concerne ao pagamento de custas. Embora a previsão não ter tido a intenção de influenciar os menos abastados da sociedade a pleitearem os seus direitos, tratando-se de um período antidemocrático no Brasil, a disposição era minimamente plausível.

Assim previa o art. 99 da Lei nº 261, de 3 de dezembro de 1841:

“Sendo o réo tão pobre, que não possa pagar as custas, perceberá o Escrivão a metade dellas do Cofre da Câmara Municipal da Cabeça do Termo, guardado o seu direito contra o réo quanto à outra metade”.41

No ano de 1842, ocorreu a previsão de isenção de taxas e custas aos pobres no que se referia aos trâmites do ramo do processo civil à época. O Decreto nº 150, de 9 de abril de 1842, em seu art. 10, tratava-se da arrecadação da “Dizima de Chancellaria” e previa a isenção aos seguintes grupos:

Art. 10. São isentos do pagamento:

1º Os Procuradores da Coroa, Soberania e Fazenda Nacional 2º Os Promotores dos Resíduos

3º Os Orphãos

4º As Viúvas e Pessoas Miseráveis.42

Apesar das previsões, as leis e decretos não eram satisfatórios para o pleno acesso da classe pobre aos tribunais. Não há de se olvidar que a sociedade do século 19 ainda era extremamente segregada e elitista. Por este motivo, conceder as mínimas condições de assistência judiciária aos pobres era na visão de muitos, um grande avanço.

40 Disponível em: http://www1.ci.uc.pt/ihti/proj/filipinas/l4p1004.htm. Acesso em 14 de outubro de 2017. 41 Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/lim/LIM261.htm. Acesso em 14 de outubro de 2017. 42Disponível em: http://www2.camara.leg.br/legin/fed/decret/1824-1899/decreto-150-9-abril-1842-560889-

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32 A partir da aprovação da lei que criou o Código de Assistência Judiciária na França em 1851, inúmeros juristas brasileiros sonhavam com algo parecido no Brasil. O jurista pernambucano, Nabuco de Araújo, que fora Ministro da Justiça do Império e, também, Presidente do Instituto dos Advogados Brasileiros em 1870, entusiasmado pelos acontecimentos na Europa e nos Estados Unidos, propôs algo inovador do Brasil, no sentido de dar concretude a ideia da assistência e acesso à justiça.43

Nabuco, pelo próprio desejo de mudar a realidade jurídica no Brasil, defendeu a criação do Instituto dos Advogados do Rio de Janeiro.44 Este seria uma espécie de conselho que dava assistência judiciária aos indigentes da cidade do Rio de Janeiro.45Tal ideia foi concretizada e serviu de parâmetro para que outros institutos no país também adotassem as medidas mais apropriadas para a inclusão dos grupos vulneráveis.

A década de 30 foi, sem sombra de dúvidas, a época em que a assistência judiciária adentrou ao sistema constitucional do país. A Constituição de 1934 trouxe, pela primeira vez, o ideal de assistência judiciária aos necessitados, dando início a longa trajetória do assistencialismo jurídico como direito fundamental.

A Constituição de 1934, considerada de relevância histórica pela doutrina, ao ser promulgada no país, determinou que os entes federativos adotassem mecanismos para a criação de órgãos aos quais deveriam ser específicos para a causa da assistência e da defesa.46 Desse modo, a assistência judiciária passaria não mais a ser uma prerrogativa concedida somente aos advogados, todavia, a assistência judiciária passaria a ter um múnus público mais abrangente.

A Carta Política de 1934 previa a assistência judiciária da seguinte forma:

43 ALVES, Cleber Francisco. Justiça para Todos: Assistência Jurídica Gratuita nos Estados Unidos, na

França e no Brasil. Editora: Lúmen Juris. Rio de Janeiro, 2006. p.238-239.

44Idem

45 SILVEIRA, Alfredo Balthazar da. O Instituto da Ordem dos Advogados Brasileiros: Memória Histórica

da sua Fundação e da sua Vida 1843-1943. Rio de Janeiro, 1944, p.54-56.

46 ALVES, Cleber Francisco. Justiça para Todos: A Assistência Jurídica Gratuita nos Estados Unidos, na

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33 Art. 113 – Inciso XXXII: A União e os Estados concederão aos necessitados assistência jurídica, criando para esse efeito órgãos especiais e assegurando a isenção de emolumentos, custas, taxas e selos.47

Desde então, a elevação desse princípio para a seara constitucional mostrava um novo entendimento, no qual era necessário definir as garantias e os direitos indispensáveis para a vida política e social da coletividade. É valido notar ainda que, de acordo com o modelo originário adotado pela Constituição de 1934, a responsabilização da prestação dos serviços de assistência judiciária ficou a cargo das unidades federativas e do próprio governo federal, não havendo a possibilidade dos municípios integrarem essa tarefa.48

Não obstante o intuito da Carta de 1934 em aprimorar a assistência judiciária no país, tal desejo deve duração efêmera. O golpe de Estado no ano de 1937 colocou em xeque todo o início da evolução constitucional social mediante a outorga pelo presidente Getúlio Vargas da nova Constituição. Esta não fazia qualquer menção ao direito dos cidadãos de receberem a assistência judiciária.49

Com a redemocratização do país após os horrores da Segunda Guerra Mundial e do fim período ditatorial de Getúlio Vargas (Estado Novo), foi em 18 de setembro de 1946 promulgada a Constituição de 1946, que detinha um viés mais assistencialista, quando comparada a Carta outorgada anteriormente. Quanto a assistência judiciária na Constituição de 1946, a mesma declarava expressamente:

Art. 141 § 35º: O poder público, na forma que a lei estabelecer, concederá assistência judiciária aos necessitados. 50

Nota-se que esta Constituição representou uma tentativa de conciliação entre a ordem liberal econômica e a estruturação do Estado Social já previsto na Constituição de 1934. No entanto, como já ocorria nas Constituições anteriores, as previsões não tinham o mérito de

47 Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao34.htm. Acesso em 14 de

outubro de 2017.

48 ALVES, Cleber Francisco. Justiça para todos: Assistência Jurídica Gratuita nos Estados Unidos, na

França e no Brasil. Editora: Lúmen Juris. Rio de Janeiro, 2006. p. 244.

49Ibidem

50 Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao46.htm. Acesso em 15 de

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34 modificar a realidade, permanecendo apenas no plano teórico ao afirmar o dever-fazer do Estado Brasileiro.

Um novo impulso marcante, porém, foi dado no ano de 1950, com a aprovação da lei própria acerca da assistência judiciária às pessoas carentes de recursos financeiros, qual seja, a Lei 1.060 de 05 de fevereiro de 1950.51Conquanto o texto da Lei não tenha ensejado novidades importantes na década de 50, teve ao menos a intenção de pôr em pauta no Congresso da época toda a discussão que girava em toda da matéria, legitimando a concepção de que a assistência judiciária merecia ser admitida como direito do cidadão.

A Lei 1.060/50teve o cuidado de consolidar em um só documento várias normas sobre a assistência jurídica que estavam espalhadas nos diversos códigos. Desse modo, ficou mais acessível para os operadores do Direito estabelecer qual a lei aplicável à assistência judiciária, servindo esta lei para todas as áreas do processo.52

Conforme já aludido acima, a redação originária da Lei nº 1.060/50 foi sofrendo alteraçõesna medida em que este modelo nacional ia se aperfeiçoando. No próprio texto originário se previa que a prestação da assistência judiciária era dever dos poderes público federal e estadual (Art. 1º)53 e que a nomeação de advogado particular para prestar tal serviço somente ocorreria em caso de ausência do serviço público respectivo (Art. 5º).54

Na década de 50, não podendo deixar de enfatizar, foi instituída a primeira Defensoria Pública do país, a Defensoria Pública do Rio de Janeiro, a qual, além do pioneirismo, foi a instituição protagonista no cenário nacional como intermédio da assistência judiciária. Em 1954, antes do Estado do Rio de Janeiro se fundir com a Guanabara, sob o governo do então governador Amaral Peixoto, foram criados os seis primeiros cargos de Defensores Públicos do Brasil. No entanto, somente em 1977, com o advento da Lei Complementar Estadual nº 6,

51 Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L1060compilada.htm. Acesso em 15 de outubro de

2017.

52 ALVES, Cleber Francisco. Justiça para todos: Assistência Judiciária Gratuita nos Estados Unidos, na

França e no Brasil. Editora: Lúmen Juris. Rio de Janeiro, 2006. p. 246.

53 Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L1060compilada.htm. Acesso em 15 de outubro de

2017.

54 Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L1060compilada.htm. Acesso em 15 de outubro de

(36)

35 a Defensoria Pública do Rio de Janeiro passaria a ser regulamentada, determinando sua forma de organização e regime jurídico dos respectivos membros.55

A crise política vivida pelo país na década de 1960 acarretou o surgimento de novo regime constitucional. A proposição da assistência judiciária continuou sendo expressamente aludido nas Constituições Federais de 1967 e de 1969, conquanto com uma branda mudança na composição do texto, limitando-se a estabelecer que fosse concedida assistência judiciária aos necessitados “na forma da lei”, sem fazer menção que o referido serviço seria proporcionado pelo poder público ou por causídicos.56

No decurso do tempo da vigência da Constituição de 1969, os estados que ainda não detinham de um aparato próprio de assistência judiciária trataram de promover a sua instauração. Dessa maneira, com a restrição do estado de Santa Catarina, as demais unidades da federação começaram a instituir algum tipo de serviço público de assistência judiciária, atuando em diversas áreas do campo jurídico, destacando para a área criminal e cível.57

Assim, com este passo dado, foi-se criando pequenos núcleos de assistência em diversos estados, primando pela efetivação do acesso à justiça e pela assistência judiciária gratuita. De certa forma, o início da Defensoria Pública no Brasil foi desafiador, haja vista toda a instabilidade política que pairava sobre o Brasil. Os primeiros núcleos de assistência, portanto, obtiveram certa independência, não necessitando do auxílio de outros organismos da administração pública.

Após toda essa trajetória, desde as designações estabelecidas pelas Ordenações Filipinas até a Constituição de 1969, um novo modelo de assistência judiciária iria surgir. A Defensoria Pública ganharia espaço amplo dentro da conjuntura jurídica e constitucional do Brasil, sendo, posteriormente, considerada essencial para o pleno funcionamento do Estado Democrático de Direito.

55Disponívelem:http://alerjln1.alerj.rj.gov.br/contlei.nsf/f25edae7e64db53b03256ce8e? OpenDocument. Acesso

em 23 de outubro de 2017.

56 O art. 153, parágrafo 32, da Constituição de 1969, reproduzindo o texto do art. 150, parágrafo 32, da

Constituição de 1967 dizia: “será concedida assistência judiciária aos necessitados na forma da lei”. O texto anterior, no art. 141, parágrafo 35, da Constituição de 1946 expressamente mencionava que a assistência judiciária seria concedida “pelo poder público”.

57 ALVES, Cleber Francisco. Justiça para todos: Assistência Jurídica nos Estados Unidos, na França e no

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36

2.2 O delineamento jurídico -institucional da Defensoria Pública

A Constituição da República Federativa do Brasil, promulgada em 05 de outubro de 1988, estreou um novo ciclo na história da assistência judiciária no Brasil, estabilizando em sua conjuntura, o modelo que havia sido concebido nas décadas preexistentes conforme fora anteriormente relatado.58

Nas palavras de Luciana Gross Siqueira Cunha:

Até 1988, a assistência judiciária era tida como um serviço caritativo. Apesar de acolhida em nível constitucional, não se encontrava regulamentada – a assistência judiciária foi tratada de forma superficial apenas em 1950 pela Lei 1.060/50, que não determinou nenhuma forma específica para a prestação dos serviços jurídicos gratuitos, e nem de quem seria a responsabilidade por estes serviços. Com a Constituição Federal de 1988, o acesso à justiça e a assistência judiciária foram concebidos: enquanto direitos fundamentais, sendo assumido o modelo de assistência jurídica, no qual o serviço é prestado pelo Estado, através de uma instituição específica – Defensoria Pública – com carreira própria de advogados contratados e pagos pelo Estado.59

Infere-se que a consolidação da Defensoria Pública no cenário democrático do Brasil foi pautada principalmente pela ruptura do modelo simplório de assistência judiciária, que denotava a sua previsão como uma espécie de “favor” ao cidadão necessitado. Com o reconhecimento da importância da instituição para o país, foi necessário que se idealizasse um modelo mais democrático e eficiente para o acesso à justiça.

Todavia, com o advento da Constituição de 1988, veio junto a novidade de se colocar a questão da assistência judiciária em um plano mais abrangente, não apenas garantindo a assistência judiciária gratuita do interessado em juízo, mas buscar assisti-lo em sua integralidade.60

Deste modo, eis o texto previsto na Constituição de 1988:

58 Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em 23 de outubro

de 2017.

59 CUNHA, Luciana Gross Siqueira. O acesso à justiça e a Assistência Jurídica em São Paulo. Dissertação de

Mestrado. USP. São Paulo, 1999. p. 121.

60 ALVES, Cleber Francisco. Justiça para todos: Assistência Jurídica nos Estados Unidos, na França e no

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