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TENDÊNCIAS E PADRÕES DE INVESTIMENTO PRIVADO EM MOÇAMBIQUE:

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TENDêNCIAS E PADRÕES

DE INVESTIMENTO PRIVADO

EM MOÇAMBIQUE:

QUESTÕES PARA ANÁLISE

Nelsa Massingue e Carlos Muianga

INTRODUÇÃO

Nos últimos vinte anos, Moçambique registou um aumento significativo nos fluxos de capitais privados nacionais e estrangeiros, um pouco por todo o país e em alguns sectores como a agricultura, a indústria, o turismo e os recursos minerais e energia. A rela-tiva abundância, incluindo as mais recentes descobertas de recursos naturais (minerais, hidrocarbonetos, energia, florestas, água, terra, etc.) e a relativa facilidade de que goza o capital estrangeiro têm tornado Moçambique cada vez mais desejável ao investimento directo estrangeiro (IDE), com destaque para a exploração de recursos minerais e acti-vidades relacionadas (infra -estrutura, logística e serviços de apoio à actividade mineira, etc.). Dados do Centro de Promoção de Investimentos (CPI) referentes ao período de 1990 a 2011 mostram que o IDE representou cerca de 37% do investimento privado total aprovado, os empréstimos 57%, e o investimento directo nacional (IDN), 6%. Durante este período, a alocação do volume de investimento em termos sectoriais foi de 29% para os recursos minerais e energia, 25% para a agricultura, 18% para a indústria, 9% para o turismo, 8% para os transportes e comunicações e 11% para os restantes sectores.

Entretanto, os fluxos externos de capitais privados, IDE e empréstimos externos, têm tido uma importância relativa no investimento privado total, com tendência a aumentar à medida que se vão anunciando mais descobertas de recursos minerais e hidrocarbonetos (carvão, gás, areias pesadas, etc.) e a necessidade de desenvolvimento da infra -estrutura relacionada. Naturalmente, pode -se, a priori, olhar para a relativa importância do IDE

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no investimento privado total e sua alocação na exploração de recursos minerais, como sendo as principais características do padrão de investimento privado em Moçambique.

Este artigo constitui um ponto de partida para um projecto de investigação mais amplo sobre padrões de investimento em Moçambique e sua relação com a estrutura produtiva. O artigo tem base no quadro analítico apresentado por Castel -Branco (2010),“Economia Extractiva”, para explicar o funcionamento da economia de Moçambique, cujas carac-terísticas principais são: (i) especialização na produção e comercialização de produtos primários (sem ou com limitado processamento), (ii) desarticulação e fracas ligações entre actividades produtivas, (iii) foco nos mercados externos para exportação de produtos primários, (iv) concentração e afunilamento das actividades económicas e produtivas, e (v) limitadas ligações entre o investimento e o financiamento bancário doméstico.

O artigo argumenta que a relativa dependência do investimento privado em relação a fluxos externos de capital e a respectiva alocação do investimento na exploração de recursos naturais (em particular recursos minerais e energia) são apenas alguns elementos do padrão de investimento em Moçambique. Portanto, elementos como a natureza do investimento e a sua relação com a economia existente podem tornar a análise sobre os padrões de investimento relativamente mais completa do que uma simples análise dos fluxos de investimento e sua distribuição sectorial. O artigo mostra ainda que as características principais do investimento privado (concentração em grandes projectos, concentração na produção primária para exportação, concentração sectorial e regional) suportam o argumento sobre a natureza extractiva da economia de Moçambique.

O artigo pretende explorar alguns destes elementos, com base em informação estatística oficial e trabalho de campo exploratório levado a cabo em algumas províncias, ao mesmo tempo que levanta questões preliminares para análise. Para além da introdução, o artigo compreende mais quatro secções. A segunda secção analisa as tendências de investimento privado em Moçambique e suas características, com base no investimento privado aprovado pelo CPI entre 1990 e 2011.1 O uso do investimento privado aprovado como proxy para análise das tendências e dinâmicas de investimento justifica -se pela dificuldade de acesso à informação sistemática e de longo prazo sobre o investimento de facto realizado, o que pode colocar algumas limitações.2 Apesar das limitações, o uso das intenções de investimento é particu-1 A base de dados do CPI sobre investimento privado mostra o número total de projectos aprovados, a

localização (por província e/ou distrito), o montante total do investimento aprovado por fonte (IDE, IDN e empréstimos), a origem do IDE (país) e os postos de trabalho que os projectos prevêem criar.

2 Em alguns dos casos, estas limitações podem induzir a alguns erros de análise. Por exemplo, pode resultar no exagero do padrão de descontinuidade do investimento, na medida em que projectos de investimento,

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larmente interessante na medida em que mostra em que actividades os capitais privados nacionais e estrangeiros tencionam investir, o que tem implicações sobre os padrões de produção e o comércio no futuro e a sua relação com os planos de inves-timento público e o financiamento doméstico da actividade produtiva. Um outro aspecto importante no uso destes dados (o que pode ser visto com algum detalhe ao longo do texto) é o facto de a estrutura e o padrão do investimento aprovado serem consistentes com a estrutura e o padrão de produção e comércio (concentrada, desarticulada e com fracas ligações com dinâmicas produtivas e mercados internos).3

A terceira secção procura mostrar como é que o financiamento bancário domés-tico pode estar ligado ao investimento privado. A quarta secção do artigo faz, com base na análise feita nas secções anteriores e com informação produzida do trabalho de campo preliminar, algumas considerações sobre os padrões de investimento e a sua relação com a estrutura produtiva. Finalmente, a quinta secção faz algumas conclusões e levanta algumas questões e hipóteses para reflexão.

TENDêNCIAS E PADRÕES DE INVESTIMENTO PRIVADO

Esta secção descreve as tendências e os padrões gerais do investimento privado em Moçambique, suas características específicas e suas implicações analíticas. A secção argumenta que as características principais do investimento privado aqui descritas sobretudo os de grande dimensão, podem ser aprovados num ano e ser realizados ao longo de vários anos ou, por algum motivo, não ser mais realizados (Castel -Branco, 2010). Por exemplo, o projecto Ayr Petro Nacala (construção de uma refinaria de petróleo em Nacala), aprovado em 2007 e avaliado em cerca de US$ 5000 milhões é um de vários casos de investimento não implementado. Outro problema é que, na ausência de mais informação sistemática, torna -se difícil estimar a taxa de realização dos diferentes tipos de investimento (grande, pequeno, nacional e estrangeiro) (Castel -Branco, 2010). Por esta razão, um trabalho de campo preliminar foi levado a cabo pelo IESE em algumas províncias (Maputo, Gaza, Tete, Nampula e Cabo Delgado), com o objectivo de confirmar o estágio dos projectos de investimento aprovados. Apesar do esforço para confirmar a existência ou não de alguns projectos e o seu nível de realização, incluindo as respectivas razões, o grosso do investimento que consta na base de dados do CPI para essas províncias não foi possível ser apurado, por vários motivos: (i) o investimento é aprovado a vários níveis (quer ao nível do CPI, como ao nível dos respectivos sectores de tutela) e, algumas vezes, na ausência completa de coorde-nação entre as várias instituições. Por exemplo, parte significativa dos projectos de investimento é aprovada ao nível do CPI em Maputo, dos Ministérios e do Conselho de Ministros sem o devido conhecimento das autoridades ou direcções provinciais onde os projectos serão implementados; (ii) ausência de avaliações públicas sistemáticas sobre o estágio dos projectos aprovados, o que não permite criar uma base de infor-mação sistemática sobre os projectos e suas implicações analíticas. Portanto, uma análise mais rigorosa sobre o que de facto está a acontecer com o investimento privado em Moçambique requer olhar não somente para a informação do CPI (que é muito importante para prever padrões de produção e comércio no futuro), mas também para as dinâmicas produtivas existentes: em que sectores se está a investir mais ou menos, quantos projectos de facto existem, o que estão a fazer, onde estão localizados, etc.

3 Para mais informação sobre a caracterização do padrão de produção e comércio em Moçambique, ver (Castel -Branco, 2010, 2003, 2002).

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explicam, em grande medida, o padrão de concentração da produção e do comércio e, por conseguinte, o carácter extractivo da economia, nos termos em que foi carac-terizado na secção anterior.

INVESTIMENTO PRIVADO APROVADO

De acordo com os dados do CPI, de 1990 a 2011 foram aprovados 3408 projectos de investimento, num valor global de US$ 35 759 milhões e com um potencial para gerar 398 125 postos de trabalho no país. Deste valor global das intenções de investimento, cerca de 37% corresponde ao IDE, 6% ao IDN e 57% a emprés-timos na banca nacional e externa (ver Gráficos 1 e 2). Embora a composição dos empréstimos não esteja identificada nos dados do CPI (isto é, a parte dos emprés-timos correspondentes à banca nacional e à banca externa) é possível, olhando para a proporção do IDE e do IDN no total do investimento aprovado, afirmar, com alguma segurança, que a maior proporção dos empréstimos corresponde à banca externa, muito possivelmente dos países de proveniência do IDE. Um aspecto inte-ressante, que resulta da leitura dos dados do CPI, é que cerca de 67% dos projectos de investimento aprovados financiados por empréstimos estão directamente ligados ao IDE. Entretanto, para além desta descrição mais geral sobre o padrão de inves-timento aprovado, é importante olhar para algumas características específicas do investimento.

GRáFICO 1 INVESTIMENTO PRIVADO POR FONTE, 1990-2011 (EM % DO INVESTIMENTO TOTAL APROVADO)

IDE 37% Empréstimos 57% IDN 6%

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CONCENTRAÇÃO DE INVESTIMENTO EM GRANDES PROJECTOS E VIRADOS PARA A EXPORTAÇÃO

O Gráfico 2 mostra que o padrão de investimento, com base nas suas intenções ao longo do período em análise, é bastante irregular, com sucessivos períodos de pico e de abrandamento. Castel -Branco (2010) compara a irregularidade das intenções de investimento ao padrão de investimento de uma grande empresa e argumenta que “a irregularidade das intenções de investimento é o reflexo de dois factores combi-nados: a concentração do investimento num pequeno grupo de grandes projectos e o enviesamento dos dados provocados pela utilização de intenções de investimento aprovado em vez de investimento de facto realizado”.

GRáFICO 2 INVESTIMENTO PRIVADO APROVADO TOTAL, POR FONTE E POR ANO, 1990-2011 (EM MILHÕES DE US$)

0 500 1 000 1 500 2 000 2 500 3 000 3 500 4 000 4 500 5 000 5 500 6 000 6 500 7 000 7 500 8 000 8 500 1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 Investimento Directo Estrangeiro Investimento Directo Nacional

Empréstimos Total FONTE: BASE DE DADOS DO CPI

No entanto, se retirarmos da análise os grandes projectos de investimento e se, pelas características destes, assumirmos a existência de ligações mínimas entre algumas intenções de investimento de pequena e média escala com as dos grandes projectos, o cenário do investimento torna -se substancialmente diferente. Com excepção dos anos 1994, 1995, 1996 e 2011, os períodos de pico das intenções de

investimento coincidem com aprovação de grandes projectos,4 nomeadamente a

MOZAL I (1997) MOZAL II, Ferro e Aço, Pemba Bay -Wildlife and Marina Resort e Ponta Dobela (2001), Limpopo Corridor Sands (2002), Vodacom MC (2003), 4 Para questões de análise, consideramos grandes projectos os que têm investimento total igual ou superior a

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Carvão de Moatize, Ayr Petro de Nacala e Procana (2007), Portucel Moçambique e Lurio Green Resources (2009) e Hidroeléctrica de Phanda -Nkuwa (2010).

TABELA 1 INVESTIMENTO PRIVADO APROVADO EM GRANDES PROJECTOS (1990 -2011)

Investimento total em milhões de US$

Projecto Sector 1997 2001 2002 2003 2007 2009 2010 Total

MOZAL I Indústria 1 340 — — — — — — 1 340

MOZALII Indústria — 1 000 — — — — — 1 000

Ferro e Aço Indústria — 1 100 — — — — — 1 100

Pemba Bay – Wild life and Marina Resort

Hotelaria

e Turismo — 967,50 — — — — — 967,50

Ponta Dobela Transportes

e Comunicações — 501,45 — — — — — 501,45 Limpopo Corridor Sands Recursos Minerais e Energia — — 1 200 — — — — 1 200 Vodacom MC Transportes e Comunicações — — — 567,32 — — — 567,32

Carvão de Moatize Recursos Minerais e Energia — — — — 1 535 — — 1 500

Procana Agricultura

e Agro -indústria — 510 510

Ayr Petro Nacala Recursos Minerais e Energia — — — — 5 000 — — 5 000

Portucel Moçambique Agricultura e Agro -indústria — — — — — 2 311,41 — 2 311,41 Lúrio Green Resources Agricultura e Agro -indústria — — — — — 2 209 — 2 209 Hidroelétrica de Mphanda Nkuwa Recursos Minerais e Energia — — — — — — 1 900 1 900 Total — 3 568,95 1 200 567,32 7 045,00 4 520,41 1 900 20 141,68

Total de investimento aprovado no ano — 4 017 1 538 849,99 8 060,94 5 748,62 3 090, 25

% do investimento total aprovado no ano — 89% 78% 66% 87% 79% 61%

FONTE: BASE DE DADOS DO CPI A Tabela 1 mostra 13 grandes projectos de investimento aprovados pelo CPI no período entre 1990 e 2011. O volume total de investimento dos 13 projectos em conjunto é de US$ 20 142,68 milhões, o que corresponde a 56% do total do investimento aprovado no período em análise. Além disso, para todos os anos em que os grandes projectos foram aprovados, estes correspondiam a pouco mais de 70% do investimento aprovado nesses anos, com excepção de 2003 e 2010, onde as intenções de investi-mento em grandes projectos foram de 66% e 61%, respectivamente. Esta análise sugere que os níveis e intenções de investimento, ao longo do período em análise, tornam -se relativamente estáveis quando não se consideram os grandes projectos. Esta informação confirma, por sua vez, o argumento da concentração do investimento (pelo menos das suas intenções) num pequeno grupo de grandes projectos e suas implicações nas

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dinâmicas de concentração da produção e comércio, focados na exploração de recursos naturais e produção e comercialização de produtos primários para exportação.5

GRáFICO 3 INVESTIMENTO PRIVADO TOTAL APROVADO COM E SEM GRANDES PROJECTOS, 1990-2011

(EM MILHÕES DE US$) 8 500 8 000 7 500 7 000 6 500 6 000 5 500 5 000 4 500 4 000 3 500 3 000 2 500 2 000 1 500 1 000 500 0 1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 Total com grandes projectos Total sem grandes projectos FONTE: BASE DE DADOS DO CPI

Por sua vez, o Gráfico 3 mostra a diferença entre as tendências das intenções de investimento privado com e sem grandes projectos. O Gráfico mostra, claramente, o quão dependente são as intenções de investimento em relação a grandes projectos de investimento e dá uma ideia geral sobre como seria o comportamento do inves-timento sem grandes projectos (por exemplo, o que acontece com o peso do IDN no total do investimento privado?) e, provavelmente, quais seriam as suas implica-ções. Um dado importante a destacar é que quase todos os grandes projectos aqui mencionados têm como finalidade a produção e posterior exportação de produtos primários, por sinal, uma das principais características da “economia extractiva”.

TABELA 2 EXPORTAÇÃO E IMPORTAÇÃO COM E SEM MEGA -PROJECTOS

2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011

Exportação excl. mega -projectos 28% 29% 24% 30% 39% 29% 28%

Exportação dos mega -projectos 72% 71% 76% 70% 61% 71% 72%

Import. excl.mega -projectos 83% 76% 78% 81% 77% 74% 66%

Import. dos mega -projectos 17% 24% 22% 19% 23% 26% 34%

FONTE: MASSINGUE (2012) 5 Importa referir que, com esta análise, não queremos que o leitor perceba que os grandes projectos não são

importantes para a economia nacional. Muito pelo contrário, os grandes projectos são uma dinâmica existente e dominante dentro da economia e estruturam e determinam os padrões e relações de produção e comércio.

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A Tabela 2 mostra que o peso das exportações sem mega -projectos é rela-tivamente estático. Segundo Massingue (2012), o nível de competitividade de um país é determinado, dentre outros factores, pelo seu grau de industrialização e diversificação da produção, pois isto tende a reduzir a flutuação de preços e aumenta as oportunidades de exportação. No entanto, Moçambique é competi-tivo em produtos primários e muito pouco diversificado para além destes (ibid.). Por outro lado, os mega -projectos tendem a contribuir com mais de metade das exportações. Por exemplo, em 2011 os mega -projectos contribuíram com 72% das exportações do país. Adicionalmente, Massingue (2012) afirma que outra questão preocupante é o facto de os grandes projectos em Moçambique beneficiarem de elevados incentivos fiscais, de livre expatriamento de capital e muito pouco é reinvestido no país.

CONCENTRAÇÃO DE INVESTIMENTO POR SECTORES E ACTIVIDADES ECONÓMICAS

A composição e a dinâmica das intenções de investimento privado, à seme-lhança do que acontece com outras actividades, como por exemplo, a produção, o comércio, a infra -estrutura e serviços (Castel -Branco, 2010), estão concentradas à volta de sectores como o dos recursos minerais e energia e agricultura e agro--indústrias. O Gráfico 4 mostra que a agricultura e a agro -indústria e os recursos minerais e energia absorvem mais de 50% do total das intenções de investimento no

GRáFICO 4 INVESTIMENTO PRIVADO TOTAL APROVADO POR SECTOR, 1990-2011

(EM % DO INVESTIMENTO PRIVADO TOTAL)

Outros 2% Serviços 2% Construção 4% Hotelaria e Turismo 9% Aquacultura e Pescas 1% Agricultura e Agro-Indústria 25%

Banca, Seguros e Leasing 2% Indústria 18% Transportes e Comunicações 8%

Recursos Minerais e Energia 29%

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período em análise, sendo que o grosso deste investimento é financiado por recursos período em análise, sendo que o grosso deste investimento é financiado por recursos externos (Gráfico 5). Esta situação sugere que a importância e o potencial destes sectores em atrair investimento estrangeiro têm sido bastante evidentes. No entanto, é importante salientar que a concentração do investimento nestes sectores é muito mais profunda, na medida em que, dentro destes, o investimento é concentrado em algumas actividades, quase todas viradas para o mercado externo (alumínio, florestas, gás, carvão, areias pesadas, etc.).

Como acontece com a irregularidade das intenções de investimento no geral, as fontes de investimento (IDE, IDN e empréstimos) também se encontram distri-buídas de forma irregular, seguindo o mesmo padrão de concentração e alocação sectorial do investimento. Enquanto o IDE e os empréstimos se concentram nos recursos minerais e energia, na agricultura e na agro -indústria e indústria, o IDN tende a concentrar -se em sectores como a banca, seguros e leasing, hotelaria e turismo, transportes e comunicação, serviços e construção. A concentração do IDN nestes sectores vem reforçar o argumento de que o capital privado nacional tem tendência a investir mais em serviços, alguns dos quais de suporte à actividade extractiva (Castel -Branco, 2010). Esta análise pode dar algumas indicações sobre até que ponto o capital nacional pode estar ligado às dinâmicas extractivas da economia.

GRáFICO 5 INVESTIMENTO PRIVADO APROVADO, POR SECTOR E FONTE, 1990-2011 (EM %)

45 40 35 30 25 20 15 10 5 0 Agricultura e

Agro-IndústriaAquaculturae Pescas Seguros eBanca, Leasing

Construção Hotelaria e

Turismo Indústria Minerais eRecursos Energia

Serviços Transportes e Comunicações Outros IDE IDN Empréstimos

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CONCENTRAÇÃO GEOGRÁFICA DO INVESTIMENTO PRIVADO

A concentração do investimento também é verificada a nível geográfico. Por exemplo, Maputo concentrou cerca de 32% do total de investimento aprovado no período em análise, seguido de Nampula, com 23%, Tete com 13% e Zambézia com 8%, conforme mostram os Gráficos 6 e 7. Portanto, existem factores específicos que determinam o volume do investimento nas diferentes partes do país. Os níveis de concentração das intenções de investimento nestas províncias são, em parte, expli-cados pelas dinâmicas económicas que estão a ocorrer localmente e pela existência de recursos naturais e infra -estruturas e serviços.

Por exemplo, enquanto o investimento em Tete, Zambézia e Nampula é deter-minado pela existência de recursos naturais (minerais, terra, florestas, etc.), o inves-timento em Maputo é determinado pela qualidade e disponibilidade das infra--estruturas e serviços (estradas, bancos, rede comercial, transportes e comunicações, etc.) comparativamente a outros pontos do país. Ademais, ao longo dos anos, é possível verificar que as intenções de investimento na banca, seguros e leasing, nos serviços, na construção e na indústria estão igualmente concentradas na província de Maputo, sugerindo uma fraca possibilidade de desenvolvimento rápido de capa-cidades produtivas em outras regiões do país, desarticulação e fracas ligações entre as actividades produtivas.

GRáFICO 6 INVESTIMENTO PRIVADO TOTAL APROVADO, POR PROVÍNCIA, 1990-2011

(% DO INVESTIMENTO TOTAL APROVADO)

Gaza 6% Inhambane 1% Manica 2% Sofala 6% Tete 13% Zambézia 8% Nampula 23% Cabo Delgado 4% Niassa 5% Maputo 32%

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GRáFICO 7 INVESTIMENTO PRIVADO APROVADO, POR FONTE E POR PROVÍNCIA, 1990-2011

(EM MILHÕES DE US$)

0 500 1 000 1 500 2 000 2 500 3 000 3 500 4 000 4 500 5 000 5 500 6 000 6 500 7 000 7 500

Maputo Gaza Inhambane Manica Sofala Tete Zambézia Nampula Cabo Delgado Niassa

IDE IDN Empréstimos

FONTE: BASE DE DADOS DO CPI

CONCENTRAÇÃO DO INVESTIMENTO EM PRODUTOS PRIMÁRIOS

Além da concentração regional e em grandes projectos dentro dos diferentes sectores, o investimento aprovado é igualmente concentrado em actividades primárias. Portanto, a concentração sectorial do investimento reside no tipo de actividades para as quais o investimento é alocado. O mapa 1 descreve, para o período de 1990 a 2011, por um lado, o número de projectos aprovados nos sectores da agricultura e agro -indústria e recursos minerais e energia por província e, por outro, o montante total de investimento em US$. As provín-cias que registaram montantes de investimento acima de US$500 milhões foram Nampula, Tete, Zambézia e Gaza. Uma análise mais profunda sobre estas provín-cias sugere que: (i) as provínprovín-cias com elevados montantes de investimento são as que têm, pelo menos, um mega -projecto; (ii) do montante total do investimento, os mega -projectos tendem a absorver acima de 70% do total do investimento na província; (iii) estes mega -projectos estão ligados à exploração de recursos natu-rais e são virados para a exportação com muito pouco ou mesmo sem processa-mento.

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MAPA 1 PROJECTOS APROVADOS, POR PROVÍNCIA, NA AGRICULTURA E NOS RECURSOS MINERAIS, 1990 -2011 (EM

US$)

Total Agri (36): US$ 254.399.874 Total RME (0): US$ 0

Total Agri (50): US$ 2.456.976.564 Total RME (5): US$ 5.104.069.260 Total Agri (13): US$ 296.284.780

Total RME (4): US$ 3.435.564.220

Total Agri (23): US$ 270.101.299 Total RME (2): US$ 178.860

Total Agri (82): US$ 390,020,688 Total RME (6): US$ 12,566,317

Total Agri (68): US$ 2.738.903.118 Total RME (3): US$ 7.553.909

Total Agri (67): US$ 956.795.618 Total RME (1): US$ 38.150.000

Total Agri (33): US$37.099.602 Total RME (2): US$13.093.000 Total Agri (62): US$ 720.416.627

Total RME (5): US$ 1.212.330.000

Total Agri (170): US$ 901.665.777 Total RME (10): US$ 366.502.698

FONTE: ADAPTADO PELOS AUTORES BASEADO NA BASE DE DADOS DO CPI – CENTRO DE PROMOÇÃO DE INVESTIMENTO, N.D.

Este cenário mostra que, tanto na agricultura quanto nos recursos mineiras, há uma tendência de concentração. No caso da agricultura, apesar de apresentar elevados níveis de investimento aprovado, grande parte deste investimento está focado na exploração florestal e essencialmente na madeira com o mínimo processa-mento para exportação. E, no caso dos recursos minerais, as dinâmicas estão à volta

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da exploração de carvão e áreas pesadas. Assim, pode concluir -se que, do montante global do investimento privado aprovado em Moçambique no período em análise, o grosso está relacionado com a exploração de recursos naturais, em particular de minerais e energia, e actividades relacionadas.

CAIXA A INVESTIMENTO PRIVADO APROVADO NAS PROVÍNCIAS NO SECTOR DA AGRICULTURA E AGRO-INDÚSTRIAS E NO

SECTOR DE RECURSOS MINERAIS E ENERGIA

• Entre 1990 e 2011, 90% do total do investimento aprovado para o sector da agricul-tura e agro-indústrias na província de Nampula (US$ 2456 milhões) é absorvido por um único projecto (Lurio Green Resources) ligado à exploração florestal, no valor de US$ 2209 milhões. No sector dos recursos minerais e energia, o projecto Ayr Petro de Nacala, no valor de US$ 5000 milhões, representa 98% do valor total do investimento aprovado nste sector para o período em análise.

• Este projecto visava a construção de uma refinaria de petróleo, cuja implementação ficou no entanto atrasada devido à falta de financiamento (A Verdade, 18/03/2009). • Na província da Zambézia, o projecto Portucel Moçambique representa 90% do total

do investimento na agricultura e agro-indústrias. Este investimento está ligado à instalação de bases florestais e prevê-se a instalação, futuramente, de uma fábrica de processamento de papel. O investimento só será concretizado se o escoamento do produto, a partir de Moçambique, for competitivo e, caso a fábrica seja instalada no país, esta irá produzir pasta de papel para exportar para o mercado asiático (Capital, 2012). No entanto, a questão que se levanta é: que ligações podem ser geradas se o projecto não passar de um processamento básico para exportação?

• Dos projectos aprovados pelo CPI na província de Tete no período em análise, o do carvão de Moatize e a hidroeléctrica de Mphanda Nkuwa absorvem 99,9% do total de investimento no sector dos recursos minerais e energia na província.

• Em Gaza a situação não difere das outras províncias acima mencionada. O projecto

Limpopo Corridor Sands corresponde a 99% do total de investimento aprovado para

os recursos minerais e energia.

INVESTIMENTO E CRÉDITO À ECONOMIA

Nas secções anteriores explorou -se as dinâmicas do investimento privado no geral e o investimento nacional, em particular. No entanto, a concretização do investimento, entre outras questões, tem como condição a existência de financiamento. Portanto, a distribuição do crédito à economia é um factor fundamental para entender as

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actuais dinâmicas produtivas internas e a sua relação com as dinâmicas de expansão do investimento privado. Esta secção procura mostrar como é que as dinâmicas de investimento podem estar ligadas ao sector financeiro doméstico.

A relevância de estudar o sector financeiro reside no facto de, a partir deste, se poder entender as dinâmicas de reprodução da economia. Portanto, o argumento de que a estrutura produtiva analisada via investimento tende a consolidar o argumento sobre o carácter extractivo da economia não seria completo se não se englobasse a componente financiamento. Para tal, é preciso perceber o que está a acontecer com o sector financeiro e até que ponto as dinâmicas de reprodução económica e finan-ceira estão a ser influenciadas e dominadas pela economia extractiva.

GRáFICO 8 DISTRIBUIÇÃO DE FLUXOS DE CAPITAL PRIVADO

Fluxos externos de capital privado 75%

Fluxos internos de capital privado 25%

FONTE: BASE DE DADOS CPI. BDM E WORLD BANk

O Gráfico 8 mostra que 75% dos fluxos de capitais são externos e somente 25% correspondem ao financiamento por via da banca doméstica. Apesar de os montantes das intenções de investimento privado serem relativamente elevados e, em média, o seu volume tender a aumentar, a banca doméstica financia muito pouco deste investimento, por várias razões. Primeiro, a própria estrutura de intenções de investimento mostra que o grosso do mesmo deriva de grandes projectos financiados por capitais externos (IDE e empréstimos). Segundo, grande parte das intenções de investimento nacional está concentrada em actividades

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como transportes e comunicação, construção e serviços. Dado este quadro geral, explicado pelas fontes de financiamento das intenções de investimento, a questão que se coloca é o que está a acontecer com o crédito à economia para o investi-mento?

Segundo Amarcy & Massingue (2011), parte do processo de expansão do crédito à economia, incluindo a expansão de instituições e serviços financeiros (balcões, ATMs, POS, etc.) está relacionada com as actuais dinâmicas de expansão do inves-timento privado e com a necessidade de captar os rendimentos de capital e do trabalho resultantes destas dinâmicas.

Dados do Banco de Moçambique (BM) sobre a distribuição de crédito mostram que o crédito à economia é composto por créditos para meios circulantes e créditos para o investimento. O crédito para meios circulantes é aquele destinado à compra de mercadorias, despesas correntes/funcionamento. Para efeitos de análise, no artigo o crédito para meios circulantes será designado por crédito ao consumo. O crédito ao investimento é aquele destinado à compra de maquinarias e equipamentos, cons-trução de edifícios, etc.

Os Gráficos 9a e 9b mostram que, do total de crédito concedido pela banca nacional à economia, existe quase que uma distribuição equitativa entre o consumo e o investimento. Entre 2003 a 2012, de um total de 5,3 mil milhões de meti-cais, o crédito ao consumo representou 49% do total de crédito à economia e o crédito ao investimento representou 51%. Se quase metade do crédito à economia é consumo, então a questão que se coloca é quais as condições de reprodução da economia, já que parece não se estar a investir na expansão da capacidade produtiva. É verdade que o consumo tem implicações no desenvolvimento da base produtiva, mas é importante perceber se este consumo está a ser derivado do processo de investimento. Embora este facto possa ser verdadeiro, não é possível identificar, a partir da estrutura de crédito, qual é a parte do crédito ao consumo que deriva do investimento.

O Gráfico 9a mostra que, do total do crédito ao consumo, cerca de 71% é absorvido por três actividades, nomeadamente, indústria transformadora, comércio e outros.6 Do Gráfico 9b é, igualmente, possível perceber que, do total do crédito para o investimento, o grosso, cerca de 72%, está concentrado em três actividades, 6 A componente “outros” é constituída por particulares, habitação e diversos. Do total (34% da

compo-nente outros) do crédito ao consumo que vai para esta compocompo-nente, 58% corresponde a particulares, 2% à habitação e 41% são diversos.

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nomeadamente comércio, transportes e comunicação e outros.7 Da análise da base de dados é possível verificar que aproximadamente três quartos do crédito para o investimento são absorvidos por três sectores, nomeadamente, transportes e comu-nicações, comércio e outros (que inclui particulares, habitação e diversos).

GRáFICO 9A DISTRIBUIÇÃO DE CRÉDITO À ECONOMIA: CRÉDITO PARA CONSUMO, POR ACTIVIDADE, 2003-2012

Comércio 26% Outros Sectores 34% Agricultura 7% Pecuária 0% Silvicul. e Expl. Florestal 0% Indústria Extractiva 1% Pescas 2% Electricidade, Gás e Água 2% Indústria Transformadora 11% Construção e Obras Públicas

7% Indústria e Turismo 2% 49% Consumo 51% Investimento Transportes e Comunicações 6% Inst. Financeiras N/ Monetárias 1%

FONTE: BASE DE DADOS DO BDM

GRáFICO 9B DISTRIBUIÇÃO DE CRÉDITO À ECONOMIA:

CRÉDITO PARA INVESTIMENTO, POR ACTIVIDADE, 2003-2012

Comércio 17% Outros Sectores 41% Agricultura 4% Pescas 2% Pecuária 0% Silvicul. e Expl. Florestal

0% Indústria Extractiva 3% Electricidade, Gás e Água 2% Indústria Transformadora 7% Construção e Obras Públicas

7% Indústria e Turismo 4% Investimento 51% Consumo 49% Transportes e Comunicações 14% Inst. Financeiras N/ Monetárias 0%

FONTE: BASE DE DADOS DO BDM

7 A componente “outros” é constituída por particulares, habitação e diversos. Do total (41% da componente outros) de crédito ao investimento que vai para esta componente, 44% corresponde a particulares, 16% à habitação e 40% são diversos.

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Esta informação não é suficiente para concluir sobre a ligação entre a estrutura de financiamento e o investimento. Para de facto chegar a conclusões definitivas sobre este ponto, será necessário analisar algumas questões. Primeiro, o investimento privado doméstico aprovado é focado na construção, na banca e nos transportes e comunicação e, quando olhamos para os projectos, estes estão ligados a linhas extractivas da economia. Se estes projectos são financiados pela banca doméstica, então o financiamento doméstico está a ser influenciado pela natureza extractiva da economia. Segundo, se o consumo é fundamental na actividade económica e faz parte do multiplicador do investimento, então o padrão do investimento tem impacto no padrão de consumo. Entretanto, para se perceber a real ligação entre os montantes de crédito para o consumo e os montantes de investimento é preciso informação adicional, por exemplo, se o crédito à economia financia actividades do sector público ou se financia somente o sector privado.

ALGUMAS CONSIDERAÇÕES E EVIDêNCIAS

SOBRE PADRÕES DE INVESTIMENTO E ESTRUTURA PRODUTIVA

Um dos aspectos evidentes da análise anterior, tanto em relação a tendências de investimento quanto à sua relação com o financiamento e com a produção e comércio, é a relativa concentração.

Por um lado, o volume de investimento, em particular o IDE, concentra -se num pequeno leque de grandes projectos, com destaque para a área dos recursos mine-rais e energia e infra -estruturas associadas e, por outro, o IDN, incluindo o crédito à economia, estão concentrados em algumas actividades como transportes e comuni-cação, comércio e outras (particulares, habitação e diversos).

A análise mostra que a dependência do investimento privado em relação a fluxos externos de capitais privados – IDE e empréstimos – e a sua alocação na explo-ração de recursos naturais, energia e infra -estruturas relacionadas, são apenas alguns elementos que reflectem uma característica dominante do padrão de investimento em Moçambique. Contudo, elementos como a natureza do investimento (a origem, o financiamento, as actividades, as ligações, etc.) e a sua relação com a economia existente (a produção, a infra -estrutura, as qualificações, os mercados, as finanças, etc.) são mais relevantes para analisar padrões de investimento e a sua ligação com a estrutura produtiva, do que uma simples descrição dos fluxos de investimento e sua distribuição sectorial.

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Algumas questões como o tipo de estrutura produtiva que estes padrões de investimento propiciam e em que medida consolidam ou transformam a estrutura produtiva existente, em que medida os padrões regionais de produção e comércio diferem entre si e com os padrões mais gerais, são fundamentais para prosseguir com a análise. Uma tentativa de resposta a estas questões passa por um olhar sobre a estrutura de produção e tendências de investimento nas últimas duas décadas.

De um modo geral, o padrão de produção e comércio em Moçambique é consi-derado concentrado e desarticulado e a estrutura produtiva, sobretudo a estrutura de produção industrial, é dominantemente centrada na produção de produtos primários não processados (ou com pouco valor acrescentado) para exportação (por exemplo: açúcar, tabaco, algodão, madeiras, alumínio, gás, areias pesadas, carvão, etc.), há mais de meio século (Castel -Branco & Mandlate, 2012; Castel--Branco, 2010). Esta tendência de concentração e desarticulação da produção e comércio explica a (e é explicada pela) concentração do investimento, das infra--estruturas e serviços.

Castel -Branco (2010) argumenta que “as dinâmicas de investimento (pelo menos, das suas intenções) estão a reforçar e a reproduzir as actuais dinâmicas concentradas e desarticuladas de produção e comércio. Por seu turno, uma extensão desta análise, que inclui o investimento privado aprovado entre 1990 e 2011, confirma e reforça este argumento, sobretudo com os sucessivos anúncios de descobertas de quantidades significativas de recursos minerais (carvão em Tete e gás natural na bacia do Rovuma), e a necessidade de logística para o transporte e exportação destes recursos minerais, o que tem atraído mais capital estrangeiro nos últimos anos.

As dinâmicas regionais de investimento podem explicar as tendências de concentração da estrutura de produção no país e a dependência do investimento privado em relação a fluxos externos de capitais. A pesquisa exploratória levada a cabo nas províncias de Gaza, Tete e Cabo Delgado sobre as dinâmicas de investi-mento pode fornecer alguma base de informação para entender alguns padrões de investimento, as suas características específicas e algumas diferenças. Contudo, a imagem que resulta da pesquisa de campo nestas províncias difere, de certa forma, da base de dados do CPI, devido a certos factores, alguns dos quais apontados na secção introdutória.

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Na província de Gaza, as dinâmicas de desenvolvimento do turismo e da agro--indústria reflectem, claramente, problemas de concentração do investimento. Por exemplo, para além de a agricultura ser uma actividade dominante e que absorve maior proporção do investimento privado e de se concentrar na produção primária para exportação (por exemplo, cana -de -açúcar, biocombustíveis, etc.), a actividade turística, para além da tradicional localização ao longo da faixa costeira, tem desen-volvido nos últimos anos um turismo de selva ou de aventura. Uma particularidade é que o turismo na região sul de Moçambique, em particular na província de Gaza, é dominado por capitais sul -africanos, às vezes em parceria com capitais nacionais, mas controlados por sul -africanos. As ligações com o mercado nacional ou local são mínimas, uma vez que a maior parte dos serviços, os materiais para a manutenção (por exemplo limpeza e infra -estrutura) estão localizados e provêem da África do Sul.

Na província de Tete, para além da tradicional dinâmica agro -industrial, por exemplo, a produção de tabaco e outras culturas de rendimento e as relações sociais de produção daí resultantes – por exemplo, o contract farming, é visível a relação entre as actuais dinâmicas de investimento privado com a dinâmica de exploração de recursos minerais, com destaque para o carvão.

Por um lado, pela análise das intenções de investimento nos últimos oito anos e das dinâmicas produtivas existentes, é possível verificar uma tendência de transfor-mação e diversificação do investimento, mas, por outro lado, tal diversificação acon-tece dentro do complexo mineral energético, dominado pela exploração do carvão pelas multinacionais VALE, RIO TINTO, entre outras, e da logística necessária para apoio à produção mineira (transporte, serviços de manutenção e limpeza industrial, acomodação, etc.). Naturalmente, o desenvolvimento de novas actividades produ-tivas e a diversificação são sinais de alguma transformação na base produtiva local, mas o facto de este processo ter como núcleo a actividade mineira voltada essencial-mente para a extracção de um produto primário para exportação pode levantar alguns problemas.

No sector de serviços, parte substancial das empresas presta serviços à exploração mineira, algumas das quais fornecem serviços específicos a um único cliente. E se

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tomarmos em consideração que os recursos minerais são limitados e que as empresas não diversificam para além do complexo mineral e energético, isto pode colocar um problema fundamental de absorção da capacidade produtiva das empresas locais quando os recursos se esgotarem. Castel -Branco (2013) coloca esta questão olhando para o esforço e luta das pequenas e médias empresas nacionais em garantir quotas proteccionistas de fornecimento de bens e serviços para grandes projectos, e chama a atenção para o facto de que “o sucesso de uma empresa em diversificar ligações com grandes projectos pode implicar desindustrialização à medida que empresas diver-sificam para serviços mais e mais distantes da base industrial”. Langa & Mandlate (2013) discutem esta questão olhando para alguns casos específicos de empresas que desenvolveram ligações com mega -projectos, especialmente com a MOZAL.

Em Cabo Delgado, excluindo as dinâmicas de exploração de recursos minerais, em particular o gás natural, e seu impacto económico e social imediato, a base de dados do CPI parece ser mais capaz de descrever alguns aspectos gerais dos padrões de investimento na província. Cabo delegado é das províncias com menos projectos de investimento aprovados pelo CPI ao longo do período em análise.

De acordo com o trabalho de seguimento do investimento levado a cabo nesta província, do total dos 117 projectos aprovados pelo CPI, apenas 40 estão opera-cionais, sendo 17 na agricultura e agro -indústria e 17 no turismo. Os restantes seis projectos operacionais correspondem a outros sectores. Para além dos projectos operacionais aprovados pelo CPI, existem outros 12 projectos que não constam na lista do CPI. Uma particularidade é que o grosso dos projectos dedica -se ao proces-samento e exportação de madeira. Por seu turno, a concentração das intenções de investimento no turismo (78%) e na agricultura e agro -indústria (18%), que é também confirmada pelos projectos operacionais na província nestes setores, levanta algumas questões sobre como a dinâmica do investimento se relaciona com a distribuição espacial do investimento.

Enquanto o turismo e, mais recentemente, os recursos minerais (com particular destaque para o gás natural) se concentram nas áreas costeiras e onde os recursos se encontram, a agricultura e agro -indústria concentram -se, respectiva e particular-mente, no sul da província onde a qualidade da infra -estrutura é relativamente melhor do que no resto da província e que está melhor ligada à província de Nampula e ao corredor de Nacala (Stevano, 2013).

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CONCLUSÕES

A análise sobre as dinâmicas do investimento neste artigo mostra que o investi-mento é concentrado num pequeno leque de grandes projectos de exploração de recursos naturais e virados para a exportação de produtos primários, e financiados essencialmente por fluxos externos de capitais, pelo IDE e por empréstimos à banca internacional. Estas características dominantes do padrão do investimento privado aprovado seguem o mesmo padrão de produção e comércio (concentrado, afuni-lado, especializado, desarticulado e com fracas ligações com dinâmicas produtivas internas), o que reforça o argumento sobre a natureza extractiva da economia de Moçambique.

A excessiva dependência do investimento privado em relação aos grandes projectos levanta algumas questões preocupantes. Os grandes projectos aprovados pelo CPI ocupam, em média, mais de 70% do investimento aprovado nos anos em que foram aprovados e cerca de 57% do total do investimento privado aprovado entre 1990 e 2011. A análise das tendências de investimento sem grandes projectos torna o quadro do investimento privado aprovado mais regular e uniforme, isso se consideramos a existência de ligações mínimas entre as intenções dos grandes projectos, com os projectos de pequena e média dimensão. No entanto, a questão que fica por responder é quanto do investimento privado aprovado na análise sem mega -projectos pode estar ligado à dinâmica dos grandes projectos. Esta infor-mação permitiria perceber melhor a base real do investimento em Moçambique, por exemplo, no que é que o sector privado está disposto a investir e as suas implicações no desenvolvimento da capacidade produtiva e de financiamento da economia.

O estudo exploratório levado a cabo nas províncias, embora com limitações do ponto de vista de acesso à informação sistemática sobre o investimento, parece confirmar as características mais gerais do padrão do investimento privado em Moçambique e as dinâmicas produtivas locais. O surgimento de novas actividades produtivas em Tete, por exemplo, mostra uma aparente tendência de diversificação, no entanto centrada à volta dos grandes projectos de extracção de carvão. Isto levanta problemas de sustentabilidade no desenvolvimento de capacidades produ-tivas para a economia como um todo.

Este artigo não traz conclusões definitivas sobre o que está a acontecer com o investimento privado em Moçambique, mas levanta algumas questões para reflexão: (i) o que poderão estar a indicar as tendências reais de investimento privado em

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Moçambique? (ii) até que ponto essas tendências contribuem para o alargamento e diversificação da base produtiva e comercial? (iii) como é que o investimento privado se liga ao financiamento doméstico? (iv) o que está o crédito ao investimento a financiar de facto? Por exemplo, na agricultura, são florestas ou produção alimentar?

Para responder a estas questões é preciso informação mais sistematizada. Para tal há necessidade de as instituições públicas (quer a nível central quer a nível local) melhorarem o sistema de acesso e disponibilização de informação, o que implica uma monitoria e/ou acompanhamento mais regular não só dos projectos de inves-timento como também de actividades relacionadas (i.e, as empresas, a actividade financeira, o comércio, a infra -estrutura, os serviços, o emprego, entre outras.).

Para além da necessidade de informação adicional, há uma necessidade de inves-tigação contínua para melhor perceber o funcionamento das várias componentes da economia e conseguir modelar melhor as ligações entre diferentes actividades, por exemplo, perceber os fluxos de recursos dentro da economia de Moçambique (de onde vêm, para onde vão e como se reproduzem).

REFERêNCIAS

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Referências

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