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QUE FORAM DEIXADAS PARA TRÁS: A HISTÓRIA DA PAISAGEM REVELADA A PARTIR DE INDIVÍDUOS REMANESCENTES NA SERRA DA CARIOCA, MACIÇO DA TIJUCA, RJ

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AS FIGUEIRAS (Ficus spp.) QUE FORAM DEIXADAS PARA TRÁS: A HISTÓRIA DA PAISAGEM REVELADA A PARTIR DE INDIVÍDUOS REMANESCENTES NA SERRA DA CARIOCA, MACIÇO DA TIJUCA, RJ

Aluno: Vicente Leal Ewerton Fernandez Orientador: Alexandro Solórzano Coorientador: Gabriel Paes da Silva Sales Introdução

A paisagem deve ser compreendida como produto da relação histórica entre a sociedade e o meio, refletindo seus aspectos culturais, sociais e econômicos (OLIVEIRA et al, 2011). Assim, a paisagem que observamos hoje é resultado de uma sobreposição de diferentes usos, deixando um legado socioecológico na forma de vestígios e que constituem o que foi denominado como paleoterritório – “a espacialização das resultantes ecológicas de usos passados dos ecossistemas por populações, os quais deixam marcas visíveis na paisagem até a atualidade” (OLIVEIRA, 2008).

A Mata Atlântica é o melhor exemplo desse grande mosaico de florestas com diferentes graus de conservação, tendo sido apropriada de diferentes formas ao longo do tempo. Citada entre as 25 áreas de tensão do mundo e, tendo perdido grande parte de sua extensão territorial, a Mata Atlântica se destaca entre as 11 áreas consideradas hotspot, ou seja, prioritárias para investimento de conservação (SVORC, 2007 citando BROOKS et al. 2002). A Mata Atlântica se expressa em diferentes tipos fisionômicos de florestas, onde se destaca a Floresta Ombrófila Densa. As alterações no relevo, altitude e diferentes processos sucessionais contribuem para a heterogeneidade dessas fisionomias florestais, assim como a ação antrópica, tanto no modo, como na intensidade destas ações de perturbação. Sendo assim, o que temos hoje como remanescentes da Mata Atlântica, são mosaicos de florestas com distintos estágios sucessionais, alguns mais jovens, outros em

fase mais avançada de sucessão ecológica.

A paisagem do Rio de Janeiro é produto de uma larga história da sociedade interagindo com a meio natural, sendo transformada de distintas formas e intensidades, antes mesmo da chegada dos portugueses. Os legados desta interação histórica estão impressos e escondidos dentro destas paisagens complexas em constante mudança. Ao longo da história, diferentes agentes sociais como Sambaquis, Tupinambás, senhores de engenhos de cana, produtores de café, produtores de carvão e mais recentemente com a expansão da população urbana, acabaram modificando a paisagem através de diferentes atividades, e com isso, deixando um legado na paisagem. Como referência das alterações sofridas pela paisagem do Rio de Janeiro, deve-se ter em conta que no início do século XVIII, os engenhos em funcionamento na cidade possuíam uma demanda individual por lenha que levava à derrubada de até 15 ha por safra (ENGEMANN et al., 2005), transformando drasticamente a paisagem da época.

A Floresta da Tijuca foi apropriada de diferentes formas e finalidades ao longo do tempo, deixando um legado na paisagem presente até os dias de hoje. Entre os séculos XVI e XVIII, as alterações começam a ser mais severas, com o surgimento de engenhos para a produção de cana, açúcar e cachaça, deixando como vestígios na paisagem antigas chácaras e moinhos. Entre 1790 e 1830, as plantações de café dentro do Rio de Janeiro ou nas suas imediações começaram a se tornar um negócio muito lucrativo. As fazendas de café logo começaram a conquistar as encostas em torno da cidade. Plantações de cana-de-açúcar, mandioca e outras culturas alimentares que eram produzidas anteriormente foram desalojadas, e dezenas de hectares de florestas foram devastadas. Assim, cada vez mais a Floresta da Tijuca foi exposta a pressões demográficas e econômicas ainda maiores. O

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meio ambiente do Rio de Janeiro não demorou a demonstrar os efeitos da devastação promovida pela cafeicultura, resultando na diminuição da oferta de água para a cidade, que crescia cada vez mais. Quando isso se combinou com anos de pouca chuva, o resultado foram crises hídricas sérias. Tentando solucionar o problema, o governo imperial partiu então para reflorestar parte das encostas, e em 18 de dezembro de 1861, Manuel Gomes Archer (1821- 1905) foi nomeado administrador da floresta, com o objetivo de recuperar a Floresta da Tijuca (DRUMMOND, 1988).

Ao entendermos a relação de uso dos recursos naturais pelo homem e suas marcas deixadas na paisagem, podemos entender melhor a dinâmica e funcionamento destes ecossistemas, a fim de elucidar o quanto as intervenções humanas interferem nestes ecossistemas e até que ponto isto pode ser significativo para a dinâmica dos mesmos. O ser humano pode interferir na estrutura dos ecossistemas de diferentes formas, inclusive por meio de sua cultura e de suas crenças (SVORC, 2007). Em qualquer tipo de culturas, a vida vegetal ocupa um dos segmentos mais significativos. Dessa forma, as plantas desempenham um importante papel na sua existência material e social e estão sempre presentes no seu cotidiano (SILVA, 2005).

Na Mata Atlântica, as figueiras somam junto com outras espécies de grande porte (Jequitibá, Cedro etc.) um legado de árvores que “foram deixadas para trás”, isto é, árvores remanescentes na paisagem. Este legado está diretamente associado a pratica de poupar do corte espécimes de grande porte por motivos culturais e logísticos (gasto energético na derrubada de árvores de grande porte) (SALES et al., 2014). No caso das figueiras (gênero Ficus spp.) na Mata Atlântica, alguns estudos mostram a relação simbólico-religioso que diversas populações (caiçaras, quilombolas, sitiantes antigos) estabeleceram com esta espécie (SVORC, 2007). Vale ressaltar que esta espécie apresenta um importante papel ecológico ao ser fonte de recurso para diversas espécies de avifauna e mastofauna, que por sua vez, dispersam sementes de espécies zoocóricas, além de servir de poleiro para aves. Além disso, a cobertura de copa da figueira permite o estabelecimento de espécies tolerantes à sombra e de estágio secundário. Com isso postula-se que as figueiras remanescentes em paisagens fragmentadas servem de pontos de nucleação da regeneração natural.

O simbolismo religioso do gênero Ficus sp.

O culto às árvores é antigo e está presente em diferentes culturas e religiões no mundo. No antigo Egito, entre os gregos, nas civilizações asiáticas, africanas, nórdicas, na Índia, na Mesopotâmia, os povos bíblicos, indígenas brasileiros, dentre outros está sempre presente a figura da árvore, com diferentes sentidos e significados (AZEVEDO, 2015). As figueiras ocupam um lugar importante na história de diversos povos e civilizações, uma vez que estão presentes na esfera cultural e religiosa dos mesmos.

Na cultura judaico-cristã as figueiras têm um papel de destaque, aparecendo no Antigo Testamento da Bíblia em mais de 40 referências, além do Novo Testamento onde são encontradas dezesseis citações sobre as figueiras. Em uma dessas citações, ao contrário do senso comum, Jesus seca e não amaldiçoa a figueira que não dá fruto (SVORC, 2007):

“Cedo de manhã, ao voltar para a cidade, teve fome; e vendo uma figueira à beira do caminho; aproximou-se dela; e, não tendo achado senão folhas, disse-lhe: nunca mais nasça fruto de ti. E a figueira secou imediatamente...” Mateus (21: 18-19) Na África, a espécie Clorophora excelsa faz parte da vida cultural e religiosa de certos grupos étnicos, sendo representada na costa ocidental africana por uma divindade chamada Iroko, que é considerada uma árvore sagrada pelas comunidades locais (SVORC

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& OLIVEIRA, 2012). Suas folhas são usadas em rituais de iniciação na religião e junto à árvore são feitas oferendas alimentares (AZEVEDO 2015).

Com a vinda de escravos africanos para o Brasil, o Iroko teve de ser (re)significado para a manutenção do culto, tendo em vista que a figueira que o representa em seu território de origem não ocorre no Brasil. Assim, figueiras nativas de diferentes espécies passaram a representar essa mesma divindade, adaptando a cultura afrodescendente no território brasileiro.

Deste modo, é possível afirmar que esta simbologia religiosa, presente em várias culturas, trouxe como consequência a conservação das figueiras no Brasil. Podemos constatar este fato ao observarmos exemplares que se destacam dos demais indivíduos pelo seu elevado diâmetro do caule e, pela sua altura total (Figura X). Em síntese, a biomassa desses exemplares quase sempre supera, em muito, a dos demais componentes arbóreos dessas formações secundárias (SVORC, 2007). Este cenário é comum principalmente na Mata Atlântica, onde ocorreram diversos usos da biomassa florestal por populações pretéritas, resultando em grandes mosaicos de florestas em diferentes graus de conservação.

Nesses ambientes fica evidente o corte seletivo da floresta, mantendo-se apenas as figueiras e indivíduos de grande porte, estes poupados do corte por questões logísticas (SALES et al., 2014). Sendo assim, o legado cultural passa a ter importância não só religiosa, mas também ambiental, tendo em visto que o manejo e propagação de determinadas espécies de plantas permitem sua conservação em detrimento de outras, como o caso das figueiras. (OLIVEIRA, 2007).

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Objetivo

A presente pesquisa tem como objetivo geral a caracterização fitossociológica sob a copa de indivíduos remanescentes do gênero Ficus. Apresenta ainda como objetivos secundários o mapeamento destas espécies de valor cultural, além de vestígios materiais, e outros vestígios biológicos que indicam a presença pretérita de populações humanas no interior da floresta que recobre o Maciço da Tijuca; determinar a estrutura e composição florística sob a copa de indivíduos remanescentes de Ficus spp. para compreender o papel desta espécie como nucleadora da regeneração natural desta floresta; identificar quais espécies compõem o estrato regenerante sob a copa das figueiras remanescentes.

Procedimentos metodológicos Áreas de estudos:

O estudo foi realizado em duas áreas do Maciço da Tijuca, na Serra da Carioca e nas Ruínas do Mocke no Alto da Boa Vista, ambas na Zona sul do Rio de Janeiro. O maciço é formado predominantemente por gnaisse e possuí alta declividade e grande quantidade de afloramentos rochosos com solo muito raso. Ele é composto predominantemente por Floresta Ombrófila Densa Submontana em estágio secundário intermediário à tardio (CONAMA,1994).

Especificamente falando das ruínas do Mocke, deve ser levado em conta o seu passado de uso e ocupação rico em história e importância para a cidade do Rio de Janeiro. Segundo o ICMBio:

Foi propriedade do holandês Alexander van Moke, onde além de café, a Fazenda Nassau produzia diversos alimentos como aspargos, couve-flor, repolho, mandioca, banana e feijão para consumo dos escravos. Era considerado o maior empreendimento cafeeiro do país, com extensas plantações de até 100 mil pés de café e 16 edificações, constituindo o mais completo estabelecimento agrícola na cidade do Rio de Janeiro. Após a morte de Moke, em 1828, a fazenda continuou sob a supervisão de sua esposa e, durante muitos anos, permaneceu sendo uma referência para a cidade. Sua importância era tanta que ganhou uma citação em um dos romances de José de Alencar, “Sonhos D´Ouro” (ICMBio, 2014).

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Figura 2. Mapa de distribuição de figueiras, carvoarias e ruínas no Parque Nacional da Tijuca.

Procedimentos metodológicos

Mapeamento de espécies de valor cultural, vestígios materiais e outros vestígios biológicos que indicam a presença pretérita de populações humanas

Um levantamento inicial da área de estudo foi realizado através de excursões de campo ao longo de diversos trechos do Maciço da Tijuca ao longo do sistema de trilhas, antigas estradas e eixos de drenagem que cortam a floresta. O mapeamento de indivíduos remanescentes de Ficus sp., vestígios humanos (biológicos, físicos e culturais), tal como ruínas e carvoarias, também foram amostrados, de modo que estes comprovam o uso e a ocupação deste território em determinado momento da história da floresta.

O mapeamento consistiu na marcação de pontos utilizando equipamento de GPS próprio para uso em ambientes sob densa cobertura vegetal (Garmin Etrex HCX), sendo os pontos encontrados transferidos para o programa ArcGis (que inclui os ambientes ArcMap e ArcCatalog) a partir do qual foram confeccionados mapas com a disposição desses vestígios. A partir desta primeira etapa foram desenvolvidos mapeamentos, tendo-se por base as informações do Instituto Pereira Passos disponibilizadas pelo LABGIS da PUC-Rio, que apresentassem informações associadas às características geomorfológicas da área. Este mapeamento subsidiará esforços para mapear as florestas secundárias de acordo com a sua idade (estimada) e associações florísticas (elevada densidade/dominância de uma espécie, ou conjunto de espécies) e uso pretérito.

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Análise da estrutura e composição florística sob a copa de indivíduos remanescentes de Ficus spp

Uma segunda etapa deste projeto consistiu em avaliar o grau a capacidade de regeneração da floresta em torno de indivíduos remanescentes de Ficus sp. à partir do estudo da estrutura, composição florística e diversidade do estrato arbóreo da vegetação. Assim, após uma seleção prévia de 2 figueiras remanescentes foi amostrada a área sob a copa destes indivíduos utilizando uma parcela circular de 10 m de raio, com uma área amostral de 314 m2, onde foi medido o diâmetro e altura dos indivíduos arbóreos e arbustivos com DAP (diâmetro à altura do peito) maior ou igual à que 5 cm (MUELLER-DOMBOIS & ELLEMBERG 1974). Para a análise da estrutura e composição dos trechos de floresta estudados serão adotadas as fórmulas apresentadas por Curtis & MacIntosh (1950; 1951) para os seguintes parâmetros: densidade (DR), área basal (AB) (KENT & COKER 1992). Os dados foram processados utilizando o programa Excel (do pacote Office 2010 da Microsoft). Quando não foi possível a identificação segura em campo, as espécies foram coletadas e prensadas segundo as normas usuais e identificadas utilizando-se bibliografia especializada, por comparação com material depositado em herbários ou consultas a especialistas. O sistema de classificação taxonômica adotado segue APG III (2009).

A densidade do estrato regenerante foi amostrada em quatro sub-parcelas, dispostas nas duas parcelas amostradas, para verificar quais espécies estão sendo recrutadas sob a copa da figueira. Para isso, foram inventariados todos os indivíduos abaixo de 5 cm de DAP (diâmetro à altura do peito) dentro da área amostral de 80 m² das sub-parcelas, seguindo os mesmos procedimentos de identificação citados acima.

Figura 3. Método utilizado para avaliar a capacidade de regeneração da floresta em torno de indivíduos remanescentes de Ficus sp

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Resultados e discussão

O mapeamento de todas as figueiras, assim como todos os outros vestígios físicos e biológicos foi obtido durante as atividades de campo realizadas entre fevereiro de 2014 e julho de 2017. Este mapeamento foi feito a partir do sistema de trilhas, antigas estradas e eixos preferenciais de drenagem do Parque Nacional da Tijuca. Muitas destas trilhas fazem parte do atual projeto “Trilha Transcarioca” que através de um sistema de trilhas pré-existentes interliga demais pontos turísticos do Parque Nacional da Tijuca com o Parque Estadual Pedra Branca (INEA, 2013). Até o momento, no Maciço da Tijuca foram encontradas 46 figueiras, 141 carvoarias, 47 ruínas evidenciando a relação do homem com a floresta.

As 46 figueiras foram encontradas em diferentes pontos do Parque Nacional da Tijuca, tendo o maior número de indivíduos ao longo de toda a Serra da Carioca. Indivíduos remanescentes de figueiras também foram encontrados na Pedra Bonita, Pedra da Gávea e Alto da Boa Vista, estando muitas vezes perto de antigas carvoarias. Esta proximidade entre figueiras e carvoarias comprova que alguns desses indivíduos podem ter sido poupados do corte, enquanto que os outros ao seu redor eram utilizados para a produção de carvão.

Figura 4. Mapa de distribuição de figueiras no Parque Nacional da Tijuca.

O elevado número de carvoarias em diferentes pontos da floresta revela que grande parte da vegetação florestal arbórea foi, em algum momento, suprimida em detrimento da produção de carvão. Fábricas existentes nas baixadas e nas áreas de baixa encosta provavelmente se utilizaram do carvão vegetal produzido na Floresta da Tijuca, a exemplo da Real Fábrica de Pólvora (1810-1827), além das propriedades particulares, como a Chácara do Macaco (Gaspar, 2011). A existência de estradas com calçamento de pedras, além de antigas pontes no meio da floresta é explicada a partir da produção de carvão,

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assim como a produção de cana e açúcar. Esta produção precisava ser escoada para outras partes da cidade, criando assim, uma rede de estradas que hoje estão sendo redescobertas e integradas ao projeto da “Trilha Transcarioca”.

O carvão vegetal era produzido por ex-escravos ou escravos fugidos (OLIVEIRA & FRAGA et al, 2011), que muitas vezes construíam casas no meio da floresta, encontradas hoje em ruínas. É provável que eles se alimentassem dos recursos encontrados na floresta, podendo se destacar a jaqueira como uma fonte de recursos, devido a sua palatabilidade e valor nutricional. Além das casas de antigos carvoeiros, também foram encontradas ruínas maiores, pertencentes a antigas fazendas, como por exemplo as ruínas do Mocke, onde antes haviam 16 edificações (Figura 4). Em alguns casos, foram encontradas garrafas e louças antigas, como aconteceu nas ruínas do Mocke, onde tivemos a oportunidade de encontrar muitos artefatos antigos (Figura 6). Muitas dessas fazendas possuíam espécies frutíferas exóticas, seja para comercialização ou consumo próprio. Este cenário é bem claro na segunda área estudada (ruínas do Mocke), onde foram encontrados 3 indivíduos de Jambo (Sygygium jambos) )(Figura 5), além de uma Mangueira (Mangifera indica).

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Figura 6. Vestígios antigos encontrados nas ruínas do Mocke.

Figura 7. Indivíduo de Jambo (Sygygium jambos) com fruto nas ruínas do Mocke, no Alto da Boa Vista.

A área da Figueira 2 teve uma densidade total superior a outra área amostrada com 1.783 indivíduos por hectare, enquanto que a área da Figueira 1 apresentou 1.115 indivíduos, no entanto, ambas possuem uma densidade esperada para florestas secundárias (SOLÓRZONO, 2006). A diferença entre as áreas com relação ao número de espécies não foi representativa, com 28 espécies encontradas na Figueira 1 e 24 na Figueira 2, ambas

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com valores esperados para florestas com os mesmos padrões sucessionais. Nas duas áreas foram encontradas espécies que condizem com uma floresta secundária, como Guarea guidonia e Artocarpus heterophyllus, no entanto, a dominância relativa nas duas áreas é distinta. Enquanto na área da Figueira 1 nenhuma espécie se destacou com relação a sua dominância relativa, na área da Figueira 2 os indivíduos de Artocarpus heterophyllus ocupam 27,27 % do total. Cabe destacar a elevada área basal destas duas áreas, com valores que ultrapassam a média das florestas secundárias do Rio de Janeiro. Os 81,29 m²/ha e 57,47 m²/ha de área basal das áreas 1 e 2 respectivamente, são justificados pela presença de indivíduos de grande porte de Artocarpus heterophyllus, Lacistema pubencens, Mangifera indica, e Guarea guidonia (Tabela 1). Em nenhuma das duas áreas foram encontrados outros indivíduos de figueira.

Tabela 1. Síntese dos resultados estruturais das parcelas levantados em torno dos dois indivíduos remanescentes de Ficus sp.

Figueira Densidade total

(ind./ha) Área basal (m²/ha) Número de morfoespécies 1 1.115 81,29 26 2 1.783 57,47 23

A exemplo do estrato arbóreo, em nenhuma das duas áreas foram encontrados

indivíduos de figueira em condição de regeneração. Isso indica que em nenhuma das áreas as figueiras estão recrutando novos indivíduos. No estrato regenerante as duas áreas possuem espécies que se destacam com relação à dominância relativa. Na área da Figueira 1, a Eugenea prasina representa 33,05 % do total de indivíduos, enquanto que na outra área amostrada 31,39 % dos indivíduos são Artocarpus heterophyllus. Como dito anteriormente, a Jaqueira (Artocarpus heterophyllu) foi muito aproveitada por sua palatabilidade e valor nutricional, o que justifica a grande representatividade desta espécie no local. Assim como a Jaqueira, a presença de outra espécie exótica é de se chamar a atenção. Os 15 indivíduos (8,72 % do total de indivíduos) de Jambo (Sygygium jambos) encontrados no estrato regenerante da área da Figueira 2 se justifica pela pequena população encontrada no local, originária provavelmente do plantio com fins de ornamentação e de subsistência. A presença dessas espécies exóticas reforça a presença de populações pretéritas nas áreas estudadas, demonstrando como que a ação do homem pode alterar a trajetória sucessional de um ecossistema.

A área da Figueira 2 apresenta uma densidade e dominância de uma espécie exótica (jaqueira), nunca antes visto para a Mata Atlântica. Assim, podemos dizer que é uma área que se enquadram como ecossistema emergente. Entende-se como ecossistema emergente uma área com densidade elevada de espécie exótica, independentemente de ser passível de ser manejado ou não (Martinuzzi et al. 2013). O que fica claro é o grau de participação da jaqueira na estrutura da vegetação, ao mesmo tempo elevando a área basal dos trechos estudados, assim como participando do sub-bosque. Neste caso o grau de emergência do ecossistema, pode estar relacionado ao grau de modificação humana, estando associado às atividades realizadas à priori. A exemplo do estrato arbóreo, em nenhuma das duas áreas foram encontrados indivíduos de figueira em condição de regeneração. Isso indica que em nenhuma das áreas as figueiras estão recrutando novos indivíduos.

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Conclusões preliminares

1) O mapeamento de vestígios físicos e biológicos evidenciou que a Florestas da Tijuca já foi intensamente utilizada e grande parte de sua cobertura florestal já passou por algum tipo uso no passado, alterando assim, sua estrutura e composição florística atual.

2) Como foi apresentado no estudo fitossociológico, os exemplares do gênero Ficus encontrados nas áreas de estudos são distintos dos demais componentes arbóreos das áreas inventariadas no que se refere à sua biomassa. Particularmente os diâmetros e, em menor escala as alturas das figueiras, são significativamente mais elevados. Isto evidencia que se tratam de exemplares mais antigos do que as demais árvores que se encontram na mesma comunidade. A presença das figueiras centenárias contribui para um aumento significativo da biomassa florestal na escala examinada. 3) Não foi verificado o recrutamento das espécies de Ficus estudadas, pelo menos no que se refere ao critério de inclusão utilizado (DAP> 5 cm), que engloba indivíduos não maduros em termos reprodutivos. Também não foram amostrados indivíduos jovens. A princípio não se trata de uma estratégia de ocupação do espaço por parte destas espécies, pois foram encontrados outros indivíduos remanescentes perto das áreas estudadas. No entanto, não é possível afirmar que esteja havendo problemas na produção de frutos, uma vez que não foi possível realizar a coleta dos indivíduos de figueira por conta de sua altura. Segundo SVORC (2007), descarta-se a hipótese de que esteja ocorrendo problemas relativos à polinização, pois se tratam de espécies nativas desenvolvendo-se em ambientes relativamente equilibrados ecologicamente. No entanto, não se dispõe de informações acerca dos seus mecanismos de germinação – se estes se dão em ambiente de luz ou de reduzida luminosidade. Seja qual for à hipótese, a maioria destas espécies não está sendo recrutada.

Referências

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2. DRUMMOND, José Augusto. O Jardim Dentro da Máquina: Estudos Históricos, Rio de Janeiro, vol. 1, n. 2, 1988, p. 276-298.

3. ENGEMANN, C. et al. 2005. Consumo de recursos florestais e produção de açúcar no período colonial: o caso do Engenho do Camorim, RJ. In: OLIVEIRA, R.R. (org.). As marcas do homem na floresta: História Ambiental de um trecho urbano de Mata Atlântica. Rio de Janeiro: Editora PUCRio.

4. GASPAR, C. B. (2011) Caminhos para o Solar. Em: Heizer, A. (Org.) Solar da Imperatriz. Jardim Botânico, Rio de Janeiro.

5. MARTINUZZI, S., LUGO, A.E., BRANDEIS, T.J., HELMER, E.H. Novel Ecosystems Case Study: Geographic Distribution and Level of Novelty of Puerto Rican Forests. IN: Hobbs, R.J., Higgs, E.C., Hall, C.M. (Orgs.) Novel Ecosystems: Intervening in the New Ecological World Order, First Edition. Oxford, John Wiley & Sons, Ltd, 2013, p. 81-87

6. MUELLER-DOMBOIS, D. & ELLENBERG, H. 1974. Aims and methods of vegetation ecology. John Wiley & Sons, New York.

7. OLIVEIRA, R. R.; SOLÓRZANO, A. “Três hipóteses ligadas à dimensão humana da biodiversidade da Mata Atlântica”. Fronteiras: journal of social, technological and environmental science, v. 3, 2014, pp. 80-95.

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8. OLIVEIRA, R. R. Mata Atlântica, paleoterritórios e história ambiental. Ambiente & Sociedade, v. 10, n. 2, p. 11-23, 2007.

9. OLIVEIRA, R. R.; FRAGA, J. S. “Metabolismo social de uma floresta e de uma cidade: paisagem, carvoeiros e invisibilidade social no Rio de Janeiro dos séculos XIX e XX”. GEOPUC – Revista do Departamento de Geografia da PUC-Rio, ano 4 – número 7, 2011. 14p.

10. ROCHA, A. M. As nações kêtu. Os candomblés antigos do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: Ed. Mauad. 2000. 115p.

11. SALES, G.P.S., SOLÓRZANO, A., PATZLAFF, R.G., OLIVEIRA, R.R., (2014), “Resultantes ecológicas, práticas culturais e provisão de lenha para a fabricação de carvãonos séculos XIX e XX no Rio de Janeiro”, Pesquisas Botânica 65: 389-402. 12. SALES, G. P. S. “No caminho dos carvoeiros: estrutura da floresta em um

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Ed. Centro de Estudos Afro-Orientais. 2005. 104p.

14. SOLÓRZANO, A. Composição florística, estrutura e história ambiental em áreas de Mata Atlântica no Parque Estadual da Pedra Branca, Rio de Janeiro, RJ. Dissertação de mestrado. Instituto de Pesquisas Jardim Botânico do Rio de Janeiro/Escola Nacional de Botânica Tropical, 2006.

15. SVORC, R. C. P. F. Figueiras centenárias, história ambiental e estrutura da Mata Atlântica no município de Angra dos Reis, RJ. 2007. 66f. Dissertação (Mestrado em Ciências Ambientais e Florestais). Seropédica, Instituto de Florestas, Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, 2007.

16. SVORC, R. C. P. F.; OLIVEIRA, R. R. “Uma dimensão cultural da paisagem: biogeografia e história ambiental das figueiras centenárias da Mata Atlântica”. GEOUSP: espaço e tempo, v. 32, 2012, pp. 124-139.

17. WORSTER, D. Para fazer história ambiental. Estudos Históricos. Vol 4, n. 8. p. 198·215. 1991.

Referências

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