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Anais do VII Seminário Fazendo Gênero 28, 29 e 30 de 2006

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28, 29 e 30 de 2006

Violência de Gênero – ST 5 Danúbia Rocha Vieira Juliana Palavezzini

Universidade Federal de Santa Catarina

Palavras-chave: Violência contra a mulher - Violência doméstica - Políticas Públicas Um novo olhar sobre a violência contra a mulher

Este artigo resulta do Projeto de Extensão: “Um novo olhar sobre a violência contra a mulher - identificando políticas públicas”, realizado nos anos de 2004 e 2005. O NUSSERGE (Núcleo de Estudos e Pesquisa em Serviço Social e Relações de Gênero) do Departamento de Serviço Social da Universidade Federal de Santa Catarina através deste projeto procurou conhecer as principais causas da violência doméstica e em especial da violência contra a mulher na Grande Florianópolis, bem como tornar ainda mais público este debate.

Em nossa sociedade a violência sempre foi uma realidade, abrangendo mulheres de todas as idades, classes sociais, graus de instrução, etnias ou raças. Segundo Telles & Melo (2002, p.19)

a violência contra a mulher é concebida por ser praticada contra a pessoa do sexo feminino apenas e simplesmente pela sua condição de mulher. Essa expressão significa a intimidação da mulher pelo homem, que desempenha um papel de agressor seu dominador e disciplinador. Já a violência doméstica é aquela que ocorre dentro de casa, nas relações entre as pessoas da família, entre homens e mulheres, pais/mães e filhos, entre jovens e pessoas idosas.

Tal projeto procurou contribuir com o debate de maneira inovadora, pois possibilitou dar voz às mulheres em situação de violência tentando conhecer a realidade a que estavam/estão submetidas. E isso se deu através de pesquisas, entrevistas, visitas domiciliares e institucionais, onde foram levantados dados como: o perfil de quem sofre violência, as condições econômicas, o perfil do agressor, o ciclo da violência e o caráter da agressão. Também procurou-se identificar possibilidades de atendimento adequado à mulher, pois o meio acadêmico pode e deve contribuir com a problemática não só trazendo a questão para o debate público, mas também apresentando sugestões de enfrentamento e possíveis soluções através de Políticas Públicas.

Durante todo o processo da pesquisa estivemos realizando entrevistas com mulheres que estão ou já estiveram sujeitas a alguma forma de violência, de onde foram obtidos os dados aqui apresentados. Nas entrevistas realizava-se a aplicação de um questionário elaborado na primeira etapa da pesquisa.

Geralmente a aproximação com essas mulheres se fazia por intermédio de líderes comunitárias locais, pessoas conhecidas das mulheres, o que lhes transmitia mais confiança e

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As saídas a campo foram, dessa forma, realizadas em bairros periféricos de Florianópolis, Palhoça e São José. Apesar de a violência permear todas as classes sociais o projeto centrou-se principalmente em regiões mais empobrecidas, pois realizávamos simultaneamente uma outra pesquisa destinada a mulheres pobres chefes de família. A partir disso, identificou-se também que um número significativo das mulheres que hoje são chefes de família passaram por algum tipo de violência. Fator que contribuiu para que elas se encontrem na atual condição social e econômica.

No processo de pesquisa, objetivando conhecer um pouco mais da realidade da violência contra a mulher na Grande Florianópolis, foram realizadas diversas visitas a 6º Delegacia de Polícia da Capital, onde tivemos acesso aos boletins de ocorrência, bem como a oportunidade de realizar uma observação participante aos atendimentos.

Ao total foram aplicados 35 questionários, sendo 15 em Florianópolis, 10 em Palhoça e outros 10 em São José. A meta inicial era de 50 questionários. Infelizmente não foi alcançado o número desejado de entrevistas, frente a grande dificuldade em localizar essas mulheres, assim como de aceitarem falar sobre as agressões sofridas. Muitas delas aceitavam num primeiro momento, mas acabavam desistindo na hora da entrevista, outras ainda aceitavam falar sobre as experiências vividas, mas não queriam que seu depoimento fosse registrado (nos questionáios).

Dessa maneira, estudar a violência doméstica apresentou-se como um desafio, sendo que muitas vítimas preferem deixar tais acontecimentos esquecidos, no passado. A vergonha é muito freqüente e é certo que a violência deixa marcas profundas fazendo com que as lembranças causem grande dor e sofrimento.

É importante frizar que o trabalho aqui apresentado trata-se de uma pesquisa por amostra, portanto, não tem como ambição traçar um perfil da mulher em situação de violência da grande Florianópolis, generalizando tais dados. Diante do número reduzido de casos estudados, nosso objetivo é apenas conhecer e entender um pouco mais dessa realidade na região.

Com os resultados do projeto observamos dados bastante relevantes que dão espaço a interessantes reflexões sobre a violência doméstica na região da Grande Florianópolis. Mas diante da amplitude de nossa pesquisa trazemos aqui apenas uma pequena parte desses resultados.

Segundo as informações obtidas a maioria dos agressores constituem-se pelo marido ou cônjuge, representando 83% dos casos entrevistados. Acrescentando-se a esse número ainda 6% que sofreram violência pelo cônjuge e também pelo pai e, 3% pelo cônjuge e por um filho.

Também foram analisados casos de mulheres que sofreram violência pelos pais, filhos e netos. É importante não esquecer que essa face da violência contra a mulher existe e merece atenção. Mas em nosso processo de pesquisa acabamos mais restritos a violência na relação conjugal, por representar a maioria dos casos que chegaram até nós.

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A partir disso, algo que nos chamou bastante atenção nos resultados finais, foi o fato de que, na maioria dos casos, os maus tratos se prolongam por um longo período sem nenhum tipo de ação por parte da mulher. É comum um intervalo de muitos anos entre o primeiro episódio de violência, a denúncia e a separação quando essa ocorre.

Nos casos estudados, 20% das mulheres nunca chegaram a procurar algum serviço de atendimento e do restante que chegou a denunciar 11% retiram a denúncia posteriormente.

Quando se fala em duração dos maus tratos os números mais expressivos se encontram entre 5 e 10 anos (23%), 15 a 20 anos (20%) e 10 a 15 (11%).

Ao observar tais resultados surge a pergunta: por que essas mulheres se mantêm submetidas a essas situações violentas por tanto tempo? Por que a demora na denúncia? Essas são questões que intrigam os pesquisadores na área da violência doméstica. É importante destacar que nenhum fator tem o poder de determinar categórica ou genericamente o fenômeno da violência, entretanto no decorrer de nossa pesquisa, através das mulheres entrevistas, foram identificadas algumas questões que tentam responder essas perguntas.

A dependência econômica é com certeza uma das facetas da questão. Muitas mulheres ao se casarem deixam de trabalhar, ou quando têm filhos passam a se dedicar exclusivamente a criação destes e aos afazeres domésticos.

Assim, na grande maioria dos casos o homem é o principal quando não é o único provedor da casa. A separação, então, pode representar dificuldades financeiras futuras, o que não só afetará a mulher, mas também os filhos, fator que acaba por influenciar muito na decisão de continuar a se submeter aos maus tratos.

Também não é possível negar a relação afetiva existente. O envolvimento emocional com o agressor torna a denúncia mais difícil. A tentativa de preservar a relação acaba por levar a mulher a silenciar. O envolvimento emocional é um dos elementos que constitui e mantém os relacionamentos, entretanto os organismos responsáveis pelo combate a violência tem negado frequentemente sua existência, ou ainda quando reconhecida é tratada como ‘escolha’ ou ‘ falta de vergonha’ da mulher.

Não é fácil para as mulheres recorrerem a polícia para denunciar a violência perpetrada por um parceiro íntimo, ao qual ela está de algum forma vinculada; alguém com quem ela compartilha a casa a cama e, muitas vezes os filhos. O medo, a vergonha e mesmo um sentimento de culpa fazem com que a mulher se cale diante da violência sofrida. (OLIVEIRA, 2005, p.235)

Assim os órgãos de prevenção e combate da violência contra mulher devem necessariamente reconhecer sentimentos e emoções como ‘peças’ que permeiam e podem determinar a violência em muitos casos.

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Quando perguntadas se manifestavam vontade de acabar com a relação, em meio aos maus tratos, a grande maioria das entrevistadas respondia sim (89%), mas a questão afetiva comumente aparecia como fator de impedimento. Segundo M.i, uma das entrevistadas, que sofreu 15 anos com a violência do marido: “Eram dois ou três meses separados e a ‘amélia’ voltava, perdoava porque amava”. Hoje ela é viúva, chegou a procurar ajuda na delegacia, duas vezes, mas nunca chegou a se separar.

É importante ressaltar que nessas relações a violência é algo que nem sempre está presente diariamente. Obedece a um ciclo onde existem algumas temporadas de calma, acompanhadas por promessas de mudanças e pedidos de desculpa, fatores amplamente percebidos entre os casos estudados.

É necessário considerar também que o medo dos julgamentos, a vergonha e o constrangimento por vezes acabam por limitar a procura por ajuda. Por outro lado, se em muitas vezes há a denúncia, esse importante passo dado pela mulher, não vai significar necessariamente a proteção à vítima e punição do agressor. A retirada da denúncia é comum e um dos comportamentos mais freqüentes é que o pedido de auxílio é, na verdade, muito mais uma tentativa de restaurar ou propor uma estabilidade para a relação no momento do conflito do que a tentativa de romper com o ciclo de violência.

Reconhecer as diversas etapas do processo de violência é imprescindível e neste processo de observação constatamos que uma realidade é quando a mulher chega á delegacia movida de sentimentos, medos, raiva, etc; Outra é quando passa certo tempo, um outro tipo de comportamento se percebe e por diversos fatores.

A partir disso, algo que ficou nítido em nossa pesquisa e que merece atenção foi a deficiência na rede de proteção a mulher em situação de violência bem como a ausência de Políticas Públicas destinadas a essa questão na Grande Florianópolis. Essa certamente é uma das barreiras que aumenta a insegurança e o medo no que diz respeito à denúncia e ao rompimento com a relação violenta. Para realizar a denúncia é necessário que a mulher sinta-se segura; essa segurança só acontece por meio de uma rede de proteção efetiva.

Existe somente uma delegacia especializada de atendimento a mulher em Florianópolis, e atente apenas mulheres da Capital. As vítimas das cidades vizinhas têm que recorrer às delegacias normais, muitas vezes sem a devida preparação para o atendimento.

Diante de um fenômeno tão complexo como a violência é indispensável ter profissionais capacitados, que estejam preparados para os encaminhamentos necessários. Muitas vezes a mulher chega fragilizada diante da situação sofrida, e um acolhimento sem o cuidado e atenção necessários ou atendimento realizado de uma forma imprópria pode inibir e até levar a desistência da denúncia. Sabe-se que a delegacia é em muitos casos a porta de entrada para a quebra do isolamento da

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mulher, o primeiro serviço em que busca proteção. Assim um atendimento humanizado é indispensável.

Outra questão que aponta a fragilidade quando se fala na rede de atendimento de Florianópolis, é o fato de que a mulher depois da denúncia, sem opção, acaba voltando para sua casa, lócus da violência, onde sem proteção fica à mercê de sofrer mais ameaças e novas violências. Nesses casos, para não se dar espaço a revimitização a construção de casas-abrigo na região se torna uma necessidade iminente. As Casas-abrigo seriam uma espécie de abrigo temporário para as mulheres em situação de risco de vida pela violência doméstica, até poderem reconstituir suas vidas.

Outro serviço que faz falta na região, seriam os Centros de Referência que seriam locais de referência no atendimento a mulher em situação de violência. Onde a mulher recebe informações, orientações e acompanhamentos psicossocial.

Serviços esses básicos e indispensáveis não existem na grande Florianópolis e são em número extremamente reduzidos em todo estado de Santa Catarina, e que vem sendo uma luta constante de vários movimentos locais ligados a questão do combate a violência contra a mulher.

Assim esse atendimento que apresenta deficiências torna-se um fator que colabora para que a violência seja silenciada. Com certeza é necessário incentivar a denúncia, mas para isso é indispensável mais atenção pelo Estado através da garantia de proteção e segurança pessoa agredida.

A submissão da mulher é um dos fatores mais relevantes do fenômeno, ouvir as estórias, as queixas, dar voz a essas mulheres, enfim “tirá-las das estatísticas e números” foi um dos nortes da pesquisa.

A partir de todas as reflexões apresentadas até então, tomando por base os resultados de pesquisa realizada, fica claro que para o enfrentamento da questão da violência contra a mulher é imperativo que esta questão seja retirada da esfera privada. Devendo ser reconhecida como uma questão pública, algo que diz respeito a toda a sociedade e necessita de ação do Estado.

Por certo é indispensável para a mulher sair de uma situação de violência a sua própria decisão. Mas é necessário que primeiramente se ofereçam condições para o rompimento com o ciclo da violência. Nesse processo, a criação e melhoria de políticas públicas voltadas para essas mulheres é imprescindível.

Políticas Públicas que ofereçam suporte e apoio a mulher por meio de uma rede efetiva de proteção, que articule serviços da polícia, jurídicos, de saúde e assistência. Só assim haverá um real impacto das ações do Estado sobre a questão da violência.

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Mas os esforços públicos não devem estar concentrados somente em atender os casos de violência, pois tão importante quanto atender é prevenir. Para isso deve-se realizar esforços para a elaboração de Políticas Públicas voltadas a esclarecimento de direitos.

Dessa maneira, para que as mulheres consigam sair da situação de violência é indispensável que alcancem sua autonomia, empoderem-se dos seus direitos, recuperando sua auto-estima e sua identidade. Um grande passo em direção a eliminação da violência contra a mulher é a superação da situação de subordinação e opressão internalizadas e reproduzidas não só pela sociedade, mas também pelas próprias mulheres.

De outra forma, é necessário fazer com que as mulheres que estão em situação de violência percebam que existe a possibilidade de romper com essa condição e reconstruir suas vidas. Provavelmente um dos caminhos mais rápidos para isso é através da quebra do isolamento e da ofereta de uma rede efetiva de proteção.

Finalmente a partir do que pôde-se observar durante esses dois anos de pesquisa a violência ainda está muito imbricada a realidade da mulher e ao contrário do que se pode imaginar, atinge mulheres nas várias faixas etárias e diversos graus de instrução. Observa-se a necessidade de divulgação desses resultados e isso com o intuito de tornar a questão da violência visível diante agenda pública, destacando sua gravidade e a emergência de uma maior atenção quanto a políticas púbicas voltadas a problemática.

Referências

BOSCH, Esperança; FERRER, Victória . La Voz de las Invisibiles, las victimas de um mal amor que mata. Madrid. Ediciones Cátedras.2002

GREGORI, Mª. Filomena. Cenas e Queixas: um estudo sobre mulheres, relações violentas e a prática feminista. Rio de Janeiro. Paz e Terra, 1993.

MEDEIROS, Mércia Carréra de. Unidos contra a Violência. In: Marcadas a ferro. CASTILLO-MARTÍN, Márcia & OLIVEIRA, Suely. Brasília: Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres, 2005.

OLIVEIRA, Suely de. Nem homem gosta de bater, nem mulher de apanhar: fortalecendo a rede de proteção. In: Marcadas a ferro. CASTILLO-MARTÍN, Márcia & OLIVEIRA, Suely. Brasília: Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres, 2005.

PORTELLA, Ana Paula. Novas faces da violência contra as mulheres. In: Marcadas a ferro. CASTILLO-MARTÍN, Márcia & OLIVEIRA, Suely. Brasília: Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres, 2005.

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RANGEL, Olívia. Violência contra a mulher: as desventuras do vitimismo e as armadilhas da cumplicidade. Disponível em: http: //www.ubmulheres.org.br/telas/ revistas/enc_39.asp#topo/. Assessado em: 20/08/2005.

SECRETARIA ESPECIAL DE POLÍTICAS PARA AS MULHERES. Programa de Prevenção, Assistência e combate à violência doméstica e de gênero: construindo políticas para as Mulheres. Brasília: A Secretaria, 2003.

TELLES, Mª. Amélia de Almeida; MELO, Mônica de. O que é violência contra a mulher. São Paulo: Brasiliense, 2002.

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