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Sumário Um... 7 Dois Três Quatro Cinco Seis Sete Oito Nove Dez Onze Doze Treze...

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Academic year: 2021

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Um ...

7

Dois ...

12

Três ...

17

Quatro ...

21

Cinco ...

25

Seis ...

31

Sete ...

36

Oito ...

41

Nove ...

53

Dez ...

57

Onze ...

65

Doze ...

72

Treze ...

82

Sumário

(2)

Quatorze ...

95

Quinze ...

101

Dezesseis ...

107

Dezessete ...

112

Dezoito ...

117

Dezenove ...

121

Vinte ...

134

Vinte e um ...

144

Vinte e dois ...

152

Vinte e três ...

159

(3)

7 Seria precipitação dizer que aspectos cotidianos pouco ou nada pesam no conjunto desta nossa vida e que remontá-los num mosaico nos leva a conclusões força-das e até premeditaforça-das. Talvez. Mas não sejamos afoitos. Vejamos desde o princípio, ou desde o momento sobre o qual consigo lançar luz. É o que me resta fazer nesta hora. Inevitavelmente surgirão os vácuos, os vácuos em que nem o esforço de imaginação consegue penetrar e ar-rancar definições. E, diante deles, ficamos a indagar o que terá acontecido nesses períodos, o que foi feito de nós até o instante seguinte, quando recuperamos o débil e con-fuso fio da meada e já não sabemos se foi antes ou depois e se, afinal, o fato de ser anterior ou posterior terá tanta importância assim. Inexplicáveis certas confusões, como

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Gilberto Kieling

a de não saber se aquilo que ocorreu aos quinze anos não terá realmente acontecido aos vinte e cinco. E, se me questiono, é claro que não saberei responder se aos vinte e cinco teria agido de maneira diferente. E as coisas ficam, realmente, feito um mosaico mal repartido, montado por pedreiro inexperiente.

Agora, tento remontar esse painel, esse mosaico. Converso comigo mesmo, tentando justificar certas ati-tudes. Preciso ordenar mentalmente esses fatos todos. Quem sabe reconstituindo-os consiga desvendar a lógica que rege sua duvidosa sequência. Sei que estas quatro pa-redes me ouvem, mas não são um interlocutor adequado. Isso dificulta as coisas. Qualquer questionamento fica truncado. Posso estar ocultando perguntas que seriam muito importantes. Mas, de todo modo, não tenho a quem dirigi-las. As pessoas que me vigiam e auxiliam não são dignas de ouvir minhas dúvidas. Enfim...

Recordo, por exemplo, que, aos quinze, aquele ga-roto ousava se apaixonar, contrariando a vontade geral e mesmo a dele próprio. E o amor, nessa idade, represen-tava o movimento fundamental do universo. Sobrepuja-va até mesmo as leis da física que ele tentaSobrepuja-va aprender apesar do ódio alimentado contra o professor arrogante e conhecedor de todas as verdades. Eram, é claro, as pai-xões repentinas, que desapareciam tão velozmente quan-to surgiam. E será quan-totalmente inútil nos perguntarmos se aquelas paixões teriam efeitos diversos caso acontecessem em outra época, quando o garoto e o mundo estivessem mudados. Paixão real foi apenas uma. E determinante, decisiva.

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O fundo invisível do olho

9 Vejo-me servindo chimarrão na varanda. É uma dessas lembranças que surgem, das quais é impossível precisar a data. O sol se despede no poente e algumas ga-linhas cruzam o pátio procurando árvores onde possam passar a noite. Sinto, naquele momento, leve torpor nos braços, em razão do manuseio da enxada. Durante todo o dia fizera a capina da roça, e o chimarrão do entardecer preparava o estômago para o jantar. Quinze anos. Ou de-zoito. Impossível não padecer suplícios nessa idade. Na época — distante, distante —, os suplícios eram multipli-cados, mas os existentes tinham de ser vividos em silên-cio. Não havia com quem reparti-los. Minha mãe retor-nava do curral, onde fora encerrar as vacas que, na manhã seguinte, derramariam litros e litros de leite quente nos baldes de alumínio. Na madrugada, antes do sol, antes de tudo, ela carregava os baldes, numa tarefa sem fim.

Os suplícios eram mistérios indecifráveis. Diante do espelho, nu, o corpo é uma arca repleta de mistérios e desafios maiores que nós mesmos. Meu corpo tinha es-tranhas transformações. E não se resumiam aos pelos que brotavam na virilha e na cara, incômodos e perturbado-res. Havia composições químicas revolucionando todo o meu metabolismo. O sono interrompido em plena ma-drugada, corpo banhado em suor, comichões nas pontas dos dedos, o pênis latejando sob as cobertas, inchado, vermelho. Uma preguiça que atravessa os dias e quebra os horários de trabalho. Uma vontade e um medo...

Mas, fitando o espelho, lá estavam os meus olhos. Eram os mesmos. Na varanda, eu servia o mate enquan-to minha mãe reenquan-tornava do curral. Ela olhava para mim

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Gilberto Kieling

e naquele rosto lanhado e com cicatrizes profundas es-tavam os meus olhos. Idênticos. Os mesmos. Terei, um dia, aquele mesmo rosto? É bem possível, se alcançar a sua idade e curvar as costas como ela faz, sentindo o peso do tempo. E naquele momento eu me perguntava: terei de carregar a mesma amargura?

Ela gostava de ficar sentada, assim, no fim da tar-de, tomando mate, quase em silêncio, esperando a noite. Eu também gostava daquele ritual tão simples. Bebíamos chimarrão de manhã cedo, antes do sol nascer, e à tar-dinha, antes dele desaparecer. Mais que um hábito, era um ritual ao astro-rei, uma espera pela noite que se apro-ximava. Nossos corpos exigiam que houvesse chimarrão de manhã e ao entardecer, o metabolismo funcionava melhor com aquele líquido quente nas horas certas. Mas tinha algo mais, uma espécie de diálogo com o sol, a sau-dação e a despedida. Ninguém jamais soube quando teve início aquele costume, mas o fato é que ele nos renovava. Era bom.

Ela ainda guardou algumas louças que restavam so-bre o balcão da cozinha. Levei o chimarrão até lá. Os seus olhos me olharam e agradeceram o gesto. Ela calculava, ou se esforçava para calcular, o destino daquele garoto. É evidente que lhe era difícil conjeturar sobre isso, sobre o futuro do filho, vivendo em local tão distante de tudo. Um dia, me falou que não queria me ver cuidando da roça, de vacas e porcos. Eu devia ir embora. Sentia medo do que poderia me acontecer caso ficasse por estas ban-das. Usou a expressão “estas bandas” com um leve tom

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O fundo invisível do olho

11 depreciativo, um certo desprezo pelo lugar. Aquilo me deixou inquieto por alguns dias. Nunca poderia imaginar que mamãe fosse pronunciar semelhante frase. O normal, o esperado era que ela defendesse intransigentemente a permanência do filho junto dela e rejeitasse a ideia de se-paração com todas as forças possíveis. Não era o seu caso, o nosso caso. Ela queria que eu partisse para bem longe, que buscasse outra vida. Tentava me dizer que eu teria alternativas longe do rio Uruguai. Nada mais estranho. Passou a vida toda naquelas paragens, cuidando do gado e da lavoura, observando o rio e suas mutações. E agora...

Dizem que pessoas dotadas de especial sensibilida-de posensibilida-dem prever o futuro, mesmo que tal percepção seja algo indefinido, impreciso. Será que minha mãe tinha tal habilidade? Mais tarde ela me repetiria tal conselho, es-pécie de premonição. Não chegou a ver o que aconteceu com o filho, e até hoje me pergunto se ela não tinha ra-zão em me advertir. Por que ir embora? Ela respondia: “porque sinto medo; em qualquer outro lugar você vai ser feliz”. Era seu modo de pedir que eu me afastasse. Na verdade, eu não gostava de ouvi-la dizer aquilo. Procu-rava ignorar suas palavras, que, naqueles momentos, eu considerava insanas. E agora, sozinho neste quarto, ten-tando ordenar os acontecimentos que consigo resgatar da memória, aqueles avisos de mamãe me soam extrema-mente lúcidos. Mas é tarde.

Referências

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