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Academic year: 2021

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Senhores Deputados, é um país que prima pela falta de políticas públicas de longo alcance. E essa faceta lamentável da nossa cultura política, particularmente presente na esfera social, frustra a vontade da Nação de dar soluções definitivas aos seus problemas seculares.

Com o passar do tempo, é de se esperar que as crises nos cenários sociais se agravem e fiquem mais complexas e freqüentes. Quando a situação fica insustentável, a resposta governamental é sempre a mesma: soluções meramente emergenciais, por meio de políticas públicas fragmentadas, sempre oportunistas e demagógicas.

E é a isso, exatamente, o que se assiste agora no plano da educação pública. Analogamente aos

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vales-isso-aquilo (como o vale-transporte, o vale-refeição e o vale-gás, para citar alguns), - que não resolvem, pela raiz, o problema da crônica falta de renda digna de grande parcela da população -, vemos hoje o governo do PT propor políticas de “vales” educacionais - as chamadas “cotas”: para negros, para pardos, para índios, para egressos da educação pública em geral, e assim por diante. Ou seja, uma política educacional permeada por uma nítida filosofia da sociedade “aos pedaços”, ainda que tenha como finalidade declarada uma causa justa: resolver desigualdades sociais, em particular no tocante ao acesso ao ensino universitário.

O cerne desse política está hoje centrado num Projeto de Lei do Poder Executivo, recentemente enviado ao Congresso Nacional, e que já se encontra na Comissão de Educação e Cultura da Câmara dos Deputados para receber Parecer de mérito. Trata-se do PL 3627, de 2004, que “institui o Sistema Especial de Reserva de Vagas para

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estudantes egressos de escolas públicas, em especial negros e indígenas, nas instituições públicas federais de educação superior e dá outras providências.”

A proposta governamental afirma no seu art. 1° que as instituições públicas federais de educação superior reservarão, em cada concurso vestibular aos cursos de graduação, no mínimo 50% de suas vagas para estudantes que tenham cursado integralmente o ensino médio em escolas públicas.

Afirma ainda, no seu art. 2°, que o percentual de 50% de vagas será preenchido por uma proporção mínima de autodeclarados negros e indígenas igual à proporção de pretos, pardos e indígenas na população da unidade da Federação onde está instalada a instituição pública federal de educação superior, segundo o último censo do IBGE -Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística.

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Faço sérias objeções à política de cotas educacionais do referido PL, o que me leva a vê-lo com desconfiança. Afinal, a proposta do governo reflete um modo simplista, imediatista, populista, e, por isso, perigoso, de tentar resolver problemas sociais graves, - como o da desigualdade de oportunidades no acesso à educação superior. Cortes percentuais e proporções baseadas em censo, como reza na proposição em apreço, é uma forma cartesiana de tratar a questão, e que ainda esconde suas raízes históricas e as suas causas.

As disposições - arts. 1° e 2° - que acabo de mencionar são o “core” da iniciativa legislativa do governo. Além de inconstitucionais, no meu entendimento, estão eivadas de arbitrariedades, distorções e equívocos, para não falar dos riscos inerentes ao que uma política de cotas pode despertar na sociedade, a saber, a intolerância e a discriminação social.

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Vejamos, Senhor Presidente, Senhoras e Senhores Deputados, a título de ilustração, alguns pontos que embasam o meu questionamento.

Em primeiro lugar, cabe lembrar que a proposta de cotas educacionais encaminhada pelo governo fere, obviamente, a autonomia universitária prevista no art. 207 da Constituição Federal. Fere ainda, quanto à Carta Magna, o sagrado princípio de que todos são iguais perante a lei (caput do art. 5°).

Além disso, o PL 3627/04 atinge a alma do princípio do mérito intelectual, mundialmente reconhecido e respeitado por ser essencial à sobrevivência das comunidades universitárias - professores, alunos e técnicos que praticam o ensino, a pesquisa e a extensão no seu mais elevado grau de excelência acadêmica.

É claro que o sistema de ingresso às escolas e aos cursos superiores - o concurso vestibular - deve ser

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democrático, aberto igualmente a todos, mas não deve, por isso, escapar de um procedimento baseado exclusivamente no mérito intelectual dos vestibulandos.

Pode-se ver a proposta governamental de cotas para a educação superior como uma tentativa de corrigir distorções e injustiças sociais, uma vez que os estudantes do ensino médio público, como se sabe, vêm de famílias que têm poder aquisitivo mais baixo do que as dos alunos das escolas privadas.

Mesmo assim, aproximadamente 42% dos estudantes que ingressam na educação superior vêm de escolas públicas. Contudo, há dados que mostram baixa competitividade dos alunos egressos do ensino médio em escola pública, quando comparados aos que cursaram o mesmo nível de ensino na escola privada, sobretudo quanto a certos cursos considerados de difícil entrada no concurso

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vestibular, por exemplo, medicina, direito e os de engenharia.

Mas numa análise mais apurada do problema, no entanto, vê-se logo a falácia: a causa de baixa competitividade no concurso vestibular entre um e outro grupo estudantil reside na falta de qualidade da educação pública no níveis fundamental e médio. E deve ser acrescentado que reside também, e muito, na total falta de políticas públicas de promoção social da família de baixa renda.

De fato, dos cerca de 40% da população estudantil do ensino fundamental que não conseguem concluir os seus estudos, e do contingente na mesma situação, mas no nível médio, que chega quase à casa dos 50% , - uma enorme evasão! -, a grande maioria é pobre, tanto brancos como negros, e também indígenas, em geral oriundos de famílias com baixa renda, e, por isso, com baixo potencial de

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estimulação intelectual de suas crianças e jovens. Além disso, em especial nas zonas urbanas, há grande número dessas famílias pobres que são também fragmentadas, sem a estrutura psicossocial e cultural duma família nuclear típica, seja pela ausência de um dos genitores, em geral o pai, seja pela falta de condições socioeconômicas para manter a dignidade da vida familiar, quadro esse agravado pelo ainda elevado número de filhos, quando comparado à média populacional.

Nesse cenário perverso há que se assinalar duas condições concorrentes: a pobreza intelectual e cultural da família, que tem forte ligação com a pobreza socioeconômica e com a falta de base institucional do núcleo familiar; e a falta generalizada de qualidade da educação básica pública, com as suas várias facetas: a pedagógica (formação precária do professor, deficiências curriculares), a material (escassez de meios, instalações

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precárias e falta de infra-estrutura) e a humana (salários baixos dos profissionais da educação, pouco ou nenhum incentivo à carreira docente, baixa motivação para o magistério, violência estudantil) etc.

Por que, então, Senhor Presidente, Senhoras e Senhores Deputados, criar a cota obrigatória de reserva de 50% das vagas nas instituições públicas de educação superior para estudantes egressos do ensino médio público?

Além de absolutamente desnecessária, pelos dados percentuais que temos sobre a origem dos estudantes universitários (ensino público X privado), a medida proposta é inconstitucional, imediatista, populista e falaciosa, pelas razões que acabo de apresentar.

Posto isso, Senhor Presidente, Senhoras e Senhores Deputados, fica-se com a nítida impressão de que o projeto de sistema de cotas para a educação superior, enviado ao Congresso Nacional pelo governo, nada mais é do que mais

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uma tentativa, espúria, de burlar a solução definitiva dos nossos problemas sociais - no caso, o de desigualdade de acesso ao nível superior de educação.

Não é de admirar, portanto, que o PL 3627/04 venha causando celeuma, não apenas entre os especialistas no assunto, como também entre os políticos, até mesmo entre aqueles aliados à base de apoio do governo.

Isso tem ficado patente em artigos e manifestações na mídia e outros fóruns. Por exemplo, numa audiência pública realizada nesta Casa na semana passada, promovida pela Comissão de Educação e Cultura, ficou claro o clima de discórdia reinante entre a Secretaria de Ensino Superior do Ministério da Educação, o Conselho de Reitores das Universidades Brasileiras, a Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior e os especialistas e Deputados presentes, em torno dos pontos da mencionada iniciativa legislativa.

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Senhor Presidente, Senhoras e Senhores Deputados: a solução, a meu ver, para um acesso à educação superior baseado no mérito intelectual, mas que também vise a eliminar desigualdades sociais, reside em dois pontos que exigem políticas públicas de amplo escopo, com investimentos humanos, materiais e financeiros de grande porte, a saber: a melhoria qualitativa e quantitativa da educação básica e superior; a formulação e a perseguição de políticas de promoção social da família de baixa renda, com ênfase naquelas que demandam reestruturação completa do núcleo familiar.

É evidente que essas vertentes não darão frutos da noite para o dia. Enquanto isso, contudo, é possível buscar soluções criativas, de curto prazo, como as que vêm sendo encetadas pela Universidade de São Paulo - isenção da taxa de inscrição no concurso vestibular, criação de curso pré-vestibular gratuito para estudantes de escolas públicas

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e criação de campus na zona leste de S. Paulo, uma das mais carentes da cidade.

Vê-se, portanto, Senhor Presidente, Senhoras e Senhores Deputados, que a proposta governamental de cotas para a universidade cria mais problemas do que oferece soluções. Pior ainda: esconde as causas do quadro de desigualdades que simula resolver e, assim, atrasa ainda mais a inserção do País numa autêntica via de desenvolvimento, com oportunidades iguais para todos.

Muito obrigado.

2004.6306.072 CDCLPE17

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