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TRATADOS INTERNACIONAIS

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ÊQUESTÕES COMENTADAS

1. (MPF – PROCURADOR DA REPÚBLICA – 25º CONCURSO)

O que são reservas a cláusulas de tratados? Qual o procedimento para sua opo-sição? Estados que opõem reservas não aceitas por outros podem manter-se parte do tratado? Quais são as relações entre Estados que opõem reservas e os que as rejeitam?

◉ RESPOSTA DO AUTOR:

Nos termos da CVDTE, de 1969, reserva é a declaração unilateral, qualquer que

seja a sua redação ou denominação, feita por um Estado ao assinar, ratificar, aceitar

ou aprovar um tratado, ou a ele aderir, com o objetivo de excluir ou modificar o efeito

jurídico de certas disposições do tratado em sua aplicação a esse Estado (art. 2.1.d).

Pode ser oposta no momento da assinatura, da ratificação ou da adesão, pelo Poder

Executivo, por escrito, e comunicada à outra parte.

Se o Estado que fez a objeção à reserva manifestar-se expressamente nesse

senti-do, o tratado não entrará em vigor entre ele e o que formulou a reserva. Caso

contrá-rio, o tratado entra em vigor entre esses Estados – o que formulou a reserva e o que

fez a objeção – sem a aplicabilidade das disposições que foram objeto de reserva (arts.

20 e 21).

◉ COMENTÁRIO:

A questão que acabou de ser resolvida mostra que, mesmo em concursos de alto

nível de dificuldade, é possível responder bem uma prova discursiva com a utilização

exclusiva das normas pertinentes (que geralmente podem ser consultadas).

◉ DOUTRINA TEMÁTICA:

“A reserva, a aceitação expressa de uma reserva e a objeção a uma reserva devem ser formuladas por escrito e comunicadas às partes contratantes e a terceiros sujeitos que tenham o direito de se tornar partes no tratado. Também a retirada de uma reserva ou de uma objeção a uma reserva devem ser formuladas por escrito”. (PORTELA, 2014, p. 123).

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“Se o tratado disciplina a questão das reservas no que lhe diz respeito, a nenhuma que seja formulada nos termos dessa disciplina por outro Estado pactuante, em regra, res-ponder com objeção ou com assentimento. O problema só aflora no silêncio do texto, quando o autor da reserva, crendo-a, naturalmente, legítima – porque compatível com a finalidade e objeto do tratado – vê objetar seu gesto outro Estado, que entende con-trário. Neste caso, ao autor da objeção incumbe esclarecer se considera o tratado, como um todo, vigente entre si e o autor da reserva, ou não. Em caso afirmativo, estatui a Convenção de Viena que somente a norma objeto da reserva não se aplica nas relações entre ambos”. (REZEK, 2014, p. 93)

◉ JURISPRUDÊNCIA TEMÁTICA:

“(...) Se uma parte da Convenção fizer objeção a uma reserva que considera incompatí-vel com o objeto e o propósito da Convenção, pode, de fato, considerar que o Estado que fez esta reserva não é parte da Convenção (...)”. (CIJ, Parecer Consultivo sobre as Reservas à Convenção sobre Prevenção e Repressão do Crime de Genocídio, 1951)

2. (MPT – PROCURADOR DO TRABALHO - 14º CONCURSO)

De acordo com a sistemática constitucional brasileira, disserte sobre as soluções dos conflitos entre tratados internacionais e as normas de direito interno.

◉ RESPOSTA DO AUTOR:

A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, devido ao contexto de

redemocratização em que foi produzida, é um marco na história constitucional

brasi-leira no campo da proteção dos direitos fundamentais. Nela o princípio da dignidade

da pessoa humana aparece como o princípio reitor de toda a ordem constitucional.

O art. 4º, como consequência da adoção do princípio da dignidade humana,

es-tabelece a prevalência dos direitos humanos como princípio regente da República em

suas relações internacionais. Tal norma obriga o Estado brasileiro a priorizar a

promo-ção dos direitos humanos no mundo e a garantir a protepromo-ção desses mesmos direitos

em seu território.

A Carta prevê um extenso rol de direitos que, ao contrário dos textos

constitucio-nais anteriores, antecede topograficamente a própria organização do Estado. E, para

evitar a crônica inefetividade dos direitos fundamentais, estabelece que tais normas

têm aplicação imediata (art. 5º, § 1º).

O art. 5º, § 2º, ao consagrar o chamado “princípio da não exaustividade dos

direi-tos fundamentais” ou “cláusula de abertura aos direidirei-tos humanos”, também inovou em

relação às constituições anteriores, ao incluir os direitos previstos nos tratados

interna-cionais como integrantes do rol de direitos fundamentais.

Nessa linha, a Emenda Constitucional nº 45, de 2004, incluiu o § 3º no art. 5º do

texto constitucional para prever a possibilidade desses tratados serem submetidos a

procedimento idêntico ao necessário para aprovação das emendas constitucionais

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(dois turnos, nas duas Casas, por três quintos dos votos) e, com isso, obterem “status”

equivalente ao de uma emenda constitucional.

Depois dessa alteração surgiu a questão a respeito do momento em que deve ser

realizada a votação destinada a conferir hierarquia constitucional ao tratado. A

dou-trina argumenta que o entendimento mais consentâneo com o sistema constitucional

brasileiro é o de que, somente depois de totalmente encerrado o processo de

incor-poração do tratado, é que o Parlamento da União deve novamente apreciar o tratado,

segundo o rito do art. 5º, § 3º, da CRFB. A doutrina também ensina que a aplicação do

rito do art. 5º, § 3º é facultativa para o Poder Legislativo.

O Brasil é signatário da Convenção de Viena sobre o Direitos dos Tratados entre

Estados, de 1969, que define tratado em seu art. 2º.1.“a”, como “um acordo

internacio-nal concluído por escrito entre Estados e regido pelo Direito Internaciointernacio-nal, quer conste

de um instrumento único, quer de dois ou mais instrumentos conexos, qualquer que

seja sua denominação específica”.

Quando os tratados consagram direitos indispensáveis para uma vida digna são

chamados de tratados internacionais de direitos humanos. Estes tratados, ao

versa-rem sobre os direitos dos indivíduos, superam o velho paradigma internacionalista que

atribui personalidade jurídica de direito internacional somente aos Estados e

comple-mentam a proteção dos direitos feita primariamente por esses entes.

A tendência moderna da doutrina é considerar esses tratados como integrantes

do “jus cogens”, entendido como a categoria de normas imperativas de direito

inter-nacional geral que não admitem derrogação, a não ser por outra posterior da mesma

natureza (art. 53 da CVDTE). A CVDTE também menciona o “jus cogens” em seu art. 64,

para dizer que a sua superveniência nulifica e extingue todos os tratados que com ele

estiverem em conflito.

No Brasil, a incorporação dos tratados internacionais é realizada de acordo com o

modelo tradicional, ou seja, depende de um “iter” que culmina com a prática de um

ato jurídico especial que é a promulgação do decreto presidencial. Todavia, alguns

au-tores sustentam que a incorporação dos tratados internacionais de direitos humanos,

em particular, é feita segundo o “sistema da recepção automática”, isto é, concretiza-se

com a simples ratificação, dispensando-se o decreto executivo presidencial do

proces-so de incorporação. Argumenta-se que o art. 5º, § 1º, da CRFB reconhece a

aplicabili-dade imediata dos direitos fundamentais e que a internalização de tratados de direitos

humanos não pode ficar condicionada a um decreto do Presidente da República.

Essa não é, entretanto, a posição acolhida pelo STF, que entende que não

exis-te exceção para o modelo tradicional de incorporação dos tratados inexis-ternacionais no

direito brasileiro. A Corte Constitucional brasileira afirma que o art. 5º, § 1º refere-se

apenas à necessidade de que os direitos humanos sejam assegurados

independente-mente de norma regulamentadora.

No direito brasileiro, conforme se extrai das normas contidas no art. 102, III, “b”,

e no art. 105, III, “a”, da CRFB, os tratados internacionais possuem “status” equivalente

ao de lei ordinária federal. Com efeito, este é o entendimento jurisprudencial

predomi-nante na atualidade, que remonta ao RE 80.004, julgado pelo STF em 1977.

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Todavia, há exceções à regra. A primeira é a previsão do art. 98 do Código

Tribu-tário Nacional, segundo o qual “os tratados e as convenções internacionais revogam

ou modificam a legislação tributária interna, e serão observados pela que lhes

sobre-venha”. Desse modo, os tratados internacionais em matéria tributária são

hierarquica-mente superiores à legislação ordinária interna.

A outra exceção são os tratados internacionais de direitos humanos. Antes de

1977, o STF filiava-se à corrente da supralegalidade dos tratados internacionais. Com

o julgamento do RE 80.004, como já foi registrado, a Corte acolheu a tese da paridade

com a legislação ordinária, até o julgamento do RE 466343-1/SP, quando adotou

no-vamente a ideia da supralegalidade dos tratados internacionais de direitos humanos.

Na oportunidade, o STF concluiu que as normas infraconstitucionais que preveem a

prisão civil do depositário infiel perderam o seu fundamento de validade, pois o art.

7.7 da Convenção Americana de Direitos Humanos (Pacto de São José de Costa Rica),

norma que se coloca acima da legislação infraconstitucional, veda tal modalidade de

prisão civil. Sem embargo, vale mencionar que alguns autores sustentam a

supracons-titucionalidade de tais tratados.

Nesse contexto, o conflito entre os tratados internacionais e o direito interno é

re-solvido, tradicionalmente, com a aplicação dos critérios hierárquico, cronológico e da

especialidade. Assim, quando houver conflito entre tratados sobre matéria tributária e

legislação ordinária, ou entre tratados sobre direitos humanos e legislação ordinária,

haverá prevalência dos tratados, por força da hierarquia superior que ostentam.

Quanto o conflito ocorre entre tratados comuns e legislação ordinária, é caso

de aplicação dos critérios cronológico ou da especialidade. Por exemplo, o STF tem

considerado os tratados bilaterais sobre extradição como prevalentes sobre a Lei nº

6.815/1980, já que esta seria geral em relação aos tratados internacionais.

Contudo, na perspectiva do Direito Internacional dos Direitos Humanos, o caminho

mais adequado para a solução de conflitos é a aplicação do princípio “pro homine”,

que aponta para a prevalência da norma mais favorável à pessoa e tem sido utilizado

frequentemente pelas cortes internacionais. Dessa forma, a implementação do sistema

de proteção dos direitos humanos é reforçada e a interpretação das normas

interna-cionais é feita de maneira harmônica com o princípio da dignidade da pessoa humana.

` CRITÉRIO DE CORREÇÃO DA BANCA EXAMINADORA:

1) Sistemática Constitucional Brasileira.

1.1) A Constituição brasileira de 1988: afirmação democrática e institucionalização

dos Direitos Humanos no Brasil.

1.2) Dignidade da pessoa humana como princípio incontrastável e informador da

Constituição brasileira.

1.3) Força expansiva dos direitos e garantias constitucionais.

1.4) Aplicabilidade imediata das normas que traduzem direitos e garantias

funda-mentais (art. 5º, § 1º da CF).

1.5) Princípios constitucionais sobre relações internacionais. a) introdução de

prin-cípios internacionalistas. b) a prevalência dos direitos humanos.

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1.6) Abertura do catálogo de direitos fundamentais da Constituição brasileira a

tratados internacionais em que o Brasil seja parte (art. 5º, § 2º da CF).

1.7) A introdução do art. 5º, § 3º pela Emenda Constitucional nº 45 e sua

interpre-tação.

2) Tratados Internacionais

2.1) Conceito.

2.2) A noção de jus cogens e o Direito Constitucional Internacional.

2.3) O Sistema Internacional de Proteção aos Direitos Humanos e o Direito

Interna-cional dos Direitos Humanos.

2.4) Peculiaridades dos Tratados Internacionais de Proteção aos Direitos Humanos.

a) Caráter suplementar; b) Atribuição ao indivíduo de personalidade jurídica de direito

internacional;

2.5) Mecanismos de incorporação de tratados internacionais ao direito brasileiro.

2.6) O princípio da boa-fé (art. 26 da Convenção de Viena) e o pacta sunt servanda

(art. 27 da Convenção de Viena).

3) Solução de conflitos entre tratados internacionais e as normas de direito interno.

3.1) Antinomia entre “standards internacionais” e “soberania do Estado nacional”.

3.2) Abordagem sob a ótica do Direito Internacional Público X Abordagem sob a

ótica do Direito Internacional dos Direitos Humanos.

3.3) Premissas da solução de conflitos: a) reforço do sistema de implementação

dos Direitos Humanos no Brasil; b) universalização e transcendência dos direitos

hu-manos; c) Primazia do princípio da dignidade da pessoa humana.

3.4) “status” hierárquico dos Tratados Internacionais incorporados pelo Brasil. a)

Sistema misto: a.1) hierarquia dos Tratados Internacionais de Proteção aos Direitos

Hu-manos deriva do art. 5º, §§ 2º e 3º da CF; a.2) hierarquia dos demais Tratados deriva

do art. 102, III, “b” da CF. b) Perspectivas hierárquicas dos Tratados Internacionais: b.1)

hierarquia supraconstitucional; b.2) hierarquia constitucional; b.3) hierarquia

infracons-titucional, mas supralegal; b.4) paridade hierárquica entre Tratado e Lei Federal.

3.5) Impacto da introdução do art. 5º, § 3º, pela EC 45 e a questão da recepção dos

Tratados ratificados antes da Emenda.

3.6) Precedentes do Supremo Tribunal Federal. a) Equiparação de Tratados

Inter-nacionais à Lei Federal (STF-RE 80.004, julgado em 1977; STF-HC 72.131, sobre prisão

civil do depositário infiel; STF-ADI 1.480, Convenção 158 da OIT, preliminar de

cabi-mento); b) Hierarquia constitucional dos Tratados (STJ-RHC 18.799, sobre o Pacto de

São José da Costa Rica; STF-RE 466.343, em andamento, sobre prisão de devedor em

alienação fiduciária; STF-HC 90.172, Rel. Gilmar Mendes, j. 5-6.2007).

3.7) Solução dos conflitos: a) para questões que envolvam direitos humanos:

esco-lha da norma mais favorável ao indivíduo protegido, máxima efetividade e

pondera-ção; b) para questões comerciais e diplomáticas em geral: paridade hierárquica com lei

ordinária federal e seus limites.

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4) Respeito à centralidade temática da pergunta; encadeamento de ideias;

Utiliza-ção correta da língua pátria e; desenvolvimento analítico.

◉ COMENTÁRIO:

A resposta do candidato deve ser abrangente tanto quanto possível, porque uma

resposta excessivamente simplória não chamará a atenção do examinador e haverá

perda de pontos por falta de abordagem de aspectos contidos no espelho. A

ques-tão que acabou de ser resolvida mostra que o examinador desejava que o candidato

explorasse diversos tópicos laterais (alguns até com pouca relação com o tema) até

chegar ao núcleo da resposta.

◉ DOUTRINA TEMÁTICA:

“Na temática dos direitos humanos, a Constituição de 1988 é um marco na história constitucional brasileira. Em primeiro lugar, introduziu o mais extenso e abrangente rol de direitos das mais diversas espécies, incluindo direitos civis, políticos, econômicos, so-ciais e culturais, além de prever várias garantias constitucionais, algumas inéditas, como o mandado de injunção e o habeas data. Além disso, essa enumeração de direitos e ga-rantias não é exaustiva, uma vez que o seu art. 5º, § 2º, prevê o princípio da não exaus-tividade dos direitos fundamentais, introduzido pela primeira vez na Constituição de 1891, também denominado abertura da Constituição aos direitos humanos, dispondo que os direitos nela previstos não excluem outros decorrentes do (i) regime, (ii) princí-pios da Constituição e em (iii) tratados celebrados pelo Brasil.

De forma inédita na história constitucional brasileira, a abertura da Constituição aos di-reitos foi baseada também nos tratados internacionais celebrados pelo Brasil”. (RAMOS, 2014, p. 365)

“À luz dessa concepção, infere-se que o valor da dignidade da pessoa humana e o valor dos direitos e garantias fundamentais vêm a constituir os princípios constitucionais que incorporam as exigências de justiça e dos valores éticos, conferindo suporte axiológico a todo sistema jurídico brasileiro.

Com efeito, a busca do Texto em resguardar o valor da dignidade humana é redimen-sionada, na medida em que, enfaticamente, privilegia a temática dos direitos funda-mentais. Constata-se, assim, uma nova topografia constitucional: o Texto de 1988, em seus primeiros capítulos, apresenta avançada Carta de direitos e garantias, elevando-os, inclusive, a cláusula pétrea, o que, mais uma vez, revela a vontade constitucional de priorizar os direitos e as garantias fundamentais.

Note-se que as Constituições anteriores primeiramente tratavam do Estado, para, so-mente então, disciplinarem direitos. Ademais, eram petrificados temas afetos ao Estado e não a direitos, destacando-se, por exemplo, a Constituição de 1967, ao consagrar como cláusulas pétreas a Federação e a República. A nova topografia constitucional inaugurada pela Carta de 1988 reflete a mudança paradigmática da lente ex parte prin-cipe para a lente ex parte populi. Isto é, de um Direito inspirado pela ótica do Estado ra-dicado nos deveres dos súditos, transita-se a um Direito inspirado pela ótica da cidada-nia, radicado nos direitos dos cidadãos. A Constituição de 1988 assume como ponto de partida a gramática dos direitos, que condiciona o constitucionalismo por ela invocado. Assim, é sob a perspectiva dos direitos que se afirma o Estado e não sob a perspectiva

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do Estado que se afirmam os direitos. Há, assim, um Direito brasileiro pré e pós-88 no campo dos direitos humanos. O Texto Constitucional propicia a reinvenção do marco jurídico dos direitos humanos, fomentando extraordinários avanços nos âmbitos da nor-matividade interna e internacional”. (PIOVESAN, 2013, p. 95-96)

“À luz dessa concepção, infere-se que o valor da dignidade da pessoa humana e o valor dos direitos e garantias fundamentais vêm a constituir os princípios constitucionais que incorporam as exigências de justiça e dos valores éticos, conferindo suporte axiológico a todo sistema jurídico brasileiro.

Com efeito, a busca do Texto em resguardar o valor da dignidade humana é redimen-sionada, na medida em que, enfaticamente, privilegia a temática dos direitos funda-mentais. Constata-se, assim, uma nova topografia constitucional: o Texto de 1988, em seus primeiros capítulos, apresenta avançada Carta de direitos e garantias, elevando-os, inclusive, a cláusula pétrea, o que, mais uma vez, revela a vontade constitucional de priorizar os direitos e as garantias fundamentais.

Note-se que as Constituições anteriores primeiramente tratavam do Estado, para, so-mente então, disciplinarem direitos. Ademais, eram petrificados temas afetos ao Estado e não a direitos, destacando-se, por exemplo, a Constituição de 1967, ao consagrar como cláusulas pétreas a Federação e a República. A nova topografia constitucional inaugurada pela Carta de 1988 reflete a mudança paradigmática da lente ex parte prin-cipe para a lente ex parte populi. Isto é, de um Direito inspirado pela ótica do Estado ra-dicado nos deveres dos súditos, transita-se a um Direito inspirado pela ótica da cidada-nia, radicado nos direitos dos cidadãos. A Constituição de 1988 assume como ponto de partida a gramática dos direitos, que condiciona o constitucionalismo por ela invocado. Assim, é sob a perspectiva dos direitos que se afirma o Estado e não sob a perspectiva do Estado que se afirmam os direitos. Há, assim, um Direito brasileiro pré e pós-88 no campo dos direitos humanos. O Texto Constitucional propicia a reinvenção do marco jurídico dos direitos humanos, fomentando extraordinários avanços nos âmbitos da nor-matividade interna e internacional”. (PIOVESAN, 2013, p. 95-96)

“Perceba-se que o § 3º do art. 5º não obriga o Poder Legislativo a aprovar eventual tratado de direitos humanos pelo quórum qualificado que estabelece. O que o parágra-fo faz é tão somente autorizar o Congresso Nacional a dar, quando lhe convier, a seu alvedrio e a seu talante, a ‘equivalência de emenda’ aos tratados de direitos humanos ratificados pelo Brasil.

(...)

Assim, o iter procedimental de celebração dos tratados de direitos humanos, nos ter-mos da nova sistemática introduzida pelo § 3º do art. 5º da Constituição, poderia, em princípio, dar-se de duas formas, eleitas à livre escolha do Poder Legislativo, quais se-jam:

1ª) Depois de assinados pelo Executivo, os tratados de direitos humanos seriam apro-vados pelo Congresso nos termos do art. 49, inc. I, da Constituição (maioria simples) e, uma vez ratificados, promulgados e publicados no Diário Oficial da União, poderiam, mais tarde, quando o nosso Parlamento Federal decidisse por bem atribuir-lhes a equi-valência de emenda constitucional, serem novamente apreciados pelo Congresso, para serem (dessa vez) aprovados pelo quórum qualificado do § 3º do art. 5º, ou;

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2ª) Depois de assinados pelo Executivo, tais tratados já seriam imediatamente aprova-dos (seguindo-se o rito das propostas de emenda constitucional) por três quintos aprova-dos votos dos membros de cada uma das Casas do Congresso em dois turnos, suprimin-do-se, em face do critério da especialidade, a fase do art. 49, inc. I, da Constituição, autorizando-se a futura ratificação do acordo já com a aprovação necessária para que o tratado, uma vez ratificado pelo Presidente da República e já se encontrando em vi-gor internacional, ingresse no nosso ordenamento jurídico interno equivalendo a uma emenda constitucional, dispensando-se, portanto, segunda manifestação congressual após o tratado já se encontrar concluído e produzindo seus efeitos.

Perceba-se que esta segunda hipótese é perigosa e pode ser mal interpretada lendo--se friamente o § 3º do art. 5º, que, à primeira vista, leva o intérprete a entender que a partir da aprovação congressual, pelo quórum que ali se estabelece, os tratados de direitos humanos já passam a equivaler às emendas constitucionais, o que não é verda-de, uma vez que, para que um tratado entre em vigor no plano interno é imprescindível a sua futura ratificação pelo Presidente da República e, também, que já produz efeitos na órbita internacional, não se concebendo que um tratado de direitos humanos passe a ter efeitos de emenda constitucional – e, consequentemente, passe a ter o poder de reformar a Constituição – antes de ratificado e, muito menos, antes de ter entrado em vigor internacionalmente”. (MAZZUOLI, 2014, p. 910-911)

“A incorporação obedece a modelos idealizados pela doutrina e adotados pelos orde-namentos nacionais.

Pelo modelo tradicional de internalização dos atos internacionais, a ‘introdução do tra-tado na ordem interna está subordinada ao cumprimento pela autoridade estatal de um ato jurídico especial’.

O modelo mais novo de incorporação é o da ‘introdução automática’, ou da ‘aplicabi-lidade imediata’, pelo qual o tratado tem força vinculante internamente tão logo entre em vigor no universo das relações internacionais, sem necessidade de outras medidas que não as necessárias para a ratificação e a publicação do ato. É o modelo adotado na União Europeia, no tocante aos tratados de Direito Comunitário.

O Brasil adota o modelo tradicional, pelo qual a incorporação depende de um proces-so que envolve a aprovação do tratado no Congresproces-so Nacional, por meio de decre-to legislativo, a ratificação do adecre-to internacional pela Presidência e a entrada em vigor do tratado no âmbito internacional e culmina na promulgação, ato de competência do Presidente da República, formalizado por meio de decreto que ordena a execução do tratado no âmbito nacional e determina sua publicação no Diário Oficial da União, con-ferindo ao ato internacional força obrigatória dentro do território nacional”. (PORTELA, 2014, p. 131)

“A infraconstitucionalidade dos tratados de direitos humanos e a visão de que tais ins-trumentos teriam hierarquia de lei ordinária, como todos os demais tratados, mantinha--se como entendimento praticamente pacífico até 2007.

(...)

A reavaliação do “status” dos tratados de direitos humanos na ordem jurídica pátria ocorreu dentro do processo, conduzido pelo Pretório Excelso, de reexame da legalida-de da prisão civil do legalida-depositário infiel, proibida pela Convenção Americana legalida-de Direitos

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Humanos, de 1969 (art. 7º, par 7º), e aparentemente permitida pela Constituição Fede-ral (CF, art. 5º, LXVII) e pelo Código Civil de 2002 (art. 652).

No passado, a jurisprudência do STF admitia a prisão. Entretanto, essa forma de restri-ção da liberdade humana passou a ser inadmissível na esteira dos novos entendimentos sobre o “status” dos tratados de direitos humanos no ordenamento jurídico brasileiro, que passaram a ser vistos como normas supralegais.

As normas supralegais são aquelas que continuam hierarquicamente inferiores à Cons-tituição Federal, mas que estão acima das demais espécies normativas nacionais. No campo específico dos direitos humanos, a supralegalidade parte da premissa de que os tratados de direitos humanos trazem normas que estão diretamente vinculadas à pro-teção da dignidade humana e que, por isso, têm importância superior no ordenamento jurídico, não podendo ser derrogadas por outras leis ordinárias simplesmente por se-rem estas mais novas ou especiais”. (PORTELA, 2014, p. 992-994)

“Abstraída a constituição do Estado, sobrevive o problema da concorrência entre trata-dos e leis internas de estatura infraconstitucional. A solução, em países diversos, con-siste em garantir a prevalência aos tratados. Noutros, entre os quais o Brasil contem-porâneo, eles têm apenas um tratamento paritário, tomadas como paradigma as leis nacionais e diplomas de grau equivalente.

a) Prevalência dos tratados sobre o direito interno infraconstitucional. Não se coloca em dúvida, em parte alguma, a prevalência dos tratados sobre leis internas anteriores à sua promulgação. Para primar, em tal contexto, não seria preciso que o tratado recolhesse da ordem constitucional um benefício hierárquico. Sua simples introdução no complexo normativo estatal faria operar, em favor dele, a regra lex posterior derrogat priori. Mas a prevalência de que fala este tópico é a que tem indisfarçado valor hierárquico, ga-rantido ao compromisso internacional plena vigência, apesar de leis posteriores que o contradigam. A França, a Grécia e a Argentina oferecem, neste momento, exemplos de semelhante sistema.

(...)

b) Paridade entre o tratado e a lei nacional. Tal é o sistema consagrado nos Estados Unidos da América, sem contramarchas na jurisprudência nem objeção doutrinária de maior vulto. Parte da ‘lei suprema da nação’, o tratado ombreia com as leis federais vo-tadas pelo Congresso e sancionadas pelo presidente – embora seja ele próprio o fruto da vontade presidencial somada à do Senado, e não à das duas casas do parlamento americano. A supremacia significa que o tratado prevalece sobre a legislação dos esta-dos federaesta-dos, tal como a lei federal ordinária. Não, porém, que seja superior a esta. De tal modo, em caso de conflito entre tratado internacional e lei do Congresso, prevalece nos Estados Unidos o texto mais recente. É certo, pois, que uma lei federal pode fazer ‘repelir’ a eficácia jurídica de tratado anterior, no plano interno. Se assim não fosse – observa Bernard Schwartz –, estar-se-ia dando ao tratado não força de lei, mas de res-trição constitucional.

(...)

Há, contudo, exceções à regra da paridade? Há domínios temáticos em que, desprezada a ideia de valorizar simplesmente a última palavra do legislador ordinário, seja possí-vel reconhecer o primado da norma internacional ainda que anterior à norma interna

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conflitante? Duas situações merecem a propósito um comentário apartado, as que se encontram, no domínio tributário, à luz do art. 98 do CTN, e, no domínio dos direitos e garantias fundamentais, à luz do art. 5º, §§ 2º e 3º, da Constituição de 1988”. (REZEK, p. 127-129).

◉ JURISPRUDÊNCIA TEMÁTICA:

PRISÃO CIVIL. Depósito. Depositário infiel. Alienação fiduciária. Decretação da medida coercitiva. Inadmissibilidade absoluta. Insubsistência da previsão constitucional e das normas subalternas. Interpretação do art. 5º, inc. LXVII e §§ 1º, 2º e 3º, da CF, à luz do art. 7º, § 7, da Convenção Americana de Direitos Humanos (Pacto de San José da Costa Rica). Recurso improvido. Julgamento conjunto do RE nº 349.703 e dos HCs nº 87.585 e nº 92.566. É ilícita a prisão civil de depositário infiel, qualquer que seja a modalidade do depósito. (STF - RE: 466343-SP, Relator: Min. CEZAR PELUSO, Data de Julgamento: 03/12/2008, Tribunal Pleno, Data de Publicação: DJe-104 DIVULG 04-06-2009 PUBLIC 05-06-2009)

MERCOSUL - CARTA ROGATÓRIA PASSIVA - DENEGAÇÃO DE EXEQUATUR - PROTOCO-LO DE MEDIDAS CAUTELARES (OURO PRET0/MG) - INAPLICABILIDADE, POR RAZÕES DE ORDEM CIRCUNSTANCIAL - ATO INTERNACIONAL CUJO CICLO DE INCORPORAÇÃO, AO DIREITO INTERNO DO BRASIL, AINDA NÃO SE ACHAVA CONCLUÍDO À DATA DA DECISÃO DENEGATÓRIA DO EXEQUATUR, PROFERIDA PELO PRESIDENTE DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL - RELAÇÕES ENTRE O DIREITO INTERNACIONAL, O DIREITO CO-MUNITÁRIO E O DIREITO NACIONAL DO BRASIL - PRINCÍPIOS DO EFEITO DIRETO E DA APLICABILIDADE IMEDIATA - AUSÊNCIA DE SUA PREVISÃO NO SISTEMA CONSTI-TUCIONAL BRASILEIRO - INEXISTÊNCIA DE CLÁUSULA GERAL DE RECEPÇÃO PLENA E AUTOMÁTICA DE ATOS INTERNACIONAIS, MESMO DAQUELES FUNDADOS EM DOS DE INTEGRAÇÃO - RECURSO DE AGRAVO IMPROVIDO. A RECEPÇÃO DOS TRATA-DOS OU CONVENÇÕES INTERNACIONAIS EM GERAL E TRATA-DOS ACORTRATA-DOS CELEBRATRATA-DOS NO ÂMBITO DO MERCOSUL ESTÁ SUJEITA À DISCIPLINA FIXADA NA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. - A recepção de acordos celebrados pelo Brasil no âmbito do MERCOSUL está sujeita à mesma disciplina constitucional que rege o processo de incorporação, à ordem positiva interna brasileira, dos tratados ou convenções internacionais em geral. É, pois, na Constituição da República, e não em instrumentos normativos de caráter internacional, que reside a definição do iter procedimental pertinente à transposição, para o plano do direito positivo interno do Brasil, dos tratados, convenções ou acordos - inclusive daqueles celebrados no contexto regional do MERCOSUL - concluídos pelo Estado brasileiro. Precedente: ADI 1.480-DF, Rel. Min. CELSO DE MELLO. - Embora dese-jável a adoção de mecanismos constitucionais diferenciados, cuja instituição privilegie o processo de recepção dos atos, acordos, protocolos ou tratados celebrados pelo Brasil no âmbito do MERCOSUL, esse é um tema que depende, essencialmente, quanto à sua solução, de reforma do texto da Constituição brasileira, reclamando, em conseqüên-cia, modificações de jure constituendo. Enquanto não sobrevier essa necessária reforma constitucional, a questão da vigência doméstica dos acordos celebrados sob a égide do MERCOSUL continuará sujeita ao mesmo tratamento normativo que a Constituição bra-sileira dispensa aos tratados internacionais em geral. PROCEDIMENTO CONSTITUCIO-NAL DE INCORPORAÇÃO DE CONVENÇÕES INTERNACIONAIS EM GERAL E DE TRATA-DOS DE INTEGRAÇÃO (MERCOSUL). - A recepção dos tratados internacionais em geral e dos acordos celebrados pelo Brasil no âmbito do MERCOSUL depende, para efeito de sua ulterior execução no plano interno, de uma sucessão causal e ordenada de atos revestidos de caráter político-jurídico, assim definidos: (a) aprovação, pelo Congresso

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Nacional, mediante decreto legislativo, de tais convenções; (b) ratificação desses atos internacionais, pelo Chefe de Estado, mediante depósito do respectivo instrumento; (c) promulgação de tais acordos ou tratados, pelo Presidente da República, mediante de-creto, em ordem a viabilizar a produção dos seguintes efeitos básicos, essenciais à sua vigência doméstica: (1) publicação oficial do texto do tratado e (2) executoriedade do ato de direito internacional público, que passa, então - e somente então - a vincular e a obrigar no plano do direito positivo interno. Precedentes. O SISTEMA CONSTITUCIONAL BRASILEIRO NÃO CONSAGRA O PRINCÍPIO DO EFEITO DIRETO E NEM O POSTULADO DA APLICABILIDADE IMEDIATA DOS TRATADOS OU CONVENÇÕES INTERNACIONAIS. - A Constituição brasileira não consagrou, em tema de convenções internacionais ou de tratados de integração, nem o princípio do efeito direto, nem o postulado da aplicabi-lidade imediata. Isso significa, de jure constituto, que, enquanto não se concluir o ciclo de sua transposição, para o direito interno, os tratados internacionais e os acordos de integração, além de não poderem ser invocados, desde logo, pelos particulares, no que se refere aos direitos e obrigações neles fundados (princípio do efeito direto), também não poderão ser aplicados, imediatamente, no âmbito doméstico do Estado brasileiro (postulado da aplicabilidade imediata). - O princípio do efeito direto (aptidão de a nor-ma internacional repercutir, desde logo, em nor-matéria de direitos e obrigações, na esfera jurídica dos particulares) e o postulado da aplicabilidade imediata (que diz respeito à vigência automática da norma internacional na ordem jurídica interna) traduzem dire-trizes que não se acham consagradas e nem positivadas no texto da Constituição da República, motivo pelo qual tais princípios não podem ser invocados para legitimar a incidência, no plano do ordenamento doméstico brasileiro, de qualquer convenção in-ternacional, ainda que se cuide de tratado de integração, enquanto não se concluírem os diversos ciclos que compõem o seu processo de incorporação ao sistema de direi-to interno do Brasil. Magistério da doutrina. - Sob a égide do modelo constitucional brasileiro, mesmo cuidando-se de tratados de integração, ainda subsistem os clássicos mecanismos institucionais de recepção das convenções internacionais em geral, não bastando, para afastá-los, a existência da norma inscrita no art. 4º, parágrafo único, da Constituição da República, que possui conteúdo meramente programático e cujo senti-do não torna dispensável a atuação senti-dos instrumentos constitucionais de transposição, para a ordem jurídica doméstica, dos acordos, protocolos e convenções celebrados pelo Brasil no âmbito do MERCOSUL. (STF - CR-AgR: 8279 AT, Relator: CELSO DE MELLO, Data de Julgamento: 17/06/1998, TRIBUNAL PLENO, Data de Publicação: DJ 10-08-2000)

Referências

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