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PROBLEMAS DE INSERÇÃO AMBIENTAL DE BACIAS DE DETENÇÃO EM MEIO URBANO

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PROBLEMAS DE INSERÇÃO AMBIENTAL DE BACIAS DE

DETENÇÃO EM MEIO URBANO

Nilo de Oliveira Nascimento(1)

Engenheiro Civil pela Escola de Engenharia da UFMG, Doutor em Ciências e Técnicas de Meio Ambiente pela Ecole Nationale des Ponts et Chaussées (França). Professor Adjunto da Escola de Engenharia da UFMG.

Márcio Benedito Baptista

Engenheiro Civil pela Escola de Engenharia da UFMG. Doutor em Ciências e Técnicas de Meio Ambiente pela Ecole Nationale des Ponts et Chaussées (França). Professor Adjunto da Escola de Engenharia da UFMG.

Eduardo von Sperling

Engenheiro Civil e Sanitarista pela Escola de Engenharia da UFMG,

Doutor em Ecologia Aquática pela Universidade de Berlim (Alemanha). Professor Titular da Escola de Engenharia da UFMG.

Endereço(1): EEUFMG/EHR - Av. do Contorno, 842 - 8o andar Belo Horizonte MG -CEP: 30110-060 - Brasil - Tel: (031) 238-1872 - e-mail: niloon@ehr.ufmg.br

RESUMO

O trabalho discute os problemas de inserção ambiental de bacias de detenção urbana, enfocando inicialmente alguns aspectos conceituais dos sistemas de drenagem urbana. Em seguida, é apresentado um estudo de caso, permitindo a real constatação dos problemas levantados.

PALAVRAS-CHAVE: Drenagem Urbana, Hidrologia, Bacias de Detenção, Planejamento Urbano.

INTRODUÇÃO

O Higienismo, uma escola de urbanismo datada do Século XIX, caracterizou-se pelo enfoque na procura por assegurar condições ambientais sadias ao ser humano, tendo por fundamentação conhecimentos, procedimentos e métodos de referência científica.

No Brasil, ainda na atualidade, o Higienismo manifesta grande influência na organização do espaço urbano por meio de concepções correntes de tratamento da presença da água nas cidades (esgotos pluvial e doméstico, cursos d’água, lagos naturais e artificiais, …), freqüentemente chamadas de soluções clássicas de drenagem.

De acordo com as soluções clássicas, o principal objetivo dos sistemas urbanos de drenagem é o de remover, tão rápido quanto tecnicamente possível, os esgotos pluvial e doméstico do meio urbano, de forma a reduzir os riscos de inundação, de transmissão de doenças de veiculação hídrica, de proliferação de mosquitos e incômodos como maus odores e perturbações à circulação de pedestres e veículos.

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A boa técnica para atingir tal objetivo emprega, tradicionalmente, redes subterrâneas de tubulações implantadas sob espaço público (sistema viário), capazes de conduzir os esgotos de forma invisível e, sempre que possível, por meio de escoamento gravitacional. Os cursos d’água naturais são utilizados como vias preferenciais de drenagem, para onde convergem as redes de drenagem pluvial, quando o sistema é separador absoluto. Nesse caso, interceptores destinados à drenagem do esgoto doméstico usualmente margeiam os cursos d’água. Para aumentar a capacidade de drenagem dos cursos d’água, esses são mais cedo ou mais tarde retificados e canalizados, adotando-se maiores dimensões de leito e revestimentos variados. A esse tipo de tratamento de fundo de vale são freqüentemente associados sistemas viários, a combinação dos dois sistemas (drenagem e viário) sendo conhecida por avenidas sanitárias.

Essas características de concepção apresentam aparentemente inúmeras vantagens. Elas contribuem para estruturar o sistema viário, não impõem limites ao uso do solo urbano, não requerem a operação do sistema de drenagem, adotam métodos de dimensionamento fáceis e padronizados e exigem um mínimo de atividades de manutenção.

Inicialmente, preponderava o sistema unitário de drenagem, com uma única rede conduzindo os esgotos doméstico e pluvial. Na atualidade, o sistema separador absoluto, que adota duas redes independentes para cada drenagem e, em princípio, elimina a conexão entre elas, é o sistema mais adotado. No presente artigo, discute-se, sobretudo, o sistema de drenagem pluvial, sem esquecer que mesmo nos países com excelentes meios de controle técnico de equipamentos públicos as duas redes jamais atingem um nível absoluto de separação. A interconexão entre os sistemas é danosa para ambos. Ela é uma das principais fontes de poluição dos meios receptores nas cidades brasileiras, como será exemplificado no estudo de caso apresentado nesse trabalho. Com essas soluções, o Higienismo certamente contribuiu para uma considerável melhoria da qualidade de vida no meio urbano. Entretanto, face à urbanização intensa observada no correr do Século XX, em particular em países em desenvolvimento, como é o caso do Brasil, as soluções de inspiração higienista têm se mostrado insuficientes e inadequadas. São recorrentes, nas grandes cidades brasileiras, os problemas de aumento de freqüência de inundações, de ocorrência de inundações catastróficas, de intensificação de processos erosivos, de poluição de meios receptores, de assoreamento e eutrofização de corpos d’água.

Certamente uma das principais razões para esse estado de coisas é a ausência, no contexto das soluções clássicas, de uma abordagem integrada dos problemas de drenagem pluvial segundo pelo menos duas referências principais:

• a escala espacial da bacia hidrográfica e da rede natural de drenagem, fortemente alteradas pela urbanização e os impactos dessas alterações físicas sobre os processos hidrológicos segundo diferentes níveis de risco, onde eventos freqüentes (tempo de retorno inferior a 1 ano) refletem-se sobretudo na poluição dos meios receptores e eventos mais raros (tempo de retorno superior a 10 anos) são principalmente impactantes sobre a gênese das inundações;

• o aspecto político e institucional em que se definem e em que se aplicam (ou não) os planos de ocupação do solo, do sistema viário e as opções de valorização (ou não) do meio ambiente natural, inclusive os corpos d’água existentes.

No primeiro caso, as soluções clássicas não consideram os impactos de novas urbanizações sobre antigas áreas urbanizadas, a jusante, nem integram a perspectiva de futuros desenvolvimentos urbanos a montante da área em implantação. Os novos sistemas de drenagem são dimensionados

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sido a obsolescência das redes de drenagem, o aumento da freqüência e da intensidade das inundações e a poluição dos corpos d’água, com repercussões econômicas, sociais, políticas e ambientais. O remodelamento do sistema, adotando-se, por exemplo, o aumento de dimensões e mudanças de materiais de revestimento de estruturas de drenagem, raramente revela-se uma solução durável, traduzindo-se em custos elevados, proibitivos para as finanças públicas municipais. Conforme enfatizado por Baptista e Nascimento (1996), estas soluções não apresentam características de sustentabilidade.

No segundo caso, as municipalidades geralmente não possuem base legal, infra-estrutura gerencial, meios técnicos e recursos financeiros adequados para tratar os problemas atuais de drenagem, de um nível de complexidade incomparavelmente superior àqueles com os quais a tradição higienista confrontou-se.

Do ponto de vista legal, nota-se a carência de instrumentos que imponham a adequada consideração e minoração dos impactos da urbanização sobre os processos hidrológicos e a qualidade de água, tomando a bacia hidrográfica como referência e não apenas as áreas de desenvolvimento de novos projetos.

Do ponto de vista gerencial, observam-se a ausência, com raras exceções, de organismos municipais autônomos responsáveis pelos problemas de drenagem pluvial, as carências de fiscalização e imposição de regulamentos afeitos à drenagem e as deficiências de manutenção e preservação do patrimônio existente.

Do ponto de vista puramente técnico, faltam dados hidrológicos e de qualidade de água, cadastro atualizado do sistema existente, modelos matemáticos, métodos e critérios de dimensionamento mais adequados à descrição dos fenômenos físicos envolvidos e à intervenção sobre os mesmos. Finalmente, a carência de recursos financeiros alocados de forma permanente para as atividades correntes de drenagem pluvial impedem o desenvolvimento de políticas e de planejamento coerentes e continuados.

CONCEPÇÕES ALTERNATIVAS AO MODELO HIGIENISTA

A partir dos anos 70 tem-se observado em países da Europa e da América do Norte a construção de novos modelos e concepções para tratar os problemas de drenagem pluvial e da valorização da água em meio urbano que se mostram antagonistas ao modelo de inspiração higienista. Os princípios que orientam essas concepções alternativas podem ser resumidos como a seguir:

• a escala espacial de avaliação dos impactos decorrentes de novos projetos de urbanização sobre os processos hidrológicos e sobre a qualidade das águas de origem pluvial é a bacia hidrográfica;

• novos empreendimentos não podem agravar ou comprometer as condições de funcionamento dos sistemas de drenagem pré-existentes e devem ter em conta um planejamento global de uso do solo urbano, incluindo projetos urbanísticos futuros;

• os objetivos dos sistemas de drenagem, que orientam sua concepção, devem ser múltiplos, complementares e integrarem o tratamento adequado de eventos de diferentes probabilidades de ocorrência (ver quadro 1);

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• a preservação do meio natural e, em particular, a valorização dos corpos d’água em meio urbano deve ser procurada e, sempre que possível, compatibilizada com os objetivos funcionais da drenagem das águas pluviais.

De um ponto de vista institucional e legal, a mudança de modelo tem exigido o desenvolvimento ou a adaptação de instrumentos legais e de planejamento urbano, como os planos diretores e a lei de uso e ocupação dos solos para que reflitam, de forma explícita, a integração das questões de drenagem pluvial nos projetos urbanísticos segundo os princípios acima relacionados.

De um ponto de vista técnico, a necessidade de atendimento aos princípios listados levou ao desenvolvimento de inúmeras soluções alternativas de drenagem. Elas têm sido concebidas tendo em vista um tratamento dos excedentes de água gerados pela impermeabilização em diferentes escalas espaciais e, sempre que possível, próximo à fonte geradora. Elas incluem, entre outras, as seguintes técnicas:

• armazenamento em coberturas, reservatórios domiciliares, planos e poços de infiltração, na escala da parcela (lote ou quarteirão);

• pavimento poroso, trincheiras de infiltração, valos de armazenamento, para o sistema viário e grandes áreas tradicionalmente impermeabilizadas, como áreas industriais, grandes áreas comerciais, áreas de estacionamento;

• bacias de detenção secas ou com espelho d’água, à superfície ou enterradas, na escala da bacia hidrográfica.

Quadro 1: Objetivos múltiplos dos sistemas de drenagem pluvial versus tempo de retorno de eventos pluviais (adaptado de CERTU, 1998).

Objetivos Ações Tempo de retorno

Drenagem pluvial

Adoção de soluções alternativas de drenagem que favoreçam a infiltração ou o armazenamento dos excedentes de água gerados pela impermeabilização de superfícies o mais próximo possível das fontes geradoras

Coleta e drenagem das águas pluviais através de redes de drenagem

Entre 1 e 50 anos

Prevenção e proteção contra riscos de inundação

Soluções não estruturais, como a gestão em tempo real dos escoamentos que debordam do sistema de drenagem pluvial e o anúncio de cheias

Análise, definição e equipamento de áreas inundáveis e de eixos prioritários de escoamento de excedentes do sistema de drenagem: parques, terrenos de esporte, ruas secundárias, … Soluções estruturais, quando adequadas, incluindo mento em bacias de detenção de maior capacidade de armazena-mento

Superiores a 50 anos, devendo incluir eventos de até 100 anos de tempo de retorno ou superiores, em função das características locais de urbanismo

Proteção dos meios receptores contra a poluição de origem pluvial

Controle de fontes de poluição crônicas e acidentais Redução de interconexões entre os sistemas de drenagem de esgotos doméstico e pluvial

Adoção de soluções alternativas de drenagem que favoreçam a infiltração ou o armazenamento dos excedentes de água, desde que não representem risco à saúde pública

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O projeto e o dimensionamento dessas soluções exigem uma modelagem distribuída dos processos hidrológicos na bacia hidrográfica, a simulação de vários eventos de precipitação para diferentes tempos de retorno e a simulação de vários cenários de combinação de alternativas, que diferem consideravelmente das práticas correntes de dimensionamento de soluções clássicas.

Da mesma forma, a gestão do risco de inundação tem requerido uma mudança tecnológica considerável:

• conhecimento do estado do sistema por meio do monitoramento continuado de variáveis hidrológicas com transmissão continuada de dados e emprego;

• previsão do estado do sistema em tempo real, por meio de observações de radar e simulação de modelos de previsão;

• operação do sistema de drenagem de forma a otimizar o funcionamento das estruturas de armazenamento e condução segundo dois objetivos, o controle de inundações e a redução do impacto da poluição de origem pluvial sobre os meios receptores.

Os parágrafos acima sintetizam apenas alguns dos pontos principais relacionados com as alternativas de tratamento das questões de drenagem pluvial em desenvolvimento, na atualidade. Entretanto, eles são suficientes para demonstrar a radicalidade das mudanças conceituais em relação às soluções de inspiração higienista (quadro 2).

Quadro 2: Contraponto entre conceitos higienistas e conceitos alternativos de drenagem.

Higienismo Soluções alternativas

Drenagem rápida das águas pluviais Favorecimento à infiltração, ao

armazenamento e ao aumento do tempo de percurso do escoamento

Redes subterrâneas, canalização de cursos d’água naturais Valorização da presença da água na cidade, busca de menor interferência sobre o sistema natural de drenagem

Associação do sistema de drenagem ao sistema viário Desenvolvimento de soluções técnicas multifuncionais, combinando o sistema de drenagem com a implantação de áreas verdes, terrenos de esporte, parques lineares, etc. Sistema de drenagem gravitacional, não controlado,

configuração fixa da rede de drenagem

Sistema de drenagem controlado,

possibilidade de alteração na configuração da rede de drenagem

Concepção e dimensionamento segundo um nível único de risco de inundação pré-estabelecido, para atender a um único objetivo

Concepção e dimensionamento segundo diferentes níveis de risco de inundação, para atender a objetivos diferenciados

Não previsão e inoperância face a eventos de tempos de retorno superiores aos de projeto

Avaliação do funcionamento do sistema para eventos de tempos de retorno superiores aos de projeto, gestão do risco de inundação Ênfase na garantia de condições de saúde pública e de

conforto no meio urbano;

Despreocupação com os impactos da urbanização sobre os meios receptores

Preocupação com a garantia de condições adequadas de saúde pública e conforto no meio urbano e de redução dos impactos da urbanização sobre os meios receptores

Nas cidades brasileiras, conforme já mencionado, predomina o emprego das soluções clássicas de drenagem pluvial de inspiração higienista. Entretanto, algumas experiências de uso de bacias de detenção são mesmo anteriores ao desenvolvimento dos conceitos alternativos de drenagem na Europa e América do Norte. A análise dessas experiências

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brasileiras é fundamental para a compreensão do funcionamento desse tipo de técnica em um contexto climático e sócio-cultural diferente das regiões mencionadas.

No presente artigo, é analisado o caso do reservatório da Pampulha, em Belo Horizonte, (Baptista et al, 1998) construído nos anos 50 como parte de um projeto urbanístico em que deveria atender a objetivos de abastecimento doméstico de água, controle de inundações e espaço de lazer. A municipalidade implantou, ainda na mesma época, duas outras bacias de detenção com fins de controle de cheias, os reservatórios de Santa Lúcia e do Acaba Mundo. Entretanto, apenas o Pampulha foi, de fato, concebido como um reservatório de usos múltiplos, integrado ao projeto urbanístico. O Santa Lúcia e o Acaba Mundo são reservatórios de cabeceiras, implantados em área rural e que, a força do desenvolvimento urbano, acabaram por tornar-se bacias de detenção em áreas urbanas densas.

ESTUDO DE CASO

A barragem da Pampulha, situada na região norte de Belo Horizonte, foi construída no final dos anos 50, com objetivos múltiplos, a saber, sanitário (abastecimento de água), laminação das cheias e paisagístico. De fato, o espelho d’água criado insere-se no mais importante conjunto paisagístico da cidade, constituindo-se em verdadeiro marco arquitetônico e urbanístico do Brasil. Por ocasião de sua inauguração apresentava um volume de reservação de 18 milhões de metros cúbicos e um espelho de água de 261 ha. A bacia hidrográfica correspondente à lagoa da Pampulha apresenta uma área de drenagem de cerca de 95 km2, tendo sido observado, nos últimos anos, um intenso e desordenado processo de urbanização. Os solos presentes na bacia da Pampulha são provenientes da decomposição de rochas granito-gnáissicas, apresentando uma baixa resistência ao intemperismo. O clima reinante na área é o tropical de altitude, com média anual de cerca de 1.500 mm, com forte concentração.

O assoreamento do reservatório e o impacto no amortecimento de cheias

O resultado da combinação dos diversos fatores citados materializa-se na ocorrência de diversos focos de erosão concentrada na bacia, observando-se o significativo crescimento das taxas de aporte de sedimentos ao reservatório e seu conseqüente assoreamento.

A taxa de erosão natural na bacia, calculada em 75.000 m3/ano, foi avaliada em cerca de 380.000 m3/ano em 1989. O volume de reservação já foi reduzido de 18 para 10 milhões de metros cúbicos, apesar das intensas operações de dragagens efetuadas, movimentando 4,2 milhões de metros cúbicos. Persistindo a evolução deste quadro, projeta-se um volume remanescente da ordem de 6 milhões de metros cúbicos no ano 2007 e o assoreamento completo do reservatório para o ano de 2020.

Visando a avaliação do risco hidrológico associado ao sistemas de macrodrenagem urbana situado a jusante da barragem, Baptista e Pinheiro (1997) estudaram a propagação no reservatório de diversos hidrogramas afluentes à Pampulha. A análise efetuada, centrada

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que sua capacidade de amortecimento já foi significativamente reduzida. Com efeito, a capacidade de amortecimento original reduzia o pico de 64 %, ou seja, de 308 m3/s para cerca de 112 m3/s. Atualmente os valores de amortecimento são próximos de 49 %, chegando-se a vazões de pico efluentes de 151 m3/s. Este valor representa, portanto, uma vazão adicional no sistema de macrodrenagem de 39 m3/s. Para as cheias com períodos de retorno maiores estes acréscimos nas vazões seriam ainda mais acentuados.

No que diz respeito às canalizações de jusante observa-se que, se elas comportariam as vazões efluentes centenárias nas condições iniciais do reservatório, no atual quadro de assoreamento apenas um pequeno trecho comporta a cheia centenária, e em 2007, todo o sistema de macrodrenagem a jusante estaria comprometido, em caso de não atuação no reservatório no sentido de reversão do quadro. A hipótese de assoreamento completo do reservatório conduziria a situações catastróficas a jusante da barragem, sobretudo por tratar-se de áreas predominantemente urbanizadas, apresentando ainda diversos equipamentos urbanos importantes, como o aeroportos e vias arteriais de tráfego.

A eutrofização e os impactos sanitários e ambientais

Além dos problemas de assoreamento, a lagoa da Pampulha encontra-se atualmente significativamente degradada, recebendo ainda o impacto do lançamento de esgotos sanitários e sofrendo os efeitos agudos da eutrofização.

A eutrofização consiste na fertilização excessiva do recursos hídrico, sendo devida, fundamentalmente, ao recebimento de águas residuárias domésticas e industriais. Com efeito, parte dos esgotos da bacia é lançada em canalizações interceptoras ou em fossas e sumidouros, sendo que, no entanto, a maior parcela é despejada em cursos d’água afluentes ao reservatório. Como conseqüência observa-se o intenso crescimento de plantas aquáticas (principalmente algas e macrófitas, com destaque para os aguapés – Eichornia crassipes). O desenvolvimento destas comunidades aquáticas é favorecido pela incidência de forte radiação solar ao longo de quase todo o ano, em particular em áreas tropicais (von Sperling, 1996). A posterior morte destes organismos conduz à sedimentação da massa orgânica e à subsequente decomposição da matéria carbonácea, provocando o esgotamento do estoque de oxigênio dissolvido armazenado no fundo do corpo d’água. Como conseqüência ocorre a prevalência de condições de anaerobiose nas camadas profundas e a subseqüente geração de maus odores.

Ainda do ponto de vista sanitário foram estabelecidas no reservatório condições extremamente favoráveis ao desenvolvimento de insetos (como por exemplo mosquitos e pernilongos, transmissores principalmente da dengue) e à proliferação de outros vetores de enfermidades de veiculação hídrica.

Finalmente, a conjugação dos aspectos de assoreamento e a proliferação dos aguapés vieram comprometer, de forma significativa, as funções urbanísticas e cênicas do complexo paisagístico da Lagoa da Pampulha.

Constata-se assim que a eutrofização é responsável por prejuízos à qualidade da água, enquanto que o assoreamento conduz a influências negativas no tocante à quantidade de água. Ambos os problemas prejudicam de forma flagrante a utilização do ambiente aquático da Lagoa da Pampulha.

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DISCUSSÃO E CONCLUSÕES

Como foi visto ao longo deste trabalho, a utilização da técnica de bacias de detenção pode desempenhar um papel importante no contexto do ambiente urbano.

Com efeito, como estruturas de amortecimento de cheias, elas contribuem, efetivamente, para minorar os efeitos da urbanização sobre os processos hidrológicos, contribuindo para reduzir as dimensões e os custos de implantação de canalizações de macrodrenagem pluvial. Ainda, a técnica pode evitar a intervenção em sistemas de macrodrenagem existentes, quando estes, em decorrência da urbanização, tornam-se insuficientes.

Como estruturas de detenção elas facilitam a redução de poluentes por decantação de matéria sólida e, no caso de se dispor de um espelho d’água permanente, também pela ação dos organismos que aí se desenvolvem.

Como equipamento urbano, as bacias de detenção, podem valorizar as condições cênicas do espaço, criando ainda diversas oportunidades de lazer, ativo e passivo.

Ainda, de acordo com análise procedida por Nascimento e Baptista (1998), evidencia-se a necessidade de um enfoque ampliado no emprego das bacias de detenção, decorrente de duas vertentes:

• os problemas de poluição, assoreamento por lixo e sedimentos, e aqueles decorrentes de seu uso indevido, pela população, demonstram a inviabilidade técnica e operacional de reservatórios concebidos apenas com a finalidade de amortecimento;

• observa-se uma maior demanda pela melhoria na qualidade ambiental em meio urbano. Esta demanda manifesta-se ainda de maneira tímida, no Brasil, no tocante à qualidade dos corpos d’água em meio urbano, mas pode-se prever que tenderá a se intensificar.

De acordo com esta diversidade de questões e enfoques que se apresentam, decorre um acréscimo significativo da complexidade para a concepção, o dimensionamento e a gestão de bacias de detenção, tornando claro que estas tarefas exigem a formação de equipes multidisciplinares, capazes de uma visão integrada, abrangendo os aspectos urbanísticos, hidrológicos e ambientais da questão, objetivando a adequada inserção ambiental desta solução técnica (Nascimento e Baptista, 1998).

Um quadro sintético dos critérios a serem levados em conta no projeto de uma bacia detenção urbana pode ser visto no Quadro 3. Muitos pontos citados neste quadro apresentam-se como de difícil equacionamento, haja visto a inexistência de estudos sistemáticos, a posteriori, das experiências sobre o uso desta técnica. Além disto, os aspectos hidrológicos e ambientais em áreas urbanas, sobretudo em ambiente tropical, são pouco conhecidos, em virtude do monitoramento insuficiente das variáveis envolvidas. Assim, torna-se cada vez mais importante o estabelecimento de programas que possam efetivamente suprir esta ausência de informações, pois a adoção de critérios inadequados de dimensionamento acarreta um elevado risco de insucesso no emprego das bacias de

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Quadro 3. Critérios para projeto de bacias detenção (adaptado de Nascimento et al, 1998).

Critério Elementos de análise

primária Vazão de pico, forma do hidrograma, características de

reservação e descarga Funcional

secundária Área e perímetro do reservatório, controle do

assoreamento, acessos proteção

ambiental

Qualidade da água, ecologia aquática, controle de insetos Ambiental

urbanismo Inserção paisagística, equipamentos de lazer,

convivência, acesso de veículos e pedestres, estacionamento

Construtivo praça de trabalho, acessos, disponibilidade de materiais e mão de obra Operacional Inspeção e manutenção do reservatório e das estruturas hidráulicas, remoção

de sedimentos e lixo, manutenção dos equipamentos urbanos

Legal regulamentação de uso como equipamento urbano, regulamentação

quantitativa e qualitativa das águas afluentes

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

1. BAPTISTA, M. B. e NASCIMENTO, N. O.- Sustainable development and urban stormwater management in the context of a tropical developing country, in Anais do XXV Congreso Interamericano de Ingenieria Sanitaria y Ambiental, volume IV, AIDIS, México, 1996, pp. 523-529. 2. BAPTISTA, M. B.; NASCIMENTO, N. O.; VON SPERLING, E. – Inserção ambiental de bacias de

detenção urbanas. in Anais do XXVI Congreso Interamericano de Ingenieria Sanitaria y Ambiental, anais eletrônicos, AIDIS, Lima, Perú, 1998.

3. BAPTISTA, M. B., PINHEIRO, M. C. – Amortecimento de cheias na Lagoa da Pampulha e seu impacto nas canalizações de jusante. Relatório Técnico, SMAU, 1997.

4. CERTU – Ruissellement urbain et POS – approche et prise en compte des risques, Dossier CERTU No 83, Ministère de l’Amenagement du Territoire et de l’Environnement, Paris, 1998.

5. NASCIMENTO, N. O e BAPTISTA, M. B. – Contribuição pra um enfoque ampliado do uso de bacias de detenção em áreas urbanas, in Drenagem Urbana – Gerenciamento, Simulação e Controle, Porto Alegre, ABRH, 1998, 203 p,

6. NASCIMENTO, N. O; ELLIS, J. B. ; BAPTISTA, M. B. ; DEUTSCH, J-C – Using detention bassins – Some experiences in, France, United Kingdom and Brazil. Trabalho apresentado e a ser publicado nos anais do International Workshop on Non-structural Flood Control Structures, São Paulo,1998.

7. VON SPERLING, E. - The process of biomass formation as the key point in the restoration of tropical eutrophic lakes. Hydrobiologia 1-4, Kluwer Academic Publishers, 1996, v. 7, pp. 1-4.

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