Principais passagens da conferência 27 – “A transferência” (Freud)
“Na medida em que a terapia analítica não tem como tarefa imediata a eliminação dos sintomas, ela age como uma terapia causal”.
Elemento novo e inesperado que aparece no tratamento (“transferência”):
“Inicialmente vou descrevê-lo em sua manifestação mais frequente e simples de compreender.
Notamos, então, que o paciente, que nada mais deve buscar senão uma saída para os conflitos que fazem sofrer, desenvolve particular interesse pela pessoa do médico. Tudo que se relaciona a essa pessoa lhe parece mais importante do que seus próprios assuntos, aparentemente desviando sua atenção da própria enfermidade. Assim sendo, o trato com o paciente se torna, por algum tempo, bastante agradável; ele se revela especialmente solícito, busca mostrar-se agradecido sempre que pode, exibe sutilezas e méritos de seu ser que, talvez, jamais teríamos encontrado nele. O médico forma, então, uma opinião bastante favorável de seu paciente e louva o acaso que lhe permitiu prestar assistência a personalidade tão valiosa. Se tem oportunidade de conversar com parentes dele, ouve com prazer que a simpatia é mútua. Em casa, o paciente não se cansa de elogiar o médico e de louvar sempre novas qualidades dele. ‘É apaixonado pelo senhor, em quem confia cegamente. Tudo que o senhor diz é como uma revelação para ele’, relatam os parentes. Vez por outra, um par de olhos mais perspicazes se destaca desse coro e diz: ‘Já está ficando chato como ele não fala em outra coisa que não seja o senhor e menciona apenas o seu nome’”.
Porque falar em “transferência”
“Referimo-nos a uma transferência de sentimentos para a pessoa do médico, pois não acreditamos que a situação terapêutica possa justificar o desenvolvimento de tais sentimentos. Supomos, isto sim, que toda essa disposição para o sentimento provém de outra parte, que ela já estava pronta no doente e, por ocasião do tratamento analítico, é transferida para a pessoa do médico”.
Transferência Positiva
“Em tais condições, a própria análise faz progressos estupendos; o paciente compreende o que lhe é indicado e se aprofunda nas tarefas que lhe são propostas pelo tratamento; é farto o material que lhe flui das lembranças e associações, e ele surpreende o médico com a segurança e a propriedade de suas próprias interpretações, [etc] [...]”.
Transferência Negativa
“Mas um tempo tão bom não pode durar para sempre. Um dia chegam as nuvens. Surgem dificuldades no tratamento, e o paciente afirma que não lhe ocorrem mais associações. Temos a nítida impressão de que o trabalho terapêutico não lhe interessa mais e de que, sem preocupação nenhuma, ele abandona a instrução que lhe foi dada de dizer tudo que lhe passa pela mente, sem ceder a nenhum obstáculo crítico. Ele se comporta como se não estivesse em tratamento, como se não tivesse feito um trato com o médico; claramente, ele foi tomado por algo que deseja guardar para si. Essa é uma situação perigosa para tratamento. Estamos, sem dúvida, diante de uma poderosa resistência”.
Nos pacientes masculinos:
“Em primeiro lugar, deixemos claro que a transferência surge no paciente desde o início do tratamento e que, por algum tempo, representa a mola propulsora do trabalho. Enquanto atua em favor da análise empreendida em conjunto, nós não a percebemos nem necessitamos nos preocupar com ela. Se, todavia, a transferência se transforma em resistência, somos obrigados a atentar para ela [...], quando consiste de impulsos hostis, em vez de afetuosos. Em regra, os sentimentos hostis aparecem depois dos afetuosos e por trás deles; em sua presença simultânea, espelham bem a ambivalência de sentimentos que rege a maioria de nossos relacionamentos íntimos com outras pessoas”.
Mecanismo de Cura:
“É coisa fora de questão ceder às demandas do paciente decorrentes da transferência; e seria um contrassenso rejeitá-las de maneira inamistosa ou, pior ainda, indignada. Nós superamos a transferência demonstrando ao doente que seus sentimentos não têm origem na situação presente nem se aplicam à pessoa do médico, mas repetem algo que já lhe ocorreu no passado. Desse modo, nós o obrigamos a transformar sua repetição em lembrança. A transferência, que, afetuosa ou hostil, parecia significar a mais forte ameaça ao tratamento, torna-se então seu melhor instrumento, aquele com o qual podem se abrir os mais cerrados compartimentos da vida psíquica”.