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UNIVERSIDADE RURAL DO SEMI-ÁRIDO PRÓ-REITORIA DE PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM MATEMÁTICA AURENILDO BEZERRA DOS SANTOS

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UNIVERSIDADE RURAL DO SEMI-ÁRIDO PRÓ-REITORIA DE PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM MATEMÁTICA

AURENILDO BEZERRA DOS SANTOS

NÚMEROS IRRACIONAIS: DA IRRACIONALIDADE DE NÚMEROS ALGÉBRICOS AOS PRIMEIROS TRANSCENDENTES

MOSSORÓ/RN 2018

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AURENILDO BEZERRA DOS SANTOS

NÚMEROS IRRACIONAIS: DA IRRACIONALIDADE DE NÚMEROS ALGÉBRICOS AOS PRIMEIROS TRANSCENDENTES

Dissertação apresentada à Universidade Federal do Semiárido, Campus Mossoró/RN para obtenção do título de Mestre em Matemática.

Orientador: Profº. Dr. Odacir Almeida Neves

MOSSORÓ/RN 2018

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ata. A mesma poderá servir de base literária para novas pesquisas, desde que a obra e seu (a) respectivo (a) autor (a) sejam devidamente citados e mencionados os seus créditos bibliográficos.

O serviço de Geração Automática de Ficha Catalográfica para Trabalhos de Conclusão de Curso (TCC´s) foi desenvolvido pelo Instituto de Ciências Matemáticas e de Computação da Universidade de São Paulo (USP) e gentilmente cedido para o Sistema de Bibliotecas da Universidade Federal Rural do Semi-Árido (SISBI-UFERSA), sendo customizado pela Superintendência de Tecnologia da Informação e Comunicação (SUTIC) sob orientação dos bibliotecários da instituição para ser adaptado às necessidades dos alunos dos Cursos de Graduação e Programas de Pós-Graduação da Universidade.

Sn Santos, Aurenildo Bezerra dos.

Números irracionais: Da Irracionalidade de Números Algébricos aos Primeiros Transcendentes / Aurenildo Bezerra dos Santos. - 2018.

47 f. : il.

Orientador: Odacir Almeida Neves.

Dissertação (Mestrado) - Universidade Federal Rural do Semi-árido, Programa de Pós-graduação em Ambiente, Tecnologia e Sociedade, 2018.

1. Ensino da Matemática. 2. História da Matemática. 3. Números Algébricos. 4. Números Transcendentes. 5. Números de Liouville. I.

Neves, Odacir Almeida , orient. II. Título.

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Dedico a Deus pelo dom da vida, à minha família, em especial, à minha mãe Evinha Bezerra de Assis Santos e ao meu pai Aurino Antônio dos Santos por todo apoio que me foi dado nessa caminhada vitoriosa.

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AGRADECIMENTOS

Ao senhor Deus pela dádiva da vida e por me abençoar em todos os momentos.

Obrigado meu Deus.

Quero agradecer, imensamente, ao meu orientador neste trabalho, Professor Odacir Almeida Neves, pela confiança, compreensão e por toda a ajuda prestada ao longo de sua realização. Quero agradecer também aos demais professores integrantes da banca: Antônio Ronaldo Gomes Garcia e Ronaldo César Duarte pelas sugestões valiosas que enriqueceram o trabalho e contribuíram bastante para realização deste trabalho.

À minha amada mãe, Evinha Bezerra de Assis Santos, pelo amor, dedicação e por sempre acreditar em mim, devo a ela tudo o que me tornei.

Aos professores que passaram e foram essenciais nessa caminhada rumo à minha formação.

Aos meus queridos colegas de mestrado do Campus da UFERSA-Mossoró, pelos ensinamentos e pelo espírito de companheirismo durante os dois anos de curso.

À minha noiva, Jaqueline Medeiros, por todo apoio na realização deste trabalho e compreensão nos meus momentos de ausência.

Agradeço aos meus alunos do Curso de Matemática do Campus Avançado de Patu, pelas palavras de incentivo e apoio durante o mestrado.

Agradeço ao PROFMAT e a CAPES por proporcionar que vários professores que, assim como eu, possam realizar o sonho de serem mestres.

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“A matemática, vista corretamente, possui não apenas verdade, mas também suprema beleza- uma beleza fria e austera, com a da escultura.”

(Bertrand Russell)

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RESUMO

No ensino fundamental e médio os números irracionais são tratados de forma muito superficial, enquanto os números naturais, inteiros e racionais abrangem praticamente todo ensino de matemática. Já na graduação, os números irracionais são estudados sob o ponto de vista da análise e da álgebra. Diferentemente do que ocorre com o estudo dos racionais, existem muitos problemas sobre propriedades de vários tipos de números irracionais, dos quais muitos ainda intrigam estudiosos da atualidade. A história da matemática relata o impacto causado pela descoberta dos pitagóricos de que o conjunto dos números racionais não é suficiente para representar medidas de qualquer comprimento. Diante da importância do conceito de irracionalidade e que seu conhecimento mais aprofundado é imprescindível para o ensino da matemática e a compreensão de seus diversos ramos, o presente trabalho procurou ampliar o foco do leitor relativo à sua visão sobre números, com destaque para os algébricos (irracionais) e os primeiros transcendentes que, segundo a história da matemática, são chamados de números de Liouville, esclarecendo então, um pouco a complexidade do comportamento desses números, mostrando tanto seu lado desafiador, como sua fertilidade matemática. Neste trabalho, abordamos, de formas distintas, as irracionalidades de √2 e de 𝑒 (Constante de Euler), com objetivo de despertar no leitor o fascínio pela matemática, mostrando diferentes “ferramentas” que podemos usar para se obter um mesmo resultado em matemática. Finalizamos o trabalho introduzindo conceito de números algébricos e transcendentes.

Palavras-chave: Ensino da Matemática. História da Matemática. Números Algébricos.

Números Transcendentes. Números de Liouville.

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ABSTRACT

In primary and secondary education, irrational numbers are treated very superficially, while natural, whole, and rational numbers cover practically all mathematics education. Already in graduation, irrational numbers are studied from the point of view of analysis and algebra.

Unlike the study of rationals, there are many problems about properties of various kinds of irrational numbers, of which many still intrigue scholars today. The history of mathematics relates the impact caused by the discovery of the Pythagoreans that the set of rational numbers is not sufficient to represent measures of any length. In view of the importance of the concept of irrationality and its deeper knowledge is essential for the teaching of mathematics and the understanding of its various branches, the present work sought to broaden the reader's focus on his view on numbers, with emphasis on algebraic irrational) and the first transcendents which, according to the history of mathematics, are called Liouville numbers, thus clarifying somewhat the complexity of the behavior of these numbers, showing both its challenging side and its mathematical fertility. In this work, we approach, in different ways, the irrationalities of √2 and e (Euler's Constant), in order to awaken in the reader the fascination with mathematics, showing different "tools" that we can use to obtain the same result in mathematics . We finish the work introducing concept of algebraic and transcendent numbers.

Keywords: Mathematics Teaching. History of Mathematics. Algebraic Numbers.

Transcendent Numbers. Numbers of Liouville.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ... 10

1 RESULTADOS PRELIMINARES ... 13

Teorema 1.2.1 ... 14

Teorema 1.2.2 (Fundamentação do Algoritmo de Euclides) ... 15

Teorema 1.2.3 (Teorema de Bézout) ... 16

Corolário 1.2.1 ... 16

Teorema 1.2.4 ... 16

Lema 1.2.1 ... 16

Teorema 1.2.5 (Teorema Fundamental da Aritmética-TFA) ... 16

Teorema 1.2.6 (Euclides) ... 17

2 A IRRACIONALIDADE DE √2 ... 18

2.1 DEMOOSTRAÇÃO POR PARIDADE E FRAÇÕES IRREDUTÍVEIS ... 18

2.2 DEMONSTRAÇÃO VIA TEOREMA FUNDAMENTAL DA ARITMÉTICA (TFA) . 18 2.3 DEMONSTRAÇÃO VIA PRINCÍPIO DA BOA ORDENAÇÃO (PBO) ... 19

2.4 NÃO EXISTE UMA SUBSEQUÊNCIA INFINITA DECRESCENTE DE NÚMEROS NATURAIS ... 20

2.5 USANDO TRIÂNGULOS ... 22

2.6 USANDO QUADRADOS ... 23

2.7 IRRACIONALIDADE DE √𝑝 ... 25

2.8 IRRACIONALIDADE DE 𝑚√𝑝1𝑛1∙ 𝑝2𝑛2 ∙ … ∙ 𝑝𝑟𝑛𝑟 ... 25

3 A IRRACIONALIDADE DA CONSTANTE DE EULER ... 27

3.1 TEOREMAS E PROPOSIÇÕES ... 28

Teorema 3.1 ... 28

Proposição 3.1 ... 29

3.2 PROVA CLÁSSICA ... 29

3.3 PROVA POR SÉRIE ALTERNADA ... 31

3.4 PROVA GEOMÉTRICA ... 33

Lema 3.4.1 ... 33

4 NÚMEROS ALGÉBRICOS E TRANSCENDENTES ... 36

4.1 INTEIROS ALGÉBRICOS ... 36

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Teorema 4.1.1 ... 36

4.2 NÚMEROS TRANSCENDENTES ... 37

4.2.1 Definições e Exemplos ... 37

Exemplo 4.2.1...37

Exemplo 4.2.2 ...37

Exemplo 4.2.3...37

Proposição 4.2.1 ... 37

Teorema 4.2.1 ... 38

Teorema 4.2.2 ... 38

Proposição. 4.2.1 ... 38

Proposição. 4.2.2 ... 39

4.3 NÚMEROS DE LIOUVILLE ... 39

Teorema 4.3.1 ... 39

Proposição 4.3.1 ... 41

Corolário 4.3.1 ... 41

Teorema 4.3.2 ... 41

Exemplo 4.3.1 ... 42

4.4 UM POUCO MAIS SOBRE TRANSCENDÊNCIA ... 43

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 46

REFERÊNCIAS ... 47

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INTRODUÇÃO

Os conceitos de irracionalidade e de transcendência1 estão ligados a um dos mais belos e desafiadores ramos da teoria dos números. Problemas relacionados a esses conceitos intrigam matemáticos até hoje.

Historicamente, a definição de número irracional surgiu nos estudos sobre incomensurabilidade entre dois segmentos de reta. Segundo LIMA (2006, p.60), “os gregos acreditavam que sejam quais fossem os comprimentos dos segmentos 𝐴𝐵 e 𝐶𝐷 haveria sempre um segmento 𝐸𝐹 que caberia um número exato 𝑛 de vezes em 𝐴𝐵 e um número exato 𝑚 de vezes em 𝐶𝐷”. As circunstâncias e a época para a primeira percepção de medidas incomensuráveis ainda causam incertezas. Credita-se ao pitagórico2 Hipasus de Metapontum, por volta de 410 a.c., a descoberta de que o lado e a diagonal de um quadrado são segmentos de reta incomensuráveis. De acordo com BOYER (1996) os pitagóricos o expulsaram da confraria3. Uma história diz que os pitagóricos lhe erigiriam um túmulo, como se estivesse morto, outra que sua apostasia foi punida pela morte num naufrágio, sendo esta a punição por ter declarado tal descoberta.

Uma argumentação possível para demonstrar a incomensurabilidade entre o lado e a diagonal de um quadrado pode ter sido a seguinte: sejam 𝑙 e 𝑑 as medidas do lado e da diagonal do quadrado, respectivamente. Suponhamos que exista um número 𝑘 ≠ 0 (que segundo os pitagóricos era inteiro ou razão entre dois inteiros) tal que 𝑑 = 𝑚 ∙ 𝑘 e 𝑙 = 𝑛. 𝑘 com 𝑚 e 𝑛 inteiros não nulos e primos entre si, ou seja, o máximo divisor comum entre 𝑚 e 𝑛 é igual a 1.

Conforme o teorema de Pitágoras segue que 𝑑2 = 𝑙2+ 𝑙2 ⇒ 𝑑2 = 2𝑙2. Assim, temos que 𝑚2∙ 𝑘2 = 2𝑛2𝑘2 ⇒ 𝑚2 = 2𝑛2, isto é, 𝑚2 é um número par e como consequência 𝑚 é par. Dessa forma, existe 𝑢 ∈ ℤ tal que 𝑚 = 2𝑢, daí obtemos a igualdade (2𝑢)2 = 2𝑛2 ⇒ 4𝑢2 = 2𝑛2 ⇒ 2𝑢2 = 𝑛2, o que implica 𝑛 um número par, provocando uma contradição, pois 𝑚 e 𝑛 são primos entre si, por hipótese. Portanto, 𝑙 e 𝑑 são medidas incomensuráveis.

O conceito de número transcendente é bem mais “sofisticado” do que o de irracional, ou seja, provar a transcendência de um número é mais difícil do que a sua irracionalidade e

1 Transcendência: Segundo Euler a razão pela qual um número é chamado de transcendente esse transcende o poder das operações algébricas.

2 Pitagóricos: Seita filosófico-religiosa, liderada por Pitágoras por volta de 410 a.c. em que um dos pontos fundamentais de sua doutrina era o lema “ os números governam o mundo”.

3 Confraria: um grupo de pessoas que se associa em torno de interesses ou objetivos comuns, seja o mesmo ofício, a mesma profissão, modo de vida ou religiosos ou espirituais.

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isso se deve ao fato de que podemos definir um número irracional como o que não satisfaz uma equação polinomial, de grau 1, com coeficientes inteiros; já os transcendentes não são raízes de polinômios não nulos, de qualquer grau, com coeficientes inteiros. Estas caraterísticas complexas e desafiadoras estimulam a curiosidade e o fascínio de matemáticos até os dias atuais na tentativa de compreender a natureza algébrica desses números.

Segundo MARQUES (2013), desde meados do século XVIII, o estudo dos números transcendentes forma uma área central da teoria dos números: a teoria dos números transcendentes. Em 1874, o matemático Georg Cantor provou que “quase” todos os números são transcendentes, porém, paradoxalmente, provar a transcendência de um número é uma tarefa em geral complicada, apesar de existirem em abundância.

Diante disso, a motivação para a escolha do tema partiu de um desejo particular de despertar no leitor o interesse pelos números irracionais e transcendentes. Através de definições, teoremas e fatos que estão ligados à aritmética desses números, priorizando, sem perda de rigor matemático, uma abordagem elementar dos resultados que serão apresentados no decorrer deste trabalho.

A escolha de discorrer um trabalho que tratasse sobre irracionalidade e transcendência se deve à relevância do tema. Nesse sentido, temos como objetivo geral, ampliar o foco do leitor relativo à sua visão sobre números, com destaque para os algébricos (irracionais) e os primeiros transcendentes, que são conhecidos como números de Liouville, na perspectiva que este texto sirva de motivação para que se busque um aprofundamento em trabalhos mais abrangentes, os quais destacamos FIGUEREDO (2011) e MARQUES (2013). A partir daí, temos os seguintes objetivos específicos que listamos abaixo:

 apresentar vários caminhos para se obter a irracionalidade de um número;

 apresentar alguns resultados com intuito de introduzir pensamentos críticos na área dos números irracionais e transcendentes;

 compreender o conceito incomensurabilidade;

 compreender o conceito de números algébricos e transcendentes;

 compreender o teorema de Liouville;

 compreender a definição de números de Liouville;

 esclarecer a diferença entre irracionalidade algébrica e a transcendência de um número real.

Quanto à sua estruturação, o trabalho, além da introdução, apresenta no primeiro capítulo, alguns resultados preliminares de aritmética dos inteiros que servirão de base para

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provas posteriores. No segundo capítulo, apresentam-se algumas formas de se obter a irracionalidade de √2. Serão três demonstrações de caráter algébrico e outras três por argumentos geométricos, na perspectiva de enfatizar que podemos obter um resultado por meio de várias técnicas e explorar a beleza que a matemática nos proporciona, que é a de relacionar ideias que, aparentemente, não têm ligações entre si, mas que podem ser usadas para resolver um mesmo problema. Aborda-se ainda a irracionalidade de √𝑝, com 𝑝 um natural primo, que será generalizado com a demonstração da irracionalidade de números da forma 𝑚√𝑎 em que 𝑚√𝑎∉ ℕ com 𝑎 e 𝑚 naturais maiores do que 1, obtendo assim, a irracionalidade de números como √10, √15, √275 , 7√8,... No terceiro capítulo, explora-se a irracionalidade de 𝑒 (constante de Euler) com uma abordagem similar à que foi feita com √2.

No quarto capítulo, definem-se números algébricos e transcendentes, dentre os transcendentes, destacam-se os números de Liouville, que representam os primeiros exemplos desses números, explicitando algumas propriedades, como também, alguns resultados da rica história desses números na matemática.

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1 RESULTADOS PRELIMINARES

Este capítulo contém definições e demonstrações de resultados que servirão de apoio para os demais capítulos deste trabalho. Aqui nos referenciamos em bibliografias como LIMA (2012) e SANTOS (2012).

1.1 INDUÇÃO

O chamado Princípio da indução Finita consiste numa indispensável ferramenta na demonstração de muitos teoremas. Enunciamos, abaixo, duas formas deste princípio e, também, o Princípio da Boa Ordenação.

𝑷𝟎. Princípio da Boa Ordenação (PBO)

Todo conjunto não-vazio 𝐴 ⊂ ℕ contém um elemento mínimo.

𝑷𝟏. Primeira forma do Princípio de Indução Finita

Seja 𝐵 um subconjunto dos inteiros positivos. Se 𝐵 possui as duas seguintes propriedades

(i) 1 ∈ 𝐵

(ii) 𝑘 + 1 ∈ 𝐵 sempre que 𝑘 ∈ 𝐵 então 𝐵 contém todos os inteiros positivos.

𝑷𝟐. Segunda forma do Princípio de Indução Finita

Seja 𝐵 um subconjunto dos inteiros positivos. Se 𝐵 possui as duas seguintes propriedades

(i) 1 ∈ 𝐵

(ii) 𝑘 + 1 ∈ 𝐵 sempre que 1,2, … , 𝑘 ∈ 𝐵 então 𝐵 contém todos os inteiros positivos.

Na realidade os princípios 𝑃0, 𝑃1 e 𝑃2 são equivalentes. Provaremos que 𝑃0 ⇔ 𝑃1. Para o leitor interessado sugerimos SANTOS (2012, p. 187,188)

Demonstração:

(𝑷𝟎⇒ 𝑷𝟏) Desejamos provar que se 𝐵 é um subconjunto dos inteiros positivos, possuindo as propriedades (i) e (ii), então 𝐵, necessariamente, contém todos os inteiros positivos. A prova que apresentamos é por contradição. Vamos supor que, mesmo possuindo as propriedades (i) e (ii), 𝐵 não contenha todos os inteiros positivos. Seja 𝐴 o conjunto dos inteiros positivos não contidos em 𝐵. Pelo PBO, 𝐴 possui um menor elemento e este é maior

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do que 1 pois 1 ∈ 𝐵. Seja 𝑎0 este elemento. É claro que 𝑎0− 1 pertence a 𝐵 e como 𝐵 satisfaz (ii) então o sucessor de 𝑎0− 1, que é 𝑎0, também deve pertencer a 𝐵. Esta contradição nos leva a concluir que 𝐴 tem que ser vazio, o que conclui a demonstração.

(𝑷𝟏⇒ 𝑷𝟎) Se 1 ∈ 𝐴, então 1 será o menor elemento de 𝐴. Se, porém, 1 ∉ 𝐴, então 1 ∈ ℕ − 𝐴. Para cada elemento 𝑛 ∈ ℕ, seja 𝐼𝑛 = {1,2,3, … , 𝑛} e defina

𝐵 = {𝑛 ∈ ℕ; 𝐼𝑛 ⊂ ℕ − 𝐴}. Note que 1 ∈ 𝐵 e que se 𝑚 ∈ 𝐴 então 𝐼𝑚 ⊄ ℕ − 𝐴 e, consequentemente 𝑚 ∉ 𝐵. Como 𝐴 ≠ ∅, então 𝐵 ≠ ℕ. De 1 ∈ 𝐵, 𝐵 ≠ ℕ e 𝑃1, consegue-se 𝑛0 ∈ 𝐵 tal que 𝑛0 + 1 ∉ 𝐵. Temos

(I) 𝑛0 ∈ 𝐵 implica que {1,2, … , 𝑛0} ⊂ ℕ − 𝐴 e portanto, {1,2, … , 𝑛0} ∩ 𝐴 = ∅.

(II) 𝑛0+ 1 ∉ 𝐵 implica que existe um elemento 𝑞 ∈ 𝐼𝑛0+1 que não pertence a ℕ − 𝐴, ou seja, 𝑞 ∈ 𝐴. Por (I), 𝑞 = 𝑛0+ 1.

Em resumo, provamos que qualquer inteiro positivo menor que 𝑛0+ 1 não pertence ao conjunto 𝐴 e que 𝑛0 + 1 ∈ 𝐴. Portanto 𝑛0+ 1 é o menor elemento de 𝐴.

1.2 NOÇÕES DE ARITMÉTICA DOS INTEIROS

O resultado a seguir é conhecido como algoritmo da divisão.

Teorema 1.2.1 Se 𝑎, 𝑏 ∈ ℤ, com 𝑏 ≠ 0, então existem (e são únicos) 𝑞, 𝑟 ∈ ℤ, com 0 ≤ 𝑟 < |𝑏|, tais que

𝑎 = 𝑞𝑏 + 𝑟 Prova. (i) Consideremos primeiramente o caso 𝑏 > 0. Então teremos o conjunto dos múltiplos de 𝑏 ordenados, de acordo com sua ordem natural sobre a reta:

… < −3𝑏 < −2𝑏 < −𝑏 < 0 < 𝑏 < 2𝑏 < 3𝑏 < ⋯ O que dá uma decomposição da reta em intervalos disjuntos da forma

[𝑞𝑏, (𝑞 + 1)𝑏) = {𝑥 ∈ ℝ: 𝑞𝑏 ≤ 𝑥 < (𝑞 + 1)𝑏}, onde 𝑞 ∈ ℤ. Assim dado 𝑎 ∈ ℤ, ele pertence a apenas um desses intervalos e portanto, deverá ser da forma 𝑎 = 𝑞𝑏 + 𝑟, onde 𝑟 ∈ ℤ e 𝑟 ≥ 0. É claro que 𝑟 < (𝑞 + 1)𝑏 − 𝑞𝑏 = 𝑏.

(ii) agora se 𝑏 < 0, então aplicamos o teorema no caso demonstrado em (i) para determinar 𝑞, 𝑟 ∈ ℤ, com 0 ≤ 𝑟 < |𝑏| para escrever

𝑎 = 𝑞|𝑏| + 𝑟 Fazendo 𝑞 = −𝑞′ e como |𝑏| = −𝑏, pois 𝑏 < 0, obtemos

𝑎 = 𝑞𝑏 + 𝑟, onde 𝑞, 𝑟 ∈ ℤ e 0 ≤ 𝑟 < |𝑏|.

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(iii) Resta demostrar que 𝑞 𝑟, com 0 ≤ 𝑟 < |𝑏| são únicos. De fato, suponha que 𝑎 = 𝑞𝑏 + 𝑟 e 𝑎 = 𝑞1𝑏 + 𝑟1,

onde 𝑟1 também satisfaz 0 ≤ 𝑟1 < |𝑏|. Por subtração das expressões obtemos (𝑞 − 𝑞1)𝑏 + (𝑟 − 𝑟1) = 0, ou seja

𝑟 − 𝑟1 = (𝑞1 − 𝑞)𝑏.

Agora afirmamos que 𝑟 = 𝑟1, e essa igualdade implicará que 𝑞 = 𝑞1, o que nos dará a unicidade pedida. Ora, se 𝑟 = 𝑟1 não ocorresse, teríamos que

0 < |𝑟1− 𝑟| < |𝑏|

Assim,

|𝑟 − 𝑟1| = |𝑞1− 𝑞||𝑏|

logo,

0 < |𝑞1− 𝑞| < 1.

O que não pode ocorrer, pois |𝑞1− 𝑞| é um inteiro, o que não é possível, pois |𝑞1− 𝑞| é um número inteiro. Portanto a demonstração do Teorema 1.2.1 está completa.

Definição: Dados dois inteiros 𝑎 e 𝑏 chamamos de máximo divisor comum (abreviadamente 𝑚𝑑𝑐) de 𝑎 e 𝑏 ao maior inteiro 𝑚 = 𝑚𝑑𝑐(𝑎, 𝑏) que é simultaneamente divisor de 𝑎 e de 𝑏, isto é:

i) 𝑚|𝑎 𝑒 𝑚|𝑏

ii) 𝑠𝑒 𝑟 ∈ ℕ, 𝑟|𝑎 𝑒 𝑟|𝑏, 𝑒𝑛𝑡ã𝑜 𝑟 ≤ 𝑚

Observação. Se um deles, digamos 𝑏, fosse 0, então o 𝑚𝑑𝑐(𝑎, 0) = |𝑎|, onde |𝑎| é o valor absoluto de 𝑎. Tem-se que o 𝑚𝑑𝑐(𝑎, 𝑏)está definido para 𝑎 ou 𝑏 diferente de zero.

Definição: Dados 𝑎, 𝑏 ∈ ℤ, dizemos que eles são primos entre si se o máximo divisor comum de 𝑎 e 𝑏 é 1.

Teorema 1.2.2 (Fundamentação do Algoritmo de Euclides) Seja 𝑐 o resto da divisão do inteiro 𝑎 pelo inteiro (positivo) 𝑏. Então 𝑚𝑑𝑐(𝑎, 𝑏) = 𝑚𝑑𝑐(𝑏, 𝑐).

Demonstração: Pela divisão euclidiana, existe um inteiro 𝑞 tal que 𝑎 = 𝑞𝑏 + 𝑐. Sejam 𝑚 = 𝑚𝑑𝑐(𝑎, 𝑏) e 𝑛 = 𝑚𝑑𝑐(𝑏, 𝑐). Como 𝑚 é divisor tanto de 𝑎 como de 𝑏, existem inteiros 𝑎1 e 𝑏1 tais que 𝑎 = 𝑚𝑎1 e 𝑏 = 𝑚𝑏1. Assim 𝑐 = 𝑎 − 𝑞𝑏 = 𝑚𝑎1− 𝑞𝑚𝑏1 = 𝑚(𝑎1− 𝑞𝑏1), logo 𝑚 é divisor comum entre 𝑏 e 𝑐, o que implica que 𝑚 ≤ 𝑛. Analogamente, como 𝑛 é divisor tanto de 𝑏 como de 𝑐, também é divisor de 𝑎 = 𝑞𝑏 + 𝑐, logo é divisor comum entre 𝑎 e 𝑏 e, portanto 𝑛 ≤ 𝑚. Isso prova que 𝑚 = 𝑛, como queríamos.

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Observação: Algoritmo de Euclides - Podemos calcular o 𝑚𝑑𝑐 entre dois inteiros aplicando recursivamente o teorema anterior, obtendo o chamado método das divisões sucessivas ou Algoritmo de Euclides.

Teorema 1.2.3 (Teorema de Bézout) Dados os inteiros 𝑎 e 𝑏, existem inteiros 𝑥 e 𝑦 tais que 𝑚𝑑𝑐(𝑎, 𝑏) = 𝑎𝑥 + 𝑏𝑦.

Demonstração: Sejam 𝑚 o menor elemento positivo do conjunto I de todos os inteiros da forma 𝑎𝑥 + 𝑏𝑦, com 𝑥 e 𝑦 inteiros. Dividindo 𝑎 por 𝑚 encontramos 𝑎 = 𝑞𝑚 + 𝑟, com 𝑞 e 𝑟 inteiros e 0 ≤ 𝑟 < 𝑚. Por ser um elemento de I, 𝑚 é a soma de um múltiplo de 𝑎 com um múltiplo de 𝑏, logo 𝑟 = 𝑎 − 𝑞𝑚 também será uma soma deste tipo e, portanto, elemento de I.

Como 𝑟 < 𝑚 e 𝑚 é o menor elemento positivo de I, concluímos que 𝑟 = 0, isto é 𝑚 é divisor de 𝑎. Analogamente, provamos que 𝑚 é divisor de 𝑏. Agora, se 𝑑 é um divisor comum qualquer de 𝑎 e 𝑏, 𝑑 é divisor de qualquer elemento de I, logo 𝑑 é divisor de 𝑚, o que implica que 𝑑 ≤ 𝑚. Assim, 𝑚 é o máximo divisor comum de 𝑎 e 𝑏.

Corolário 1.2.1 Todo divisor comum de dois inteiros 𝑎 e 𝑏 é divisor do 𝑚𝑑𝑐(𝑎, 𝑏).

Demonstração: Seja 𝑐 um inteiro tal que 𝑐|𝑎 e 𝑐|𝑏. Considere 𝑑 = 𝑚𝑑𝑐(𝑎, 𝑏), pelo Teorema de Bézout segue que existem 𝑥, 𝑦 ∈ ℤ tais que 𝑑 = 𝑎𝑥 + 𝑏𝑦. Como 𝑐|𝑎 ⇒ 𝑐|𝑎𝑥 e 𝑐|𝑏 ⇒ 𝑐|𝑏𝑦, daí temos que 𝑐|(𝑎𝑥 + 𝑏𝑦) ⇒ 𝑐|𝑑.

Teorema 1.2.4 Se o produto 𝑏𝑐 é múltiplo de 𝑎 e 𝑚𝑑𝑐(𝑎, 𝑏) = 1, então 𝑐 é múltiplo de 𝑎.

Demonstração. Pelo Teorema de Bézout, existem inteiros 𝑥 e 𝑦 tais que 1 = 𝑎𝑥 + 𝑏𝑦.

Multiplicando por 𝑐 obtemos 𝑐 = 𝑐𝑎𝑥 + 𝑏𝑐𝑦. Como 𝑐𝑎𝑥 e 𝑏𝑐𝑦 são múltiplos de 𝑎, 𝑐 é múltiplo de 𝑎.

Definição. Um número inteiro 𝑛 > 1) possuindo somente dois divisores positivos 𝑛 e 1 é chamado primo. Se 𝑛 > 1 não é primo dizemos que 𝑛 é composto.

Lema 1.2.1 Se 𝑝|𝑎𝑏, 𝑝 primo, então 𝑝|𝑎 𝑜𝑢 𝑝|𝑏.

Demonstração: Se 𝑝 ∤ 𝑎, então 𝑚𝑑𝑐(𝑎, 𝑝) = 1 o que implica, pelo Teorema 2.1.4, 𝑝|𝑏.

Teorema 1.2.5 (Teorema Fundamental da Aritmética-TFA) Todo inteiro maior do que 1 pode ser representado de maneira única (a menos da ordem) como um produto de fatores primos.

Demonstração: Se 𝑛 é primo não há nada a ser demonstrado. Suponhamos, então, 𝑛 composto. Seja 𝑝1 > 1 o menor dos divisores positivos de 𝑛. Afirmamos que 𝑝1 é primo. Isto é verdade, pois, caso contrário existiria 𝑝, 1 < 𝑝 < 𝑝1 com 𝑝|𝑛, contradizendo a escolha de 𝑝1. Logo, 𝑛 = 𝑝1𝑛1.

(19)

Se 𝑛1 for primo a prova está completa. Caso contrário, tomamos 𝑝2 como o menor divisor positivo de 𝑛1. Pelo argumento anterior, 𝑝2 é primo e temos que 𝑛 = 𝑝1𝑝2𝑛2. Repetindo este procedimento, obtemos uma sequencia decrescente de inteiros positivos 𝑛1, 𝑛2, … , 𝑛𝑟. Como todos eles são inteiros maiores do que 1, este processo deve terminar. Como os primos na sequencia 𝑝1, 𝑝2, … , 𝑝𝑘 não são, necessariamente, distintos, 𝑛 terá, em geral, a forma:

𝑛 = 𝑝1𝑎1𝑝2𝑎2… 𝑝𝑘𝑎𝑘.

Para mostrarmos a unicidade usamos indução em 𝑛. Para 𝑛 = 2 e afirmação é verdadeira.

Assumimos então, que ela se verifica para todos os inteiros maiores do que 1 e menores do que 𝑛. Vamos provar que ela também é verdadeira para 𝑛. Se 𝑛 é primo, não há nada a provar.

Vamos supor, então, que 𝑛 seja composto e que tenha duas fatorações, isto é, 𝑛 = 𝑝1𝑝2… 𝑝𝑠 = 𝑞1𝑞2… 𝑞𝑟.

Vamos provar que 𝑠 = 𝑟 e que cada 𝑝𝑖 é igual a algum 𝑞𝑗. Como 𝑝1 divide o produto 𝑞1𝑞2… 𝑞𝑟 ele divide pelo menos um dos fatores 𝑞𝑗. Sem perda de generalidade podemos supor que 𝑝1|𝑞1. Como são ambos primos, isto implica 𝑝1 = 𝑞1. Logo 𝑛 𝑝⁄ 1 = 𝑝2… 𝑝𝑠 = 𝑞2… 𝑞𝑟. Como 1 < 𝑛 𝑝⁄ 1 < 𝑛, a hipótese de indução os diz que as duas fatorações são idênticas, isto é, 𝑠 = 𝑟 e, a menos da ordem, as fatorações 𝑝1𝑝2… 𝑝𝑠 e 𝑞1𝑞2… 𝑞𝑠 são iguais.

Teorema 1.2.6 (Euclides). Existem infinitos primos.

Demonstração: Suponha por absurdo que 𝑝1, 𝑝2… 𝑝𝑚 fossem todos primos. O número 𝑁 = 𝑝1, 𝑝2… 𝑝𝑚+ 1 > 1 não seria divisível por nenhum primo 𝑝𝑖 tal que 𝑖 ∈ {1,2, … , 𝑚}, o que contradiz o Teorema Fundamental da Aritmética.

(20)

2 A IRRACIONALIDADE DE √𝟐

As ideias para a demonstração da irracionalidade de √2 consistem em supor que √2 é um número racional e chegar numa contradição. A razão de se obter que √2 ∉ ℚ por argumentos simples está ligada ao fato de que esse é um número algébrico, como veremos mais adiante neste trabalho, ou seja, por existir um 𝑥 ∈ ℝ tal que 𝑥 ∙ 𝑥 = 2, possibilita-nos mostrar sua irracionalidade usando fortemente essa relação.

2.1 DEMONSTRAÇÃO POR PARIDADE E FRAÇÕES IRREDUTÍVEIS

A demonstração a seguir usa as ideias de paridade e frações irredutíveis e é frequentemente utilizada em textos para a demonstração da irracionalidade de √2 devido a sua simplicidade.

Demonstração:

Suponha que

√2 =𝑝𝑞, com 𝑝, 𝑞 ∈ ℤ 𝑒 𝑞 ≠ 0, (i)

onde 𝑝 ∕ 𝑞 é uma fração irredutível (𝑚𝑑𝑐(𝑝, 𝑞) = 1). Logo, elevando os membros de (𝑖) ao quadrado, tem-se.

𝑝2

𝑞2= 2 ⇒ 𝑝2 = 2𝑞2 ⇒ 𝑝2 é um número par.

Temos que se 𝑝2 é par, então 𝑝 é par, de fato, se 𝑝 fosse ímpar, ou seja,

𝑝 = 2𝑚 + 1, para algum 𝑚 ∈ ℤ, teríamos 𝑝2 = (2𝑚 + 1)2= 4𝑚2+ 4𝑚 + 1 = 2(2𝑚2 + 2𝑚) + 1, o que acarreta 𝑝2 ímpar.

Segue-se que 𝑝 par, existe um 𝑛 ∈ ℤ tal que 𝑝 = 2𝑛, logo:

𝑝2 = 2𝑞2 ⇒ (2𝑛)2 = 2𝑞2 ⇒ 4𝑛2 = 2𝑞2

⇒ 2𝑛2 = 𝑞2 ⇒ 𝑞2 é 𝑝𝑎𝑟 ⇒ 𝑞 é 𝑝𝑎𝑟.

Mas, com 𝑝 𝑒 𝑞 números pares teríamos 𝑚𝑑𝑐(𝑝, 𝑞) ≠ 1, o que contradiz a hipótese de que a fração 𝑃

𝑞 é irredutível.

2.2 DEMONSTRAÇÃO VIA TEOREMA FUNDAMENTAL DA ARITMÉTICA (TFA) A próxima demonstração baseia-se no Teorema Fundamental da Aritmética (TFA).

(21)

Demonstração:

Suponhamos que √2 =𝑚𝑛, como √2 > 0 podemos supor 𝑚, 𝑛 ∈ ℕ. Elevando os membros da igualdade ao quadrado, segue que

2 = 𝑚2

𝑛2 ⇔ 𝑚2 = 2𝑛2,

mas essa igualdade é absurda, já que na fatoração de 𝑚2 em primos o fator 2 aparece um número par de vezes. Enquanto em 2𝑛2 o fator 2 aparece um número ímpar de vezes, o que contradiz a unicidade do TFA. Portanto √2 é irracional.

2.3 DEMONSTRAÇÃO VIA PRINCÍPIO DA BOA ORDENAÇÃO (PBO)

Para a demonstração a seguir, usaremos o Princípio da Boa Ordenação (PBO):

Demonstração:

Suponha que o conjunto 𝑆 = {𝑛 ∈ ℕ; 𝑛√2 ∈ ℤ} é não vazio (𝑆 ≠ ∅). Então, de acordo com o PBO, existe um 𝑏 ∈ 𝑆 tal que 𝑏 ≤ 𝑛, ∀𝑛 ∈ 𝑆. Desse modo, temos:

𝑏√2 = 𝑎 ∈ ℤ ⇔ √2 =𝑎 𝑏, como

1 < √2 < 2 ⇔ 1 <𝑎 𝑏< 2, segue que multiplicando as desigualdades por 𝑏 > 0, obtemos:

𝑏 < 𝑎 < 2𝑏,

subtraindo 𝑏 em cada membro, segue que 0 < 𝑎 − 𝑏 < 𝑏 ⟹ 𝑎 − 𝑏 < 𝑏. (∗) Provaremos agora que 𝑎 − 𝑏 ∈ 𝑆. De fato,

√2(√2 − 1) = 2 − √2 ⇔ √2 =2 − √2

√2 − 1. Por hipótese,

√2 =𝑎 𝑏, logo:

√2 =2 −𝑎 𝑎 𝑏

𝑏− 1 ⇔ √2 =

2𝑏 − 𝑎 𝑏 𝑎 − 𝑏

𝑏

√2 =2𝑏 − 𝑎

𝑎 − 𝑏 ⇔ (𝑎 − 𝑏)√2 = 2𝑏 − 𝑎 ∈ ℤ,

(22)

logo (𝑎 − 𝑏) ∈ 𝑆, o que é um absurdo, já que de (∗) temos que 𝑎 − 𝑏 < 𝑏 e 𝑏 é o elemento mínimo de 𝑆. Portanto, 𝑆 = ∅ e √2 é irracional.

As próximas demonstrações para irracionalidade de √2 se baseiam em argumentos geométricos.

2.4 NÃO EXISTE UMA SUBSEQUÊNCIA INFINITA DECRESCENTE DE NÚMEROS NATURAIS

A seguinte prova se baseia no fato de que não existe uma subsequência decrescente e infinita de números naturais.

Demonstração:

Considere um retângulo 𝑅1 com lados 𝐿1 = 1 + √2 e 𝑙1 = 1. Como 𝐿1 > 2, pode-se dividir 𝑅1 em dois quadrados de lado 1 e um retângulo 𝑅2 com lados 𝐿2 = 1 e 𝑙2 = √2 − 1 ( veja a Figura1) . Note que 𝐿1

𝑙1

=

𝐿2

𝑙2

= √2 + 1.

Recursivamente, constrói-se retângulos 𝑅𝑛, 𝑛 = 3,4,5,6, …, com lado maior 𝐿𝑛(= 𝑙𝑛−1) e de lado menor 𝑙𝑛(= 𝐿𝑛−1− 2𝑙𝑛−1).

Provaremos por indução que 𝐿𝑛

𝑙𝑛

= √2 + 1

para todo 𝑛 ∈ ℕ tal que 𝑛 ≥ 3. Suponha, por hipótese de indução, que 𝐿𝑛−1

𝑙𝑛−1

= √2 + 1,

então 𝐿𝑛

𝑙𝑛 = 𝑙𝑛−1

𝐿𝑛−1− 2𝑙𝑛−1= 1 𝐿𝑛−1

𝑙𝑛−1 − 2

= 1

√2 − 1 = √2 + 1.

Logo, a proporção entre os lados maior e menor dos retângulos obtidos é sempre constante e igual a √2 + 1, assim existem infinitos retângulos 𝑅𝑛. Note que:

1 < √2 + 1 = 𝐿𝑛

𝑙𝑛 = 𝑙𝑛−1

𝑙𝑛 ⟹ 𝑙𝑛−1 > 𝑙𝑛. ou seja, a sequência (𝑙𝑛) é decrescente e infinita.

(23)

Figura 1 - Representação geométrica da demonstração da irracionalidade de √2 utilizando retângulos.

Fonte: Elaborada pelo autor

Suponha que √2 = 𝑃𝑞, com 𝑝 e 𝑞 números naturais primos entre si. Definimos 𝑆1 como o retângulo e para cada 𝑛 ∈ ℕ de lados 𝐿1 = 𝑝 + 𝑞 e 𝑙1 = 𝑞, desse modo, temos:

𝐿1

𝑙1 =𝑝 + 𝑞 𝑞 = 𝑝

𝑞+ 1 = √2 + 1

Figura 2 - Representação geométrica da demonstração da irracionalidade de √2 utilizando retângulos.

Fonte: Elaborada pelo autor

assim, analogamente à construção anterior, obtemos infinitos retângulos 𝑆𝑛 com lados 𝐿𝑛 e 𝑙𝑛. Como a construção dos lados menores 𝑙𝑛 envolve subtração a partir dos lados 𝑝 + 𝑞 e 𝑞, obtendo uma sequência 𝑙1 > 𝑙2 > 𝑙3 > ⋯ > 𝑙𝑛 > ⋯ de números inteiros positivos, já que se tratam de lados de um retângulo, o que acarreta um absurdo, pois a sequência (𝑙𝑛) é decrescente e infinita de números naturais, o que não é possível.

(24)

2.5 USANDO TRIÂNGULOS

A demonstração que apresentaremos agora foi publicada por APOSTOL (2000) e utiliza construções com triângulos.

Demonstração:

Considere um triângulo retângulo isósceles com os catetos medindo 1, suponha que sua hipotenusa possa ser expressa por um número racional, isto é,

√2 = 𝑝 𝑞,

com 𝑝 𝑒 𝑞 inteiros positivos tais que 𝑚𝑑𝑐(𝑝, 𝑞) = 1. Denominaremos tal triângulo por 𝑇1. Multiplicando todos os lados de 𝑇1 por 𝑞, obtemos um triângulo 𝑇, semelhante a 𝑇1 com catetos e hipotenusa medindo 𝑞 𝑒 𝑝, respectivamente. Não existe outro triângulo com lados de medida inteira menor e semelhante a 𝑇. De fato, para todo 𝑘 inteiro positivo 𝑘 < 𝑞, ao multiplicarmos os lados de 𝑇1 por 𝑘, obtemos um novo triângulo com catetos de medida 𝑘 e hipotenusa 𝑘√2 = 𝑘.𝑝𝑞, que não é um número inteiro já que 𝑞 não divide 𝑘, o que gera uma contradição.

Figura 3 - Representação geométrica da demonstração da irracionalidade de √2 utilizando triângulos.

Fonte: Elaborada pelo autor

A partir daí, basta construir um triângulo semelhante a 𝑇 com lados de medidas inteiras e menores do que os lados de 𝑇. Seja 𝑇 o triângulo 𝐴𝐵𝐶, conforme a figura 4, traçamos um arco 𝐴𝑋 com centro no vértice 𝐶 e 𝑋 é um ponto sobre a hipotenusa de medida 𝑝.

(25)

Figura 4 - Representação geométrica da demonstração da irracionalidade de √2 utilizando retângulos.

Fonte: Elaborada pelo autor

Observe que os números inteiros 𝑝 − 𝑞 e 2𝑞 − 𝑝 representam, respectivamente, os catetos e a hipotenusa do triângulo 𝑋𝑌𝐵 que é semelhante 𝑇, o que é um absurdo. Portanto, por estes argumentos, o número √2 é irracional.

2.6 USANDO QUADRADOS

Antes de abordarmos a irracionalidade de outros números, apresentaremos uma demonstração de que √2 é irracional com o auxílio de construções de quadrados, aparentemente, a prova foi descoberta por Stanley Tennenbaum na década de 1950, mas foi amplamente divulgada por John Conway por volta de 1990.

Demonstração:

Suponha que √2 possa ser escrito na forma √2 =𝑥

𝑦, com 𝑥 e 𝑦 números naturais e primos entre si. Não existem números naturais 𝑥1 e 𝑦1 com 𝑥1 < 𝑥 ou 𝑦1 < 𝑦 tais que

√2 =𝑥1

𝑦1 ⟺ 2 =𝑥12 𝑦12. De fato, se 𝑥1 < 𝑥 e 2. 𝑦12 = 𝑥12, teríamos

𝑥2 𝑦2 =𝑥12

𝑦12 ⇔ (𝑥 𝑦)

2

= (𝑥1 𝑦1)

2

⇔𝑥 𝑦=𝑥1

𝑦1,

logo 𝑥 e 𝑦 não seriam primos entre si, acarretando uma contradição. A figura a seguir expressa o significado geométrico da relação 𝑥2 = 2𝑦2.

(26)

Figura 5 - Representação geométrica da demonstração da irracionalidade de √2 utilizando quadrados.

Fonte: Elaborada pelo Autor

Isto é, o quadrado de lado 𝑥 e área 𝐴 tem o dobro da área do quadrado 𝐵 com lado 𝑦.

Agora vamos sobrepor os dois quadrados de área 𝐵 no quadrado 𝐴, veja a figura a seguir:

Figura 6 - Representação geométrica da demonstração da irracionalidade de √2 utilizando quadrados.

Fonte: Elaborada pelo autor

Na figura 6, à esquerda, são formados três novos quadrados cujos lados são os números inteiros 2𝑥 − 𝑦 e 𝑥 − 𝑦. A soma das áreas dos dois quadrados de lado 𝑥 − 𝑦 é igual à área do quadrado de lado 2𝑦 − 𝑥, pois 2𝐵 = 𝐴. Logo, obtemos 2𝐵1 = 𝐴1 onde 𝐴1 é a área do quadrado de lado 𝑥1 = 2𝑦 − 𝑥 e 𝐵1 a área do quadrado de lado 𝑦1 = 𝑥 − 𝑦. Veja a figura a seguir:

(27)

Figura 7 - Representação geométrica da demonstração da irracionalidade de √2 utilizando retângulos.

Fonte: Elaborada pelo autor

Daí, tem-se 𝑥12 = 2𝑦12. Como 𝑥1 < 𝑥 e 𝑥1 é um número inteiro, chegamos numa contradição. Portanto √2 é irracional.

2.7 IRRACIONALIDADE DE √𝒑

Trataremos agora da irracionalidade de √𝑝, com 𝑝 ∈ ℕ e primo, logo em seguida provaremos a irracionalidade de números do tipo 𝑚√𝑝1𝑛1 ∙ 𝑝2𝑛2∙ … ∙ 𝑝𝑟𝑛𝑟. Nas demonstrações utilizaremos o TFA.

Demonstração:

Por um procedimento análogo ao que foi feito com √2, supõe-se, por hipótese, que

√𝑝 =𝑚𝑛 com 𝑚 e 𝑛 números naturais e primos entre si, isto é, 𝑚𝑑𝑐(𝑚, 𝑛) = 1. Logo,

√𝑝 =𝑚𝑛 ⇒ 𝑝 =𝑚2

𝑛2 ⇒ 𝑚2 = 𝑝𝑛2 ⇒ 𝑝|𝑚2. Como 𝑝 é primo, segue que 𝑝|𝑚. Assim, existe um 𝑥 ∈ ℤ tal que 𝑚 = 𝑥 ∙ 𝑝, desse modo temos que:

𝑚2 = 𝑝𝑛2 ⇒ (𝑥𝑝)2 = 𝑝𝑛2 ⇒ 𝑥2𝑝2 = 𝑝𝑛2 ⇒ 𝑥2𝑝 = 𝑛2 ⇒ 𝑝|𝑛2 ⇒ 𝑝|𝑛.

Logo, 𝑝|𝑚 e 𝑝|𝑛, o que contradiz a hipótese de 𝑚 e 𝑛 serem primos entre si. Portanto,

√𝑝 é irracional.

2.8 IRRACIONALIDADE DE 𝒎√𝒑𝟏𝒏𝟏∙ 𝒑𝟐𝒏𝟐 ∙ … ∙ 𝒑𝒓𝒏𝒓

A prova a seguir revela um resultado mais geral, que mostra a irracionalidade de números como: √10, √153 , √274 e √93 isto é, números da forma 𝑚√𝑎, onde 𝑎 e 𝑚 são números naturais maiores do que 1 tais que:

(28)

𝑎 = 𝑝1𝑛1 ∙ 𝑝2𝑛2 ∙ … ∙ 𝑝𝑟𝑛𝑟

em que 𝑝1, 𝑝2, … , 𝑝𝑟 são primos distintos e 𝑛1, 𝑛2, … , 𝑛𝑟 pertencem aos naturais, além disso, 𝑛𝑘 < 𝑚, para todo 𝑘 = 1,2,3, … , 𝑟. Vale salientar que a existência da fatoração

𝑝1𝑛1∙ 𝑝2𝑛2∙ … ∙ 𝑝𝑟𝑛𝑟 é garantida pelo TFA.

Demonstração:

Suponha que 𝑚√𝑎= √𝑝𝑚 1𝑛1∙ 𝑝2𝑛2 ∙ … ∙ 𝑝𝑟𝑛𝑟 seja racional, segue que:

√𝑝1𝑛1 ∙ 𝑝2𝑛2∙ … ∙ 𝑝𝑟𝑛𝑟

𝑚 =𝑢

𝑣 com 𝑢 e 𝑣 naturais e primos entre si. Manipulando obtemos:

𝑝1𝑛1 ∙ 𝑝2𝑛2 ∙ … ∙ 𝑝𝑟𝑛𝑟 =𝑢𝑚

𝑣𝑚 ⇒ 𝑢𝑚 = 𝑣𝑚∙ 𝑝1𝑛1∙ 𝑝2𝑛2 ∙ … ∙ 𝑝𝑟𝑛𝑟,

desse modo, para algum 𝑘 = 1,2,3, … , 𝑟 existe um 𝑛𝑘, que tomaremos 𝑛1 sem perda de generalidade, tal que

𝑝1𝑛1|𝑢𝑚⇒ 𝑝1|𝑢𝑚 ⇒ 𝑝1|𝑢.

Então podemos escrever 𝑢 = 𝑝1∙ 𝑡, 𝑡 ∈ ℤ e obtermos:

(𝑝1∙ 𝑡)𝑚 = 𝑣𝑚∙ 𝑝1𝑛1 ∙ 𝑝2𝑛2 ∙ … ∙ 𝑝𝑟𝑛𝑟 ⇒ 𝑝1𝑚∙ 𝑡𝑚 = 𝑣𝑚∙ 𝑝1𝑛1∙ 𝑝2𝑛2 ∙ … ∙ 𝑝𝑟𝑛𝑟

𝑝1𝑗∙ 𝑡𝑚 = 𝑣𝑚∙ 𝑝2𝑛2∙ … ∙ 𝑝𝑟𝑛𝑟 em que 𝑗 = (𝑚 − 𝑛1) ∈ ℕ, pois 𝑚 − 𝑛1 > 0. Logo,

𝑝1𝑗|𝑣𝑚∙ 𝑝2𝑛2∙ … ∙ 𝑝𝑟𝑛𝑟 ⇒ 𝑝1|𝑣𝑚∙ 𝑝2𝑛2∙ … ∙ 𝑝𝑟𝑛𝑟.

Então, segue que 𝑝1 ∤ 𝑝2𝑛2∙ … ∙ 𝑝𝑟𝑛𝑟, já que 𝑝1, 𝑝2, … , 𝑝𝑟 são primos distintos. Portanto, 𝑝1|𝑣𝑚 ⇒ 𝑝1|𝑣. Logo, 𝑝1|𝑢 e 𝑝1|𝑣, o que contradiz o fato de 𝑢 e 𝑣 serem primos entre si.

Portanto, 𝑚√𝑝1𝑛1 ∙ 𝑝2𝑛2∙ … ∙ 𝑝𝑟𝑛𝑟 ∉ ℚ.

De posse desse resultado, números como:

√10 = √2 ∙ 5, 5√27= √35 3 e √755 = √55 2∙ 3 são exemplos de números irracionais.

(29)

3 A IRRACIONALIDADE DA CONSTANTE DE EULER

Um importante exemplo de número irracional é o 𝑒 conhecido como constante de Euler4. Apesar de, segundo MAOR (2008), as origens de 𝑒 são anteriores a Euler e aparentemente surgiram em problemas de juros. MAOR (2008) afirma ainda que o número de Euler era conhecido, de modo implícito e não intencional, pelos antigos, por meio de situações de ordem prática, antes de qualquer estudo teórico.

Uma motivação para o estudo do numero 𝑒 vem de cálculos financeiros, em virtude do limite da sequência de números reais cujo termo geral é (1 + 1 𝑛⁄ )𝑛. A história conta que os babilônios haviam aproximado o valor da constante de Euler, em cálculos financeiros, mas não há indícios da compreensão deste fato, pelo caráter empírico da matemática deste povo. Vejamos alguns valores para expressão (1 + 1 𝑛⁄ )𝑛 à medida que 𝑛 cresce segundo a tabela:

𝑛

(1 +1 𝑛)

𝑛

1

(1 +1

1)

1

= 2

2 (1 +1

2)

2

= 2,25

10 (1 + 1

10)

10

= 2,593842601

100 (1 + 1

100)

100

= 2,70481382942152 … 1

Figura 8 - Desenvolvimento da expressão (1 +1

𝑛)𝑛 Fonte - Elaborada pelo autor

4 Leonhard Euler (1707-1783), matemático suíço, foi um dos primeiros a estudar as propriedades do número 𝑒.

(30)

Todos os números da tabela são racionais e poderíamos realizar mais cálculos e ir um pouco mais além, porém estes cálculos não levariam a um entendimento das propriedades do número 𝑒. Na realidade, prova-se que

𝑒 = lim

𝑛→∞(1 +1 𝑛)

𝑛

Buscaremos agora a irracionalidade do número 𝑒 por métodos diferentes, mas todas demonstrações que apresentaremos neste capítulo usam a série de Taylor da função exponencial.

𝑒𝑥 = ∑𝑥𝑛 𝑛!

𝑛=0

Diferentemente, do que ocorreu com √2, as provas para a irracionalidade de 𝑒 recaem em métodos um pouco mais sofisticados do ponto de vista desta comparação. Isso se deve ao fato de que 𝑒 é um número transcendente, os quais abordaremos com mais detalhes no próximo capítulo. Para mais detalhes a respeito da transcendência de 𝑒 recomendamos a leitura de MARQUES (2013).

Para as próximas demonstrações faremos uso de um resultado conhecido como Princípio Fundamental da Teoria dos Números.

3.1 TEOREMAS E PROPOSIÇÕES

Nesta seção será abordada a irracionalidade de 𝑒 (Constante de Euler) de algumas maneiras distintas e em todas elas usaremos o forte fato do 𝑒 ser definido por série em que seu termo geral converge para zero de forma muito rápida.

Teorema 3.1 Dado 𝑚 ∈ ℤ, não existe 𝑛 ∈ ℤ tal que 𝑚 < 𝑛 < 𝑚 + 1.

Demonstração: Como 𝑚 < 𝑛 < 𝑚 + 1 se, e somente se 0 < 𝑛 − 𝑚 < 1, então é necessário e suficiente mostrar que não há número natural entre 0 e 1. Suponhamos, por absurdo, que o teorema é falso, ou seja, podemos definir um conjunto 𝑆 = {𝑛 ∈ ℕ; 0 < 𝑛 < 1} não vazio.

Logo, pelo Princípio da Boa Ordenação (PBO), existe 𝑛0 ∈ 𝑆 mínimo. Assim, 𝑛0 satisfaz as desigualdades 0 < 𝑛0 < 1, agora multiplicando essas desigualdades por 𝑛0, obtemos 0 < 𝑛02 < 𝑛0 ⇔ 0 < 𝑛02 < 𝑛0 < 1, então 𝑛02 ∈ 𝑆, contrariando a minimalidade de 𝑛0.

(31)

Proposição 3.1 O número 𝒆 pertence ao intervalo aberto (2,3).

Demonstração:

Como

𝑒 = 1 + 1 + 1 2!+ 1

3!+ 1 4!+ ⋯

claramente 2 < 𝑒, resta-nos mostrar que 𝑒 < 3, para isso provaremos por indução que 𝑛! > 2𝑛−1 para 𝑛 ≥ 4. Para 𝑛 = 4, temos 4! > 23 ⇔ 24 > 8, o que é verdade. Suponhamos que 𝑛! > 2𝑛−1 para 𝑛 ≥ 4, resta mostrar que (𝑛 + 1)! > 2𝑛. De fato,

(𝑛 + 1)! = (𝑛 + 1)𝑛! > 2 ∙ 𝑛!, pois 𝑛 ≥ 4, logo, (𝑛 + 1)! > 2 ∙ 𝑛! e conforme a hipótese, segue que

(𝑛 + 1)! > 2 ∙ 2𝑛−1 = 2𝑛, provando assim a desigualdade desejada. De posse disso, temos:

𝑒 = 1 + 1 + 1 2!+ 1

3!+ 1 4!+ 1

5!+ 1

6!+ ⋯ < 1 + 1 +1 2+ 1

22+ 1 23 + 1

24+ 1 25 + ⋯ Note que 1 +1

2+ 1

22+ 1

23+ 1

24+ 1

25+ ⋯

é a soma de uma progressão geométrica infinita de razão 1

2, logo, 1 +1

2+ 1 22 + 1

23+ 1 24 + 1

25+ ⋯ = 1 1 −1

2

= 2.

Assim,

𝑒 < 1 + (1 +1

2+ 1

22+ 1

23+ 1

24+ 1

25+ ⋯ ) = 1 + 2 = 3, provando a proposição.

3.2 PROVA CLÁSSICA

A prova da irracionalidade de 𝑒 que apresentaremos inicialmente foi dada por Fourier, em 1815, a qual julgamos a mais elementar. Considere a série de Taylor de 𝑒

𝑒 = 1 + 1 + 1 2!+ 1

3!+ 1 4!+ ⋯ Suponha que 𝑒 possa ser escrito na forma

𝑒 =𝑝 𝑞

com 𝑝, 𝑞 ∈ ℕ e 𝑞 > 1, pois de acordo com a proposição 3.1, 𝑒 ∉ ℤ .Ao multiplicar os dois membros da igualdade por 𝑞! temos:

𝑒. 𝑞! = 𝑞! + 𝑞! +𝑞!

2!+𝑞!

3!+ ⋯ + 𝑞!

(𝑞 − 1)!+𝑞!

𝑞!+ 𝑞!

(𝑞 + 1)!+ ⋯

(32)

𝑝

𝑞. 𝑞! = (𝑞! + 𝑞! +𝑞!

2!+𝑞!

3!+ ⋯ + 𝑞!

(𝑞 − 1)!+𝑞!

𝑞!) + ( 1

𝑞 + 1+ 1

(𝑞 + 1)(𝑞 + 2)+ ⋯ ) 𝑝. (𝑞 − 1)! = (𝑞! + 𝑞! +𝑞!

2!+ ⋯ + 𝑞 + 1) + ( 1

𝑞 + 1+ 1

(𝑞 + 1)(𝑞 + 2)+ ⋯ ) 𝑝. (𝑞 − 1)! − (𝑞! + 𝑞! +𝑞!

2!+ ⋯ + 𝑞 + 1)

∈ℤ

= ( 1

𝑞+1+ 1

(𝑞+1)(𝑞+2)+ ⋯ ).

Seja 𝑆 = ( 1

𝑞+1+ 1

(𝑞+1)(𝑞+2)+ ⋯ ), claramente 𝑆 > 0, pois é soma de infinitas frações positivas. Provaremos agora que 𝑆 < 1. Note que as desigualdades abaixo são verdadeiras, já que 𝑞 > 1.

1

(𝑞 + 2)(𝑞 + 1)< 1

(𝑞 + 1)(𝑞 + 1) = 1 (𝑞 + 1)2 1

(𝑞 + 3)(𝑞 + 2)(𝑞 + 1)< 1

(𝑞 + 1)(𝑞 + 1)(𝑞 + 1)= 1 (𝑞 + 1)3 1

(𝑞 + 4)(𝑞 + 3)(𝑞 + 2)(𝑞 + 1)< 1

(𝑞 + 1)(𝑞 + 1)(𝑞 + 1)(𝑞 + 1) = 1 (𝑞 + 1)4

… … … ..

Faremos agora uma estimativa para o número 𝑆:

𝑆 = 1

(𝑞 + 1)+ 1

(𝑞 + 1)(𝑞 + 2)+ 1

(𝑞 + 1)(𝑞 + 2)(𝑞 + 3)+ ⋯

≤ 1

(𝑞 + 1)+ 1

(𝑞 + 1)2+ 1

(𝑞 + 1)3+ ⋯ Temos que a soma

1

(𝑞 + 1)+ 1

(𝑞 + 1)2+ 1

(𝑞 + 1)3+ ⋯ é de uma progressão geométrica de infinitas parcelas, com razão

1

𝑞 + 1< 1, já que 𝑞 ∈ ℕ. Logo:

𝑆 ≤ 1 (𝑞 + 1)⁄

1 − 1 (𝑞 + 1)⁄ =1 (𝑞 + 1)⁄ 𝑞 (𝑞 + 1)⁄ =1

𝑞 Como 𝑞 > 1, segue que

𝑆 ≤1 𝑞< 1.

Portanto 𝑆 pertence ao intervalo (0,1) o que é um absurdo. Portanto 𝑒 ∉ ℚ.

(33)

3.3 PROVA POR SÉRIE ALTERNADA

Para a próxima demonstração da irracionalidade do número 𝑒, utiliza-se o conceito de séries alternadas. Uma série alternada é uma série da forma:

∑(−1)𝑛+1𝑎𝑛

𝑛=1

= 𝑎1− 𝑎2+ 𝑎3− 𝑎4+ ⋯,

em que a sequência de números reais (𝑎𝑛) é não negativa. Dizemos que 𝑆𝑚 = ∑(−1)𝑛+1. 𝑎𝑛

𝑚

𝑛=1

é a m-ésima soma parcial da série. Um critério para a série convergir é o seguinte:

se,

i) 𝑎𝑛 ≥ 𝑎𝑛+1 para todo 𝑛 ∈ ℕ;

ii) 𝑎𝑛 converge para zero,

então a série converge para um número real 𝑆, satisfazendo 𝑆2𝑛≤ 𝑆 ≤ 𝑆2𝑛−1

para todo 𝑛 ∈ ℕ. Este resultado é devido a Leibniz e será usado para a demonstração seguinte.

Para mais detalhes sobre o Teorema de Leibniz e o estudo de séries, sugerimos LIMA (2012).

Demonstração: Suponha que 𝑒 =𝑝

𝑞 com 𝑝, 𝑞 ∈ ℕ, então 𝑒−1= 𝑞

𝑝∈ ℚ. Mas, 𝑒−1 = ∑(−1)𝑛

𝑛! ,

𝑛=0

já que a série da função exponencial é

𝑒𝑥 = ∑𝑥𝑛 𝑛!

𝑛=0

Assim, seja

∑(−1)𝑛 𝑛!

𝑝

𝑛=0

uma soma parcial de 𝑒−1, temos que (−1)𝑝+1. 𝑝! (𝑒−1− ∑(−1)𝑛

𝑛!

𝑝

𝑛=0

) = (−1)𝑝+1. 𝑝! (𝑞

𝑝− ∑(−1)𝑛 𝑛!

𝑝

𝑛=0

) =

(34)

= (−1)𝑝+1. (𝑞(𝑝 − 1)! − ∑(−1)𝑛. 𝑝!

𝑛!

𝑝

𝑛=0

)

temos que o número

(−1)𝑝+1. (𝑞(𝑝 − 1)! − ∑(−1)𝑛. 𝑝!

𝑛!

𝑝

𝑛=0

)

pertence aos inteiros, a partir daí, obtemos (−1)𝑝+1𝑝! (𝑞

𝑝− ∑(−1)𝑛 𝑛!

𝑝

𝑛=0

) = (−1)𝑝+1𝑝! ∑ (−1)𝑛 𝑛!

𝑛=𝑝+1

= (−1)𝑝+1. 𝑝! [(−1)𝑝+1

(𝑝 + 1)!+(−1)𝑝+2

(𝑝 + 2)!+ ⋯ ]

= 1

𝑝 + 1− 1

(𝑝 + 1)(𝑝 + 2)+ 1

(𝑝 + 1)(𝑝 + 2)(𝑝 + 3)− ⋯.

Note que a série 1

𝑝 + 1− 1

(𝑝 + 1)(𝑝 + 2)+ 1

(𝑝 + 1)(𝑝 + 2)(𝑝 + 3)− ⋯

é alternada e satisfaz (𝑖)𝑒 (𝑖𝑖). Sejam 𝑆1 e 𝑆2 as primeiras somas parciais, ou seja, 𝑆1 = 1

𝑝 + 1 e 𝑆2 = 1

𝑝 + 1− 1

(𝑝 + 1)(𝑝 + 2)= (𝑝 + 2) − 1

(𝑝 + 1)(𝑝 + 2) = 1 𝑝 + 2. Fazendo

𝑆 = 1

𝑝 + 1− 1

(𝑝 + 1)(𝑝 + 2)+ 1

(𝑝 + 1)(𝑝 + 2)(𝑝 + 3)− ⋯, temos que

𝑆 ∈ ( 1

𝑝 + 2, 1 𝑝 + 1).

Como 𝑝 ∈ ℕ segue que

( 1

𝑝 + 2, 1

𝑝 + 1) ⊂ (0,1),

ou seja, 𝑆 ∈ (0; 1), o que é um absurdo já que 𝑆 ∈ ℤ. Daí 𝑒 é irracional.

Referências

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