• Nenhum resultado encontrado

Breve Introdução à Relatividade Especial

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2021

Share "Breve Introdução à Relatividade Especial"

Copied!
9
0
0

Texto

(1)

Esmerindo Bernardes

1,

1

L.I.A. – Laborat´ orio de Instrumentac ¸˜ ao Alg´ ebrica Instituto de F´ısica de S˜ ao Carlos

Universidade de S˜ ao Paulo 13560-970 S˜ ao Carlos, SP, Brasil

(Dated: 19 de Setembro de 2018)

A fim de complementar as discuss˜ oes feitas sobre movimento e suas leis, faremos aqui uma dis- cuss˜ ao muito breve sobre a relatividade especial, a qual corrige o modelo newtoniano para velocidades pr´ oximas ` a velocidade m´ axima permitida na nossa natureza (a velocidade da luz). Veremos tamb´ em a fus˜ ao das no¸ c˜ oes de espa¸ co e tempo por um lado e da fus˜ ao entre as no¸ c˜ oes de energia e massa por outro.

CONTENTS

I. Espa¸co + Tempo 1

I.1. Transforma¸ c˜ oes de Galileu 1

I.2. Espa¸ co euclidiano 2

II. Espa¸cotempo 3

II.1. Transforma¸ c˜ oes de Lorentz 3 II.1.1. Dilata¸c˜ ao temporal 3 II.1.2. Contra¸ c˜ ao espacial 3

II.2. Espa¸co minkowskiano 4

II.3. Cinem´ atica relativ´ıstica 5

II.4. Dinˆ amica relativ´ıstica 7

II.4.1. ∆E = ∆mc

2

8

III. Exerc´ıcios 9

I. ESPAC ¸ O + TEMPO I.1. Transforma¸ oes de Galileu

Suponha dois referenciais inerciais quaisquer, digamos O e ¯ O , cada um equipado com seu pr´ opio rel´ ogio. Consi- dere o referencial ¯ O em movimento uniforme em rela¸c˜ ao a O . Para simplificar um pouco, vamos supor que os ei- xos espaciais X , Y e Z do referencial O sejam paralelos aos eixos espaciais ¯ X, ¯ Y e ¯ Z do referencial ¯ O em qual- quer instante de tempo. Vamos supor tamb´ em que suas origens coincidam em t = ¯ t = 0, onde ambos rel´ ogios s˜ ao sincronizados. Vamos tamb´ em considerar que o referen- cial ¯ O se movimente ao longo do eixo X com velocidade constante V , conforme indicado na Figura 1.

Muito bem. Imagine agora que algum experimento mecˆ anico seja realizado (no v´ acuo) no referencial em mo- vimento ¯ O . Este experimento pode ser (1) o lan¸ camento ou a queda livre de um objeto sob a a¸c˜ ao da gravidade ou (2) o movimento de um corpo preso a uma mola (os- cilador harmˆ onico sem atrito) ou (3) o movimento de um

sousa@ifsc.usp.br

corpo sob a a¸ c˜ ao da gravidade, por´ em preso a uma extre- midade de uma haste inextens´ıvel e de massa nula com a outra extremidade fixa (pˆ endulo simples sem atrito), para citar apenas trˆ es possibilidades. Como os resulta- dos desses experimentos em ¯ O ser˜ ao vistos no referencial em repouso O ? Todos os n´ umeros ser˜ ao os mesmos? As trajet´ orias ser˜ ao as mesmas? Eventos simultˆ aneos em ¯ O ser˜ ao vistos tamb´ em simultaneamente no outro referen- cial O ?

O

¯ O V t ¯

V

x ¯

x

X

¯ X Y

¯ Y

Figura 1. Transforma¸ c˜ oes de coordenadas entre referenciais inerciais. A velocidade relativa entre eles ´ e V . Os rel´ ogios foram sincronizados no momento em que os dois referenciais coincidiram.

Para respondermos estas quest˜ oes, precisaremos saber primeiramente como relacionar coordenadas nestes dois referenciais. Segundo Newton, esta rela¸ c˜ ao deve cum- prir uma exigˆ encia fundamental: ela deve preservar a defini¸ c˜ ao de for¸ ca, ou seja, o produto massa (constante) por acelera¸ c˜ ao deve ser o mesmo ou proporcionais nos dois referenciais, pois estes dois referenciais s˜ ao inerci- ais. Isto ´ e conhecido como o princ´ıpio da relatividade de Galileu-Newton:

Princ´ ıpio 1

Todas as leis da Mecˆ anica s˜ ao as mesmas em todos os sis- temas inerciais de referˆ encia.

Note que Galileu e Newton n˜ ao ousaram incluir as demais leis f´ısicas, al´ em daquelas da Mecˆ anica, neste princ´ıpio.

Portanto, se queremos aderir ao princ´ıpio da relatividade

(2)

de Galileu-Newton, a ´ unica possibilidade de efetuarmos uma transforma¸ c˜ ao de coordenadas que preserve a de- fini¸ c˜ ao de for¸ ca (portanto as leis da Mecˆ anica) ´ e uma rela¸ c˜ ao linear no tempo e na posi¸ c˜ ao,

x = γ(¯ x + V ¯ t), (1) quando o referencial ¯ O estiver movimentando-se no sen- tido positivo do eixo X (veja a Figura 1), ou

¯

x = γ(x V t), (2)

quando o referencial O estiver movimentando-se no sen- tido negativo do eixo ¯ X. Note que mantivemos a mesma constante γ nestas duas rela¸c˜ oes. Isto ´ e razo´ avel, pois es- tamos considerando que o nosso espa¸ co vazio (o palco de todos os movimentos) seja homogˆ eneo e isotr´ opico. Ser homogˆ eneo significa que a constante γ n˜ ao pode depen- der da posi¸c˜ ao. Em um espa¸co isotr´ opico, a constante γ n˜ ao pode depender nem da dire¸c˜ ao nem do sentido de qualquer vetor. Consequentemente, se γ tiver qualquer dependˆ encia com a velocidade do referencial ¯ O , poder´ a ser apenas uma dependˆ encia em seu m´ odulo V (rapidez).

At´ e aqui, n˜ ao mencionamos qualquer rela¸ c˜ ao entre t e ¯ t, a n˜ ao ser que x = ¯ x em t = ¯ t = 0. Quem s˜ ao os poss´ıveis valores de γ?

Galileu e Newton fizeram a hip´ otese de que o tempo flui uniformemente nos dois referenciais, ou seja, t = ¯ t sempre. Isto significa que o tempo ´ e absoluto, o mesmo em todos os referenciais inerciais, ou seja, um evento que

´

e simultˆ aneo em um referencial inercial, o ser´ a em todos os demais. Newton acreditava tamb´ em que a existˆ encia de um tempo absoluto estivesse ligado com a existˆ encia de um Deus supremo. Fazendo t = ¯ t em (1) e (2) e depois somando estes dois resultados, obteremos

x + ¯ x = γ(x + ¯ x) γ = 1. (3) Tamb´ em fazendo x = ¯ x em t = ¯ t = 0, determinamos γ = 1. Tamb´ em observando Figura 1 e usando geometria plana euclidiana, deduzimos que γ = 1 nas rela¸c˜ oes (1) e (2).

As transforma¸ c˜ oes

x = ¯ x + V t, y = ¯ y, z = ¯ z, t = ¯ t, (4)

¯

x = x V t, y ¯ = y, z ¯ = z, ¯ t = t, (5) s˜ ao conhecidas por transforma¸ c˜ oes de Galileu. Note que derivando no tempo estas equa¸c˜ oes, obtemos a conhecida regra de composi¸c˜ ao para velocidades,

¯

v

x¯

= v

x

± V. (6) Note tamb´ em que as transforma¸ c˜ oes de Galileu preser- vam a acelera¸ c˜ ao dos corpos. Consequentemente, o pro- duto massa (constante) por acelera¸c˜ ao ´ e mantido invari- ante, ou seja a segunda lei ´ e preservada. Naturalmente, estas transforma¸c˜ oes tˆ em sido verificadas em todos os ca- sos conhecidos, exceto quando o valor de V ´ e compar´ avel ao valor da velocidade da luz. Surpreso? Isto ´ e realmente surpreendente!

I.2. Espa¸ co euclidiano

Imagine um espa¸ co tridimensional onde um ponto ´ e localizado pelas coordenadas (x, y, z) e a distˆ ancia infini- tesimal entre dois pontos ´ e dada por

(ds)

2

= (dx)

2

+ (dy)

2

+ (dz)

2

=

3 i,j=1

g

ij

dx

i

dx

j

, g

ij

= δ

ij

, (7) onde a m´ etrica g ´ e a identidade. Esta distˆ ancia infini- tesimal (7) ´ e invariante mediante transla¸c˜ oes e rota¸ c˜ oes espaciais (independentes do tempo; tempo absoluto).

Um espa¸co deste tipo ´ e denominado de euclidiano. A Mecˆ anica newtoniana est´ a inserida num espa¸ co euclidi- ano tridimensional equipado com rel´ ogios que uma vez sincronizados, assim premanecer˜ ao mesmo se estiverem em movimento.

Para mostrar que a distˆ ancia infinitesimal (7) ´ e um invariante perante rota¸c˜ oes (fa¸ca o Exerc´ıcio 1), considere uma rota¸ c˜ ao em torno do eixo z,

¯

x = x cos θ y sin θ, y ¯ = x sin θ + y cos θ, (8) onde θ ´ e o ˆ angulo de rota¸ c˜ ao (medido no sentido contr´ ario aos ponteiros de um rel´ ogio; regra da m˜ ao direita). Agora escreva a distˆ ancia s

2

no referencial girado e use as transforma¸ c˜ oes de Galileu (8) para passar as diferenciais para o outro referencial. Por exemplo, x = dx cos θ dy sin θ (θ ´ e constante) e assim por adiante. Como as diferenciais n˜ ao “enxergam” constantes, ´ e imediato mos- trar que transla¸c˜ oes n˜ ao afetam a distˆ ancia infinitesimal (7), pois elas apenas somam constantes ` as coordenadas cujas varia¸ c˜ oes ser˜ ao tomadas em seguida.

No entanto, curiosamente, a distˆ ancia infinitesimal (7) n˜ ao ´ e invariante perante ` as transforma¸ c˜ oes de Galileu (4). Para ver isto, escreva a distˆ ancia s

2

no referen- cial em movimento e use as transforma¸ c˜ oes de Galileu (4) para passar as diferenciais para o outro referencial.

Por exemplo, x = dx V dt (a velocidade relativa V ´ e constante) e assim por adiante. Verifique que para (7) ser invariante ` as transforma¸c˜ oes de Galileu (4), ter´ıamos de aceitar V = 2v

x

, o que ´ e um absurdo.

A discrepˆ ancia entre a previs˜ ao (6), fruto das trans- forma¸ c˜ oes de Galileu (4), e experimentos foi consagrada no experimento de Michelson-Morley, realizado pela pri- meira vez um pouco antes de 1900. Vejamos primeiro o que a teoria de Galileu-Newton prediz quando luz ´ e emitida na origem do referencial em movimento ¯ O e ob- servada em O (nosso referencial, “fixo”). No instante t, a luz est´ a na posi¸ c˜ ao ¯ x = ct em ¯ O . Ent˜ ao, no refe- rencial O , segundo a transforma¸c˜ ao (4), ela estar´ a em x = ¯ x + V t = (c + V )t. Portanto, no referencial O a luz deve ser vista com uma velocidade c + V , maior que c.

Entretanto, o experimento de Michelson-Morley diz que a velocidade da luz ´ e a igual a c em todos os referenci- ais inerciais! Pronto, a confus˜ ao estava feita. Albert A.

Michelson, por achar que havia alguma coisa errada em

(3)

seu experimento, continuou a repeti-lo por quase 30 anos!

Ele recebeu o prˆ emio Nobel em 1907 (por estas medidas e por ter inventando o interferˆ ometro, um instrumento

´

otico de alta precis˜ ao).

II. ESPAC ¸ OTEMPO II.1. Transforma¸ oes de Lorentz

No entanto, ainda em 1905, Albert Einstein, um jo- vem f´ısico, at´ e ent˜ ao completamente desconhecido, disse de forma arrebatedora que a nossa natureza ´ e assim: a velocidade da luz no v´ acuo ´ e independente do movimento da fonte, ou seja, ela ´ e uma constante universal. Sem ter conhecimento do experimento de Michelson-Morley. Sim- ples assim. E concluiu: ent˜ ao n˜ ao poderemos ter γ = 1 e nem ¯ t = t! Devemos ter x = ct em O e ¯ x = c ¯ t em ¯ O . Substituindo estes valores em (1) e (2), teremos (fa¸ca o Exerc´ıcio 2)

ct = γ(c + Vt, c ¯ t = γ(c V )t, (9) da qual resulta (a menos de um sinal)

γ = 1

√ 1 β

2

= 1 + 1

2 β

2

+ O

4

), β = V

c . (10) Note que γ depende somente do m´ odulo da velocidade relativa entre os referenciais inerciais, como previsto. A presen¸ ca da velocidade da luz ´ e uma surpresa enorme.

Podemos ver ent˜ ao que no limite de baixa velocidade V c, β 0 e γ 1, que ´ e o seu valor no caso cl´ assico (3) se escolhermos γ positivo em (10). No en- tanto, quando V ´ e compar´ avel a c, temos de usar as transforma¸ c˜ oes (1) e (2) com γ dado em (10). Rela¸c˜ oes similares para o tempo visto nos dois referenciais podem ser obtidas eliminando-se ou x ou ¯ x em (1) e (2) (fa¸ca o Exerc´ıcio 3),

¯

x = γ(x β ct), c t ¯ = γ(ct β x), (11) x = γ(¯ x + β c ¯ t), ct = γ(c ¯ t + β x). ¯ (12) com ¯ y = y e ¯ z = z.

Estas transforma¸c˜ oes foram apresentadas por Einstein em 1905 e s˜ ao conhecidas por transforma¸ c˜ oes de Lorentz (por motivos diferentes dos relacionados aqui e anterio- res a 1905). Em (11), expressamos as coordenadas do referencial ¯ O em termos das coordenadas do referencial O . As transforma¸c˜ oes inversas (12) s˜ ao obtidas simples- mente invertendo o sinal de V (e, consequentemente, de β = V /c tamb´ em).

Como as rela¸c˜ oes (11)–(12) misturam as posi¸ c˜ oes espa- ciais com o tempo (e vice-versa), o tempo n˜ ao ´ e absoluto, como Galileu e Newton imaginaram (e o resto do mundo).

Isto significa que um acontecimento n˜ ao precisa ser si- multˆ aneo em todos os referenciais inerciais. Isto trar´ a consequˆ encias ainda mais surpreendentes, como veremos a seguir.

Naturalmente, as transforma¸c˜ oes (11) s˜ ao idˆ enticas ` as transforma¸ c˜ oes (4) quando V c (ou β 1). Este

´ e um exemplo onde uma teoria foi devidamente corri- gida: para velocidades baixas (comparado ` a velocidade da luz) podemos usar a mecˆ anica newtoniana; para velo- cidades altas devemos usar a mecˆ anica relativ´ıstica. Na- turalmente, nossas experiˆ encias sensoriais est˜ ao imersas no mundo newtoniano.

II.1.1. Dilata¸ ao temporal

Suponha um rel´ ogio em repouso no referencial ¯ O . Per- manecendo sempre no mesmo lugar (¯ x

1

= ¯ x

2

), marque um determinado intervalo de tempo, ¯ T = ¯ t

2

¯ t

1

, usando este mesmo rel´ ogio. Este intervalo de tempo medido com o rel´ ogio em repouso ser´ a denominado de tempo pr´ oprio.

No outro referencial O , aquele rel´ ogio usado para medir o tempo pr´ oprio em ¯ O ser´ a visto em movimento. Por- tanto os dois eventos que determinaram o intervalo de tempo ¯ T ser˜ ao vistos no referencial O nos instantes t

1

e t

2

(em posi¸ c˜ oes diferentes), correspondendo a um inter- valo T = t

2

t

1

. Usando as transforma¸ c˜ oes (12) em T , encontraremos (fa¸ca o Exerc´ıcio 5)

T = γ T . ¯ (13)

Esta rela¸c˜ ao nos mostra que T > T ¯ , ou seja, que o in- tervalo de tempo T medido (calculado) no referencial O

´ e maior que o intervalo de tempo ¯ T medido no referen- cial ¯ O . Isto significa que o rel´ ogio no referencial ¯ O em movimento ´ e visto como mais lento: o tempo passa mais devagar no referencial em movimento. Este efeito ´ e co- nhecido por dilata¸ c˜ ao temporal.

Os observadores solid´ arios ao referencial ¯ O chegar˜ ao ` a mesma conclus˜ ao a respeito de um rel´ ogio usado para me- dir um tempo pr´ oprio em O . H´ a nenhuma contradi¸ c˜ ao nisto. O tempo pr´ oprio ser´ a sempre o menor intervalo de tempo e pode somente ser medido em apenas um re- ferencial inercial. Todos os demais referenciais inercias distintos ir˜ ao medir intervalos de tempo maiores, por´ em haver´ a nenhuma concordˆ ancia de valores entre eles.

Estas previs˜ ao, a dilata¸c˜ ao temporal, ´ e confirmada em experimentos usando part´ıculas elementares em acelera- dores de part´ıculas (para saber mais sobre part´ıculas ele- mentares, consulte Aventuras das Part´ıculas, mantido pelo Instituto de F´ısica Te´ orica (IFT), Unesp). Em par- ticular, visite o site Experimento com M´ uons.

II.1.2. Contra¸ ao espacial

Suponha uma r´ egua em repouso no referencial ¯ O , de

comprimento ¯ L = ¯ x

2

x ¯

1

. Este ´ e o comprimento pr´ oprio

(r´ egua em repouso). Uma vez que a r´ egua est´ a em re-

pouso, a medida das posi¸ c˜ oes ¯ x

1

e ¯ x

2

das extremidades

podem ser efetuadas em tempos diferentes. No outro re-

ferencial O , esta r´ egua ser´ a vista em movimento, por isto

(4)

a leitura de suas extremidades dever˜ ao ser efetuadas no mesmo instante de tempo (t

1

= t

2

). Assim, o compri- mento da r´ egua medido em O ser´ a L = x

2

(t) x

1

(t).

Usando as transforma¸c˜ oes (11) em ¯ L, encontraremos (fa¸ca o Exerc´ıcio 5)

L = L ¯

γ . (14)

Esta rela¸c˜ ao nos mostra que L < L, pois ¯ γ > 1. Portanto, a r´ egua no referencial ¯ O em movimento ser´ a vista com um comprimento menor no outro referencial O . Este resultado ´ e conhecido por contra¸ c˜ ao espacial.

Os observadores solid´ arios ao referencial ¯ O chegar˜ ao

`

a mesma conclus˜ ao a respeito de uma r´ egua usada para medir um comprimento pr´ oprio em O . Novamente, h´ a nenhuma contradi¸ c˜ ao nisto. O comprimento pr´ oprio ser´ a sempre o maior comprimento pr´ oprio e pode somente ser medido em apenas um referencial inercial. Todos os de- mais referenciais inercias distintos ir˜ ao medir comprimen- tos menores, por´ em haver´ a nenhuma concordˆ ancia de va- lores entre eles.

II.2. Espa¸ co minkowskiano

Imagine um espa¸ co quadridimensional onde um ponto (evento) ´ e localizado pelas coordenadas

(x

µ

) = (x

0

, x

1

, x

2

, x

3

) = (ct, x, y, z) = (ct, ⃗ r) (15) e a distˆ ancia infinitesimal entre dois pontos ´ e dada por

(ds)

2

= (cdt)

2

(dx)

2

(dy)

2

(dz)

2

=

3 µ,ν=0

g

µν

dx

µ

dx

ν

= dx

µ

dx

µ

, (16) onde x

0

= ct. A m´ etrica g

µν

tem os seguintes elementos n˜ ao-nulos (diagonal):

g

00

= g

11

= g

22

= g

33

= 1. (17) Um espa¸ co deste tipo ´ e denominado de espa¸ co de Min- kowski.

Neste espa¸co, as coordenadas x

µ

de um evento s˜ ao de- nominadas de contra-variantes e as coordenadas

x

µ

=

3 ν=0

g

µν

x

ν

= g

µν

x

ν

(18) s˜ ao denominadas de co-variantes. Note a presen¸ ca impl´ıcita de um somat´ orio na ´ ultima igualdade em (16) e tamb´ em em (18). O sinal de somat´ orio ser´ a omitido sempre que tivermos dois ´ındices, um contra e outro co-variante, numa mesma express˜ ao (conven¸ c˜ ao de Eins- tein). A m´ etrica (17) deve ser usada para comutarmos entre ´ındices contra e co-variantes (diz-se da subida e descida de ´ındices).

A m´ etrica (17) deve ser usada tamb´ em para alterar seus pr´ oprios ´ındices:

g

µα

g

αν

= g

µν

, g

να

g

αµ

= g

νµ

, g

µν

= (g

T

)

νµ

= δ

νµ

, (19) onde δ

νµ

´ e o delta de Kronecker,

δ

νµ

= {

1 se ν = µ,

0 se ν ̸ = µ. (20)

Em geral, objetos com dois ´ındices, como a m´ etrica (17), podem ser vistos como matrizes. O ´ındice na esquerda ser´ a o ´ındice das linhas e o ´ındice na direita ser´ a o ´ındice das colunas, independentemente se os ´ındices s˜ ao contra ou co-variantes.

As transforma¸c˜ oes de Lorentz (11)–(12) deixam a distˆ ancia infinitesimal (16) invariante (fa¸ ca o Exerc´ıcio 4). Portanto estas transforma¸c˜ oes devem re- presentar algum tipo de rota¸c˜ ao. Antes por´ em, vamos reescrevˆ e-las numa nota¸c˜ ao covariante:

x

0

= γ¯ x

0

+ βγ¯ x

1

, x

1

= βγ¯ x

0

+ γ x ¯

1

,

x

2

= ¯ x

2

, x

3

= ¯ x

3

. (21) Por ser uma transforma¸ c˜ ao linear entre coordenadas, me- lhor expres´ a-la na forma matricial

x

µ

= Λ

µν

x ¯

ν

,

µν

) =

 

γ βγ 0 0 βγ γ 0 0 0 0 1 0 0 0 0 1

  . (22)

Fisicamente, a transforma¸c˜ ao inversa ´ e dada pela troca β → − β aplicada ` a matriz (22). Qual ser´ a a forma co- variante da matriz representando esta transforma¸c˜ ao in- versa? Por inspe¸c˜ ao, encontramos

µν

) = (g

µα

Λ

αβ

g

βν

) =

 

γ βγ 0 0

βγ γ 0 0

0 0 1 0

0 0 0 1

  . (23)

Esta matriz ´ e a inversa daquela apresentada em (22).

Por´ em, para escrevermos o produto matricial entre elas numa forma covariante, precisaremos do transposto de (23). Assim, a matriz da transforma¸c˜ ao inversa ´ e

1µν

) = (Λ

νµ

)

T

= (g

να

Λ

T αβ

g

βµ

) =

 

γ βγ 0 0

βγ γ 0 0

0 0 1 0

0 0 0 1

  , (24) ou, removendo os ´ındices,

Λ

1

= g

1

Λ

T

g. (25)

Note a semelhan¸ ca (e a diferen¸ca) desta rela¸ c˜ ao com

uma matriz ortogonal R (representando uma rota¸ c˜ ao no

espa¸ co euclidiano), R

1

= R

T

= g

−1

R

T

g (g ´ e a identi-

dade no espa¸co euclidiano). Note tamb´ em que a inversa

(5)

´

e calculada usando uma conjuga¸ c˜ ao (transforma¸c˜ ao de similaridade), um dos procedimentos mais ´ uteis em ma- tem´ atica. A conjuga¸c˜ ao ´ e equivalente a levarmos um ele- trodom´ estico para ser consertado numa oficina e depois o retornarmos para casa (analogia feita pelo Prof. Antˆ onio Conde).

A transforma¸c˜ ao linear (22) representa uma “rota¸c˜ ao”

no plano ct x, onde γ = cosh ψ, βγ = senh ψ,

cosh

2

ψ senh

2

ψ = 1, tanh ψ = β. (26) Novamente, esta rota¸c˜ ao no espa¸ co de Minkowski, reali- zada por fun¸c˜ oes trigonom´ etricas (ou circulares), lembra uma rota¸c˜ ao no espa¸co euclidiano, realizadas por fun¸c˜ oes hiperb´ olicas.

A semelhan¸ca (ou diferen¸ca) entre as fun¸ c˜ oes circula- res e hiperb´ olicas impressionam. As fun¸ c˜ oes circulares representam um c´ırculo unit´ ario,

x

2

+ y

2

= 1, x = cos θ, y = sen θ, (27) onde o ˆ angulo θ ´ e numericamente igual ao dobro da ´ area da regi˜ ao delimitada pelo vetor posi¸ c˜ ao (x, y), o eixo x (referˆ encia) e o arco circular compreendido. As fun¸c˜ oes hiperb´ olicas representam uma hip´ erbole unit´ aria,

x

2

y

2

= 1, x = cosh ψ, y = senh ψ, (28) com

cosh ψ = 1

2 ( e

ψ

+ e

ψ

), senh ψ = 1

2 ( e

ψ

e

ψ

), (29) onde o ˆ angulo ψ ´ e numericamente igual ao dobro da ´ area da regi˜ ao delimitada pelo vetor posi¸ c˜ ao (x, y), o eixo x (referˆ encia) e o arco hiperb´ olico compreendido. Desta semelhan¸ ca podemos perceber o qu˜ ao diferentes s˜ ao estes dois espa¸ cos.

Suponha a existˆ encia de trˆ es referenciais inerciais, A, B, C, alinhados como na Figura 1. O referencial A tem uma velocidade relativa a B dada por V e o referencial B tem uma velocidade relativa a C dada por U . Quem ´ e a velocidade relativa W entre A e C em termos das veloci- dades U e V ? Em outras palavras, a aplica¸c˜ ao sucessiva de duas transforma¸ c˜ oes de Lorentz, A

Ψ

B e B

Φ

C, ´ e tamb´ em uma transforma¸ c˜ ao de Lorentz, A

C? Esta situa¸ c˜ ao ´ e melhor analisada em termos dos ˆ angulos de rota¸ c˜ ao

tanh ψ = V

c , tanh ϕ = U

c , tanh ω = W

c , (30) associados a cada uma desta transforma¸c˜ oes. Assim, os elementos da matriz resultante da aplica¸c˜ ao sucessiva das transforma¸c˜ oes de Lorentz A

Ψ

B e B

Φ

C s˜ ao

µν

(ω) = Ψ

µα

(ψ)Φ

αν

(ϕ), (31)

onde

(Ω

µν

) =

 

cosh ω sinh ω 0 0 sinh ω cosh ω 0 0

0 0 1 0

0 0 0 1

  , ω = ψ + ϕ. (32)

Da lei de composi¸c˜ ao ω(ψ, ϕ) = ψ + ϕ em (32), tanh ω = tanh(ψ + ϕ) = tanh ψ + tanh ϕ

tanh ψ tanh ϕ + 1 , (33) obtemos uma rela¸c˜ ao entre as velocidades relativas cor- respontes,

W = U + V 1 + U V

c

2

. (34)

Esta ´ e a lei de composi¸c˜ ao de velocidades relativ´ısticas (todas na mesma dire¸c˜ ao). Quando as velocidades relati- vas s˜ ao pequenas, recuperamos a lei de composi¸c˜ ao new- toniana (U + V ). Note que mesmo impondo U = V = c, conseguimos apenas W = c. Isto mostra que a velocidade da luz ´ e um invariante, uma constante universal, inde- pendente do movimento de sua fonte. Mostra tamb´ em que n˜ ao conseguimos produzir uma velocidade superior

`

a da luz. A velocidade da luz ´ e um limite superior para velocidades (espero que n˜ ao seja definitivo).

O resultado em (32) mostra que a aplica¸ c˜ ao sucessiva de duas transforma¸c˜ oes de Lorentz ´ e tamb´ em uma trans- forma¸ c˜ ao de Lorentz; ou seja, as transforma¸c˜ oes de Lo- rentz formam um grupo (j´ a verificamos a existˆ encia da identidade, ω = 0, e da inversa, ω). Neste caso particu- lar, onde alinhamos os eixos dos referenciais, este grupo

´ e abeliano (comutativo). Al´ em disso, como a fun¸c˜ ao ω(ψ, ϕ) = ψ + ϕ em (32) ´ e anal´ıtica, ent˜ ao trata-se de um grupo de Lie. Este grupo ´ e n˜ ao-compacto, pois os ˆ

angulos hiperb´ olicos ψ, ϕ, . . . n˜ ao est˜ ao limitados superi- ormente. Compare este cen´ ario com aquele das rota¸c˜ oes em torno de um eixo (fixo): elas formam tamb´ em um grupo de Lie, por´ em compacto, pois o ˆ anglo θ pode ser limitado ao intervalo 0 θ 2π.

II.3. Cinem´ atica relativ´ ıstica

Neste espa¸co da relatividade especial, o espa¸cotempo de Minkowski, o tempo junta-se ` as demais coordena- das espaciais e perde o status de absoluto. Se na mecˆ anica newtoniana o tempo absoluto ´ e o parˆ ametro na- tural da representa¸ c˜ ao param´ etrica de uma trajet´ oria, na mecˆ anica relativ´ıstica esse parˆ ametro natural ´ e o pr´ oprio comprimento s da trajet´ oria. O comprimento de um tre- cho infinitesimal ´ e dado por (16),

(ds)

2

= dx

µ

dx

µ

= (cdt)

2

(dx)

2

(dy)

2

(dz)

2

= (cdt)

2

(1 v

2

c

2

) =

[ cdt γ(v)

]

2

, (35)

(6)

onde v = || v || ´ e o m´ odulo (rapidez) do vetor velocidade (de um corpo) e

γ(v) = 1

√ 1 v

2

c

2

,

dt = γ

3

v · ⃗a

c

2

, ⃗ v = d⃗ r

dt , ⃗a = d⃗ v dt . (36) Embora esse corpo possa estar acelerado, podemos as- sociar a ele um referencial inercial a cada instante, sendo v a sua velocidade relativa. No espa¸cotempo de Min- kowski, taxas de varia¸ c˜ ao em rela¸c˜ ao ao comprimento infinitesimal

ds = cdt

γ(v) (37)

definem 4-velocidade e 4-acelera¸ c˜ ao, u

µ

= dx

µ

ds , w

µ

= du

µ

ds = d

2

x

µ

ds

2

, (38) respectivamente, cujas componentes s˜ ao (verifique)

(u

µ

) = γ ( 1, v

c

) , (39)

(w

µ

) = γ

4

v · ⃗a c

3

( 1, v c

) + γ

2

( 0, ⃗a

c

2

) (40)

= γ

3

v · ⃗a

c

3

(u

µ

) + γ

2

( 0, ⃗a

c

2

) .

Esses dois 4-vetores possuem algumas propriedades inte- ressantes e nada intuitivas. A 4-velocidade ´ e adimensio- nal e unit´ aria:

u

α

u

α

= dx

α

dx

α

ds

2

= 1. (41)

A 4-acelera¸ c˜ ao tem dimens˜ ao de inverso de comprimento,

´

e ortogonal ` a 4-velocidade, u

α

w

α

= u

α

du

α

ds = 1 2

d

ds (u

α

u

α

) = 0, (42) e de m´ odulo dado por

w

α

w

α

= γ

4

c

4

[

a

2

+ γ

2

c

2

(⃗ v · ⃗a)

2

]

. (43)

Como ser´ a vista no referencial O a velocidade de um determinado corpo movendo-se com velocidade ¯ v

x¯

= x/d ¯ t no referencial ¯ O , este movendo-se com velocidade constante V em rela¸c˜ ao a O ? Vejamos. A compo- nente x da velocidade deste corpo em O ´ e definida como v

x

= dx/dt, ou seja, a raz˜ ao entre as diferenciais dx e dt.

Ent˜ ao, usando as transforma¸ c˜ oes (11)–(12), teremos v

x

= dx

dt = x + β cd ¯ t

d ¯ t +

βc

x = v ¯

x¯

+ V

1 +

Vcv¯2x¯

. (44) Fazendo o mesmo para as demais componentes, teremos

v

y

= dy

dt = v ¯

¯y

γ (

1 +

Vcv¯2x¯

), (45)

v

z

= dz

dt = v ¯

z¯

γ (

1 +

Vc¯v2x¯

) . (46)

Note que ¯ v

¯x

= c implica em v

x

= c. Note tamb´ em que a regra de adi¸c˜ ao de velocidades (44) ´ e a mesma encontrada em (34). A regra relativ´ıstica de composi¸c˜ ao de veloci- dades (44)–(46) nunca fornece uma velocidade relativa maior que a velocidade da luz.

Uma situa¸ c˜ ao interessante, an´ aloga ao movimento

“queda livre” no cen´ ario newtoniano, ´ e o movimento re- lativ´ıstico de um corpo sujeito a uma acelera¸c˜ ao cons- tante. No referencial do corpo, a sua velocidade (es- pacial) ´ e nula. Portanto, de (40) sua 4-acelera¸c˜ ao ser´ a ( ¯ w

µ

) = (0, ⃗ g/c

2

), cujo m´ odulo ´ e ¯ w

µ

w ¯

µ

= g

2

/c

4

. Supo- nha tamb´ em que g seja constante (o equivalente de uma queda livre). Como o m´ odulo de um 4-vetor ´ e um inva- riante, ent˜ ao o m´ odulo da 4-acelera¸c˜ ao em (43) deve ser igual a g

2

/c

4

. Sendo g constante, podemos alinhar os vetores espaciais velocidade e acelera¸c˜ ao, (⃗ v · ⃗a)

2

= (va)

2

e a = ˙ v, onde ˙ v significa uma derivada temporal. Neste caso, a express˜ ao do lado direito em (43) simplifica para (verifique)

w

α

w

α

= ( γ

3

c

2

v ˙ )

2

= ¯ w

µ

w ¯

µ

= ( g

c

2

)

2

, (47) onde impusemos tamb´ em que este m´ odulo ´ e uma cons- tante e invariante. Disto resulta a EDO

˙ ( v

1 v

2

c

2

)

32

= g, (48)

cuja solu¸ c˜ ao ´ e (verifique)

γ(v) v = gt, v(t) = gt

1 + g

2

t

2

c

2

, (49)

onde impusemos v(0) = 0 como condi¸c˜ ao inicial. No regime n˜ ao-relativ´ıstico, gt/c 1, recuperamos uma ve- locidade linear no tempo, v = gt, e, se formos sufici- entemente pacientes, poderemos ter v > c. No regime relativ´ıstico, mesmo tendo um tempo de vida tendendo ao infinito, o m´ aximo que consiguiremos ´ e v c (veri- fique), mostrando que mesmo num movimento acelerado (acelera¸ c˜ ao constante), n˜ ao conseguimos ultrapassar a ve- locidade da luz. A velocidade da luz aparece aqui como uma velocidade terminal, caracter´ıstica de objetos em queda livre na presen¸ca de uma atmosfera.

Para esse caso unidimensional, v = ˙ r, onde r ´ e a distˆ ancia radial (ao longo do eixo x, por exemplo). Assim podemos integrar v(t) em (49) para obter como a posi¸ c˜ ao varia com o tempo (verifique):

r(t) =

t t=0

v(t)dt = c

2

g

(√

1 + g

2

t

2

c

2

1

)

. (50)

Note que esta express˜ ao tem ct como ass´ımptota; ´ e como

se a acelera¸c˜ ao desaparecesse depois de um tempo longo,

como ocorre no movimento de objetos em queda livre na

presen¸ ca de uma atmosfera. Isto ´ e condizente com o fato

(7)

da velocidade (49) ter c como ass´ımptota. Resta calcular o tempo pr´ oprio deste objeto sujeito a esta acelera¸c˜ ao constante g. Supondo que o objeto esteja na origem de seu pr´ oprio referencial, ent˜ ao da invariˆ ancia do intervalo (16), reescrito na forma (35),

ds = cdt

γ(v) = cdτ, (51)

podemos calcular o tempo pr´ oprio τ do objeto (verifique), τ(t) =

t 0

dt γ(v) = c

g senh

1

( gt c

) . (52)

Esta express˜ ao deve ser comparada com t, o tempo no nosso referencial. Em particular, ap´ os um tempo t longo, o tempo pr´ oprio tem (c/g) ln(2gt/c) como ass´ımptota, mostrando que o tempo pr´ oprio τ transcorre de forma mais lenta que o nosso tempo t.

II.4. Dinˆ amica relativ´ ıstica

Podemos usar a 4-velocidade em (39) para definir o 4-momentum linear

p

µ

= mcu

µ

, p

µ

p

µ

= m

2

c

2

, (53) onde m ´ e a massa do objeto. Note que esse 4-vetor tem as dimens˜ oes de momentum linear. ´ E muito interessante ob- servar sua componente temporal, p

0

= mcγ , multiplicada pelo velocidade da luz (que produz uma quantidade com dimens˜ ao de energia), para velocidades n˜ ao-relativ´ısticas (verifique),

cp

0

= γmc

2

= mc

2

+ 1

2 mv

2

+ · · · (54) O primeiro termo mc

2

´ e denominado de energia de re- pouso. O segundo termo ´ e a energia cin´ etica newtoniana.

Por isso, a quantidade

E = γmc

2

(55)

´

e denominada de energia (mecˆ anica). A energia rela- tiv´ıstica ´ e n˜ ao-nula mesmo na ausˆ encia de movimento, re- sultando na energia de repouso E = mc

2

, a qual depende diretamente da massa inercial do objeto. Isto indica que massa e energia s˜ ao manifesta¸c˜ oes de uma mesma quan- tidade. Sabemos hoje que podemos transformar uma na outra. Um exemplo dessa transforma¸c˜ ao ´ e a energia libe- rada na quebra (jun¸c˜ ao) de ´ atomos grandes (pequenos), um processo conhecido por fiss˜ ao (fus˜ ao) nuclear.

O 4-momentum linear (53) reescrito em termos da energia e do momentum linear relativ´ısticos,

(p

µ

) = mc(u

µ

) = ( E c , ⃗ p )

, ⃗ p = γm⃗ v, (56) cuja intensidade

p

µ

p

µ

= E

2

c

2

p

2

= m

2

c

2

(57)

e denominada de rela¸c˜ ao de dispers˜ ao relativ´ıstica. Por inspe¸c˜ ao das defini¸ c˜ oes de energia (55) e momentum li- near (56) relativ´ısticos, encontramos

p = E

c

2

v. (58)

Esta rela¸ c˜ ao n˜ ao menciona a massa m diretamente e nos diz que um objeto com rapidez || v || = c tem momentum p = E /c, que ´ e a componente temporal do 4-momentum em (56). Esta ´ e a rela¸ c˜ ao de dispers˜ ao adequada para objetos que possuem massa nula, como o f´ oton (e neutri- nos).

E poss´ıvel construir uma vers˜ ´ ao relativ´ıstica de se- gunda lei de Newton, onde for¸ ca se iguala ` a taxa de va- ria¸ c˜ ao do momentum linear,

z

µ

= dp

µ

ds = mcω

µ

, (59)

onde a ´ ultima igualdade ´ e v´ alida somente quando a massa m for constante. note as dimen˜ oes de massa por tempo desse quadrivetor for¸ca. Para massa constante, os qua- drivetores for¸ca e momentum linear s˜ ao ortogonais,

p

α

z

α

= 1 2

d

ds (p

α

p

α

) = 1 2

d

ds (mc)

2

= 0. (60) Podemos usar as componentes do quadrivetor momen- tum linear dadas em (56) para escrevermos as compo- nentes do quadrivetor for¸ ca,

( z

µ

) = γ c

( E ˙ c , ⃗ F )

, ⃗ F = d⃗ p

dt , ⃗ p = γm⃗ v. (61) O princ´ıpio da relatividade de Galileu-Newton agora deve ser enunciado na seguinte forma:

Princ´ ıpio 2 (Relatividade de Einstein)

1. Todas as leis f´ısicas s˜ ao as mesmas em todos os sis- temas inerciais de referˆ encia;

2. A velocidade da luz no v´ acuo tem o mesmo valor em todos os sistemas inerciais.

Este princ´ıpio ´ e conhecido como o princ´ıpio da re-

latividade de Einstein. Note que ele ´ e mais ge-

ral que o princ´ıpio da relatividade de Galileu-Newton

(Princ´ıpio 1), pois agora todas as leis f´ısicas foram de-

vidamente inclu´ıdas.

(8)

II.4.1. ∆E = ∆mc

2

¯ O

O

V

A

¯ X X

¯

Y Y

c c

Figura 2. Colis˜ ao entre um corpo A e dois f´ otons vista por dois referenciais inerciais em movimento relativo com V c.

O corpo A est´ a em repouso no referencial O e tem massa M neste referencial.

Tudo que tem massa, possui esta energia ∆E = ∆mc

2

armazenada. At´ e a descoberta desta rela¸ c˜ ao, acreditava- se na conserva¸ c˜ ao da energia e da massa separadamente.

Hoje sabemos que massa e energia s˜ ao manifesta¸c˜ oes de uma mesma quantidade f´ısica (ainda sem nome!). Se- guindo o pr´ oprio Einstein, ´ e instrutivo realizarmos uma deriva¸ c˜ ao elementar desta equivalˆ encia entre massa e energia. Consideremos um sistema como ilustrado na Figura 2. O corpo A est´ a em repouso no referencial O e tem massa M . Neste mesmo referencial, observamos dois f´ otons (luz) movendo-se na mesma dire¸ c˜ ao mas em sentidos opostos, os quais ser˜ ao absorvidos pelo corpo A.

Supondo que cada f´ oton tenha uma energia igual a E /2, o corpo A ter´ a sua energia aumentada por ∆E = E .

O f´ oton ´ e uma part´ıcula curiosa, pois ele n˜ ao tem carga el´ etrica e nem massa de repouso, isto ´ e, um f´ oton parado em algum referencial inercial teria massa nula. No en- tanto ele s´ o pode estar em movimento! Mas como, se ele n˜ ao tem massa? Mesmo n˜ ao tendo massa, o f´ oton pode ter ent˜ ao uma quantidade de movimento n˜ ao-nula! O momentum linear do f´ oton ´ e a sua energia dividida pela velocidade da luz (no v´ acuo). Devemos lembrar que o f´ oton carrega a menor quantidade de energia em um feixe luminoso. Esta energia depende apenas da frequˆ encia ν da luz e da constante de Planck h = 6.626 × 10

34

J s, E = hν. Por isso ele ´ e denominado de quantum de luz (ou da radia¸ c˜ ao eletromagn´ etica). O f´ oton foi descoberto por Max Planck em 1900 (Planck recebeu o prˆ emio Nobel em 1918 por esta descoberta). Coube a Einstein esclarecer a natureza corpuscular (composta de muitos f´ otons) da luz em 1905 (ele recebeu o prˆ emio Nobel em 1921, por esta e outras contribui¸ c˜ oes ` a f´ısica te´ orica).

¯ O

V

A

¯ X

¯ Y

c c

α α

Figura 3. Colis˜ ao entre um corpo A e dois f´ otons vista pelo referencial inercial em movimento ¯ O com V c.

De volta ao nosso experimento: uma colis˜ ao entre trˆ es corpos, onde um dos corpos (o corpo A) absorve dois f´ otons. Estes trˆ es corpos est˜ ao isolados. Portanto, de acordo com a segunda lei (princ´ıpio 2 do Cap. 2) h´ a con- serva¸ c˜ ao do momentum linear. Como o momentum linear

´ e um vetor, devemos olhar para as trˆ es dire¸c˜ oes em cada referencial. No referencial O onde o corpo A est´ a em repouso, a componente no eixo X do momentum linear total ´ e nula, pois cada f´ oton tem p

x

= E /2c, mas em sentidos opostos e o corpo A est´ a em repouso. Depois da colis˜ ao, eles s˜ ao completamente absorvidos e, por sime- tria, o corpo A continua em repouso. Portanto h´ a con- serva¸ c˜ ao da componente X do momentum linear. Como n˜ ao h´ a movimento nas demais dire¸ c˜ oes (Y e Z), n˜ ao pre- cisamos nos preocupar como as respectivas componentes do momentum linear.

Passemos agora para o outro referencial inercial em movimento, ¯ O . Este referencial est´ a em movimento uni- forme ao longo eixo Y , como indicado na Figura 2. Neste referencial em movimento, nosso experimento ´ e visto como mostrado na Figura 3. Considerando que o fator β = V /c ´ e pequeno, podemos aproximar o ˆ angulo α pelo seu seno,

sin(α) = V

c α. (62)

Assim, antes da colis˜ ao, o momentum linear total no eixo Y ¯ ´ e

P

y¯(a)

= M V + 2 ( E

2c sin(α) )

= M V + E

c

2

V. (63) Na verdade, tanto a massa M do corpo A quanto o mo- mentum linear do f´ oton E /2c no referencial ¯ O deveriam sofrer corre¸c˜ oes relativ´ısticas. No entanto, estas corre¸ c˜ oes s˜ ao muito pequenas se β = V /c ´ e pequeno, que ´ e o caso em quest˜ ao (veja o Exerc´ıcio 8). Bem e depois da ab- sor¸ c˜ ao? Vimos no referencial em repouso O que o corpo A permanece em repouso ap´ os a colis˜ ao dos dois f´ otons.

Portanto ele ter´ a de continuar com a velocidade V ao

longo do eixo ¯ Y , como indicado na Figura 3, mesmo

ap´ os a colis˜ ao (explique). Ap´ os a colis˜ ao os dois f´ otons

n˜ ao existem mais, devido ` a absor¸ c˜ ao. Ent˜ ao, para n˜ ao

concluirmos que os f´ otons n˜ ao existiam antes da colis˜ ao

devido ` a conserva¸ c˜ ao do momentum linear, ou ent˜ ao para

(9)

n˜ ao concluirmos que a conserva¸ c˜ ao do momentum linear est´ a errada, temos de supor uma massa M

̸ = M para o corpo A ap´ os a colis˜ ao. Assim, ap´ os a colis˜ ao o mo- mentum linear total no eixo ¯ Y ´ e P

¯y(d)

= M

V . Como o momentum linear deve ser conservado, pois n˜ ao existem for¸cas externas, ent˜ ao

M V + E

c

2

V = M

V, (64) de onde obtemos

∆M = M

M = E c

2

= ∆E

c

2

. (65) Este resultado est´ a nos dizendo que a energia ∆E, ab- sorvida ou liberada por um corpo, ´ e equivalente a uma varia¸ c˜ ao ∆m na sua massa de repouso m, ∆E = ∆m c

2

. Veja o Exerc´ıcio 10 para um exemplo num´ erico. Esta rela¸ c˜ ao entre massa e energia explica porque o f´ oton tem uma quantidade de movimento, mesmo n˜ ao tendo uma massa de repouso (como a nossa): ele tem energia. N˜ ao poder (nunca) estar parado, ´ e o pre¸co que ele paga por n˜ ao ter uma massa de repouso, ele precisa estar sempre em movimento.

III. EXERC´ ICIOS Exerc´ ıcio 1

Mostre que as transforma¸ c˜ oes de Galileu (4) n˜ ao deixam a distˆ ancia infinitesimal (7) invariante. Mostre que as rota¸ c˜ oes (8) deixam a distˆ ancia infinitesimal (7) invari- ante (considere tamb´ em dt = 0).

Exerc´ ıcio 2

Mostre que as rela¸ c˜ oes (9) est˜ ao corretas e determine explicitamente o valor de γ.

Exerc´ ıcio 3

Determine explicitamente as transforma¸c˜ oes para o tempo, mostradas na segunda coluna das Eqs. (11) e (12), a partir das rela¸ c˜ oes (1) e (2).

Exerc´ ıcio 4

Mostre que as transforma¸c˜ oes de Lorentz (11)–(12) dei- xam a distˆ ancia infinitesimal (16) invariante.

Exerc´ ıcio 5

Determine explicitamente as rela¸ c˜ oes (14) e (13).

Exerc´ ıcio 6

Determine explicitamente os resultados (44), (45) e (46).

Exerc´ ıcio 7

Quais s˜ ao os valores relativos das contra¸ c˜ oes espacial ( ¯ L/L) e temporal ( ¯ T /T ) quando β = 0.3, β = 0.6, β = 0.9 e β = 0.99?

Exerc´ ıcio 8

Mostre, usando a s´ erie de Taylor, que a corre¸c˜ ao rela- tiv´ıstica (10) pode ser escrita na forma de uma s´ erie de potˆ encias quando β 1,

γ 1 + 1 2 β

2

+ 3

8 β

4

. (66)

Exerc´ ıcio 9

Considere a part´ıcula denominada de m´ uon. Ela tem a mesma carga de um el´ etron, mas uma massa cerca de 200 vezes maior. Ela ´ e inst´ avel: ap´ os o tempo ¯ L = 2.2 µs (medido no referencial do m´ uon (lento) em laborat´ orios) ela se transforma (decai) em outras part´ıculas. Quando o m´ uon vem de raios c´ osmicos, ele penetra nossa atmosfera com uma velocidade V = 0.99c e chega at´ e o solo em grandes quantidades. Explique como o m´ uon chega at´ e a superf´ıcie (poucos kilˆ ometros abaixo do in´ıcio da nossa atmosfera).

Exerc´ ıcio 10

O is´ otopo

216

Po do ´ atomo de polˆ onio, n´ umero atˆ omico Z = 84, massa atˆ omica 216.001889 u.m.a., foi descoberto por Marie Curie em 1893, como um ´ atomo radioativo.

Pela descoberta de ´ atomos radioativos, ela e seu marido (Pierre) receberam o prˆ emio Nobel em 1903. Vale menci- onar que ela recebeu um segundo prˆ emio Nobel em 1911 pela descoberta do polˆ onio. O processo de desintegra¸ c˜ ao do polˆ onio ´ e

216

Po

212

Pb +

4

He. (67)

Sabendo que a massa atˆ omica do chumbo

212

Pb ´ e

211.991872 u.m.a. e a do h´ elio ´ e 4.002602 u.m.a. e

que uma unidade de massa atˆ omica (u.m.a) vale 1.66 ×

10

27

kg, calcule a energia liberada neste processo radio-

ativo. Esta energia ´ e usada na forma de energia cin´ etica

pelos produtos da rea¸c˜ ao nuclear.

Referências

Documentos relacionados

Existe ainda uma outra forma, na qual resumidamente se compreende o primeiro passo do Nobre Caminho Óctuplo e se utiliza a vontade de superação da experiência da existência

Para o Planeta Orgânico (2010), o crescimento da agricultura orgânica no Brasil e na América Latina dependerá, entre outros fatores, de uma legislação eficiente

In: VI SEMINÁRIO NACIONAL DE PESQUISADORES DA HISTÓRIA DAS COMUNIDADES TEUTO-BRASILEIRAS (6: 2002: Santa Cruz do Sul).. BARROSO, Véra Lúcia

O método propriamente dito de um trabalho científico só pode ser estabelecido depois que o objetivo tiver sido definido. Por esse motivo, no caso da Computação, normalmente a revisão

Os testes de desequilíbrio de resistência DC dentro de um par e de desequilíbrio de resistência DC entre pares se tornarão uma preocupação ainda maior à medida que mais

Caso o usuário deseje temperaturas diferentes das programadas pelo fabricante, com valores mais frios para os vinhos brancos, ou direcionar o seu equipamento para vinhos tintos,

Os resultados deste trabalho mostram que o tempo médio de jejum realizado é superior ao prescrito, sendo aqueles que realizam a operação no período da tarde foram submetidos a

Vinculado ao projeto de pesquisa “Tradução Intersemiótica: uma ferramenta para criação em dança”, esta proposta visa aprofundar os estudos acerca das