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Adaptação estratégica organizacional em uma empresa do setor calçadista do Vale dos Sinos-RS

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Adaptação estratégica organizacional em uma empresa do setor calçadista do Vale dos Sinos-RS

Márcia Regina Kaiser Zanini (UFSM) kaiserm@terra.com.br Luis Carlos Pistóia de Oliveira (UFSM) pistoia@pro.viars.com.br

Resumo

Este artigo teve como objetivo descrever e analisar o processo de adaptação estratégica organizacional de uma empresa do setor calçadista do Vale dos Sinos-RS. A metodologia utilizada foi o estudo de caso simples, com a utilização da abordagem qualitativa. Utilizou-se, também, a análise longitudinal e histórica combinando os procedimentos da abordagem da direct research (MINTZBERG & MCHUGH, 1985) com os da abordagem da grouded-theory (GLASER &

STRAUSS, 1980). De maneira geral, interpretou o processo de adaptação, evidenciando quais foram, como se desenvolveram e que fatores dos contextos interno e externo ocasionaram as mudanças. Pôde-se concluir que a interpretação das condições ambientais feita pela coalizão dominante deu origem a um conjunto de estratégias deliberadas e emergentes, que promoveram as mudanças estratégicas na organização, configurando o seu processo de adaptação.

Palavras chave: Mudança organizacional, Adaptação estratégica, Estratégia.

1. Introdução

As profundas transformações e reestruturações mundiais em curso ocorrem de maneira incontestável. Desse modo, uma das questões centrais do desenvolvimento brasileiro atual reside na busca de competitividade da indústria nacional em um mercado internacional cada vez mais dinâmico e eficiente. As mudanças ocorridas no Brasil, principalmente após a abertura comercial no início da década de 90, alteraram significativamente as condições concorrenciais da indústria. Além disso, inovações tecnológicas ocorridas no âmbito do produto, do processo e da gerência, têm a potencialidade de mudar a atratividade e competitividade de todo um setor.

Inserida nesse contexto está a indústria calçadista nacional cujas vantagens competitivas obtidas pela abundância de mão-de-obra barata e facilidade no acesso às matérias-primas, perderam gradativamente a atratividade num cenário mundial no qual as plantas industriais priorizam padrões mais elevados de qualidade, produtividade e flexibilidade, serviços melhores aos clientes, agilidade na entrega, respostas rápidas às variações da demanda e variedade dos produtos e serviços.

As mudanças ambientais provocaram reações e mudanças nas estratégias das organizações, de modo a adaptá-las à nova realidade forçando os tomadores de decisões a rever suas estratégias visando moldar as organizações e inseri-las no novo contexto, adequando-as para que sobrevivessem e aumentassem sua competitividade.

2. Adaptação estratégica organizacional

Existem diversas teorias que procuram explicar como as organizações se adaptam a seus ambientes, entretanto, elas podem ser agrupadas basicamente em dois grupos de perspectivas, deterministas e voluntaristas.

A perspectiva determinista defende que o ambiente organizacional é altamente determinístico e imutável, controlando e coagindo as organizações a se adaptarem de acordo com suas imposições. O ambiente considerado, neste caso, é o imediato (ambiente específico, de ação

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direta). Aqui, duas abordagens se sobressaem: a abordagem da ecologia das populações e a institucional (MILES, 1982).

Na perspectiva voluntarista a adaptação organizacional é vista como resultado das escolhas feitas pela coalizão dominante, às quais são realizadas com base em seus valores, tanto com relação a seu ambiente específico, como com relação ao ambiente mais geral. Sob esta perspectiva, as organizações têm poder até mesmo para influir no ambiente onde estão inseridas. As principais abordagens aqui são: dependência de recursos, seleção racional (modelo racional de contingências) e a escolha estratégica.

Hrebiniak & Joyce (1985) se referem à adaptação como um processo dinâmico que resulta da força relativa e do tipo de poder, ou da dependência existente entre a organização e o ambiente. Defendem que a posição de uma organização pode mudar, ao longo do tempo, como resultado tanto de escolhas estratégicas como de mudanças no ambiente externo. As interações das variáveis resultam em quatro tipos principais: (I) seleção natural, com o mínimo de escolha e adaptação ou seleção; (II) diferenciação, com alta escolha e alto determinismo ambiental e adaptação com restrições; escolha estratégica, com máxima escolha e adaptação pelo design e; (IV) escolha indiferenciada, com escolha incremental e adaptação por chance. Para os autores, esses tipos influenciam o número e formas estratégicas das organizações, a ênfase decisória nos meios e fins, comportamento político e conflito e a busca de atividades da organização em seu ambiente.

Miles & Snow (1978) definem adaptação como sendo o alinhamento consistente das decisões referentes ao domínio, à tecnologia e à estrutura organizacional, quer seja de modo proativo ou de modo reativo. Seu modelo apresenta um conjunto de arquétipos de adaptação organizacional. Esses tipos estratégicos, assim denominados pelos autores, configuram padrões de comportamento estratégico que emergem quando a organização procura responder às demandas do ambiente, possuindo cada um deles uma configuração particular de tecnologia, estrutura e processo, consistentes com sua estratégia. Os tipos são: defensivo, explorador, analista e reativo.

As organizações defensoras possuem domínios de produto-mercados estreitos. Exploradoras são as que estão quase sempre em busca de oportunidades de mercado e respondem rapidamente às tendências ambientais emergentes. Analistas são as que operam em dois tipos de domínio de produto-mercado, um relativamente estável, e o outro mutável. E, finalmente, as reativas são as organizações nas quais os altos dirigentes percebem freqüentemente as mudanças e incertezas que ocorrem em seus ambientes organizacionais, mas são incapazes de responder eficazmente.

3. Estratégia organizacional

Em face dos diversos conceitos de estratégia, Mintzberg (1987), sistematizou, em “5 Ps para Estratégia”, as várias definições e sentidos, com que se entende esse conceito. Assim, para o autor, o termo estratégia, pode ser utilizado com os seguintes sentidos: plano; manobra (ploy em inglês); padrão; posição; e, perspectiva.

A estratégia é vista como um plano quando existe uma intenção consciente para a ação, uma diretriz para lidar com diversas situações. A estratégia como padrão, significa que o comportamento da empresa, no que se refere às decisões e ações tomadas ao longo do tempo, mostra uma certa consistência quanto ao tipo de escolhas privilegiadas. A estratégia como posição, representa a localização da empresa no interior do meio ambiente. Como perspectiva, se refere à forma como o(s) estrategista(s) da empresa percebe(m) a mesma e o mundo que a rodeia. Como manobra (ploy), representa as ações tomadas pela empresa para superar os seus adversários em situações específicas, sem que essas ações constituam, necessariamente, os verdadeiros objetivos da sua estratégia.

As estratégias assim definidas deixam, ainda, dúvidas quanto a sua formação na organização.

Mintzberg (1987) apresenta, então, conceitos de estratégia que se identificam em duas vertentes:

estratégias deliberadas enquanto intenções antecipadamente afirmadas pela liderança da

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organização; ou emergentes, aquelas que surgem diante de um fato novo, surpreendente, para o qual não houve plano, ou na correção de rumos e ajustes da intenção inicial

As estratégias podem ser classificadas em deliberadas ou emergentes em função do nível da estrutura organizacional em que são tomadas as decisões. Assim, pode-se classificar a estratégia de uma organização em três níveis, que correspondem basicamente às unidades organizacionais encarregadas da sua formulação (WHEELWRIGHT, 1984):

Estratégia corporativa (ou de grupo): especifica os negócios nos quais o grupo pretende atuar, a forma de aquisição dos recursos corporativos e a sua alocação a cada um dos negócios.

Estratégia da unidade de negócio (ou da empresa): define o escopo e as fronteiras do negócio, bem como as ações necessárias para alcançar e desenvolver vantagens competitivas.

Estratégia funcional: determina como as diversas áreas funcionais (produção, marketing, finanças, etc) darão suporte na determinação, obtenção e manutenção das vantagens competitivas escolhidas.

Porter (1986) aponta a liderança em custos ou a diferenciação como alternativas estratégicas a considerar, em escopo competitivo de alvo amplo ou estreito. Seu modelo de análise da estrutura da indústria e das cinco forças que influenciam a concorrência (rivalidade entre os concorrentes, ameaça de novos entrantes, poder de barganha dos fornecedores, poder de barganha dos compradores e ameaça de substitutos) significou importante contribuição, especialmente à avaliação do ambiente competitivo e da rentabilidade da indústria.

3. Metodologia

A metodologia utilizada foi o estudo de caso simples, com a utilização da abordagem qualitativa. Utilizou-se, também, a análise longitudinal e histórica combinando os procedimentos da abordagem da direct research (MINTZBERG & MCHUGH, 1985) com os da abordagem da grouded-theory (GLASER & STRAUSS, 1980).

4. O estudo do processo de adaptação estratégica da empresa X

A empresa X produz calçados femininos com cabedal de couro, distribuídos da seguinte maneira:

10% sapatos de moda, 30% de sapatos casuais, 15% de botas e, 45% de sandálias, sendo que estas são produtos com grande valor agregado. Além disso, é responsável pela geração de aproximadamente 1.500 empregos diretos.

A produção em 2002 foi de 1.768.400 pares de calçados destinados totalmente à exportação, sendo que cerca de 90% destinam-se aos Estados Unidos e os 10% restantes para o Canadá e à Europa. Esse volume de negócios foi responsável por uma receita bruta de aproximadamente 24 milhões de dólares nesse mesmo ano.

Cabe destacar que tanto em termos de faturamento, quanto pelo critério relacionado ao número de funcionários, utilizado pela Federação das Indústrias do Rio Grande do Sul (FIERGS), a empresa é classificada como de grande porte, desempenhando, portanto, um importante papel no desenvolvimento dos municípios onde atua, a partir da geração de emprego e renda.

4.1 Fases do processo de adaptação estratégica da empresa X

Para a compreensão do processo de adaptação estratégica da empresa X, no período compreendido entre 1990 e 2002, foram identificados os eventos críticos que mais influenciaram os rumos da organização e, a partir desses eventos, foram definidos três períodos estratégicos. Descreveu-se, então, o processo de adaptação, enfatizando as estratégias e os resultados alcançados com a adoção dessas estratégias, de acordo com a percepção dos informantes.

Com base nos eventos críticos, entre 1990 e 2002, foram definidos 3 períodos estratégicos da empresa pesquisada. Esses períodos, caracterizados pelas decisões estratégicas, foram identificados a partir das entrevistas e da base teórica adotada pela pesquisa.

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Período estratégico I - Crise organizacional provocada pela abertura comercial (1990-1993) No período estratégico I (1990-1993), houve 2 eventos críticos: Valorização cambial e Entrada efetiva dos chineses no mercado de baixo preço.

Evento crítico 1: Valorização Cambial

No início dos anos 90, além da inflação elevada, da instabilidade macroeconômica e da valorização cambial, as empresas tiveram que enfrentar a abertura comercial que expôs os produtores nacionais à concorrência internacional, provocando uma profunda desestruturação no setor produtivo brasileiro, acostumado com a proteção do Governo. Nesse contexto, a preocupação do empresário foi de diminuir custos, mantendo a produtividade. As estratégias adotadas foram o fechamento de fábricas, a demissão de funcionários e a redução de desperdícios, tais medidas permitiram a manutenção da empresa no mercado.

Evento crítico 2: Entrada efetiva da concorrência chinesa no mercado de baixo custo A entrada da concorrência dos chineses no mercado mundial de calçados provocou uma mudança de orientação em todo o setor calçadista e, em pouco tempo, o mercado de baixo custo foi totalmente tomado pelos chineses. Desse modo, os produtores brasileiros tiveram que rever seus métodos de produção e perceberam que não estavam tão seguros quanto pensavam, algo deveria ser feito se quisessem continuar operando.

Análise teórica do período estratégico I – de 1990 a 1993

O contexto ambiental externo se mostra turbulento no início da década de 90, principalmente devido à abertura comercial e a grande instabilidade macroeconômica. As sucessivas tentativas de estabilização macroeconômicas por parte do governo, provocam a reação da empresa pesquisada e, conseqüentemente, modificações no seu ambiente interno.

As estratégias utilizadas pela empresa para enfrentar esses problemas foram, principalmente, investimentos em fundos que na época rendiam juros excepcionais e orientar toda a produção para o mercado externo, tendência que já vinha sendo delineada desde a década anterior. A geração de excedentes de caixa que permitiram ganhos no mercado financeiro deve-se à cultura do líder da organização que sempre se preocupou em manter uma reserva financeira, propiciada pelo enorme crescimento da empresa em períodos anteriores a 1990, resultando em uma empresa com situação financeira bastante sólida. Segundo a definição de Mintzberg (1987), essa estratégia pode ser definida como um padrão, pois vinha sendo utilizado há muito tempo pela empresa.

No que diz respeito à adaptação organizacional estratégica, pela tipologia de Hrebiniak &

Joyce (1985), nesse período foi identificado o tipo I, pois a organização não exerceu nenhum controle sobre os fatores exógenos. As ações gerenciais foram restritas e limitadas. Isso se deve, principalmente, porque os preços dos calçados são determinados pelo mercado, mais especificamente pelos importadores: as organizações têm pouca ou nenhuma influência sobre os mesmos.

Pela a classificação de Porter (1986), a estratégia da empresa nesse período foi a de baixo custo, com o suporte de estratégia funcional (WHEELWRIGHT, 1984), principalmente da área de produção e finanças.

O padrão de comportamento adaptativo proposto por Miles & Snow (1978) surgiu quando a organização procurou responder às demandas do ambiente. No período I, a empresa apresentou características de organizações reativas, na medida que seus dirigentes foram forçados a reagir a mudanças impostas por pressões ambientais. Entretanto, em relação à entrada da China no mercado de baixo custo, o comportamento adotado foi o defensivo, pois, os tomadores de decisão não perceberam a ameaça desse poderoso concorrente no mercado atendido pela empresa.

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Período estratégico II – Reorganização da produção (1994-1998)

No período estratégico II, ocorreram 5 eventos críticos: estabilidade econômica com valorização cambial, mudança no mercado de atuação, incorporação de novas tecnologias, mudança no comportamento do consumidor e participação dos gerentes nas decisões da empresa.

Evento crítico 1: Estabilidade econômica com valorização cambial

A partir de 1994, houve uma rápida queda da inflação e o governo conseguiu, depois de diversas tentativas, a estabilidade econômica. Porém, juntamente com a estabilidade veio a valorização cambial, o que prejudicou sobremaneira as exportações brasileiras. O líder da empresa pesquisada atribuiu os problemas enfrentados pelo setor, no início desse período à conjuntura econômica da época.

Para compensar as perdas do setor produtivo, o governo concedeu incentivo aos exportadores, principalmente por meio de Adiantamento dos Contratos de Câmbio (ACC), que permitia aos exportadores se beneficiarem das elevadas taxas de juros internas. Além disso, em 1995 houve um retrocesso no processo de abertura comercial, com elevação de tarifas de vários produtos. Essas medidas permitiram às empresas um fôlego e a ampliação em seus investimentos.

Evento crítico 2: Mudança no mercado de atuação

Nesse período, já com a clara percepção da concorrência da China, a empresa decide mudar o mercado de atuação. Na primeira metade dos anos 90, cerca de metade da produção destinava-se ao mercado europeu, e a outra metade, ao mercado americano. A partir de 1995, o percentual da produção destinada ao mercado americano passa para 90%, situação que permanece até hoje.

A nova realidade imposta ao setor provoca mudanças na empresa, entre elas, a reavaliação da linha de produtos, agora com maior valor agregado. A empresa concorre hoje com países da Europa onde os critérios de competitividade não se concentram somente no baixo custo da mão-de-obra, apesar de ainda ser um critério importante.

Com a adoção dessa estratégia, a empresa conseguiu fugir da concorrência no mercado de baixo custo e ainda obter uma certa vantagem sobre os novos concorrentes, pois, apesar de conseguirem fazer um calçado de qualidade semelhante, o custo da mão-de-obra no Brasil é menor que nesses países.

Evento crítico 3: Mudança no comportamento do consumidor

As novas exigências do mercado consumidor e as novas tecnologias impuseram mudanças às empresas, dentre elas, a redução dos lotes médios de produção e a maior variedade de modelos, exigindo um maior número de preparações (set-ups) e, conseqüentemente, um custo adicional devido à curva de aprendizagem para cada modelo ou linha.

O meio encontrado pela empresa para atender a essas novas exigências foi alterar a organização da produção. Isso foi possível através da terceirização e subcontratação de ateliês para confeccionar algumas partes dos calçados. Outra importante alteração foi a divisão da produção em minifábricas, organizadas de acordo com o tipo de modelo (sandálias, botas, sapato social ou casual). Com essas medidas a empresa conseguiu a flexibilidade produtiva e a alavancagem da produção.

Evento crítico 4: Incorporação de novas tecnologias

Para fabricar a nova linha de calçados, agora com mais qualidade, existia a necessidade de investimentos em inovações tecnológicas. Desse modo, aproveitando a expansão do crédito concedido pelo governo, e o câmbio valorizado que facilitou a importação, a empresa decidiu investir na modernização de seu parque industrial. As inovações se traduziram em inovações tecnológicas, gerenciais e de processo. As primeiras dizem respeito às modernas técnicas de administração da produção. Com a introdução dessas técnicas, houve uma redução no nível de refugos, perdas e retrabalho, além de um aumento significativo da produtividade. As inovações

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tecnológicas de processo, por sua vez, referem-se, principalmente, às tecnologias com base microeletrônica, como por exemplo, o sistema CAM (Manufatura Assistida por Computador), máquinas de bordar eletrônicas, máquinas de montar bico automáticas, etc.

O investimento nesses equipamentos propiciou diminuição dos custos de mão-de-obra, maior aproveitamento do couro, aumento de produtividade e maior qualidade dos produtos. Porém, como a utilização de máquinas não é possível em todas as etapas do processo produtivo, existe, até hoje, a necessidade da coexistência de novos e velhos processos de produção.

Devido à grande instabilidade de oferta de couros de qualidade, outra estratégia adotada pela empresa é manter grande quantidade de couro estocado, além disso, procura trabalhar com diversos fornecedores, não ficando, portanto, na dependência de conseguir essa importante matéria-prima na hora de fechar um pedido. Apesar de não ser aconselhável manter estoques, devido ao alto custo de manutenção, essa estratégia permite à empresa uma posição privilegiada perante a maioria de seus concorrentes que não possuem recursos para mantê-los, conseguindo com isso, além de fugir da fixação de preços pelos curtumes nacionais, atender pedidos de última hora, o que a favorece aos olhos das companhias de exportação.

Evento crítico 5: Participação dos gerentes nas decisões da empresa

Como a empresa trabalha somente com as companhias de exportação, fazendo sapatos sob encomenda, são os gerentes que fazem o levantamento da necessidade de matéria-prima e de máquinas e calculam o custo do sapato, após esse levantamento, os negociadores da empresa se reúnem com as companhias para o começo das negociações. Como a fase pré-negociação é muito importante, o líder decidiu dar maior autonomia aos gerentes, os quais passaram a influenciar as estratégias da organização e, com isso, conseguiu um maior envolvimento destes com os objetivos da organização.

Análise teórica do período II – de 1994 a 1998

A partir de 1995, através da mudança estratégica corporativa a empresa redefiniu seu core business: calçados de melhor qualidade, principalmente direcionado ao mercado americano.

A estratégia da empresa utilizada nesse período foi a de diferenciação aliada ao baixo custo (PORTER, 1986), com o suporte de estratégia funcional (WHEELWRIGHT, 1984), principalmente da área de produção.

De acordo com Mintzberg (1987), as estratégias adotadas no período estratégico II foram do tipo posicionamento, pois a organização, ao formular suas estratégias, considerou o contexto ambiental, encontrou seu posicionamento e o protegeu, mantendo, assim, a competitividade.

As estratégias implementadas nesse período, segundo a definição de Mintzberg & McHugh (1985), tiveram características emergentes, pois surgiram de mudanças não planejadas. O tomador de decisões não desenvolveu uma perspectiva de futuro, apenas percebeu o ambiente e agiu de acordo com esse ambiente.

Os resultados alcançados, com a adoção dessas estratégias, foram aumento da qualidade, maior agilidade na entrega dos lotes cada vez menores e mais diversificados, calçados com maior valor agregado o que, conseqüentemente, proporcionou maior preço.

Quanto ao comportamento adaptativo, no período II, a empresa apresentou características de organizações reativas, na medida em que seus dirigentes foram forçados a reagir a mudanças impostas por pressões ambientais.

Nesse período, segundo a tipologia de Hrebiniak & Joyce (1985), no que se refere à adaptação estratégica organizacional, foi do tipo II, ou seja, tanto a escolha estratégica quanto o determinismo ambiental são altos, definindo um contexto turbulento para a adaptação. Sob

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essas condições, existiram fatores externos que afetaram a tomada de decisão (principalmente o câmbio valorizado e concorrência da China), mas apesar disso, a organização mudou o foco para um mercado de maior qualidade e preço, ou seja, um mercado onde pudesse fugir da concorrência chinesa, através da diferenciação.

Período estratégico III: Reorientação planejada (1999-2002)

No período estratégico III, foi identificado 1 evento crítico: desvalorização cambial.

Evento crítico 1: Desvalorização cambial

A desvalorização cambial e as mudanças implementadas no período estratégico anterior proporcionaram à empresa uma certa tranqüilidade, podendo assim, dedicar-se com maior intensidade ao fortalecimento das relações dessa com os clientes.

A confiabilidade como fornecedor é uma dimensão muito importante para os exportadores de calçados, pois os relacionamentos com as companhias de exportação são baseados em preços e na confiança de que os fabricantes terão condições de cumprir prazos nas especificações e qualidade desejadas. Devido à seriedade da administração quanto à qualidade dos produtos e o cumprimento dos prazos estabelecidos, a empresa conquistou, ao longo dos anos, uma excelente reputação junto às companhias de exportação, apesar de essa parceria ainda se estabelecer em bases frágeis, dependente e competitiva, centrando-se praticamente em preços.

Em vista disso, ao longo de toda a sua existência, mas principalmente no final da década de 90, a estratégia utilizada foi o fortalecimento dessa imagem junto aos compradores. Esse fortalecimento se deu em função de um tratamento diferenciado dos principais negociadores da empresa junto às companhias, visto que quase todos as empresas do Vale dos Sinos concorrem pelos mesmos clientes.

Com essa estratégia, a empresa conseguiu, apesar da crise verificada no setor ao longo de toda a década, uma garantia de pedidos relativamente constante.

Análise teórica do período estratégico 3

Nesse período, de acordo com a classificação de Miles & Snow (1978), a empresa adota o comportamento prospector, quando os principais negociadores da empresa, através da observação do ambiente, perceberam que a confiabilidade como fornecedor, conquistada pela empresa ao longo dos anos, poderia ser utilizada em seu favor. O restante do período, entretanto, foi marcado por um comportamento defensivo, pois após as mudanças feitas no período II, não procuraram oportunidades fora de seu domínio, dedicando atenção apenas à melhoria de eficiência nas operações já existentes.

Para Porter (1986), quando a empresa adota a estratégia da diferenciação, procura ser única em sua indústria, ao longo das dimensões amplamente valorizadas pelos compradores. Passa a selecionar um ou mais atributos que os compradores consideram como importantes, posicionando-se singularmente para satisfazer essas necessidades e ser recompensada pela sua singularidade com um preço-prêmio. No caso da empresa X, o prêmio desse tratamento diferenciado ao cliente e da confiabilidade como fornecedor se traduzem na garantia de pedidos.

As condições para a adoção dessa estratégia já estavam formadas com as mudanças implementadas no período estratégico II e o momento favorável para as exportações com a desvalorização cambial, bastava fazer um trabalho mais focado no cliente, estabelecendo uma relação mais personalizada na venda, o que acabou sendo implementado.

A estratégia da empresa priorizada nesse período foi a de diferenciação aliada ao baixo custo (PORTER, 1986), com o suporte de estratégias funcionais (WHEELWRIGHT, 1984), principalmente da área de produção e vendas.

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Pela tipologia de Mintzberg (1987), a estratégia adotada foi do tipo deliberada, isto é, foi desenvolvida consciente e propositadamente pelos principais negociadores da empresa, quando perceberam as condições favoráveis e planejaram um melhor tratamento aos clientes, alcançando, dessa forma, os resultados pretendidos.

Pela De acordo com a tipologia de Hrebiniak & Joyce (1985), no que se refere à adaptação estratégica organizacional, foi identificado o tipo II, ou seja, com as mudanças implementadas no período estratégico II, optou por melhorias, ainda maiores, na qualidade dos produtos e por um melhor atendimento ao cliente, diferenciando-se dos concorrentes.

Conclusão

Este artigo propôs-se a compreender, o processo de adaptação estratégica de uma empresa exportadora do setor calçadista do Vale dos Sinos-RS, no período compreendido entre 1990 e 2002, baseado na interpretação dos fatos pelos atores organizacionais.

Observou-se que o processo de formulação das estratégias da empresa é fortemente embasado na figura da coalizão dominante, ou seja, o poder é centralizado. Esse grupo sempre decidiu os rumos da organização em função de sua percepção dos ambientes externo e interno (geral e específico).

A interpretação que a coalizão dominante fez das condições ambientais deu origem a um conjunto de estratégias deliberadas (planejadas, intencionais) e emergentes (padrões de decisões e ações surgindo incrementalmente, sem uma formulação prévia), que promoveram as mudanças estratégicas na organização, configurando o seu processo de adaptação estratégica organizacional. Essas mudanças estratégicas se distribuíram ao longo de três períodos estratégicos que marcaram o processo de evolução e transformação da organização.

Apesar de ter-se procurado destacar a predominância de um determinado comportamento estratégico sobre o outro, pôde-se concluir que a organização, para o desenvolvimento de seus negócios, apresentou, ao longo do período estudado, todos os tipos de comportamento estratégico, alterando-se de acordo com as exigências do ambiente. Isso comprova que o processo de adaptação estratégica exige das empresas um constante aprendizado de como se relacionar melhor com o meio ambiente onde estão inseridas.

Referências

GLASER, B.G. & STRAUSS, A.L. (1980). The discovery of grounded theory : strategies for qualitative research. New York: Aldine Publ.

HREBINIAK, L.G. & JOYCE, W.F. (1985). Organizational Adaptation: Strategic Choice and Environmental Determinism. Administrative Science Quarterly, v.30, set. 1985.

MILES, R.H. (1982). Coffin nails and corporate strategies. New Jersey: Prentice-Hall.

MILES, R.H. & SNOW, C.C. (1978). Organizational strategy, structure and process. New York: McGraw-Hill.

MINTZBERG, H. (1987). The Strategy Concept: Five P´s for Strategy. California Management Review, v. 30, n.1, p.11-24.

MINTZBERG, H. & McHUGH A. (1985). Strategy Formation in an Adhocracy.

Administrative Science Quarterly, v.30, p.160-197.

PORTER, M. E. (1986). Estratégia Competitiva: Técnicas para Análise da Indústria e da Concorrência. Rio de Janeiro: Campus.

WHEELWRIGHT, S. (1984). Manufacturing through strategy: defining the missing link.

Strategic Management Journal, v. 5. p. 77-91.

Referências

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