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O DIA EM QUE AYRTON SENNA NÃO MORREU NA TAMBURELLO

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O DIA EM QUE AYRTON SENNA NÃO MORREU NA

TAMBURELLO

Posted on 17 de setembro de 2020 by Paulo Antonio Papini

Categories: Artigos, Colunistas, Cultura, Paulo Papini

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Lembro como se fosse hoje...

1º de maio de 1994, Ayrton Senna morreu ao chocar-se, a 300km/h, contra um muro de concreto na curva Tamburello, no Grande Prêmio de San Marino. Lembro dos comentaristas esportivos e de Nelson Piquet narrando o trágico evento; das investigações que seriam realizadas depois para descobrir as causas do acidente; de toda a comoção gerada pela sua morte.

Não, eu não estou louco. Isso aconteceu. Foi a história acontecendo na minha frente! Sei que faz muitos anos e hoje sou um idoso, sei também que a memória é traiçoeira e, com o passar do tempo, costuma nos pregar peças. Sei de tudo isso, mas sei também o quão real são para mim aquelas lembranças.

É que hoje, ao abrir as redes sociais descubro que Senna não morreu, continuou sua carreira como piloto (até se tornar pentacampeão mundial, 94 e 95) e depois como empresário e filantropo, e frequentemente o vemos dar entrevistas na TV e na Internet.

Ocorre que eu, como outras milhões de pessoas, assisti sua morte ao vivo. Esse é o fato...

Nos treinos classificatórios daquele grande prêmio, Roland Ratzenberger se acidentou e morreu;

Rubens Barrichello sofreu um grave acidente. Anos antes, Gerard Berger e Nelson Piquet também se acidentaram na mesma Curva Tamburello. Tudo isso foi – simplesmente – apagado dos manuais esportivos e dos registros históricos.

Tenho uma teoria para isso. Se já não fosse um idoso, que pudesse ser desacreditado pela minha senilidade, que pudesse ser julgado e banido permanentemente de toda e qualquer rede social, sem direito a fazer uma live sequer para conversar com minha família e amigos... Lembro que essa, seguramente, é a pior e mais desumana pena que se pode infringir às pessoas, mormente quando os decretos de lockdown e isolamento social iniciados nos anos de 2020 foram sendo reeditados, ano após ano, até integrarem – não como exceção – mas como regra geral de todos ordenamentos jurídicos constitucionais do mundo ocidental.

A simples conversa, ainda que indireta, pode ser severamente punida. Veja: um “proscrito” fala para alguém o que ele quer que seja publicado. Se descoberto, gera a proscrição, também, daquele que o ajudou. Não são incomuns casos de proscritos que morrem de fome, ou por falta de remédios e/ou atendimento médico, em razão do medo de qualquer mínimo contato com eles.

São penas graves, sim, mas foram feitas com a finalidade de combater um mal maior, qual seja, a disseminação de desinformações ou, como preferem os amantes da língua inglesa: Fake News, bem como os Hate Crimes.

Sim, nos plebiscitos e debates públicos que ocorreram, fui um enfático defensor das penas de banimento a quem cometesse aquele odioso crime. O argumento era lógico, científico, corroborado por dissertações de mestrado e teses de doutoramento. O banimento digital dos propagadores de

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Fake News ia ao encontro dos Direitos Fundamentais a um meio ambiente saudável, à saúde pública e à vida.

Que tipo de canalha seria contrário a essa criminalização? Aliás, os defensores da ‘restrição digital’

(esse era o termo), tinham o lógico argumento de que a medida não era violadora de Direitos Fundamentais; eram, em suma, um mecanismo de proteção aos mesmos.

Ora, a humanidade sobreviveu por oitenta mil anos sem computadores, tablets e smartphones, por que alguns poucos que forem restritos desses aparelhos iriam morrer? Poderiam continuar

interagindo com as outras pessoas. Ademais, seria como deixar condenados por crimes graves terem acesso às armas de fogo.

Na prática, não foi bem isso que aconteceu. Pessoas que moravam na mesma casa, ou trabalhavam nos mesmos locais que os proscritos, também tinham problemas na hora de conseguir crédito e, com frequência, sofriam ameaças de bloqueio de redes sociais. Cada telemóvel, cada aparelho de televisão, cada dispositivo eletrônico (principalmente com o advento da internet 16G) também nos filmava e mandava nossas imagens, tanto para agências de publicidade e bancos, quanto para órgãos do governo (obviamente que isso era negado, de forma peremptória, pelas autoridades).

Embora não fosse (abertamente) declarado, e o uso indevido desses dados fosse até mesmo tipificado criminalmente, o fato é que todos sabiam que se você fosse flagrado com um proscrito sua vida ficaria muito, mas muito mais difícil. Conseguir autorizações para deixar o país (ou mesmo sua cidade), concessões de crédito, vales alimentares, ou mesmo coisas simples, como ter acesso às moedas digitais e à sua conta bancária tornar-se-iam um martírio.

A pressão contra aqueles que conviviam – fisicamente – com os proscritos era tão grande, e tão devastadora, que, em não muito tempo, viver sob o mesmo teto que um deles lhe transformaria (num prazo relativamente curto) em mais um proscrito.

Essa engenharia social digital foi responsável pelo movimento que convencionou-se chamar:

‘Expulsão dos Filhos Pródigos’. Pais cortavam relações com seus filhos, esposas com seus maridos, irmãos. Enfim, se você fosse um proscrito ou, se ao menos fosse investigado pelas Agências

Checadoras de Fatos, provavelmente as pessoas que lhe eram mais próximas (pais, mães, melhores amigos, namoradas, irmãos) lhe virariam a cara, talvez elas próprias o denunciassem.

Na verdade, a maior parte das denúncias vinham de amigos e familiares. Eu mesmo, e não tenho orgulho de dizer isso, por vezes denunciei alguns amigos e parentes. À época em que agi como um alcagueta procurei me convencer de que fizera aquilo em nome de um mundo melhor. Todos sabiam que isso era mentira. Na realidade, embora tenha vergonha de o admitir em voz alta – até hoje –, sei que minhas delações tinham o único intuito de me fornecer benefícios materiais e, eventualmente, algum respeito social que viria com uma Good Citizen Medal.

Sim, aqueles que denunciavam propagadores de Fake News e ‘Mensagens de Ódio’ – conceitos

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estes que, até hoje, são vagos e indeterminados – não apenas se blindariam contra eventuais investigações como, também, recebiam prêmios e incentivos estatais, além de ter facilitado o acesso a créditos e autorizações de viagens ou, ainda, para montar pequenos negócios.

Delatar havia deixado de ser um mecanismo de autoproteção para tornar-se um meio de vida e uma importante fonte de renda para grande parte da sociedade.

Mas, novamente diziam os humanistas, que mal haveria nisso? Seria crime um homem ganhar dinheiro fazendo o que ama, tal como um policial, um médico, um advogado? Delatores não praticavam esses atos por ganância ou qualquer outro motivo mesquinho, mas por um profundo amor à Verdade e ao mundo em que vivemos. Não é natural, quase darwiniano diriam alguns (e novamente Darwin seria invocado para justificar regimes totalitários), que um homem lucrasse com aquilo que lhe dá prazer?!

Na verdade, a sociedade em que vivemos virou algo muito parecido com a Alemanha Oriental antes da queda do Muro de Berlim (e para quem chegou a essa parte da carta e tem algum grau de

curiosidade, a Queda do Muro de Berlim também fora apagada da história e dos registros digitais).

Cidadãos comuns, pais de família e amigos convertiam-se – voluntariamente – em carrascos e delatores oficiais do Estado e o faziam acreditando estar, dessa forma, contribuindo para o tal

“Mundo Melhor”; ou ao menos tingiam sua ganância e covardia com as cores do altruísmo.

Não sei exatamente qual escritor que li em minha juventude que dissera: ‘tenho medo dos altruístas, as maiores carnificinas pelas quais passou a humanidade aconteceram em nome de causas nobres’.

As Agências Checadoras de Fatos são outro capítulo importante nesta história. Nascidas na primeira década do Século XXI com a finalidade de distinguir o falso do verdadeiro na Internet, com a Era das Pandemias, iniciada em 2020, elas passariam a ter Poder de Polícia, podendo efetuar prisões sem ordens judiciais, sem ter a obrigatoriedade de fornecer um advogado aos acusados (aliás, advogar para um proscrito também poderia ser categorizado como crime, também passível de restrição digital), por prazo indefinido.

Não, não era dado ao acusado o direito de explicar-se a um magistrado, em prazo curto, tal como orientado pelos Tratados Internacionais de Direitos Humanos! As Fake News punham em causa todo o sistema protetivo de Direitos Fundamentais, de sorte que, para protegê-los, far-se-ia necessária a sua não aplicação obrigatória em relação ao Crime of all Crimes. O inglês, no Século XXI, substituíra o latim como a língua empregada no Direito para emprestar gravidade e

respeitabilidade a algum conceito, ainda que o mesmo nada mais fosse que um simples slogan.

Aliás, tal como acontecera no mundo pós 11 de setembro de 2001, os princípios de Direito Penal seriam invertidos. A presunção de inocência transformar-se-ia (para os casos de propagação de Fake News e Hate Crimes – nada como uma palavra em inglês para emprestar um ar legitimidade a qualquer coisa!) em presunção de culpa; tudo isso, por incrível que pareça, com o apoio de

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advogados garantistas e de entidades defensoras de Direitos Humanos.

O princípio em questão também era provido de uma lógica inquestionável. Como podemos ter um sistema jurídico que prevê a garantia das liberdades plenas, dos direitos ao contraditório e à ampla defesa, se os fatos que ensejam a criação das normas jurídicas são deturpados pelas Fake News.

Assim, o entendimento da comunidade jurídica era que uma norma que nascesse de uma fonte viciada estaria, de igual modo, comprometida, razão pela qual a – imperiosa e urgente –

necessidade de atacar o problema em sua origem, isto é, perseguindo implacavelmente os perpetradores de Fake News e Hate Crimes.

(Não sei quanto a vocês, mas eu quase me convenço, ainda hoje e, ainda que tenha visto tudo o que vi, dessa inexorável lógica quando vejo o nome desses tipos penais em língua inglesa. Com efeito

“crimes de ódio” e “notícias falsas”, ditos em qualquer idioma neolatino, não teriam o condão de encerrar o quão grave e singular seriam aquelas condutas!)

Na realidade, diziam os garantistas, a criminalização severa das Fake News era um meio de se proteger a própria higidez do Ordenamento Jurídico voltado à proteção plena dos Direitos Humanos, a um meio ambiente saudável e – principalmente – da Saúde Pública. A palavra de Ordem no mundo a partir de 2020 passou a ser “Saúde Pública”. Em nome dela tudo seria válido e lícito.

Eu mesmo escrevi artigos e papers defendendo, de forma enfática, a criminalização severa do crime de propagação de Fake News. Se o terrorismo foi a ameaça que atingiu a civilização em 11 de

setembro de 2001, Fake News e Hate Crimes cumpririam aquele papel a partir do início da segunda década do Século XXI.

Bem, como eu já falei nesse documento à posteridade (num mundo onde as pessoas,

sistematicamente, perderam a capacidade de ler um texto com mais de 100 palavras, pergunto-me, qual a utilidade dessa missiva?), as pessoas banidas digitalmente, popularmente chamada de

proscritos, após serem expulsas de suas casas pela própria família (e hoje me culpo por ter apoiado esse tipo de barbaridade) viravam mendigos, nas grandes cidades e, após um tempo, desapareciam.

Diversos boatos existiam sobre seus destinos. Foram mortos e transformados em ração para pets, diziam uns; outros que foram viver em favelas às margens da sociedade, ou, simplesmente, que se tornaram socialmente invisíveis. Particularmente, fico com a última teoria, embora ache que nunca saberemos a verdade.

Na verdade, indagar sobre o paradeiro dessas pessoas, ainda que em conversas verbais, seria o bastante para trazer agentes armados das Agências às suas casas. A tecnologia ficou sofisticada e câmeras captavam leituras labiais. Ainda que você use uma máscara, é possível a uma Agência saber o que você está murmurando, acredite.

A Liberdade de Pensamento precisa ser restringida. Essa é outra questão importante da nossa era,

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ou ao menos do que sobrou dela. Havia no Século XX um livro (banido em nome da proteção aos Direitos Fundamentais) escrito por um tal W.S. (e é só o que se sabe desse autor, se é que o livro e ele de fato existiram) que abordava uma realidade, ficcional ao que parece, em que as pessoas poderiam ser enquadradas por terem pensamentos nocivos ao Estado.

Hoje a tecnologia refinou-se ao ponto de tornar isso possível. A leitura feita em microssegundos de nossas contrações faciais e o dilatar de nossas pupilas poderiam ser cruzadas com nossas fotos e vídeos em Redes Sociais, para assim permitir, com uma margem de erro próxima a zero, inferir se estávamos – ainda que internamente – questionando as decisões de Cortes Constitucionais (mesmo quando estas contrariavam, sem pudor algum, o Texto da Norma), e motivar prisões efetuadas pelas Agências. Noutros termos, não bastava apenas que silenciássemos sobre os abusos que víamos e sofríamos todos os dias, precisávamos acreditar que aquele era o melhor dos mundos possíveis. Era imperioso que acreditássemos nisso!

Sim, eu falei acima que a utilização de nossos dados pessoais de forma não autorizada seria ilegal.

Ocorre que todos esses processos nasciam de supostas denúncias anônimas e os processos nos quais elas estavam inseridas eram sigilosos. Sequer os advogados dos indiciados tinham acesso aos mesmos.

E, mesmo quando excepcionalmente pudessem ler e peticionar, o formato dos processos era digital, e aí residia outro problema. A A.I. que controlava os Tribunais e Agências teria, assim diziam, de customizar o processo para quem o estivesse lendo. Então, poderia acontecer de que eu, como advogado, escrevesse a, lesse que escrevi a, mas para fins de registro, o Sistema poderia constar que eu teria escrito b.

Isso implicava que eu poderia declarar um cliente meu como inocente, eu leria isso no processo, o cliente leria isso no processo; mas para fins de registros oficiais, o que constaria nos autos do processo era que declarei meu cliente como culpado, com a anuência deste que concordara por escrito com o arrazoado apresentado pelo seu defensor.

Sei que vocês que leem isso devem pensar que é um exagero. Esse problema seria resolvido com a simples impressão dos processos em meios físicos. Não é bem assim que funcionava. Por questões ambientais (diziam que o planeta passava por um processo de superaquecimento que poderia dizimar a humanidade em menos de duas décadas, não obstante ouço essa conversa desde a década de 1980 do Século XX) a impressão de documentos digitais havia se tornado proibida. Além do mais, a impressão de um documento digital como meio de se verificar a correção do Sistema e, possivelmente, auditá-lo, era algo que afetaria a sua própria credibilidade e transparência, razão pela qual a impressão de qualquer processo se tornou um crime inafiançável e, se praticada por um advogado, significaria sua imediata – sem direito a contraditório e ampla defesa – expulsão do respectivo órgão de classe a que estivesse vinculado.

Mesmo assim, passei minha vida acreditando no Estado de Direito e gosto de pensar que devo ter

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feito a diferença na vida de alguém. Temos que corrigir os erros dentro da lei, era o que dizíamos.

Ainda que víssemos nossos colegas, amigos e professores serem processados e terem suas vidas destruídas por terem a audácia de questionar uma decisão oriunda de Cortes Constitucionais ou, pior ainda, de Órgãos Supranacionais. Ainda assim, sempre fui um ferrenho defensor da lei e tive a certeza de que esse era o bom combate, o lado correto da trincheira. A luta contra as instituições através das instituições, isso foi o que sempre defendi. Hoje não sei se estava correto, mas era o máximo que poderia fazer.

Ainda sobre a questão da morte de Ayrton Senna. Bem, espero que me perdoem, fiz essa digressão e acabei fugindo do que queria dizer. Como é que posso ter tanta certeza de que Senna morrera na curva Tamburello? Aliás, a primeira pergunta: por que iriam criar essa falsa memória nas pessoas, alterando a história?

Respondamos a essa pergunta em primeiro lugar: Panis et circenses. Pão e circo, em latim. Sim, sou das últimas gerações que teve classes de Direito Romano e Latim na graduação. Hoje considera-se o ensino dessas disciplinas, além de inútil, politicamente incorreto para com os povos vítimas de movimentos imperialistas, algo que afeta os espaços-seguros que as Universidades devem

representar aos seus alunos. Também por essa razão foram abolidas as provas escritas e as provas testes passaram a ter apenas duas alternativas. Qualquer coisa além disso era considerado um privilégio indevido e uma forma de discriminação e preconceito contra as minorias.

Bem, minha teoria sobre a morte de Ayrton Senna: as pessoas precisam de fantasias, de heróis comuns nos quais possam acreditar. Talvez seja mais fácil para A.I. que nos controla (e temos aí uma importante questão: quem são os Donos do Poder? É o deep state que controla essa A.I. ou, por outra, é ela que também os controla?) manter a população domesticada se nos forem dados mitos comuns nos quais devemos acreditar.

Pode ser loucura da minha parte? Talvez esteja, como falei logo no começo, senil? Provavelmente sim, razão pela qual seriam desnecessários o gasto de recursos com prisões, processos, mais fácil deixar um velho gagá gritando para as paredes, convencendo seus cachorros ou escrevendo cartas que não serão lidas por ninguém.

Não descarto essa possibilidade, a de não saber mais o que é real e o que não o é. Mas, no caso específico desse ídolo do esporte, temos a seguinte questão que ninguém responde, ou melhor dizendo, que ninguém se faz: como Ayrton Senna pode ter sido pentacampeão de Fórmula 1,

ganhando o título nos anos de 1994 e 1995, se Michael Schumacher continua com seus sete títulos?

O piloto alemão também fora campeão naqueles anos e isso também consta de sua biografia oficial.

Ao que consta ninguém se questiona em relação a esta evidente – e óbvia – contradição. É pior, quando tenho coragem de questionar isso aos mais jovens, nos raríssimos locais inalcançados pelas câmeras, invariavelmente ouço a seguinte resposta: “não quer o chapeuzinho de Napoleão, vovô”, ou, por vezes, algo mais agressivo como: “cala a boca, velho de merda, para de falar besteira.”.

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Fodam-se, retardados e covardes filhos das putas. Ratos que não têm coragem de enxergar, e questionar, o óbvio. Isso é o que tenho vontade de responder. A reação que gosto de pensar que teria se tivesse um quarto de século a menos, mas...,tenho medo. Medo de perder o quase-nada que me restou, medo de também me tornar socialmente invisível. Chega o triste momento em que você prefere o desprezo ao esquecimento, a vergonha à solidão.

Nesses momentos, quando vejo o olhar injetado de raiva daqueles que veem em mim alguém disposto a enfrentar a ‘Verdade Oficial’, me calo e finjo acreditar na mentira e até comento sobre o heptacampeonato improvável de Michael Schumacher. É vergonhoso ter medo? Claro que o é. Mas, de certa forma, esse medo, esse aceitar humilhações, essa anuência para com a mentira é o que nos permite, a todos, ficarmos vivos.

Sim, aqueles que têm raiva, quase que um ódio à minha pessoa por contestar fatos históricos, têm esse sentimento apenas e tão-somente por saberem que, no fundo, falo a verdade.

Ninguém em seu juízo perfeito ficaria tal alterado, psicologicamente alterado, com as bobagens ditas por quem, provavelmente, já apresenta os primeiros sinais de Alzheimer (da mesma forma que eu não me irritava com meu bisavô, que não acreditava que o homem teria pisado na Lua).

Realmente, não há muito sentido em ter raiva de alguém que diz uma enorme bobagem. Tive uma carreira de 40 anos como professor e advogado e quando um aluno dizia algo muito estúpido, o sentimento que me vinha era o de misericórdia. O mesmo se dava na advocacia. Quando meu oponente, no Tribunal, dizia algo sem fundamento técnico algum, vários sentimentos se misturavam: felicidade, por saber que a vitória seria fácil; comiseração, por ver um Colega de profissão com tão pouca qualificação intelectual; curiosidade, em saber como alguém tão

despreparado conseguia convencer alguém a contratá-lo. Ocorre que a única coisa que não sentia por aquele profissional era raiva.

Hoje, a ira que vejo nos jovens, nos breves instantes em que os confronto com a realidade...sim, depois eu me acovardo e recuo em minhas posições. Julguem-me aqueles que quiserem, mas o temor pela sobrevivência ao dia seguinte fez de mim um homem assustado. Não tenho orgulho de tão pusilânime forma de agir. E como já aqui confessei coisas que não teria coragem de dizer em frente a um espelho; sim, já denunciei amigos para as Agências.

Pior, denunciei amigos que sabia não terem cometido crime algum, apenas e tão-somente para dissipar alguma suspeita que pairava sobre mim e, como subproduto, ter acesso a melhores

serviços, rações alimentares, remédios, enfim. Não, nunca me apresentei como o herói desse texto.

Talvez eu queira apenas, neste momento, resolver alguma pendência com o Criador, considerando ser uma porta que, em breve, baterei.

Não sou herói algum, ok. Se você fez essa inferência não entendeu o conteúdo dessa carta. Não é – tampouco tem a intenção de o ser – uma autobiografia. É apenas o testemunho de alguém que viu o mundo em seus tempos áureos, no esplendor do Século XX, e de repente, viu tudo o que

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conhecia desfazer sobre seus pés.

Em dados momentos vejo minha geração como os dinossauros extintos com o meteoro que caiu em Yucatán há 65 milhões de anos. Foram pegos de surpresa sem prévio aviso algum. Não, quero dizer, os répteis gigantes foram; nossa geração não. Pequenos sinais nos eram dados por todo o tempo de que períodos totalitários, como esse que vivemos, chegariam. Nós que preferimos nos acomodar.

Estávamos tão acostumados à opulência e aos direitos que nos foram entregues (vejam bem, nos foram entregues, não conquistamos nada, nossos pais e avós o fizeram em guerras e revoluções, nós apenas os herdamos e os tratamos da forma, geralmente displicente, que os filhos de pais ricos tratam seu dinheiro), que pensávamos que eram algo inerente à nossa existência, como o

crescimento contínuo de nossas unhas, por exemplo. Sequer imaginávamos, eu sequer fazia ideia, do quão frágeis eram os pilares que sustentavam a sociedade

Bem, estava falando dos momentos em que confronto os mais jovens com a realidade, com fatos simples, como, por exemplo, que Ayrton Senna falecera em 1 de maio de 1994 e foi campeão mundial de Fórmula 1 três, e não cinco vezes.

A postura irascível desses jovens é parecida quando eu via um cliente ser confrontado com o fato de que estava sendo roubado pelo sócio, ou traído pela esposa. Não era incomum que o cliente rescindisse seu contrato com meu escritório e me culpasse por descobrir o fato, e não pelo próprio fato. É exatamente essa expressão que vejo nas pessoas quando tenho lampejos de coragem e as ofereço à realidade.

Por um microssegundo eu leio que elas pensam: “eu sei que esse filho da puta está falando a verdade, quer dizer que fui enganado em toda a minha vida; minha vida inteira é uma mentira”. As vezes penso: o que aconteceria se eu mantivesse firme minha posição? Se não me acovardasse?

Começaria uma revolução? Talvez? Muito improvável! Possivelmente acabaria preso, ou morto.

(Há momentos em que me pego sorrindo, imaginando iniciar uma revolução. Aquilo é quase meu universo particular, um mundo meu onde os bravos prevaleceram e restituíram a verdade. Tudo isso é impossível, hoje sabemos, mas por vezes eu quase vejo essas cenas na minha frente e, por um Tempo de Planck eu acredito que aquilo é a realidade e nosso mundo é um pesadelo. Talvez existam universos paralelos?! Talvez o Século XXI seja o Oitavo Círculo do Inferno?! Nunca saberemos.)

Tudo que aqui digo parece inverossímil, vocês devem pensar. Será que não existe um único lugar sequer que seja o depositário dos fatos tal como eles aconteceram? Calma, eles existem...sim, existem.

Até hoje são feitos trabalhos de Mestrado e Doutorado sobre temas espinhosos como a

“desinformação” e a “vida e morte das celebridades”, mas, convenhamos, são trabalhos aos quais

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pouquíssimas pessoas têm interesse, um número menor ainda tem acesso, e outro grupo, mais diminuto ainda, consegue entender.

Isto é, provavelmente já não há mais ninguém lendo essa mensagem.

É estatisticamente comprovado que vivemos num mundo onde mais de 90% das pessoas desistem de um texto, ou dispersam, após a centésima palavra. Imaginar que alguém irá ler um trabalho acadêmico de 500 páginas, com mais de 90.000 palavras é quase uma fantasia.

Mesmo que alguém o faça, ao citar os trabalhos que confirmam, por exemplo, a morte de Ayrton Senna, dentre outros assuntos oficialmente sensíveis (censura foi substituída por esse eufemístico termo), teria que conhecer profundamente aquele trabalho pois seria arguido numa banca, tal como num trabalho acadêmico; com a sútil diferença de que – no paper acadêmico – a intenção dos seus arguentes é a sua aprovação; já na acusação de Fake News (e a interpretação equivocada de uma tese de doutoramento também enquadra-se nesse tipo penal) o desiderato da Agência é apenas o de comprovar sua prática criminosa e impingir-lhe o peso da Lei, em decorrência dos seus atos.

Tinha um amigo que dizia que o mundo é um lugar perigoso para se viver; hoje ele diria que o mundo é um lugar perigoso para se interpretar textos acadêmicos.

Com as bibliotecas acontece o mesmo. Não, elas não foram destruídas, como poderiam supor alguns. Ocorre que as pessoas simplesmente perderam a capacidade de leitura e, ao retirar um livro numa biblioteca você ficará fichado. Em suma, corremos o risco de aumentarmos nossas chances de sermos presos pela Agência e, após, sermos banidos digitalmente por conta de um livro que, provavelmente, não temos mais condições intelectuais de ler e compreender.

Os livros são proibidos? Com exceção de alguns pouquíssimos, a maior parte não, mas tudo o que disse acima sobre uma interpretação errada de um trabalho acadêmico aplica-se, também, a uma obra literária.

Não apenas a capacidade de leitura desaparece, percebo que a capacidade de falar, de formular raciocínios complexos, está cada vez mais comprometida. Talvez o fato das pessoas, desde 2020, serem compulsoriamente obrigadas a usar máscaras, associado com os inúmeros métodos de distração dos seres humanos em redes sociais, sejam responsáveis por estarmos a perder a capacidade de falar.

Não, o ser humano ainda não deixou de falar. Ainda. Mas é perceptível que as frases são cada vez mais curtas, cada vez com maior quantidade de erros gramaticais e de concordância, cada vez com uma quantidade maior de palavras repetidas.

Vejo homens adultos com uma oratória comparável à de uma criança de 10 anos em minha época de infância e adolescência. De vez em quando percebo que alguns deles soltam grunhidos no meio de uma frase.

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Esse é outro assunto sensível e, apenas pensar sobre ele, pode custar-lhe muito caro, do ponto de vista da perda de permissões.

Sim, os Tratados de Direito para Tempos de Pandemia estabeleceram, de forma muito clara, que temos permissões das mais variadas. Assim, o termo direito foi substituído por algo que pode ser- lhe concedido por ato de voluntarismo de alguém (normalmente o Estado, grandes Corporações e a Agência).

Apesar de ser um assunto proibido, é visível que a linguagem foi empobrecida e as pessoas estão abrutalhadas, não necessariamente sob o aspecto físico (tampouco ficaram mais corajosas, muito ao contrário); mas no plano intelectual.

Ora, pensamos por palavras e se elas nos são, de forma sistêmica, roubadas, seja pela aniquilação da cultura, seja pelas máscaras que dificulta nossa respiração e, por conseguinte, nossa vontade de engatar uma conversa, começamos a ficar menos inteligentes, começamos a perder aquilo que faz de nós humanos.

Alguns pesquisadores diziam, antes dos memes dominarem as comunicações, que os neandertais eram mais inteligentes que os humanos modernos e, mesmo assim, não sobreviveram ao homo sapiens.

Pergunto-me se, eventualmente, não estamos no declínio de nossa espécie e não estamos sendo (numa espécie de seleção natural acelerada por interesses externos) transformados numa espécie inferior aos sapiens, tal como esses eram inferiores aos neandertais? É totalmente improvável?

Sinceramente, não sei.

Por ora, cabe a mim – talvez como o lenitivo necessário nessa fase final da minha vida – acreditar na grandeza do Espírito Humano e na capacidade de superação da nossa espécie, por mais improvável que possa parecer. Wishful thinking? Quase que com certeza.

Talvez queira me iludir, e provavelmente estou mesmo me enganando, mas há momentos em que, ao ouvir um grupo de jovens grunhindo, percebo, sutilmente, o pronunciar de uma proparoxítona.

– Paulo Antonio Papini – Advogado e Professor. Um conservador inconformado com o rumo das coisas.

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