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ECLI:PT:STJ:2009:08S3918.AF

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ECLI:PT:STJ:2009:08S3918.AF

http://jurisprudencia.csm.org.pt/ecli/ECLI:PT:STJ:2009:08S3918.AF

Relator Nº do Documento

Sousa Peixoto sj200909230039184

Apenso Data do Acordão

23/09/2009

Data de decisão sumária Votação

unanimidade

Tribunal de recurso Processo de recurso

Data Recurso

Referência de processo de recurso Nivel de acesso Público

Meio Processual Decisão

Revista concedida revista

Indicações eventuais Área Temática

Referencias Internacionais

Jurisprudência Nacional

Legislação Comunitária

Legislação Estrangeira

Descritores

praticante desportivo; acidente de trabalho; contrato de seguro;

(2)

Sumário:

1. Tendo o sinistrado, praticante desportivo profissional, ficado afectado, em consequência de acidente de trabalho, de uma IPP de 5%, com incapacidade permanente absoluta para o trabalho habitual, e não constando das Condições da apólice a exclusão da responsabilidade da seguradora relativamente à incapacidade permanente absoluta para o trabalho habitual (IPTAH), a seguradora responde, em função do salário transferido, pelo pagamento da pensão correspondente àquelas duas incapacidades e não só pelo pagamento da pensão correspondente à IPP de 5%,

independentemente da idade do sinistrado.

2. A Grelha de Comutação anexa ao contrato de seguro não exclui a responsabilidade decorrente da IPATH.

Decisão Integral:

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça:

1. Os presentes autos prendem-se com um acidente de trabalho sofrido por AA, no dia 28 de Julho de 2001, em C... do B..., quando, remunerada e subordinadamente, trabalhava para o Clube de Futebol E... da A..., exercendo as funções de guarda-redes de futebol.

O processo passou à fase contenciosa pelo facto da entidade empregadora e da Companhia de Seguros F... M..., S. A., que entre si tinham celebrado um contrato de seguro do ramo acidentes de trabalho, não terem concordado com a incapacidade que o perito médico atribuiu ao sinistrado (incapacidade permanente de 5% com incapacidade permanente absoluta para o trabalho habitual) e pelo facto da primeira delas entender que sobre a segunda recaía a obrigação pela reparação integral do acidente.

Só a ré seguradora contestou, tendo alegado, em resumo, o seguinte:

- aceita, como sempre aceitou, a caracterização do acidente como sendo de trabalho e também aceita o nexo de causalidade entre o acidente as lesões descritas no auto de exame médico realizado pelo perito do tribunal;

- aceita ainda a sua responsabilidade, limitada nos termos e condições do contrato de seguro e em função da retribuição transferida;

- não aceita a avaliação da incapacidade atribuída ao sinistrado pelo perito médico do tribunal;

- a retribuição anual transferida pelo contrato de seguro era apenas de 11.000.000$00;

- o contrato de seguro foi celebrado de harmonia com o CCT acordado entre a Liga Portuguesa de Futebol e o Sindicato dos Jogadores Profissionais de Futebol e o protocolo celebrado entre a Desporto Seguro - Mediadora dos Clubes Portugueses e seus associados e a ré;

- no anexo 1, pontos 3 e 6 desse protocolo ficou consignado que, em caso de invalidez permanente para a actividade específica de atleta profissional e para efeitos do cálculo da respectiva pensão, seria considerada a grelha de comutação apensa ao protocolo e o limite máximo de 15 salários mínimos nacionais;

- no caso de vir a confirmar-se, em junta médica, que o sinistrado é portador de uma IPP de 5%

com IPTH, ele apenas teria direito a ser ressarcido pela seguradora em função de uma IPP simples de 5%, por aplicação da referida tabela de comutação, nos termos contratuais celebrados,

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considerando-se o salário transferido com o limite de 15 salários mínimos nacionais e a sua idade;

- tais limitações na responsabilidade transferida prendiam-se com o facto do regime geral da LAT, antes da publicação da Lei n.º 8/2003, de 12 de Maio (e não Lei n.º 24/03, de 24 de Julho, como por lapso é dito pela seguradora), que veio estabelecer um regime específico relativo à reparação dos danos emergentes de acidentes de trabalho dos praticantes desportivos profissionais, não ter sido pensado para profissões de desgaste rápido, de baixa média etária que são objecto de carreiras cuja duração é bastante inferior às demais carreiras profissionais e ao facto do futebol, enquanto desporto de alta competição, propiciar a ocorrência de acidentes de trabalho que determinam incapacidades permanentes, ainda que mínimas e sem significado para outras profissões, que impedem o exercício daquela exigente actividade;

- as referidas limitações influenciaram decisivamente as condições do contrato de seguro no que concerne à redução do respectivo prémio;

- a seguradora limitou-se a aceitar – sem se intrometer na eventual legalidade das mencionadas limitações – a responsabilidade que a Liga e o Clube para ela entenderam transferir, sendo certo que o inquestionável carácter parcial no que respeita a eventuais situações de incapacidade permanente, não difere substancialmente das situações, frequentemente verificadas, em que as entidade patronais transferem para as seguradoras apenas parte do salário dos seus

trabalhadores.

Saneada, condensada, instruída a causa, procedeu-se julgamento e, no apenso para fixação do grau de incapacidade, decidiu-se que o sinistrado era portador da IPP de 5% com Incapacidade permanente absoluta para o trabalho habitual.

Na sentença, posteriormente proferida, decidiu-se que o sinistrado autor tinha direito a uma pensão anual e vitalícia de € 30.314,45, com efeitos a partir de 22.2.2003, e a um subsídio de elevada incapacidade permanente no montante de € 4.279,20, tendo sido a ré Companhia de Seguros F...

M... condenada a pagar ao sinistrado o referido subsídio e a quota- -parte de 92,3% da referida pensão anual e vitalícia, no valor de € 27.982,56, correspondente ao salário para ela transferido pelo contrato de seguro, e o réu Clube de Futebol E... da A... condenado a pagar ao sinistrado a quota-parte de 7,7% da mesma pensão anual e vitalícia, no montante de € 2.331,88, e os dois condenados a pagar os juros de mora vencidos e vincendos.

Para decidir dessa forma, a M.ma Juíza considerou que a única questão em apreço era a de saber qual era o limite máximo da pensão a atribuir ao sinistrado; que essa questão devia ser resolvida ao abrigo da Lei n.º 8/2003, de 12 de Maio; que, atenta a idade do sinistrado (35 anos), a incapacidade permanente de que ele ficou afectado (5% com IPATH), a retribuição anual de € 59.440,09 que auferia, à data do acidente, e o salário mínimo vigente na mesma data, o mesmo tinha direito a uma pensão anual e vitalícia no montante de € 30.314,45; que esta pensão não excedia o limite previsto no art.º 2.º, n.º 2, alínea b), da referida Lei e que a seguradora era responsável na medida do salário de € 54.867,77 que para ele tinha sido transferido, respondendo a entidade empregadora pela diferença.

A Companhia de Seguros recorreu da sentença, por discordar do montante da pensão e do valor do subsídio por situação de elevada incapacidade, alegando, em síntese, o seguinte:

- a pensão foi calculada de acordo com os critérios legais, mas o regime geral da lei dos acidentes

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de trabalho não foi pensado para as chamadas profissões de desgaste rápido, como é o caso dos futebolistas profissionais;

- a equidade, o bom senso e a criteriosa ponderação exigem que, nestas profissões, a

indemnização tenha em consideração esse facto, uma vez que a indemnização atribuída deve representar um capital que se extinga no fim da vida activa e seja susceptível de garantir durante esta as prestações periódicas correspondentes à perda de ganho;

- assim, a indemnização devida ao sinistrado deve ser calculada em função apenas da IPP de 5%, sem incapacidade para o trabalho habitual, uma vez que o sinistrado já tinha mais de 35 anos, à data da fixação da pensão, ou seja, à pensão anual de € 1.397,87, a que corresponde um capital de remição de € 22.586,78;

- o CCT celebrado entre a Liga Portuguesa de Futebol e o Sindicato dos Jogadores Profissionais de Futebol (BTE n.º 33/99, 1.ª Série), com Portaria de extensão de 20.10.99, e o Protocolo celebrado entre a Desporto Seguro – Mediadora dos Clubes Portugueses e seus associados e a seguradora, ora recorrente, estabelecem que, em caso de invalidez permanente para a actividade específica de atleta profissional e para efeitos do cálculo da pensão respectiva, deve ser considerada a grelha de comutação apensa ao referido Protocolo, sendo que essa grelha prevê os 34 anos como a idade máxima para o exercício da profissão;

- deste modo, ainda que se entendesse que a lei não estabelece qualquer limitação relativamente às profissões de desgaste rápido, a verdade é que a responsabilidade da recorrente sempre estaria limitada nos termos do contrato de seguro celebrado entre a recorrente e a entidade patronal do sinistrado, uma vez que esta se limitou a transferir a sua responsabilidade pelas indemnizações decorrentes de uma incapacidade permanente sem incapacidade para o trabalho habitual, situação esta que é em tudo idêntica às frequentemente verificadas em que as entidades patronais apenas transferem para as seguradoras uma parte da retribuição auferidas pelos trabalhadores;

- sem prescindir, o cálculo da pensão sempre estaria incorrecto, por ter levado em conta uma

retribuição superior à prevista no art.º 2.º, n.º 2, alínea b), da Lei n.º 8/2003 e por não ter em conta a ponderação a que o art.º 17.º da lei n.º 100/97 manda atender, nos casos de incapacidade

permanente absoluta para o trabalho habitual;

- correctamente calculada, a pensão anual devida ao sinistrado seria de € 20.368,99, sendo da responsabilidade da recorrente o pagamento da quantia de € 18.800,58 e da entidade empregadora o pagamento da quantia de € 1.568,41;

- o subsídio por elevada incapacidade permanente é igual a 12 vezes a remuneração mínima garantida à data do acidente (que era de € 334,19) e, nas situações de incapacidade permanente absoluta para o trabalho habitual, deve ser ponderado em função do grau de incapacidade

permanente de que o sinistrado ficou afectado para as restantes profissões, ou seja, deve

corresponder a 70% do salário mínimo nacional mais elevado, acrescido do montante que resultar da multiplicação do grau de incapacidade permanente de que o sinistrado ficou afectado para as restantes profissões, por 30% daquele salário mínimo;

- assim, no caso em apreço, o subsídio devido ao sinistrado é tão-somente de € 2.867,35.

O Tribunal da Relação de Lisboa (com um voto de vencido relativamente ao montante do subsídio por elevada incapacidade) julgou parcialmente procedente o recurso e, alterando a sentença, condenou:

- a ré Companhia de Seguros a pagar ao sinistrado a pensão anual e vitalícia de € 1.920,37, com início em 22.2.2003 (correspondente a 6,34% da pensão global de € 30.314,44), € 4.010,28, a título

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de subsídio por situação de levada incapacidade, e juros de mora;

- a ré entidade empregadora pagar ao sinistrado a pensão anual e vitalícia de € 28.394,07, com início em 22.2.2003 (correspondente a 93,66% da referida pensão global), acrescida dos juros de mora.

E tal decisão assentou na seguinte argumentação:

- a Lei n.º 8/2003, de 12 de Maio – que veio estabelecer o regime de reparação dos acidentes de trabalho sofridos pelo praticantes desportivos profissionais – não é aplicável ao caso dos autos, uma vez que a mesma só é aplicável aos acidentes ocorridos após a sua entrada em vigor (o que ocorreu no dia seguinte ao da sua publicação – vide art.º 7.º da referida Lei) e o acidente que vitimou o sinistrado tinha sucedido em 28.7.2001;

- a IPTH é de levar em conta no cálculo da pensão, nos termos da Lei n.º 100/97, de 13 de Setembro, por esta ser a lei geral e não contemplar qualquer especificidade relativamente aos praticantes desportivos profissionais;

- apesar disso, a seguradora só responde nos termos do contrato de seguro, sendo que este não cobria a reparação por IPTH nem a totalidade do salário auferido pelo sinistrado;

- na fixação do subsídio por elevada incapacidade permanente há que levar em conta o salário mínimo nacional mais elevado em vigor à data do acidente e não à data da alta;

- na fixação daquele subsídio não há que distinguir entre as situações de incapacidade permanente absoluta para todo e qualquer trabalho e as situações de incapacidade permanente absoluta para o trabalho habitual.

Inconformado com a decisão da Relação, o réu Clube de Futebol E... da A... interpôs recurso de revista, tendo concluído as respectivas alegações da seguinte forma:

«1 - O processo encontra-se ferido de nulidade desde a primeira intervenção irregular do ora recorrente em face do mesmo não ter constituído mandatário sendo todavia essa constituição obrigatória de acordo com o art. 31.º do CPC.

2 - Em momento algum foi o ora recorrente notificado para constituir mandatário pelo que a sua defesa ficou seriamente comprometida durante todo o processado.

3 - Por outro lado, e sem prejuízo do exposto, o Ac. da Relação foi para além do objecto

determinado no recurso ao se pronunciar não só relativamente ao coeficiente a aplicar como ainda ao determinar a responsabilidade para cada uma das partes em contradição com a sentença proferida em 1ª instância.

4 -Ao fazê-lo pronuncia-se sobre questões que não foram objecto de recurso e relativamente à qual se formara caso julgado, e portanto sobre a qual não podia tomar conhecimento, incorrendo em excesso de pronúncia bem como condena em objecto diverso do pedido o que acarreta o vício de nulidade da decisão de acordo com o art. 668.°, n.º 1, als. d) e e) do CPC.

5- Mais, não interpreta o Tribunal da Relação de Lisboa correctamente a legislação aplicável ao caso ao eximir da responsabilidade da R. seguradora da pensão por IPATH e [ao] ter atribuído essa responsabilidade apenas ao ora recorrente[,] por considerar que a cobertura da apólice excluía a pensão por IPATH[,] a partir dos 35 anos de idade.

6- Não é isso que resulta da LAT nem mesmo do contrato de seguro e do protocolo que a mesma celebrou com a Desporto Seguro – Mediadora dos Clubes Portugueses e seus Associados[,]

conforme referido.

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Em face do exposto, requer-se a V/ Exas. que

a) seja proferida decisão no sentido de anular todo o processado, desde a primeira intervenção irregular do ora recorrente e consequentemente revoguem a decisão do Tribunal da Relação, b) caso assim não se entenda, que seja revogada a decisão do Tribunal da Relação por a mesma apreciar questão que não foi objecto de recurso e nessa medida questão relativamente à qual se formara caso julgado, sendo a sua apreciação nula nos termos supra referidos bem ainda,

conforme supra exposto, não ter aplicado correctamente a legislação em vigor, no que à responsabilidade da R. Seguradora quanto à atribuição da pensão pela IPATH diz respeito.»

A seguradora contra-alegou, defendendo a confirmação da decisão recorrida e, neste Supremo Tribunal, a Ex.ma Procuradora-Geral pronunciou-se pela improcedência do recurso, em parecer a que as partes não reagiram.

Corridos os vistos dos Ex.mos Juízes Conselheiros adjuntos, cumpre apreciar e decidir.

2. Os factos

Os factos que vêm dados como provados são os seguintes:

1. O A. exerceu, até 30 de Junho de 2002, a profissão de jogador de futebol profissional, na posição de guarda-redes.

2. Desde 1 de Julho de 1999 até 30 de Junho de 2002, o A. exerceu a sua actividade ao serviço do ora R. Clube de Futebol E... da A... .

3. No dia 28 de Julho de 2001, pela 19 horas, em C... do B..., quando se encontrava ao serviço do R. Clube de Futebol E... da A..., no decurso de um jogo de futebol com a equipa local, no âmbito da preparação da época desportiva de 2001/2002, o A. foi vítima de um acidente, o qual lhe provocou as lesões melhor descritas nos autos.

4. Em consequência do referido acidente, o A. sofreu incapacidades temporárias para o trabalho.

5. O A. teve alta a 21.2.2003.

6. À data referida em 3, o A. auferia a retribuição anual de € 59.440,09 (cinquenta e nove mil, quatrocentos e quarenta euros e nove cêntimos).

7. Enquanto se manteve com incapacidades temporárias, o A. auferiu o vencimento por inteiro.

8. O A. auferia a remuneração anual ilíquida de € 59.440,09 (cinquenta e nove mil, quatrocentos e quarenta euros e nove cêntimos).

9. A entidade patronal do A. tinha a sua responsabilidade civil emergente de acidentes de trabalho transferida para a Ré, em função da retribuição anual de Esc. 11.000.000$00, através de contrato de seguro titulado pela apólice 20.5303477.

10. Na tentativa de conciliação, as RR. reconheceram o acidente dos autos como de trabalho e o nexo causal entre esse acidente e as lesões apresentadas pelo A.

11. No anexo 1, pontos 3 e 6, do Protocolo estabelecido entre a DESPORTO SEGURO – -

Mediadora dos Clubes Portugueses e seus Associados e a Seguradora R., de que foi junto cópia a fls. 118 a 133, ficou consignado, em matéria de acidentes de trabalho dos jogadores profissionais, que "em caso de incapacidade permanente, e para efeitos do cálculo da pensão respectiva, será considerada a grelha de comutação apensa ao presente Protocolo de Acordo e o limite máximo de quinze (15) salários mínimos nacionais, de harmonia com o Contrato de Colectivo de Trabalho dos Jogadores Profissionais de Futebol".

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12. O contrato de seguro referido na alínea 9 foi celebrado no âmbito do protocolo a que se alude em 11.

13. O A. nasceu em 29/12/1966[ - Este facto foi aditado pela Relação.].

Os factos referidos não foram objecto de impugnação pelo recorrente e não sofrem de dos vícios previstos no art.º 729.º, n.º 3, do CPC, susceptíveis de justificar a intervenção oficiosa deste

Supremo Tribunal no que concerne à factualidade em causa. Há-de ser, por isso, com base nesses factos e nos documentos para que os mesmos remetem que o recurso terá de ser apreciado.

3. O direito

Como decorre das conclusões formuladas pelo recorrente, são três as questões por ele suscitadas no recurso:

- saber se o processo deve ser considerado nulo, a partir da primeira intervenção do recorrente;

- saber se o acórdão recorrido sofre de nulidade, por ter conhecido de questão que a seguradora não tinha colocado no recurso de apelação;

- saber se a seguradora é responsável pelo pagamento da pensão correspondente à IPATH.

3. 1 Da nulidade processual

O recorrente alega que interveio no processo sem constituir mandatário judicial, apesar de tal constituição ser obrigatória nos termos do art.º 32.º, n.º 1, alínea a), do CPC, e que, em momento algum, foi notificado para constituir mandatário, o que prejudicou seriamente a sua defesa, tendo essa irregularidade influído no exame e na decisão da causa, conduzindo, por isso, à nulidade de todo o processado a partir da sua primeira intervenção nos autos.

Como decorre do assim alegado pelo recorrente, a nulidade por ele invocada seria

inequivocamente de natureza processual e cairia na previsão do estatuído no art.º 201.º, n.º 1, do CPC. Todavia e como é sabido, o recurso não é meio processual idóneo para reagir contra as nulidades processuais, uma vez que os recursos têm por função a impugnação das decisões judiciais (art.º 676.º, n.º 1, do CPC).

É bem conhecida a expressão dos despachos recorre-se, contra as nulidades reclama--se.

Efectivamente, conforme resulta do teor dos artigos 203.º, 204.º e 205.º do CPC, a reacção contra as nulidades processuais realiza-se através da respectiva arguição junto do tribunal onde as mesmas foram cometidas. A sua arguição junto do tribunal superior só pode ser efectuada quando o processo tiver sido expedido em recurso antes de findar o prazo da sua arguição (art.º 205.º, n.º 3, do CPC), mas tal arguição terá naturalmente de ser feita através de requerimento autónomo e não pela via do recurso.

Só assim não será, isto é, a arguição junto do tribunal onde foram cometidas só não será a forma adequada de reagir contra as nulidades processuais, se estas tiverem sido cometidas ao abrigo de um despacho judicial. Na verdade, como diz A. Reis (Comentário, II, p. 507) se há um despacho a ordenar ou autorizar a prática ou omissão do acto ou da formalidade, o meio próprio para reagir contra a ilegalidade que se tenha cometido não é a arguição ou reclamação por nulidade, é a

impugnação do respectivo despacho pela interposição do recurso competente, pois, de outro modo, estar-se-ia a pedir ao juiz que alterasse ou revogasse o seu próprio despacho, o que é contrário ao

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princípio de que, proferida a decisão, fica esgotado o poder jurisdicional de quem a proferiu (art.º 666.º, n.º 1, do CPC).

E sendo assim, como se entende que é, é óbvio que o Supremo não pode conhecer da alegada nulidade processual.

É certo que a pretensa nulidade foi arguida pelo recorrente junto do tribunal da 1.ª instância, depois de ter sido notificado da conta e para pagar as custas (fls. 300), mas também é verdade que a nulidade foi indeferida por despacho proferido a fls. 317 e que o recurso de agravo interposto desse despacho (fls. 327 e 415) veio a ser julgado deserto, pelo facto de o respectivo requerimento não vir acompanhado das correspondentes alegações, conforme despacho proferido a fls. 429, que não foi objecto de qualquer reclamação.

A deserção do referido recurso também constituiria, só por si, motivo de não conhecimento da nulidade invocada.

3.2 Da nulidade do acórdão recorrido

O recorrente alega que, no recurso de apelação, a seguradora não questionou a quota--parte de responsabilidade atribuída, na sentença, a cada uma das partes (92,3% para a seguradora e 7,7%

para o Clube), mas que o acórdão recorrido alterou as referidas quotas-partes, incorrendo assim nos vícios de excesso de pronúncia e de condenação além do pedido, o que configura as nulidades previstas nas alíneas d) e e) do n.º 1 do art.º 668.º do CPC.

Sucede, porém, que as nulidades invocadas não foram expressa e separadamente arguidas no requerimento de interposição do recurso de revista, como impõe o disposto no art.º 77.º, n.º 1, do CPT, que, conforme jurisprudência reiterada e pacífica deste tribunal, também é aplicável aos recursos de revista.

As nulidades em questão só foram arguidas posteriormente, nas alegações do recurso de revista, o que torna a arguição extemporânea, obstando, por isso, a que o Supremo sobre elas se pronuncie.

3.3 Da responsabilidade pelo pagamento da pensão

Como atrás já foi referido no ponto 1.Relatório, na decisão recorrida entendeu-se que no cômputo da pensão devia ser levada em conta a incapacidade permanente absoluta para o trabalho habitual de que o sinistrado ficara afectado e não somente, como pretendia a seguradora, a IPP de 5%. Mas entendeu-se, porém, que a seguradora só respondia pelo valor da pensão que corresponderia a uma IPP de 5% e à retribuição que o co-réu empregador para ela tinha transferido (€ 54.867,76), dado que “de acordo com as cláusulas do contrato de seguro a seguradora, após os 35 anos do sinistrado, não responde pela IPATH”.

O ora recorrente/Clube de Futebol E... da A... discorda da parte da decisão que ilibou a seguradora da responsabilidade pelo pagamento da pensão no que toca à IPATH, alegando, em resumo o seguinte:

- o acidente ocorreu antes da entrada em vigor da Lei n.º 8/2003, e antes da entrada em vigor da

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referida Lei não existia legislação especial de conteúdo idêntico ao daquela Lei que afastasse a aplicação do regime geral da reparação de acidentes de trabalho contido na Lei n.º 100/97 e respectivo regulamento, o Decreto-Lei n.º 143/99;

- embora ao legislador, quando estabeleceu as formas de cálculo do art.º 17.º bem como as

devidas tabelas legais, não tenha sido estranho o critério da consideração da vida activa expectável do trabalhador, e se reconheça razão à seguradora quando invoca que a perda da capacidade de ganho de um futebolista se situa antes dos 65 anos de idade, o certo é que não existia qualquer disposição legal que, anteriormente, à Lei n.º 8/2003, afastasse a aplicação da lei geral aos praticantes desportivos profissionais;

- para este efeito e em momento anterior à entrada em vigor da Lei n.º 8/2003, a invocação do clausulado no CCT celebrado entre a Liga Portuguesa de Futebol e os Sindicatos dos Jogadores Profissionais de Futebol e a invocação da apólice do contrato de seguro são irrelevantes, dado o princípio da irrenunciabilidade e da inalienabilidade das prestações estabelecidas na LAT;

- mesmo a tabela de comutação anexa ao Protocolo estabelecido entre a Desporto Seguro – Mediadora dos Clubes Portugueses e seus associados e a ré seguradora não exclui a

responsabilidade desta pela IPATH, pois tão-somente determina que o grau de desvalorização seja decrescente quanto maior for a idade do sinistrado, sendo que o limite é a idade igual ou superior a 34 anos.

Relativamente ao assim alegado pelo recorrente/empregador, importa dizer que a sua

argumentação não faz o menor sentido no que toca à não aplicação, ao caso, da Lei n.º 8/2003, uma vez que a decisão recorrida se pronunciou expressamente pela inaplicabilidade da referida Lei e pela aplicação do regime geral.

Por sua vez, no que toca à invocação do princípio da irrenunciabilidade e da inalienabilidade das prestações previstas na LAT, tal invocação também é manifestamente descabida, dado que o clausulado no contrato de seguro celebrado entre o empregador e a seguradora não é susceptível de beliscar minimamente os mencionados princípios, desde logo, pelo simples facto de o sinistrado não ser parte naquele contrato, sendo que a pensão foi calculada com base na retribuição anual que efectivamente era auferida pelo sinistrado (€ 59.440,09) que é inferior ao limite máximo estabelecido no art.º 31.º, n.º , n.º 2, do CCT acima mencionado (15 vezes o salário mínimo nacional).

Deste modo, não tendo o recorrente posto em causa o montante da pensão global que foi arbitrada ao sinistrado, apenas teremos de apreciar a argumentação por ele tecida relativamente à tabela de comutação anexa ao Protocolo celebrado entre a Desporto Seguro – Mediadora dos Clubes

Portugueses e seus associados e a ré seguradora. Mais concretamente, só temos de apreciar se o contrato de seguro não abrange a responsabilidade da seguradora relativamente à IPATH.

E para resolver esta questão importa ter presente as condições estabelecidas na apólice do contrato de seguro, especificamente as Condições Particulares juntas por cópia a fls. 6 e 7.

E no que para o caso releva, no n.º 5 das referidas Condições Particulares, que trata das

“INCAPACIDADES PERMANENTES”, estipulou-se o seguinte:

“. Para efeitos de cobertura do seguro e no respeitante às Incapacidades Permanentes, serão

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consideradas as disposições legais que disciplinam os Acidentes de Trabalho e ainda a Grelha de Comutação em anexo, com repercussão directa no cálculo da pensão a atribuir.

. Para efeitos do cálculo das Pensões, considera-se que as IPP’s objectivas iguais ou superiores a 25% são equiparadas a 100% (X) para a profissão habitual, sofrendo a pensão apurada uma redução nos termos da Grelha de Comutação (Y).”

Na decisão recorrida entendeu-se que a Grelha de Comutação referida naquele n.º 5 (e que se encontra junta a fls. 10 dos autos) não contemplava as situações de incapacidade permanente absoluta para o trabalho habitual e que, por essa razão, a responsabilidade da seguradora não abrangia a reparação dos danos decorrentes daquela incapacidade.

Discordamos em absoluto de tal entendimento. Vejamos porquê.

O n.º 5 das Condições Particulares não exclui as situações de morte nem os casos de incapacidade permanente absoluta para todo e qualquer trabalho em geral ou para o trabalho habitual em

particular. Pelo contrário, diz expressamente, no seu primeiro parágrafo, que para efeitos de cobertura do seguro e no que respeita às incapacidades permanentes serão consideradas as disposições legais que regulam os acidentes de trabalho. A referida estipulação contratual não faz qualquer ressalva no que toca às incapacidades permanentes, devendo, por isso, entender-se que a expressão incapacidades permanentes abrange todo o tipo de incapacidades permanentes: as incapacidades permanentes parciais, as incapacidades permanentes absolutas para todo e qualquer trabalho e as incapacidades permanentes absolutas para o trabalho habitual.

E tal interpretação é avalizada pelo disposto no segundo parágrafo do mencionado n.º 5, que se refere precisamente às situações de incapacidade permanente absoluta para a profissão habitual, indo mais longe, até, do que o regime geral, ao equiparar a simples incapacidade permanente para o trabalho, quando igual ou superior a 25%, à incapacidade permanente para o trabalho habitual, sujeitando, embora, a respectiva pensão a uma redução, nos termos da Grelha de Comutação, em função da idade do sinistrado, atingindo a percentagem dessa redução o seu valor máximo (30%) quando o sinistrado atingir os 34 anos de idade.

É certo que o primeiro parágrafo do n.º 5 das Condições Particulares não se limita a remeter para a lei geral dos acidentes de trabalho (a Lei n.º 100/97). Também remete para a Grelha de Comutação anexa ao contrato de seguro, precisando que essa Grelha tem repercussão directa no cálculo da pensão a atribuir.

Analisando, todavia, a referida Grelha, não vislumbramos que dela resulte a não cobertura pelo contrato de seguro da responsabilidade emergente das situações de incapacidade permanente absoluta para o trabalho habitual.

A referida Grelha, que tem por título “INVALIDEZ PERMANENTE PARA A ACTIVIDADE ESPECÍFICA DE ATELTA PROFISSIONAL”, mais não é do que uma grelha de majoração dos graus de incapacidade permanente decorrentes da Tabela Nacional de Incapacidades (TNI), majoração essa que vai até à conversão das IPP’s iguais ou superiores a 25% em incapacidade absoluta para o trabalho habitual.

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Na verdade, como da referida Grelha se constata, esta é composta por duas colunas: a coluna X e a coluna Y. A coluna X refere-se à “invalidez permanente genérica” e contém 25 graus de

incapacidade (de 1 a 25). Por sua vez, a coluna Y desdobra-se em 15 colunas, em função da idade do sinistrado (dos 20 aos 34 anos), refere-se à “invalidez permanente específica” e contém o grau de invalidez permanente específica que, em função da idade, corresponde a cada um dos graus de invalidez permanente genérica contidos na coluna X.

E da intercepção daquela duas colunas verifica-se que o objectivo da tabela foi o de majorar em termos específicos as incapacidades permanentes fixadas aos sinistrados nos termos da TNI (excepto as IPP’s inferiores a 6%), em função da idade do sinistrado, atingindo essa majoração o seu ponto mais baixo quando o sinistrado tiver 34 ou mais anos de idade.

E constata-se também que, quando a IPP genérica é igual ou superior a 25%, há lugar a uma majoração mais substancial, melhor dizendo a uma conversão da IPP, uma vez que o sinistrado é considerado com uma incapacidade específica de 100%, ou seja, é considerado com incapacidade permanente absoluta para a profissão habitual, embora o valor da pensão correspondente a essa incapacidade sofra as reduções previstas na coluna Y, em função da idade, sendo que a maior redução (30%) ocorre quando o sinistrado tem 34 ou mais anos de idade.

Assim, e a título de exemplo, se às lesões resultantes do acidente corresponder, nos termos da Tabela Nacional de Incapacidades (invalidez permanente genérica), uma IPP de 6%, a

incapacidade permanente específica a fixar ao sinistrado/praticante desportivo será de 6,425%, se tiver 20 anos de idade, e será de 6,027%, se tiver 34 de idade. E a majoração vai sendo cada vez mais substancial à medida que o grau da IPP vai aumentando, sendo convertida em IPATH quando atingir os 25%, como já se disse.

A Grelha de Comutação nada tem, pois, a ver com as situações de incapacidade permanente absoluta, seja para todo e qualquer trabalho, seja apenas para o trabalho habitual, sendo, por isso, absolutamente descabido afirmar que a mesma só prevê a reparação por incapacidade permanente absoluta para o trabalho habitual, se o praticante desportivo não tiver mais do que 34 anos de idade. Como decorre do que já foi dito, os 34 anos funcionam como idade limite para a majoração da incapacidade permanente parcial genérica prevista na lei geral e para a redução da pensão nas situações de incapacidade permanente absoluta para o trabalho habitual resultante da conversão das incapacidades permanentes iguais ou superiores a 25%.

Fora da Grelha ficaram as incapacidades permanentes absolutas para todo e qualquer trabalho e também as incapacidades permanentes absolutas para o trabalho habitual quando resultem, não da conversão prevista na Grelha, mas sim da aplicação directa da TNI, como foi o caso do

sinistrado.

De qualquer modo, mesmo que se aceitasse a tese da seguradora e da Relação, de que o contrato de seguro excluía a pensão por incapacidade permanente absoluta para o trabalho habitual a partir dos 35 anos de idade, a verdade é que, in casu, essa exclusão não se verificaria, uma vez que à data do acidente o sinistrado apenas tinha 34 anos de idade (recorde-se que o acidente ocorreu em 28 de Julho de 2001 e o sinistrado nasceu em 29 de Dezembro de 1966), sendo que a data

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relevante para efeitos do contrato de seguro é a data em que o sinistro laboral ocorreu e não, como entendeu a Relação, a data do início da pensão (22.2.2003).

E, sendo assim, temos de concluir pela procedência do recurso, o que implica que a ré seguradora passa a responder pela pensão que ao sinistrado foi arbitrada, e não só pela pensão que

corresponderia à IPP de 5%, embora essa sua responsabilidade seja restrita à retribuição coberta pelo contrato de seguro, o que vale por dizer que a seguradora e o réu empregador são

responsáveis pelo pagamento das pensões nos termos em que foram condenados na 1.ª instância.

4. Decisão

Nos termos expostos, decide-se julgar procedente o recurso, revogar o acórdão recorrido na parte referente à responsabilidade pelo pagamento da pensão e repristinar nessa parte a sentença da 1.ª instância.

Custas pela seguradora, nas instâncias e no Supremo.

LISBOA, 23 de Setembro de 2009 Sousa Peixoto

Sousa Grandão Pinto Hespanhol

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